AS RELAÇÕES CONSTITUTIVAS DO SER SOCIAL

Documentos relacionados
A sociologia de Marx. A sociologia de Marx Monitor: Pedro Ribeiro 24/05/2014. Material de apoio para Monitoria

Sofrimento Psíquico e Trabalho

MATERIALISMO HISTÓRICO (Marx e Engels)

O TRABALHO NA DIALÉTICA MARXISTA: UMA PERSPECTIVA ONTOLÓGICA.

LIBERDADE E POLÍTICA KARL MARX

OS PROCESSOS DE SOCIALIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO ESCOLAR: AS CONCEPÇÕES DOS PROFESSORES

Uma análise ontológica sobre a Relação de Identidade entre Produção, Distribuição, Troca e Consumo

Aula 8 A crítica marxista e o paradigma da evolução contraditória. Profa. Dra. Eliana Tadeu Terci

- Foi ele quem introduziu um sistema para compreender a história da filosofia e do mundo,

ALGUNS PRESSUPOSTOS EM COMUM ENTRE: MATERIALISMO HISTÓRICO DIALÉTICO TEORIA HISTÓRICO CULTURAL PEDAGOGIA HISTÓRICO CRÍTICA

EDUCAÇÃO: UMA ABORDAGEM CRÍTICA

PLURALIDADE CULTURAL E EDUCAÇÃO*

Shauane Itainhara Freire Nunes. Universidade Federal de Sergipe. INTRODUÇÃO

ANOTAÇÕES SOBRA A CRÍTICA DE MARX À CONCEPÇÃO DO ESTADO DE HEGEL

(A Ideologia Alemã Introdução)

A DIALÉTICA HUMANIZAÇÃO-ALIENAÇÃO NO TRABALHO: DO POTENCIAL HUMANIZADOR AO SENTIDO EMPOBRECIDO NA ATIVIDADE DE TRABALHO

Comparação entre as abordagens de classe marxiana e weberiana

FILOSOFIA E SOCIEDADE: O TRABALHO NA SOCIEDADE MODERNA

Os Sociólogos Clássicos Pt.2

Concepção de Educação e Trabalho

UMA BREVE APROXIMAÇÃO: A ONTOLOGIA DO SER SOCIAL E O TRABALHO ENQUANTO CATEGORIA FUNDANTE

SOBRE A CENTRALIDADE DO TRABALHO: da antropologia filosófica à ontologia do ser social Vinícius Bezerra *

A IDEOLOGIA ALEMÃ - SEGUNDA PARTE

Introdução ao pensamento de Marx 1

O TRABALHO E A ORIGEM DO HOMEM EM SOCIEDADE: UMA ANÁLISE ATRAVÉS DA FILOSOFIA DE MARX E LUKÁCS

HISTORICIDADE DA IDEOLOGIA: DE CONCEITO CRÍTICO A CONCEITO ADAPTADO

Teoria da História. Prof. Dr. Celso Ramos Figueiredo Filho

Currículo Integrado: Os desafios do PROEJA Componentes curriculares do processo ensino aprendizagem

A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO DO PROFESSOR DE EDUCAÇAO FÍSICA: NECESSIDADES PARA ALÉM DA SOCIEDADE DO CAPITAL

O Serviço Social na cena contemporânea. Profª. Jussara Almeida

PARA ALÉM DO IDEALISMO E DA TEORIA CRÍTICO-REPRODUTIVISTA: ANÁLISE MARXISTA DOS LIMITES DA EDUCAÇÃO ESCOLAR NA ORDEM DO CAPITAL

ÉTICA: FUNDAMENTOS SÓCIO - HISTÓRICOS

O ESTADO MODERNO COMO PROCESSO HISTÓRICO A formação do Estado na concepção dialética de Hegel

Sobre a Questão Judaica (1843)

A IMPORTÂNCIA DA CONCEPÇÃO ONTOLÓGICA PARA A TEORIA DO ESTADO

Abril Sociologia 2ª Série Marx

CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ CURSO DE DESIGN. Método Dialético. Profª: Kátia Paulino

O Mundo reificado ou Da Natureza da economia

IDEALISMO ESPECULATIVO E A FENOMENOLOGIA DO ESPÍRITO CURSO DE EXTENSÃO 22/10/ Prof. Ricardo Pereira Tassinari

A Crítica Marxista ao Processo de Trabalho no Capitalismo

DESAFIOS DOS ESTUDOS CURRICULARES CRÍTICOS:

História das Teorias Econômicas Aula 5: Karl Marx Instituto de Geociências / Unicamp

A partir de nossas análises e estudos, preencha adequadamente as lacunas da sentença abaixo, na respectiva ordem:

FILOSOFIA DO SÉCULO XIX

Trabalho e Educação 68 horas. Universidade Estadual de Ponta Grossa Curso de Pedagogia 4º ano Professora Gisele Masson

CUIDADO! ELES PODEM OUVIR: A DIALÉTICA DO SENHOR E DO ESCRAVO

e-issn Vol 8 Nº ª edição

ENSAIO SOBRE MARX E ENGELS, MÉSZÁROS E O PROBLEMA DA IDEOLOGIA. Alexandre de Jesus Santos 1 Mailton Rocha Pereira 2 INTRODUÇÃO

CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ CURSO DE DIREITO. Método Dialético. Profª: Kátia Paulino

1. A dialética de Hegel a) envolve duas etapas, formadas por opostos encontrados na natureza (dia-noite, claro-escuro, friocalor).

Revista Filosofia Capital ISSN Vol. 1, Edição 2, Ano BREVE ANÁLISE FILOSÓFICA DA PESSOA HUMANA DO PERÍODO CLÁSSICO AO CONTEMPORÂNEO

EDUCAÇÃO E IDEOLOGIA

Teorias socialistas. Capítulo 26. Socialismo aparece como uma reação às péssimas condições dos trabalhadores SOCIALISMO UTÓPICO ROBERT OWEN

BREVES REFLEXÕES SOBRE A DUPLA FACE DA CATEGORIA TRABALHO EM MARX RESUMO

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA PLANO DE ENSINO DA DISCIPLINA

As concepções do Ser humano na filosofia contemporânea

Santomé (1998) explica que a denominação

SOBRE O MÉTODO MARXIANO PARA O CONHECIMENTO DO SER SOCIAL

EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO NO SISTEMA CAPITALISTA

Marxismo e Autogestão

INTRODUÇÃO LONDON, J. Ao sul da fenda. In: LONDON, J. Contos. São Paulo: Expressão Popular, (p )

A Filosofia Hegeliana

Uma concepção marxista de homem

A fenomenologia de O Capital

KARL MARX MATERIALISMO HISTÓRICO E DIALÉTICO

Introdução a Filosofia

MARX, ENGELS E A DIVISÃO SEXUAL DO TRABALHO

Positivismo de Augusto Comte, Colégio Ser Ensino Médio Introdução à Sociologia Prof. Marilia Coltri

NOTAS PARA UMA CONTRIBUIÇÃO À CONCEPÇÃO MARXIANA DA TECNOLOGIA. Palavras-chave: Tecnologia; Trabalho; Marxismo; Economia política.

PLANEJAMENTO. GOIÂNIA, 20 de março de 2013.

Teoria de Karl Marx ( )

REPRODUÇÃO, DIVISÃO DO TRABALHO E DESIGUALDADE SOCIAL

PLANO DE CURSO. 1. Apresentar a emergência da teoria social de Marx e da tradição sociológica, discutindo os traços pertinentes destas duas vertentes.

OLÍTICAS PÚBLICAS INCLUSIVAS, FORMAÇÃO DOCENTE E EDUCAÇÃO INFANTIL: NA REDE MUNICIPAL DE MARINGÁ

O pensamento sociológico no séc. XIX. Sociologia Profa. Ms. Maria Thereza Rímoli

PARA QUE E PARA QUEM A ESCOLA CAPITALISTA SERVE? Um olhar sob à luz da teoria Marxiana do valor

ETICA E FUNDAMENTOS SOCIO-HISTÓRICOS. Profª.Ms.Maria Beatriz Alarcón Disciplina:Ética e Serviço Social (2012)

O MÉTODO SOB A ONTOLOGIA DO SER SOCIAL: A CONTRIBUIÇÃO DA CATEGORIA TRABALHO NO PROCESSO DE INVESTIGAÇÃO E EXPOSIÇÃO

FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA PROFESSOR: REINALDO SOUZA

Universidade de São Paulo Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz KARL MARX. Tiago Barbosa Diniz

MARX. Prof. Fabiano Rosa de Magalhães

Sociologia 23/11/2015 PRODUÇÃO & MODELOS ECONÔMICOS TIPOS DE MODOS DE PRODUÇÃO

O MATERIALISMO-HISTÓRICO: UMA NOVA LEITURA DA FORMA DE SER DOS HOMENS

TRABALHO FUNDANTE E ONTOLOGIA DO SER SOCIAL EM KARL MARX E ÁLVARO VIEIRA PINTO

A CONCEPÇÃO DE HISTÓRIA EM MARX 1

COLÉGIO CEC 24/08/2015. Conceito de Dialética. Professor: Carlos Eduardo Foganholo DIALÉTICA. Originalmente, é a arte do diálogo, da contraposição de

Teorias do materialismo histórico-dialético e históricocultural como fundamento para a formação docente

IDEOLOGIA: UMA IDEIA OU UMA INFLUÊNCIA?

O Trabalho como centro das discussões da teoria marxiana.

IDEALISMO ESPECULATIVO, FELICIDADE E ESPÍRITO LIVRE CURSO DE EXTENSÃO 24/10/ Prof. Ricardo Pereira Tassinari

Desenvolvimento Capitalista e Questão Social. Profa. Roseli Albuquerque

HISTORIOGRAFIA EM TRABALHO E EDUCAÇÃO

Profª Karina Oliveira Bezerra Aula 05 Unidade 1, capítulo 5: p. 63 Unidade 8, capítulo 5: p. 455 Filme: Germinal

O PAPEL DA EDUCAÇÃO NA EMANCIPAÇÃO HUMANA: LIMITES E POSSIBILIDADES SOB O OLHAR DO MATERIALISMO HISTORICO DIALÉTICO

ARON, Raymond. O Marxismo de Marx. 3. Ed. Tradução: Jorge Bastos. São Paulo: Arx, 2005.

O entendimento dialético da transição

A dialética e a concepção universalista em Hegel e em Marx: IDEALISMO E MATERIALISMO:

Programa de Disciplina

A Abolição do Trabalho: Marcuse e o Processo de Trabalho em Razão e Revolução

Transcrição:

AS RELAÇÕES CONSTITUTIVAS DO SER SOCIAL BASTOS, Rachel Benta Messias Faculdade de Educação rachelbenta@hotmail.com Os seres humanos produzem ações para garantir a produção e a reprodução da vida. A ação humana é estabelecida nas relações homem natureza e homem homem, realizada através do trabalho. O homem recria a si próprio, reproduz sua espécie, transforma a natureza e por ela é transformado. O que possibilita a sua existência é justamente os homens estarem em condições, segundo Marx e Engels (1984) [...] de viver para poder fazer história. Mas para viver, é preciso antes de tudo comer, beber, ter habitação, vestir-se e algumas coisas mais (p.39). Trata-se do modo de produção da vida material condicionado a vida social. Na produção social das suas vidas os homens entram em relações definidas, que são indispensáveis e independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem a uma fase definida de desenvolvimento das suas forças materiais de produção. A soma total destas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se ergue uma superstrutura legal e política e à qual correspondem formas definidas de consciência social (MARX, 1974, p. 62). O homem produz sua própria realidade social através das condições materiais existentes. Na relação com a natureza, o homem objetiva-se e constitui a sua humanidade por meio do trabalho. É uma ação que o homem reproduz a cada momento, de forma que o homem tem como referência uma realidade já construída por outros homens (MARX e ENGELS, 1984). Essa produção objetiva o difere dos animais, que atuam na natureza de forma inconsciente. É através da ação produtiva que o homem humaniza a natureza e a si. Em relação à existência do homem, Marx e Engels (1984) afirmam também que o primeiro ato histórico do homem é essa possibilidade de satisfação de suas necessidades, é a produção da vida material. O segundo ato é a condução de novas necessidades após a ação e o instrumento de satisfação das necessidades primárias. E a terceira é a própria relação entre os homens, é a criação da família. Esta família que no início é a única relação social, torna-se depois, quando as necessidades ampliadas engendram novas relações sociais e o acréscimo de população engendra novas necessidades [...] (p.41). A existência humana, portanto, é caracterizada pelo domínio na natureza, pela organização social e o estabelecimento de relações sociais.

Neste sentido, a satisfação das necessidades ocorre através do trabalho, a partir de uma dupla relação: a natural e a social. Esta última é compreendida como a cooperação dos indivíduos e constitui as forças produtivas vinculadas à divisão do trabalho. Cada um tem uma atividade determinada, vinculada a uma distribuição desigual do trabalho e dos produtos (propriedade privada). Isto engendra uma separação entre o interesse comum e o interesse particular. Com esse antagonismo social, as contradições estão postas tanto na divisão do trabalho, como no próprio ato de produzir, que cria novas necessidades, não apenas naturais e físicas, mas também provenientes da própria experiência da atividade social do homem. O homem, portanto constitui-se no trabalho, na mediação com a natureza. O trabalho é objetivação humana, é condição de ser da consciência em um processo de apropriação, naturalização e humanização da natureza. Trata-se do trabalho universal, do metabolismo entre o homem e a natureza, com a finalidade de produzir e reproduzir os meios de vida para suprir as suas necessidades. Para Marx e Engels (1984) O modo pelo qual os homens produzem seus meios de vida depende, antes de tudo da natureza dos meios de vida já encontrados e que têm de reproduzir. Não se deve considerar tal modo de produção de um único ponto de vista, a saber: a reprodução da existência física dos indivíduos. Trata-se, muito mais, de uma determinada forma de atividade dos indivíduos, determinada forma de manifestar sua vida, determinado modo de vida dos mesmos. Tal como os indivíduos manifestam sua vida, assim são eles. O que eles são coincide, portanto, com a sua produção, tanto com o que produzem, como o modo como produzem. O que os indivíduos são, portanto, depende das condições materiais de sua produção (p. 27-28). O trabalho enquanto objetivação humana produz as relações sociais e sendo o homem um ser, que veio ao mundo carente, portador de necessidades, precisa se objetivar na relação com o outro. É da sua natureza a incompletude, assim, a apetência, a exteriorização da consciência põe a necessidade de objetivação. É, portanto, a ação do homem que modifica o curso da história, a produção de objetivações cria a existência de indivíduos humanos vivos. Desse modo, as necessidades são ampliadas a outros homens, criando as relações sociais que determinam as condições históricas do trabalho. A dependência entre os homens é recíproca, um não sobrevive sem o outro. As suas necessidades são produzidas historicamente nas relações sociais, constituidora da subjetividade e da objetividade e da sua distinção em relação aos animais.

Pode-se distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião ou por tudo que se queira. Mas eles próprios começam a se diferenciar dos animais tão logo começam a produzir seus meios de vida, passo este que é condicionado por sua organização corporal. Produzindo seus meios de vida, os homens produzem, indiretamente, sua própria vida material (MARX E ENGELS, 1984, p.27). A relação de dependência entre os homens é uma condição de ser, é ontológica, está relacionada à objetivação e a produção da consciência. A ontologia não é uma determinação histórica, mas sim uma universalidade da condição de objetivação do ser social. Nesta perspectiva, a realidade está mediada pelas objetivações das consciências humanas, de acordo com Hegel. O homem exterioriza, se coloca, reconhece, interioriza o objeto não mais externo a ele, mas como objeto para sua consciência. O que constitui esse objeto é a idéia. É o trabalho universal compreendido como condição positiva que está ocorrendo no plano das idéias. Mas para Marx (1989) essa objetivação humana em certa particularidade histórica, como a sociedade capitalista, não acontece, fica obstacularizada, pois a objetivação é negação da consciência do sujeito, ele não se reconhece como ser genérico. E o alienamento que era condição da consciência se converte em alienação, não ocorre o momento do reconhecimento, é a negatividade do trabalho. Essas objetivações não são de reconhecimento em decorrência da formas sociais do trabalho. Desse modo Marx, afirma que Hegel se deteve apenas nos aspectos positivos do trabalho. Marx (1989) submete a ontologia a práxis histórica, isto é, a particularidade histórica impõe-se sobre a condição natural do homem, determinando a realidade. A vinculação por meio do trabalho, que é condição ontológica do homem, condição de ser humano, é subordinado a condição histórica das relações sociais produzidas pelo modo de vida ou forma social do trabalho. É a ação do homem em suas relações concretas, práxis, que o próprio homem poderá intervir transformando esse contexto, elucidando a realidade, apreendendo o concreto e suas determinações. A práxis constitui a instância concreta de realização da natureza humana. Para Marx e Engels (1984) trata-se também da realidade compreendida como objeto, como uma atividade humana sensível, práxis entendida lógica e historicamente. Neste sentido, as mudanças históricas a partir da atividade sensível viva dos homens, é mediada pelo trabalho. Os homens desenvolvem a sua produção material e suas relações matérias e com isso mudam a realidade, também o pensamento, haja vista que é a realidade que determina a consciência.

É pelo trabalho que o homem se descobre como ser da práxis, ser individual e coletivo. Esse trabalho enquanto práxis cria e recria as condições materiais e espirituais de existência humana. E é na materialidade histórica que acontecem as objetivações humanas e a constituição da consciência. Com isso, se contrapõe a dialética hegeliana, ao afirmar que: Para Hegel, o processo de pensamento, que ele, sob o nome de idéia, transforma num sujeito autônomo, é o demiurgo do real, real que constitui apenas a sua manifestação externa. Para mim, pelo contrário, o ideal não é nada mais que o material, transposto e traduzido na cabeça do homem (MARX, 1999, p.28) Para Marx, o momento da objetivação humana é o da inserção do homem como ser, genérico, social. O trabalho é compreendido como uma elaboração histórica que constitui uma categoria lógica e epistemológica fundamental da sociedade. O trabalho é determinação histórica que produz às classes, as coisas, as estruturas, os sentidos das objetivações humanas, funda as condições, ser e de se desenvolver da sociedade. Mas nesta particularidade histórica do capitalismo esse trabalho constitui-se como alienado, em função do antagonismo das forças produtivas e das relações sociais de produção. O trabalho alienado produz o objeto como ser estranho ao trabalhador; [...] o trabalho, a atividade vital, a vida produtiva, aparece agora ao homem como o único meio de satisfação de uma necessidade, a de manter a existência física (MARX, 1989, p. 164). Esse estado de alienação reproduz principalmente através da negação do homem de sua condição de ser genérico. O homem como ser genérico é um ser humano na sua totalidade e universalidade e está relacionado a constituição da vida orgânica e intelectual a partir da objetivação humana. Essa é um fator determinante da consciência do sujeito perante a si próprio como espécie presente, viva, como um ser universal, e portanto livre (MARX, 1989, p. 165). Na medida em que a alienação, como uma forma capitalista de elaboração da consciência e de formação do sujeito, marca a relação de exterioridade entre o trabalhador e o processo de produção, o trabalhador e o trabalho são desvinculados da determinação recíproca entre eles. Com isso, o homem trabalho, como forças contrárias, culmina para a negação do homem na sua possibilidade de objetivação. Desse modo, não há consciência ou autoconsciência para o homem que aliena de si mesmo. Assim, para Marx (1989), a alienação pode ser compreendida como um elemento de legitimação de uma realidade sem passado, e sem futuro, que dificulta por sua vez a

possibilidade dos sujeitos constituírem-se a partir de relações sociais que visem o humano como princípio. No capitalismo, o trabalho é alienado e está incorporado na própria forma como a sociedade reproduz-se em todas as áreas da vida humana, que atinge a alienação das relações dos homens entre si e, desses com a cultura, política, aspectos históricos. Neste sentido, o princípio ontológico está impossibilitado pela alienação presente na materialidade histórica. A materialidade é composta por relações humanas constituídas socialmente por diversos nexos, econômico, social, cultural, político. São relações complexas e de interdependências entre os indivíduos, que produzem a vida material. Para Marx, O modo de produção da vida material condiciona o processo em geral de vida social, político e espiritual. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas ao contrário, é o seu ser social que determina sua consciência (1978, p.130). E sendo a vida material alienada pelas formas sociais do trabalho, instaura, portanto a idéia de que as objetivações humanas implicam a negação do sujeito e domínio do objeto sobre ele. Desse modo, os sujeitos não são puramente natureza, mas também natureza historicamente determinada. O trabalho é compreendido como uma categoria universal, que na particularidade histórica do capitalismo se transforma em trabalho alienado, desenvolvido a partir de determinadas formas e condições históricas contraditórias da relação do modo de produção e das relações de produção. Trata-se das relações sociais de produção contraditórias inerente ao sistema social. A contradição é engendrada no movimento das relações determinadas pela forma social do trabalho capitalista na sociedade. Para Marx (1974) a sociedade é um sistema social. Esse é definido a partir dos seguintes aspectos: ter mais de uma unidade identificável de caráter social; ter uma vinculação duradoura e também que as relações internas constituam distintas da externas. Nesta perspectiva, as relações sociais de produção, nesse sistema, são denominadas como interações que os homens estabelecem entre si, por meio do desenvolvimento das forças de produção, compondo assim o modo de produção. REFERÊNCIAS

MARX, K. Para a crítica da economia política. In: Marx Os pensadores. Tradução de José Carlos Bruni (et al). 2ª ed. São Paulo: Abril Cultural, 1978, p.103-132.. Sociedade e mudanças sociais. Lisboa: Edições 70, 1974..Manuscritos econômico-filosóficos. Tradução: Artur Morão. Lisboa; Portugual: Edições 70, 1989.. O Capital. Livro I, 17ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1999. e ENGELS. A Ideologia Alemã (Feuerbach). Tradução de José Carlos Bruni e Marco Aurélio Nogueira. 4ªed. São Paulo, Hucitec, 1984.