A VOLATILIDADE DAS COTAÇÕES DE CAFÉ NAS BOLSAS INTERNACIONAIS



Documentos relacionados
Exportações recordes do Brasil influenciam o mercado cafeeiro

Preços se fixam em baixa e o foco passa a ser o próximo ano

Volatilidade retorna e preços continuam baixos no mercado de café

Preocupações com oferta diminuem e preços caem para seus níveis mais baixos de 18 meses

Ano cafeeiro de 2014/15 fecha com a maior baixa de 20 meses

Milho: preços elevados mesmo com super-safra norte-americana

Mercado cafeeiro prossegue volátil, mas sem direção

Chuvas no Brasil esfriam o mercado, enquanto estimativas da produção para 2014/15 são mais baixas

Boletim Ativos do Café - Edição 15 / Dezembro 2013 Preços do café intensificam a descapitalização na cafeicultura brasileira em 2013

1. Introdução. 1.1 Introdução

Milho Período: 11 a 15/05/2015

Curva Futura das Cotações 1 : baixa safra de café em ano de ciclo de alta

Pindyck & Rubinfeld, Capítulo 15, Mercado de Capitais::REVISÃO

Reiteradas Vendas Pressionam a Curva Futura das Cotações do Café 1

NOTAS ECONÔMICAS. Regimes cambiais dos BRICs revelam diferentes graus de intervenção no câmbio

Vamos usar a seguinte definição: Aumento da taxa de cambio = Desvalorização. Taxa de cambio real : é o preço relativo dos bens em dois paises.

Esclarecimentos sobre rentabilidade das cotas do Plano SEBRAEPREV

TRABALHO DE ECONOMIA:

Depressões e crises CAPÍTULO 22. Olivier Blanchard Pearson Education Pearson Education Macroeconomia, 4/e Olivier Blanchard

NOTA TÉCNICA ALERTA PARA OS PRODUTORES DE SOJA

Escolha de Portfólio. Professor do IE-UNICAMP

Projeções econômicas para o setor de seguros Ano 2000 (Trabalho concluído em 21/10/99)

ECONOMIA INTERNACIONAL II Professor: André M. Cunha

Setor Externo: Triste Ajuste

Tabela 01 Mundo Soja Área, produção e produtividade Safra 2009/10 a 2013/14

Gestão do Conhecimento A Chave para o Sucesso Empresarial. José Renato Sátiro Santiago Jr.

Documento Explicativo

Nota de Crédito PJ. Janeiro Fonte: BACEN Base: Novembro de 2014

2.7 Financiamento. Por que Financiamento? Comparação Internacional. Visão 2022

TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL II RELATÓRIO ANALÍTICO

Os investimentos no Brasil estão perdendo valor?

INFORMAÇÕES SOBRE CAFÉ NO ESPÍRITO SANTO HISTÓRICO:

São Paulo (SP), 20 de julho de 2015.

Módulo 2 Custos de Oportunidade e Curva de Possibilidades de Produção

fev./2010. ago./2011. fev./2012. nov.

Ano I Boletim II Outubro/2015. Primeira quinzena. são específicos aos segmentos industriais de Sertãozinho e região.

UM CONCEITO FUNDAMENTAL: PATRIMÔNIO LÍQUIDO FINANCEIRO. Prof. Alvaro Guimarães de Oliveira Rio, 07/09/2014.

Maxi Indicadores de Desempenho da Indústria de Produtos Plásticos do Estado de Santa Catarina Relatório do 4º Trimestre 2011 Análise Conjuntural

SINCOR-SP 2015 JULHO 2015 CARTA DE CONJUNTURA DO SETOR DE SEGUROS

ESTUDO SOBRE CIRCULAÇÃO DE REVISTAS

Índice de Confiança do Agronegócio

GASTAR MAIS COM A LOGÍSTICA PODE SIGNIFICAR, TAMBÉM, AUMENTO DE LUCRO

1 Introdução. futuras, que são as relevantes para descontar os fluxos de caixa.

Aula 2 Contextualização

Risco e Retorno dos Investimentos. Paulo Pereira Ferreira Miba 507

Curso CPA-10 Certificação ANBID Módulo 4 - Princípios de Investimento

SONDAGEM INDUSTRIAL Dezembro de 2015

Açúcar: Informativo Quinzenal. Oferta se acentua e preços cedem. Indicador de Açúcar Cristal Cepea/Esalq Estado de São Paulo.

NOTA CEMEC 06/2015 CÂMBIO CONTRIBUI PARA RECUPERAÇÃO DE MARGENS E COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA

ED 2059/09. 9 fevereiro 2009 Original: inglês. A crise econômica mundial e o setor cafeeiro

Visão. O comércio entre os BRICS e suas oportunidades de crescimento. do Desenvolvimento. nº abr no comércio internacional

A Taxa de Câmbio no Longo Prazo

ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE EMPRESAS PETROLÍFERAS

USDA REAFIRMA DÉFICIT INTERNACIONAL EM 2015/16 - MERCADO REAGE TIMIDAMENTE

Elementos de Análise Financeira Matemática Financeira e Inflação Profa. Patricia Maria Bortolon

Rodrigo Corrêa da Costa

10º LEVANTAMENTO DE SAFRAS DA CONAB /2013 Julho/2013

SINCOR-SP 2016 ABRIL 2016 CARTA DE CONJUNTURA DO SETOR DE SEGUROS

ANEXO VII OBJETIVOS DAS POLÍTICAS MONETÁRIA, CREDITÍCIA E CAMBIAL LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTÁRIAS

NBC TSP 10 - Contabilidade e Evidenciação em Economia Altamente Inflacionária

Estudos sobre a Taxa de Câmbio no Brasil

15 anos de Gasto Social Federal Notas sobre o período de 1995 a Coordenação de Finanças Sociais Diretoria de Estudos e Políticas Sociais

O Custo Unitário do Trabalho na Indústria

ipea políticas sociais acompanhamento e análise 7 ago GASTOS SOCIAIS: FOCALIZAR VERSUS UNIVERSALIZAR José Márcio Camargo*

Tabela 1 - OPERACOES DE CREDITO (milhões de R$) Ano I Nov/13. Fonte: ESTBAN, Banco Central do Brasil

Cesta básica tem alta moderada na maioria das capitais

3.1 Da c onta t bil i i l d i ade nacio i nal para r a t e t ori r a i ma m cro r econômi m c i a Det e er e mi m n i a n ç a ã ç o ã o da d

SINCOR-SP 2015 DEZEMBRO 2015 CARTA DE CONJUNTURA DO SETOR DE SEGUROS

número 3 maio de 2005 A Valorização do Real e as Negociações Coletivas

MOBILIDADE DOS EMPREENDEDORES E VARIAÇÕES NOS RENDIMENTOS

Uma análise econômica do seguro-saúde Francisco Galiza Outubro/2005

A balança comercial do agronegócio brasileiro

A pergunta de um trilhão de dólares: Quem detém a dívida pública dos mercados emergentes

ED 2180/ maio 2014 Original: espanhol. Pesquisa sobre os custos de transação dos produtores de café

A desigualdade de renda parou de cair? (Parte I)

Um estudo da correlação dos resultados patrimoniais e operacionais das seguradoras Francisco Galiza, Mestre em Economia (FGV)

Máquinas e Equipamentos de Qualidade

Apresentação de Teresa Ter-Minassian na conferencia IDEFF: Portugal 2011: Coming to the bottom or going to the bottom? Lisboa, Jan.31-Fev.

Margem de comercialização da carne bovina nos diferentes elos da cadeia. Novembro de 2009

REDUÇÃO DA TAXA DE POUPANÇA E AS EMPRESAS NÃO FINANCEIRAS:

Macroeconomia. Prof. Aquiles Rocha de Farias

na região metropolitana do Rio de Janeiro

Período São Bernardo SB Zero SB 20 SB 40 CDI. Janeiro 0,92% 1,05% -0,29% -1,71% 0,93% Fevereiro 0,81% 0,74% 1,93% 3,23% 0,82%

Crescimento Econômico Brasileiro: Análise e Perspectivas

Pequenas e Médias Empresas no Canadá. Pequenos Negócios Conceito e Principais instituições de Apoio aos Pequenos Negócios

Decomposição da Inflação de 2011

Crescimento em longo prazo

Índice de Confiança do Empresário do Comércio (ICEC) NOVEMBRO/2013

ANÁLISE ECONÔMICO FINANCEIRA DA EMPRESA BOMBRIL S.A.

A Influência da Crise Econômica Global no Setor Florestal do Brasil

Perfil de investimentos

Neurodinâmica do Mercado de Ações

ÍNDICE INSTITUIÇÃO TÍPICA DO TERCEIRO SETOR DE BELO HORIZONTE A Instituição Típica do Terceiro Setor por Principal Área de Atividade...

PERGUNTAS MAIS FREQÜENTES SOBRE VALOR PRESENTE LÍQUIDO (VPL)

Tema: evasão escolar no ensino superior brasileiro

MERCADO DE TRIGO CONJUNTURA E CENÁRIO NO BRASIL E NO MUNDO

Política monetária e senhoriagem: depósitos compulsórios na economia brasileira recente

Cacau Amêndoa Período: Junho de 2013

NÍVEL DE ATIVIDADE, INFLAÇÃO E POLÍTICA MONETÁRIA A evolução dos principais indicadores econômicos do Brasil em 2007

LÂMINA DE INFORMAÇÕES ESSENCIAIS SOBRE O SPINELLI FUNDO DE INVESTIMENTO EM AÇÕES CNPJ / SETEMBRO/2015

Transcrição:

A VOLATILIDADE DAS COTAÇÕES DE CAFÉ NAS BOLSAS INTERNACIONAIS Rubens Nunes Maria Sylvia M. Saes João Alberto Brando Resumo O artigo tem como objetivo analisar os efeitos da queda das cotações dos preços do café no mercado internacional e a sua volatilidade nos últimos anos. Na primeira parte do trabalho foram avaliados os fundamentos do mercado de café, considerando as variáveis oferta e demanda total. Na segunda parte, foi analisada a volatilidade dos preços de café nos últimos anos. Em termos de fundamentos a análise mostrou que o comportamento baixista dos preços é o reflexo da expansão da oferta. As características da produção, que responde defasadamente ao aumento dos preços, aliadas às barreiras à saída do mercado alto investimento fixo -, são os principais condicionantes da demora do ajuste da oferta. Na análise das cotações de preços do café na CSCE verificou-se que ocorrem periodicamente surtos de alta volatilidade mas que estes tendem a se resolver espontaneamente. Foi observado também que os surtos de alta volatilidade têm duração limitada. Esse fenômeno deve-se à estrutura do negócio (ciclo de investimento longo e lentidão no ajuste da oferta; custos de saída, etc.). Não houve evidência de que os fundos tiveram influência nas cotações. Palavras Chaves: café, volatilidade, bolsas de futuros Abstract The objective of the paper is to analyze the effects of the fall in the coffee prices on the international market. The volatility of these prices over the past years is also analyzed. Firstly, the fundamentals of the coffee market are analyzed. In this part of the paper the world demand and supply of coffee are the variables that were taken into consideration. The second part is dedicated to the analysis of coffee price volatility over the last few years. From the first analysis it was concluded that the fall in prices was derived from increases in supply. The adjustment of coffee supply is slow. That is because of the particularities of the production of coffee, e.g.: the lag between price increases and production response; and the existence of barriers to exit the market (sunk costs). High volatility moments were periodically observed in the volatility analysis of the CSCE prices. These disturbances have limited duration. They dissipate by themselves. These phenomena are due to the business structure of this sector (large investment cycles, slow supply adjustment, sunk costs, etc.). No evidence was found that the investment funds played a key role determining the trend of the coffee prices along these years. Key words: coffee, volatility, futures market

A VOLATILIDADE DAS COTAÇÕES DE CAFÉ NAS BOLSAS INTERNACIONAIS 1. INTRODUÇÃO A receita das exportações dos países produtores de café caiu de US$ 12,2 bilhões em 1998 para R$ 5,64 bilhões em 2003. Aliado ao fenômeno da queda dos preços desta commodity, os agentes produtivos do mercado admitem que a volatilidade das cotações está mais acentuada do que se observava em anos anteriores. Há uma certa crença entre agentes do mercado que os especuladores das bolsas de futuros têm grande parte da responsabilidade das flutuações de preço. Acreditam que como o mercado futuro de café é relativamente pequeno, comparado a outros mercados agrícolas (como, por exemplo, o da soja) o ingresso agressivo dos fundos, alterando rapidamente suas posições, resulta em grandes movimentos das cotações. Admitem, assim, que boatos ou expectativas sobre o clima, muitas vezes sem respaldo técnicocientífico, refletem em perdas substanciais das cotações nas bolsas de Nova York ou Londres, acarretando grandes prejuízos para os produtores, já que a bolsa de futuros é a referência para a venda a termo. Para honrar seus compromissos, via de regra, os produtores realizam seus negócios sem esperar a melhora dos preços. A incerteza quanto aos negócios é também um impedimento para o crescimento da participação de produtores no mercado futuro. A volatilidade, ao invés de incentivar a utilização das bolsas para a fixação de preço por parte dos produtores, afasta-os, em função da dificuldade de bancar as diferenças de margens, que exigem um aporte significativo de capital de curto prazo. O presente documento tem, portanto, como objetivo analisar os efeitos da queda das cotações dos preços do café no mercado internacional e a sua volatilidade nos últimos anos. Para isso, na primeira parte do trabalho serão avaliados os fundamentos do mercado de café considerando as seguintes variáveis: i. produção total e por espécie (arábica e robusta); ii. demanda geral; iii. estoques dos países produtores e consumidores; e iv. oferta global e preços nos mercados internacionais e no mercado interno (BM&F e produtor). Pretende-se correlacionar as variáveis analisadas indicando os principais fatores que estão influenciando os preços e as principais mudanças observadas no mercado. Na segunda parte do trabalho será analisada a volatilidade dos preços de café nos últimos anos. 2. OS FUNDAMENTOS DO MERCADO Nesta seção trataremos da análise fundamentalista procurando destacar os principais fatores da tendência de queda das cotações de café nos últimos anos. 2.1 Oferta mundial Apesar dos avanços tecnológicos, a oferta mundial de café ainda apresenta movimentos cíclicos devido ao ciclo bienal da produção mundial e à sua resposta defasada em relação aos estímulos de preço gerados, freqüentemente, por fortes alterações climáticas. Enquanto o primeiro efeito, tem sido relativamente administrado, o segundo ainda tem repercutido de forma dramática nos negócios do setor (SAES; NAKAZONE, 2002). O período caracterizado pela oferta mundial apertada, em meados dos anos 1990, devido em boa parte às geadas de 1994 e à seca de 1997 nas regiões produtoras brasileiras, refletiu em elevação 2

das cotações, derrubando barreiras à entrada no setor, e atraindo novos e antigos produtores. Sem dúvida alguma estes eventos estão ligados aos posteriores aumentos da oferta e à queda nos preços do café neste início de século (SAES; FARINA, 1999). Houve expressivo crescimento do parque cafeeiro na maioria dos países produtores, com destaque para o Vietnã e Brasil, conforme se pode observar na tabela 2.1. Tabela 2. 1 Parque cafeeiro nos principais países produtores (em milhões de pés) 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Var.% Brasil 3.120 3.170 3.080 3.380 3.753 4.590 4.920 5.400 5.710 8,6% Costa do Marfim 1.792 1.792 1.800 1.810 1.826 1.838 1.858 1.869 1.873 0,6% Colômbia 3.740 3.700 3.950 3.710 4.000 3.692 3.820 3.820 3.820 0,2% Costa Rica 413 413 413 413 413 450 460 460 460 1,6% El Salvador 611 608 607 606 604 599 599 602 602-0,2% Equador 295 290 290 285 280 260 270 255 237-2,7% Filipinas 131 130 132 132 129 113 113 111 110-2,5% Honduras 805 831 862 872 898 921 937 883 835 0,2% Guatemala 770 801 837 855 834 832 837 839 841 0,7% Índia 500 505 525 535 550 590 595 600 600 2,4% Indonésia 1.475 1.475 1.480 1.520 1.520 1.520 1.520 1.520 1.430-0,2% Quênia 270 273 274 276 266 267 277 277 217-1,9% México 790 790 790 800 830 855 880 880 880 1,6% Nicarágua 360 361 372 369 390 392 393 393 395 1,2% Peru 365 390 370 390 400 400 400 450 450 2,4% Venezuela 610 615 620 620 620 620 620 630 630 0,3% Vietnã n/d n/d n/d n/d 425 438 575 700 675 10,3% TOTAL Acima 16.047 16.144 16.402 16.573 17.738 18.377 19.074 19.689 19.765 2,9% Fonte: USDA A produção mundial partiu de 92,9 mil sacas de café na safra 1990/91 alcançando o volume de 119,9 mil sacas na safra 2002/03, isto é, uma diferença de cerca de 20 mil sacas. Vale observar que a última safra apresenta um decréscimo. Parte devido ao ciclo bienal da produção brasileira e, em outra, decorrente da erradicação de lavouras em várias regiões produtoras em função dos preços baixos. O crescimento da produção tem ocorrido de forma assimétrica entre as variedades arábica e robusta. Em 2003, o robusta representou quase 40% do total produzido ante uma participação de menos de 30% no início da década de 90 (Gráfico 2.1). 3

Gráfico 2.1- Produção mundial de café por variedade: robusta e arábica (milhões sacas) 140 120 milhões de sacas 100 80 60 40 20 28 30 71 74 27 27 28 64 65 69 37 33 27 61 66 65 34 85 40 46 43 73 71 68 42 82 40 66 0 90/91 91/92 92/93 93/94 94/95 95/96 Arábica 96/97 97/98 98/99 99/00 Robusta 00/01 01/02 02/03 03/04 Fonte: USDA citado em coffeebusiness. A produção mundial de café robusta cresceu a uma taxa média de 4%, enquanto a de arábica apresentou uma taxa de crescimento médio nula, entre os anos 1997 e 2003. Além do efeito cíclico da produção, tal resultado deve-se a uma tendência de adequação da demanda vis-à-vis os preços observados nos últimos quatro anos. O Vietnã merece destaque apresentando uma taxa de crescimento de 9% ao ano no mesmo período. O crescimento de 17% ao ano da produção brasileira de café robusta nestes anos também foi significativo. O acréscimo da produção de robusta tem resultado no deslocamento da média mundial de consumo em favor desta variedade. Nos anos 1997 a 2001, o café robusta passou a deter 30% do mercado mundial ante uma participação de 25% na primeira metade da década de 1990. 2.2 Demanda mundial O crescimento da oferta mundial de café não seria problemático se a demanda pelo produto não fosse inelástica. Ou seja, uma variação negativa dos preços significa um aumento menos do que proporcional na quantidade demandada. Isso é devido ao fato de o café ser um hábito de consumo cuja demanda tende a ser estável mesmo com variações significativas de preço. Nos últimos dez anos, apesar do crescimento de 12% na oferta, a demanda mundial de café cresceu apenas à taxa média de 1% ao ano. Além disso, desde os anos 50 o consumo anual per capita no mundo é de cerca de um quilo. Nos mercados tradicionais dos países desenvolvidos, o café acabou perdendo mercado para outras bebidas e seu consumo manteve-se estagnado ou com tendência a queda (ZYLBERSZTAJN, D. et al, 2001). Apesar do fenômeno recente do boom do segmento de cafés especiais e da crescente demanda dos países do leste europeu, o consumo global ainda tem se mostrado, em média, muito inferior à oferta nestes últimos anos (Gráfico 2.2). 4

Gráfico 2.2 Oferta e demanda mundial de café mil sacas de 60 kg 125.000 120.000 115.000 mil sacas de 60 kg 110.000 105.000 100.000 95.000 90.000 85.000 80.000 1996/97 1997/98 1998/99 1999/00 2000/01 2001/02 2002/03 2003/04 Produção Mundial Consumo Mundial Fonte: USDA A Tabela 2.2 apresenta o balanço entre oferta e demanda de café desde a safra 96/97. Neste período a diferença entre produção e consumo alcança o valor de 41,7 mil sacas, acelerando o crescimento dos estoques finais, conforme analisaremos com maior detalhe na próxima seção. Tabela 2.2 Balanço entre oferta e demanda de café Produção Mundial Consumo Mundial Diferença 1996/97 104.221 99.972 4.249 1997/98 97.932 101.287 (3.355) 1998/99 107.895 103.352 4.543 1999/00 114.550 104.402 10.148 2000/01 117.138 105.440 11.698 2001/02 119.351 107.157 12.194 2002/03 113.354 108.965 4.389 2003/04 108.723 111.010 (2.287) Fonte: USDA. 2.3 Estoques mundiais: países produtores e consumidores Como observado, o aumento da produção mundial não acompanhado pelo crescimento da demanda repercutiu no aumento dos estoques nos países consumidores. No início da década de 1990, os estoques também eram altos, mas a sua maior parte se concentrava nos países produtores, especialmente no Brasil. Durante a década, os estoques foram sendo consumidos em função da escassez de oferta, chegando aos níveis mais baixos em 1998. A partir daí, o crescimento da oferta e dos embarques elevaram novamente os estoques, só que desta vez nas mãos dos países consumidores, que passaram a deter 50% deles (Gráfico 2.3). 5

Gráfico 2.3 - Estoques nos países produtores e consumidores (milhões de sacas) e preço composto da OIC (cents US$/lb) Fonte: OIC. milhões de sacas de 60 kg 50 45 40 35 30 25 20 15 10 5-1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Consumidores Produtores Preço - OIC 160 140 120 100 80 60 40 20 0 centavos de dólar por librapeso Embora em quantidade menor do que a do início dos anos 1990, atualmente os estoques têm um efeito mais depressivo do que tinham em anos anteriores. Isso porque quando concentrados nos países produtores e principalmente nas mãos do governo brasileiro, as regras de venda do produto não são claras. Estoques públicos não têm a mesma liquidez dos estoques privados. Há interesses conflitantes que impedem que o desove obedeça a regras econômicas. O desove acaba, então, obedecendo a regras políticas, como se viu em meados da década de 1990. Quando os estoques passam para o setor privado, manter estoques representa o custo de oportunidade do capital. Por isso, os estoques acabam adquirindo uma função contra-ciclíca. Isto posto, podemos argumentar que os estoques proporcionalmente maiores com o setor privado (tanto dos países produtores como consumidores) permitem um maior poder de barganha das torrefadoras internacionais que podem dispor do produto com grande facilidade. Dois outros fatores que tendem a melhorar a barganha dos consumidores são: i. a grande melhora nos meios de comunicação e de transporte observadas nos anos recentes, que permite um rápido abastecimento do produto que se encontra em qualquer parte das regiões produtoras; e ii. a facilidade com que as torrefadoras alteram a composição de seu blend pela espécie que se encontra mais ofertada, devido às novas tecnologias de processamento. Um exemplo, dessa tecnologia, é a vaporização, que permite neutralizar a espécie robusta, podendo ser adicionada ao blend sem praticamente alterar as características de sabor e aroma do produto. 2.4 Oferta mundial e preços Das estatísticas anteriores, podemos inferir que o comportamento dos preços no final dos anos 1990 e início deste teve como principal causa o excesso de oferta. Conforme já amplamente explorado pela literatura (SAES, 1997), o movimento defasado da oferta ocasionado pelo caráter perene da cultura cafeeira torna o mercado de café mais susceptível a grandes variações de preços decorrente de uma perturbação climática. O gráfico 2.4 mostra a relação entre oferta total e preços ressaltando os movimento dos preços nesses últimos anos. Podemos também observar 6

que o ciclo de baixa chegou a seu limite. Os ajustes que estão sendo realizados na produção, com a saída de produtores do mercado e a erradicação de áreas produtivas têm elevado paulatinamente as cotações. Gráfico 2.4 - Oferta mundial de café (milhões de sacas) e cotações médias do preço composto da OIC Oferta Global milhões de sacas 160 140 120 100 80 60 40 20 0 180,00 160,00 140,00 120,00 100,00 80,00 60,00 40,00 20,00 0,00 cents por libra peso 80/81 82/83 84/85 86/87 88/89 90/91 92/93 94/95 96/97 98/99 00/01 02/03 Oferta Total milhões de sacas Preços OIC US$ cents/lb Fonte: OIC. Por fim, a tendência de recuperação dos preços pode ser observada no Gráfico 2.6, que apresenta as cotações médias mensais de preços na Bolsa de Nova York (cents por libra peso) e Brasil (reais). Na curva preço nacional do café (PNC) há uma maior variação ao longo dos meses que pode ser entendida pelo movimento do câmbio (gráfico 2.5). No primeiro período do governo FHC, com o câmbio estável, o preço do café mantinha o mesmo movimento do preço internacional. No segundo período, depois da desvalorização cambial e a adoção de taxas flexíveis, o café brasileiro aumentou a sua competitividade e os preços passaram a sofrer variações decorrentes da instabilidade cambial, particularmente antes das eleições de 2002 e logo após a posse do presidente Lula. Com as freqüentes desvalorizações da moeda, o café brasileiro passou a ter vantagens com relação aos concorrentes. Por isso, no caso brasileiro, os ganhos de competitividade devem, portanto, ter refletido em uma menor tendência à erradicação. Naturalmente, tais ganhos dependem das condições de custo de cada região e produtor em particular. 7

Gráfico 2.5 - Preços do Café na CSCE e Brasil (Preço Nacional do Café FIPE) Preços café: NY e Brasil 300,00 250,00 200,00 150,00 100,00 50,00 0,00 jun/95 nov/95 abr/96 set/96 fev/97 jul/97 dez/97 mai/98 out/98 mar/99 ago/99 jan/00 jun/00 nov/00 abr/01 set/01 fev/02 jul/02 dez/02 mai/03 out/03 Fonte: CSCE e FIPE Preço NY US$/libra-peso PNC R$/saca Na próxima seção, um modelo de comportamento de preços do café será apresentado com o objetivo de discutir a dinâmica dos preços e sua volatilidade. 3. MODELO PARA A ANÁLISE DO COMPORTAMENTO DOS PREÇOS DO CAFÉ Em geral, os preços de produtos transacionados em mercados amplos comportam-se como um passeio aleatório (random walk). Os agentes processam de forma eficiente as informações disponíveis e, de sua interação, definem-se preços e quantidades negociadas. O ajuste do mercado é praticamente instantâneo. Como as informações chegam de forma aleatória, as variações dos preços não exibem uma tendência ou mesmo um padrão facilmente identificável. Do contrário, os agentes aprenderiam o padrão, fariam uso das previsões mais acuradas e acabariam por modificar o padrão original. A melhor previsão de uma variável que se comporta como random walk é seu valor passado. Não há como incorporar mais informação e melhorar a previsão. O processo random walk pode ser representado como p t = p t-1 + ε t onde p t é o preço no momento presente, p t-1 é o preço no momento anterior e ε t é um termo aleatório de média zero. Alguns modelos assumem que a variância do termo aleatório (que é uma medida da volatilidade dos preços) é constante e as variações de preços são independentes entre si, mas nem sempre essa é uma descrição adequada do comportamento observado dos preços. Uma especificação alternativa é dada por p t = p t-1 + ε t (ε t-1 ) que diz que o erro aleatório ε (se a previsão de p t é p t-1, então ε é o erro da previsão) é uma função do erro passado. Não podemos mais dizer que os erros são independentes entre si. Supondo que a dependência entre os erros possa ser expressa como ε t = φ ε t-1 + ν t em que φ representa a parcela do erro presente que é transferida para o erro futuro (e conseqüentemente para o preço no futuro) e ν é uma variável aleatória com média zero, variância constante e independente de seus valores precedentes. Admite-se que 1 < φ < 1, pois, caso contrário, a série de preços seria explosiva, com preços tendendo a zero ou infinito. Nesse tipo 8

de processo, ocorrem períodos de alta volatilidade (ε grande na média do período) e períodos de relativa calmaria, com pequenas variações de preço entre dois períodos subseqüentes. Tanto no processo random walk quanto nos processos em que parte dos choques aleatórios são transferidos para os períodos seguintes, os preços incorporam uma memória do passado: numa random walk, os preços conservam todos os choques aleatórios do passado (ε); no outro modelo, chamado auto-regressivo, os choques se dissipam mais ou menos lentamente (dependendo do valor de φ). No caso do café, como em outros produtos com ciclo longo de produção e ativos dedicados, os ajustes do mercado a choques são relativamente lentos, pois o parque cafeeiro existente em dado momento depende de decisões tomadas no passado, num ambiente quase certamente distinto do atual. Para complicar, há custos importantes no ajuste do parque cafeeiro, tanto para investir, quanto para desinvestir (erradicar). O que se segue é uma proposta de análise das relações entre os preços do café no mercado internacional e o comportamento dinâmico do parque cafeeiro. Para que o parque cafeeiro se mantenha constante ao longo do tempo é preciso que o investimento em novas plantas seja igual à depreciação, isto é, as árvores que, pela idade ou doenças, deixam de produzir ou cuja produção deixa de ser economicamente viável. O investimento necessário para a manutenção de um parque cafeeiro pequeno é menor que o investimento para repor a depreciação de um grande parque. (As aspas justificam-se pois não se trata de definir o que é grande ou pequeno, mas de estabelecer uma comparação entre situações hipotéticas em que há, numa delas, um número de árvores significativamente maior do que na outra.) Ora, preços baixos são suficientes para manter constante (investimento = depreciação) um parque cafeeiro pequeno, mas não um parque grande, que requer investimento maior, que depende, por sua vez, de preços mais altos. A Figura 3.1 ilustra essa relação. Figura 3.1 Preços consistentes com parque cafeeiro estável preço do café p preços consistentes com estabilidade do parque cafeeiro parque cafeeiro K A linha de preços compatíveis com a estabilidade do parque cafeeiro é positivamente inclinada em virtude da relação entre preços e investimento necessário para manter a condição de estabilidade, que é a igualdade entre investimento e depreciação. Para um dado parque cafeeiro, 9

preços acima da linha vão fazer com que os investimentos excedam a depreciação e o parque cafeeiro cresça; preços mais baixos fazem com que não haja investimentos suficientes e o parque encolhe em virtude da depreciação líquida. A dinâmica dos estoques é contracíclica e confere alguma estabilidade ao mercado. Para analisar a dinâmica dos preços, vamos supor constante a demanda. Um parque cafeeiro pequeno produz, obviamente, pouco café, que deverá atingir preços altos. Para a mesma demanda, um grande parque coloca muito café no mercado, que o consumidor só absorverá se os preços estiverem baixos. Desse modo, a linha de preços estáveis é negativamente inclinada (quanto maior o parque cafeeiro, menor o preço de equilíbrio). Em equilíbrio, vale a condição de arbitragem entre momentos distintos no tempo. O que se ganha por carregar estoques é exatamente o custo de oportunidade do capital, ajustado ao risco da operação. p t = pe t+1 t / (1 + r) - θ Isso quer dizer que o preço corrente (p t ) é o valor presente do preço esperado no período atual para o período seguinte (pe t+1 t), menos um prêmio de risco (θ). O termo r é a taxa de juros, a taxa de desconto, ou ainda a taxa de preferência intertemporal do agente. Valendo a arbitragem entre o presente e o futuro, uma mudança nas expectativas para o futuro alteram o preço presente. Se o preço esperado sobe (em razão, por exemplo, de geada nas regiões produtoras), o preço corrente subirá instantaneamente (ainda que não na mesma magnitude). Figura 3.2 Parque cafeeiro consistente com preços estáveis preço do café p parque cafeeiro consistente com preços estáveis parque cafeeiro K A Figura 3.3 permite analisar simultaneamente a dinâmica dos preços e do parque cafeeiro. Há um equilíbrio de longo prazo, representado pelo ponto E, e vários equilíbrios de curto prazo, correspondentes à linha SS. A linha SS é uma trajetória que converge para o equilíbrio de longo prazo. Nos equilíbrios de curto prazo ocorrem aumentos ou diminuições dos preços e do parque cafeeiro. Qualquer outra trajetória distinta de SS é explosiva, ou seja, conduz a um afastamento do ponto E que cresce com o tempo. Um mercado eficiente permanece sempre sobre a linha SS. 10

Os preços observados, entretanto, não são tão estável quanto o modelo permite prever. Na realidade, as condições que definem as curvas desenhadas na Figura 3.3 dependem de variáveis macroeconômicas, tecnológicas, institucionais, etc. As taxas de câmbio, de juros, o crescimento da economia, tudo isso redefine o equilíbrio do mercado. Figura 3.3 Equilíbrios de curto e longo prazos S E S Suponhamos o efeito de uma desvalorização do câmbio em um grande país exportador. Para os mesmos preços internacionais, os produtores terão uma remuneração maior em moeda local. Como os custos não sobem na mesma proporção, pelo fato de haver non-tradeables entre eles, haverá investimentos novos, definindo-se um novo equilíbrio de longo prazo (consistente com a nova realidade microeconômica das fazendas). Utilizando o gráfico para ilustrar o argumento, vemos que a curva de parque cafeeiro estável se desloca para baixo e para a direita. Figura 3.4 Efeitos de uma desvalorização do câmbio E 0 E cp E 1 Ao ser anunciada a desvalorização, os preços caem muito instantaneamente, até o equilíbrio de curto prazo E cp e, em seguida, continuam caindo lentamente até atingir o novo equilíbrio. O 11

primeiro efeito é o ajuste à nova taxa de câmbio e o segundo decorre do crescimento do parque cafeeiro. O novo equilíbrio terá preço mais baixo e parque cafeeiro (bem como oferta de café) mais elevados. Da mesma forma, podemos analisar o efeito de um aumento inesperado e permanente da renda do consumidor (crescimento econômico não esperado, redução da alíquota do imposto de renda). Com mais renda, o consumidor passa a demandar mais e melhores cafés. Para cada tamanho de parque cafeeiro, os preços estáveis sobem, o que corresponde a um deslocamento para cima e para direita da linha de preços estáveis. Figura 3.5 Efeito de um aumento da renda do consumidor Ecp E 1 E 0 Nesse exemplo, ocorre o fenômeno conhecido como overshooting : no primeiro momento, os preços sobem além do preço de equilíbrio de longo prazo, para depois declinar suavemente, a medida que cresce o parque cafeeiro. Uma mudança institucional que diminua o prêmio de risco, como por exemplo a criação de mercados de futuros, eleva os preços correntes. De acordo com o modelo, a curva de preços estáveis seria deslocada para cima e para a direita, pois, para os mesmos preços esperados no futuro, os preços correntes seriam maiores, com a diminuição do prêmio de risco. A equação de arbitragem p t = pe t+1 t / (1 + r) - θ mostra um aumento de p t associado a uma diminuição de θ. Nesse caso também ocorreria o overshooting. Distinguiremos, para a análise das séries temporais à luz do modelo apresentado, pequenos choques, em que os equilíbrios de curto e longo prazo não estão muito distantes e o novo equilíbrio é atingido em período menor ou igual ao período das observações, e grandes choques, em que as distâncias entre equilíbrios são maiores e o novo equilíbrio de longo prazo só é alcançado depois de alguns períodos de observação. Pequenos choques sucessivos fazem a série de tempo parecer um processo random walk; o ajuste a choques grandes gera séries de tempo auto regressivas. Então, o mais verossímil é o aparecimento de séries de preços que intercalem trechos de um e de outro tipo, ora apresentando aspecto de passeio aleatório (próximo do equilíbrio de longo prazo), ora revelando uma tendência (em direção ao equilíbrio de longo prazo). 12

Gráfico 3.1 Cotações de Café na CSCE 450,00 400,00 Choque 350,00 300,00 Choque 250,00 200,00 150,00 100,00 Tendência de queda dos preços 50,00 Sem tendência 0,00 1/11/1995 1/1/1996 1/3/1996 1/5/1996 1/7/1996 1/9/1996 1/11/1996 1/1/1997 1/3/1997 1/5/1997 1/7/1997 1/9/1997 1/11/1997 1/1/1998 1/3/1998 1/5/1998 1/7/1998 1/9/1998 1/11/1998 1/1/1999 1/3/1999 1/5/1999 1/7/1999 1/9/1999 1/11/1999 1/1/2000 1/3/2000 1/5/2000 1/7/2000 1/9/2000 1/11/2000 1/1/2001 1/3/2001 As variações de preço de uma série random walk são variáveis aleatórias geradas por um processo estocástico conhecido como ruído branco (white noise), ε t = p t - p t-1. Esse processo é caracterizado pela média zero, variância constante e independência das observações. Se o preço do café é uma random walk, as diferenças entre o fechamento de hoje e o de ontem formarão um ruído branco. A probabilidade de o preço subir amanhã independe do que aconteceu hoje. Observa-se no gráfico 3.1 que as diferenças não revelam tendência de longo prazo: na média, elas não diferem de zero. Duas características do ruído branco, entretanto, não são observadas. A variância do termo aleatório (volatilidade) não é constante, com períodos de grande amplitude das diferenças e períodos de relativa calmaria. Além disso, em alguns momentos as diferenças parecem ser serialmente correlacionadas, acumulando-se várias altas (ou baixas) sucessivas, improváveis em uma realização de um processo do tipo ruído branco. Se os preços comportam-se como random walk, as diferenças p t - p t-1 funcionam como uma medida do tamanho de ε e, conseqüentemente da volatilidade. Podemos definir um indicador relativo da volatilidade como a variação percentual entre duas observações: Variação entre dias = (((p t - p t-1 )/ p t )-1)*100 13

Gráfico 3.2 - Diferenças das cotações na CSCE 40,00 20,00 0,00-20,00 1/11/1995 1/1/1996 1/3/1996 1/5/1996 1/7/1996 1/9/1996 1/11/1996 1/1/1997 1/3/1997 1/5/1997 1/7/1997 1/9/1997 1/11/1997 1/1/1998 1/3/1998 1/5/1998 1/7/1998 1/9/1998 1/11/1998 1/1/1999 1/3/1999 1/5/1999 1/7/1999 1/9/1999 1/11/1999 1/1/2000 1/3/2000 1/5/2000 1/7/2000 1/9/2000 1/11/2000 1/1/2001 1/3/2001 1/5/2001 1/7/2001-40,00-60,00-80,00-100,00 Gráfico 3.3 Índice de volatilidade das cotações do café na CSCE 60,00 50,00 40,00 30,00 20,00 10,00 0,00 5/12/1995 5/2/1996 5/4/1996 5/6/1996 5/8/1996 5/10/1996 5/12/1996 5/2/1997 5/4/1997 5/6/1997 5/8/1997 5/10/1997 5/12/1997 5/2/1998 5/4/1998 5/6/1998 5/8/1998 5/10/1998 5/12/1998 5/2/1999 5/4/1999 5/6/1999 5/8/1999 5/10/1999 5/12/1999 5/2/2000 5/4/2000 5/6/2000 5/8/2000 5/10/2000 5/12/2000 5/2/2001 5/4/2001 5/6/2001 5/8/2001 Para períodos mais longos (um mês) construímos um índice de volatilidade que é a média móvel da raiz quadrada das variações percentuais entre dias elevadas ao quadrado. t + 10 1 2 IVt = ( VED ) 22 t 11 14

O gráfico 3.3 mostra esses indicadores para as cotações do café na CSCE. Foi considerada uma média de 22 dias úteis, o que se aproxima, na prática, de um mês. Entre 1995 e 2001, houve quatro episódios de alta volatilidade: i) março de 1997; ii) junho de 1997, devido em ambos os períodos ao impasse em torno da real estimativa de safra brasileira somado ao ambiente de estoques em baixa; iii) outubro a dezembro de 1999, devido a fatores climáticos; e iv) julho a agosto de 2000, devido às geadas pontuais em regiões produtoras brasileiras somado ao anúncio da política de retenção. A BM&F (gráfico 3.4.) e o mercado físico brasileiro, representado pelo PNC Preço Nacional do Café (gráfico 3.5), seguem padrão semelhante ao da CSCE. A Bolsa de Londres (gráfico 3.6), entretanto, apresenta comportamento distinto, em termos de volatilidade, com apenas alguns surtos coincidindo com os demais mercados. Gráfico 3.4. Índice de volatilidade das cotações do café na BM&F 7,00 6,00 out.99 jul.00 5,00 4,00 jun.97 3,00 2,00 1,00 0,00 20/11/1995 20/1/1996 20/3/1996 20/5/1996 20/7/1996 20/9/1996 20/11/1996 20/1/1997 20/3/1997 20/5/1997 20/7/1997 20/9/1997 20/11/1997 20/1/1998 20/3/1998 20/5/1998 20/7/1998 20/9/1998 20/11/1998 20/1/1999 20/3/1999 20/5/1999 20/7/1999 20/9/1999 20/11/1999 20/1/2000 20/3/2000 20/5/2000 20/7/2000 20/9/2000 20/11/2000 20/1/2001 20/3/2001 20/5/2001 20/7/2001 15

Gráfico 3.5 Índice de volatilidade do Preço Nacional do Café - PNC 7,00 6,00 jul.00 5,00 out.99 4,00 jun.97 3,00 2,00 1,00 0,00 20/11/1995 20/1/1996 20/3/1996 20/5/1996 20/7/1996 20/9/1996 20/11/1996 20/1/1997 20/3/1997 20/5/1997 20/7/1997 20/9/1997 20/11/1997 20/1/1998 20/3/1998 20/5/1998 20/7/1998 20/9/1998 20/11/1998 20/1/1999 20/3/1999 20/5/1999 20/7/1999 20/9/1999 20/11/1999 20/1/2000 20/3/2000 20/5/2000 20/7/2000 20/9/2000 20/11/2000 20/1/2001 20/3/2001 20/5/2001 20/7/2001 Gráfico 3.6. Índice de volatilidade das cotações do café na Bolsa de Londres 4,50 jun.97 jan.00 mar.00 4,00 3,50 nov.98 3,00 2,50 2,00 1,50 1,00 0,50 0,00 20/11/1995 20/1/1996 20/3/1996 20/5/1996 20/7/1996 20/9/1996 20/11/1996 20/1/1997 20/3/1997 20/5/1997 20/7/1997 20/9/1997 20/11/1997 20/1/1998 20/3/1998 20/5/1998 20/7/1998 20/9/1998 20/11/1998 20/1/1999 20/3/1999 20/5/1999 20/7/1999 20/9/1999 20/11/1999 20/1/2000 20/3/2000 20/5/2000 20/7/2000 20/9/2000 20/11/2000 20/1/2001 Em meados de 2000 a participação dos fundos nos mercados de futuros cresceu substancialmente (Gráfico 3.7). Esse fato, entretanto, não parece ter afetado o padrão de volatilidade das cotações, registrando-se um surto justamente em julho de 2000 e em seguida a volta à volatilidade normal. Os fundos foram atraídos, possivelmente, pela oportunidade de atuar no mercado de risco aberto pelo já referido surto de volatilidade dos preços do café. 16

Não há evidência de que os fundos tenham atuado de maneira coordenada, de modo que é pouco verossímil que as cotações tenham sido manipuladas. Gráfico 3.7 - Posição dos fundos nos mercados futuros de café 35.000 30.000 25.000 20.000 15.000 10.000 5.000 0-5.000-10.000-15.000-20.000-25.000-30.000-35.000-40.000 02/01 /95 02/04/95 02/07/95 02/10/95 02/01/96 02/04 /96 02/07 /96 02/10 /96 02/01/97 02/04 /97 02/07/97 02/10/97 02/01/98 02/04/98 02/07 /98 02/10 /98 02/01 /99 02/04/99 02/07/99 02/10/99 02/01/00 02/04 /00 02/07 /00 02/10 /00 02/01/01 02/04 /01 02/07/01 02/10 /01 02/01 /02 02/04/02 02/07 /02 02/10/02 02/01/03 02/04 /03 02/07 /03 02/10 /03 No curto prazo, as variações de preços decorrem de choques aleatórios representados pelas informações que atingem os agentes do mercado. São imprevisíveis e podem ser representadas pelo modelo random walk. No longo prazo, entretanto, os preços tendem para o equilíbrio, que depende de vários fatores mutáveis (preferências do consumidor, conjuntura macroeconômica, inovações tecnológicas, aspectos institucionais, etc.). Assim, o equilíbrio do sistema é redefinido continuamente, mas em cada período os preços tendem para um nível próximo dos custos econômicos de produção. A amplitude das variações dos preços é, em geral, da ordem de 1% a 2%, mas ocorrem episódios em que a volatilidade cresce em resposta a grandes choques. Os surtos de alta volatilidade têm duração limitada, entre duas semanas a dois meses, retornando-se ao padrão normal à medida que o mercado se ajusta aos choques. Retomando a figura 3.3., e plotando nela os dados referentes ao parque cafeeiro e aos preços médios anuais no período de 1994 a 2002, observamos que os preços e a capacidade produtiva têm se comportado como se estivessem no ramo da curva SS à esquerda do equilíbrio E de longo prazo. A figura 3.6. sugere que o preço de equilíbrio de longo prazo, para uma demanda semelhante a atual, esteja entre 55 a 70 centavos de dólar por libra-peso, com um parque próximo dos 20 bilhões de pés. Figura 3.6. Evolução do parque cafeeiro mundial e dos preços do café (CSCE, 1994-2002) 180,00 160,00 140,00 1994 120,00 100,00 80,00 E 60,00 2002 40,00 15.500 16.000 16.500 17.000 17.500 18.000 18.500 19.000 19.500 20.000 17

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS O trabalho teve como objetivo estudar o comportamento dos preços do café nos anos recentes. Na primeira parte foram apresentadas estatísticas visando dar suporte a análise dos fundamentos do mercado. Observou-se um aumento da oferta geral do produto em vários países, principalmente no Brasil e Vietnã. Houve também um crescimento maior da espécie robusta que teve um efeito importante em deslocar negativamente o consumo global da espécie arábica, em função do valor inferior do robusta no mercado internacional. O aumento da oferta não foi acompanhado pelo aumento da demanda que refletiu em incremento dos estoques. Os estoques que no início da década estavam em grande parte nas mãos do governo brasileiro, passam a crescer nas mãos dos países consumidores e empresas privadas. Isto significa que se tornaram mais líquidos ante uma situação de difícil regra de desove quando pertencente ao setor público. Em termos de fundamentos o comportamento dos preços é, portanto, reflexo da expansão da oferta. As características da produção, que responde defasadamente ao aumento dos preços, aliadas às barreiras à saída do mercado alto investimento fixo -, são os principais condicionantes da demora do ajuste da oferta. Mais ainda, podemos afirmar que os estoques brasileiros poderiam ter atuado contra-ciclicamente, o que não ocorreu e não irá ocorrer. Estoques públicos acabam se tornando um mico para o governo, as pressões contra o desove são bastante conhecidas. Na segunda parte do trabalho, foi apresentado um modelo de análise das relações entre os preços do café no mercado internacional e o comportamento dinâmico do parque cafeeiro. As relações entre parque cafeeiro e preço são positivas. Quanto maior os preços maior será incentivo ao aumento do parque cafeeiro. Considerando a demanda estável, aumentos de preços irão, entretanto, provocar instabilidade no mercado. Sem considerar questões climáticas, as instabilidades podem ser geradas por modificações em taxas de câmbio, nos juros e no crescimento da economia. Estas vão redefinir o equilíbrio do mercado. Como em outros produtos com ciclo longo de produção, os ajustes do mercado a choques são relativamente lentos. No caso de uma desvalorização do câmbio em um grande país exportador, observa-se que para os mesmos preços internacionais, os produtores terão uma remuneração maior em moeda local. Então, o novo equilíbrio terá preço mais baixo e parque cafeeiro mais elevado. O primeiro efeito é o ajuste à nova taxa de câmbio e o segundo decorre do crescimento do parque cafeeiro. No choque decorrente do aumento permanente da renda do consumidor e maior demanda, verifica-se que os preços do produto sobem além do preço de equilíbrio de longo prazo, para depois declinar suavemente, a medida que cresce o parque cafeeiro. Considerando a demanda atual e o parque cafeeiro mundial que se encontra ao redor de 20 bilhões sugere-se que o preço de equilíbrio de longo prazo seja semelhante a 55 a 70 centavos de dólar por libra-peso. Analisando as cotações de preços do café na CSCE verificamos que ocorrem periodicamente surtos de alta volatilidade, que tendem a se resolver espontaneamente. Os surtos de alta volatilidade têm duração limitada, entre duas semanas a dois meses, retornando-se ao padrão normal à medida que o mercado se ajusta aos choques. Esse fenômeno deve-se à estrutura do negócio (ciclo de investimento longo e lentidão no ajuste da oferta; custos de saída, etc.). Não houve evidência de que os fundos tiveram influência nas cotações, mas há possibilidade de uma 18

ação coordenada para criar oportunidades artificiais de arbitragem - é preciso monitorar os fundos e analisar os mecanismos de controle das bolsas de futuros. Por fim, vemos a necessidade de políticas públicas/ações coletivas para capacitar produtores e cooperativas a atravessarem os surtos de alta volatilidade ilesos, ou seja, sem quebrarem. E mudança nas instituições para reduzir os custos de transação nos mercados de futuros. BIBLIOGRAFIA COFFEE BUSINESS. Anuário Estatístico do Café, 2003. COFFEE BUSINESS. Boletim Diário, vários números, 2003 e 2004. OIC. Informações disponíveis no site da Organização Internacional do Café. Disponível em <http//:www.ico.org>. SAES, M. S. M. A Racionalidade Econômica da Regulamentação no Mercado Brasileiro de Café. São Paulo: Annablume, 1997. 150p. SAES, M. S. M.; FARINA, E. M. M. Q. O Agribusiness do café no Brasil. PENSA, São Paulo Setembro 1999. 230 p. SAES, M. S. M.; NAKAZONE, D. Estudo da Competitividade de Cadeias Integradas no Brasil: Impactos das Zonas de Livre Comércio. São Paulo: UNICAMP, MDIC, MCT, FINEP. Outubro, 2002. ZYLBERSZTAJN, D. et al Diagnóstico sobre o Sistema Agroindustrial de Cafés Especiais e Qualidade Superior do Estado de Minas de Gerais. São Paulo: SEBRAE MG, Junho 2001. 19