TRABALHO E EDUCAÇÃO: alguns elementos para discussão

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Transcrição:

TRABALHO E EDUCAÇÃO: alguns elementos para discussão Maria Auxiliadora Silva Moreira Oliveira 1 Maria da Conceição Almeida Vasconcelos 2 Resumo O presente trabalho é parte integrante da pesquisa de mestrado, em andamento, intitulada como Programa Mulheres Mil no Instituto Federal de Sergipe: interfaces com a Educação e o Trabalho. Para tanto, procurou-se elencar os conceitos das categorias em destaque trabalho e educação, bem como entender quais os seus pontos de convergência. Assim, na fase do levantamento bibliográfico da pesquisa, aqui procurou-se destacar a contribuição de teóricos que discutem tais temas e os contextualiza no modo de produção capitalista. Palavras-chave: Trabalho; Educação. Abstract: This paper is part of the master's research in progress, titled Thousand Women Program at Instituto Federal de Sergipe: interfaces with the Education and Labor. Therefore, we tried to list the concepts of categories highlighted labor and educations, as well as understand what their points of convergence. Thus, the phase of the research literature, here we sought to highlight the contribution of theorists who discuss such topics and contextualize them with the capitalist mode of production. Keywords: Labor, Education 1 Estudante de Pós-Graduação.Universidade Federal de Sergipe (UFS). E-mail: doramoreira.mestradoss@gmail.com 2 Doutor.Universidade Federal de Sergipe (UFS)

1 INTRODUÇÃO Compreender a relação entre educação e trabalho requer elementos que explicitem o papel fundante do trabalho na construção da sociabilidade humana e ainda entender a forma como outros complexos sociais específicos - a educação -, contribuem no modo de produção capitalista, para o processo de sociabilidade. Parte-se portanto, da compreensão de que o trabalho é categoria fundante da ontologia do ser social e contribui para a determinação social da produção e reprodução da vida humana. Quando Marx (1985, p.149), afirma ser o trabalho [...] um processo entre o homem e a natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a Natureza, já demonstra que o homem ao estabelecer essa relação vai transformando não só os elementos naturais, mas a si mesmo. Tal transformação ocorre porque, diferentemente dos animais irracionais, o ser social possui a capacidade de idealizar sua ação. A célebre citação de Marx sobre o trabalho desenvolvido pela aranha e por um arquiteto mostra que ao transformar a natureza e a si mesmo, o faz mediante a utilização da capacidade teleológica que possui. Diz Marx (1985, p. 149-150): Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos favos de suas colmeias. Mas o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo na cera. No fim do processo de trabalho obtém-se um resultado que já no início deste já existiu na imaginação do trabalhador e, portanto, idealmente. Sendo, pois, o homem o único ser capaz de realizar trabalho, ele o faz pela capacidade teleológica, de relacionar o plano ideal com o concreto, ou seja, O trabalho ganha a vida do meio do pôr teleológico, constituído por posições primárias e secundárias. Nesse momento, é bom ressaltar que o homem é um ser concreto e histórico, que realiza uma série de realizações ativas e conscientes com a natureza e com os outros homens. O trabalho, nessa dimensão capacidade teleológica primária e secundária -, constitui o processo pelo qual o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo social (LARA, 2010, p.21).

Este processo do agir, pensado e planejado, conduz o homem ao atendimento de suas necessidades e à construção de novas demandas (entendendo que a realidade é dinâmica), ultrapassando assim o imediatamente posto afastamento das barreiras naturais -, por meio da ação humana, o que contribui para a formação de um mundo social complexo de relações e mediações. Neste contexto, a atividade produtiva humana de transformar a natureza em resposta às suas necessidades, é um importante elemento para se entender a ontologia do ser social, sua história e suas características. O processo de produção e reprodução da humanidade se deu, portanto, por meio das transformações da natureza realizadas pela atividade humano produtiva. Assim, buscando elementos para o entendimento desta assertiva, Mészáros (2006, p. 9) destaca que: Ser uma parte da natureza implica que o ser humano é um ser com necessidades físicas historicamente anteriores a todas as outras e que, exatamente por conta disto, precisa produzir a fim de manter-se, a fim de satisfazer essas necessidades. Portanto, ao realizar trabalho o ser humano é capaz de transformar a natureza, se humanizar, e se distanciar do imediatamente posto. Frente a isto, Antunes (2011, p.68) destaca que: No fim deste processo de trabalho, o ser humano se depara com algo não mais imediatamente dado pela natureza, mas algo transformado, algo humanizado. Ou seja: ao final do processo de trabalho, o trabalhador se defronta com o resultado de sua ação; com a natureza feita humana; com sua subjetividade objetivada; consigo próprio na forma de objeto. 2 DESENVOLVIMENTO A assertiva de que é através do trabalho que o homem apropria-se da natureza para suprir suas necessidades, se humaniza e estabelece relações sociais, pode ser destacada nas indicações marxianas quando estas, [...] situam o trabalho como o processo recíproco de interação entre o homem e a natureza. Processo em que é afirmada a ação humana sobre o mundo. O homem, ao relacionar com a natureza, objetiva-se por meio das forças do seu corpo, com o intuito de apropriar-se dos recursos naturais disponíveis. Esta interação possibilita ao homem, ao mesmo tempo,

transformar a natureza e a si mesmo. A relação entre o homem e a natureza proporciona o desenvolvimento das potencialidades humanas e, consequentemente, submete a natureza ao seu domínio. [...] No entanto, o trabalho é a mediação ineliminável do homem com a natureza, que objetiva suprir as carências humanas, sejam elas materiais ou espirituais. No processo da apropriação da natureza, o ser começa a produzir os seus meios de vida e a si mesmo, pois ao objetivar-se pelo trabalho ele não só supre as suas carências imediatas como também cria novas carências, que vão se complexificando ao longo da história da humanidade. O ato de externação da vida pelo trabalho nunca é algo acabado em si mesmo, mas é um processo de constantes superações, pois o próprio processo de trabalho cobra novos avanços. O homem que o executa ao dar respostas para determinada situação cria necessariamente novas perguntas, que nunca serão respondidas definitivamente. Se acreditamos que as respostas dadas pelo homem, por meio do processo de trabalho fossem acabadas em si mesmas, estaríamos negando a capacidade teleológica do homem de negar a condição dada, e pré-idealizar uma nova forma de produção e reprodução social (LARA, 2010, p.19). É a partir da compreensão da categoria trabalho, como sendo o elemento mediador da relação entre o ser humano para com a natureza, que se apreendem as razões pelas quais este se configura como sendo, [...] tanto a causa da diferenciação entre ser humano e natureza, meio de constante humanização do ser humano e fim, ou finalidade em si do próprio processo humano, uma vez que o ser humano, por conta do longo processo histórico já trilhado, não mais produz para assegurar sua condição animal, mas sim para, uma vez assegurada esta sobrevivência, desenvolve-se livre, isto é, humanamente (ANTUNES, 2011, p.69). Existem elementos pertinentes à categoria trabalho que merecem ser destacados por contribuírem diretamente para o discernimento da questão aqui proposta, um deles diz respeito ao processo de alienação do trabalho. É possível observar a questão da alienação do trabalho, quando se recorre a Marx (2004, p. 82-83), e este pondera que: A consequência prática imediata da alienação do trabalho é que o trabalhador só se sente, por conseguinte e em primeiro lugar, junto de si [quando] fora do trabalho e fora de si [quando] no trabalho. Está em casa quando não trabalha e, quando trabalha, não está em casa. [...] Em vez, então, de contemplar a si próprio em um objeto (e, no fim das contas, em um mundo) por ele próprio criado, o ser humano reduz-se cada vez mais a algo absolutamente inferior àquilo que ele próprio produziu. O trabalho produz maravilhas para os ricos, mas produz privação para o trabalhador. Produz palácios, mas cavernas para o trabalhador. Produz beleza, mas deformação para o trabalhador. É essa lógica adotada pelos capitalistas em seus processos produtivos que se reflete, consequentemente, nos demais espaços da sociabilidade humana e no estabelecimento das relações sociais. Como afirma Antunes (2011), o trabalho alienado propicia um processo educativo que beneficia o capital. Tal processo indica o tipo de

educação que serve à reprodução das relações de exploração próprias do sistema capitalista, que imprime uma realidade diferenciada ao intervir diretamente nos resultados da consciência dos trabalhadores e nas condições materiais da produção e reprodução da vida. Como afirma Souza (2010, p.151), por meio da educação é possível a [...] aquisição de conhecimentos necessários ao homem no seu intercâmbio com a natureza e com os outros indivíduos [...] ela se dá no próprio contexto do processo de trabalho e dele é fruto. Se, por um lado, a aquisição de conhecimentos é um instrumento necessário e essencial ao processo de trabalho, por outro, o próprio conhecimento se dá no contexto desse processo. É mediante esse intercâmbio com a natureza e do estabelecimento de relações sociais que o homem, por meio do trabalho, vai adquirindo novos conhecimentos. A questão que se coloca é que esse aprendizado, na sociedade capitalista, é construído a partir de relações de exploração que auxiliam na reprodução do capital e na forma capitalista de pensar. Esse domínio capitalista,na formação da classe trabalhadora,de acordo com os princípios condizentes com a sua reprodução e acumulação, já era percebido por Marx e Engels. Como diz Souza (2010, p.145), Engels (1988) já havia percebido este conflito entre projetos distintos de formação do trabalhador em meados do século XIX, quando analisava a situação da classe operária na Inglaterra, e denunciou que a educação da classe trabalhadora se dá a partir da relação de subordinação de classe. O ensino transmitido nas escolas se dá na direção da classe dominante para a classe subalterna. Isto ocorre de forma tal que, ao realizar, faz com que a classe trabalhadora perca toda a sua disponibilidade original, conduzindo-a a uma autêntica e verdadeira atrofia moral e desolação intelectual. Trata-se de um tipo de educação interessada, utilitarista, que prepara o trabalhador apenas para atender a demandas da empresa capitalista, em oposição à educação desinteressada, típica das camadas burguesas. Por outro lado, a educação desinteressada que a burguesia reivindica para si é inconsistente, despossuída de qualquer capacidade prática. Assim, a denúncia de Engels contra o instrumentalismo da escola destinada à classe subalterna associa-se à condenação da cultura tradicional e da educação das classes dominantes. Tendo como análise a luta de classes, Marx (1978) acreditava que por meio da educação seria possível a transformação da sociedade. Para ele era preciso educar as crianças desde cedo, envolvendo não uma mera educação para o trabalho, mas outros elementos a exemplo da educação intelectual, corporal e tecnológica (teórico e prática). O trabalho seria a mediação para essa mudança, uma vez que por meio dele ocorre a sociabilidade humana em diversas dimensões da vida, ou seja, [...] não se reduz à atividade laborativa ou emprego, mas à produção de todas as dimensões da vida

humana (FRIGOTTO, s/d, p. 247). Nesse sentido, alguns autores destacam a proximidade da relação trabalho e educação, demonstrando que a educação [...] entendida como uma prática humana, não existe de forma independente das relações de trabalho que se configuram dentre o enorme conjunto das relações sociais que os homens travam ao produzirem a sua existência em determinada sociedade. Por conseguinte, por ela também perpassam as contradições sociais contidas no movimento geral da sociedade que a produz como tal. [...] Ao analisar trabalho e educação na sociabilidade do capitalismo pressupõe o entendimento de que se refere a processos distintos, mas que fazem parte de um mesmo movimento histórico (CZERNISZ e NOMA, 2010, p.194). Nessa direção, a contribuição de Tonet (2010, p.9), deixa claro que mesmo estando em relação direta é preciso compreender o papel de cada uma dessas categorias: [...] À diferença dos animais, nós humanos não nascemos geneticamente determinados a realizar as atividades necessárias à nossa existência. Precisamos aprender o que temos que fazer. Precisamente porque o trabalho implica teleologia, isto é uma atividade intencional prévia e a existência de alternativas. Nada disso é biologicamente pré-determinado. Precisa ser conscientemente assumido. Daí a necessidade da educação, vale dizer, de um processo de aquisição de conhecimentos, habilidades, comportamentos, valores, etc. que permitem ao indivíduo tornar-se apto a participar conscientemente (mesmo que essa consciência seja limitada) da vida social. Esta abordagem deixa muito clara a distinção entre trabalho e educação. [...] trabalho é a única categoria que faz a mediação entre o homem e a natureza. Só ele tem a função de produzir os bens materiais necessários à existência humana. A educação, por sua vez, é uma mediação entre os próprios homens. [...] a afirmação de que a educação não é trabalho não implica nenhuma valoração entre essas categorias, mas apenas a constatação de um fato ontológico. Trata-se, aqui, apenas, de deixar clara a natureza fundante da categoria trabalho e a natureza fundada da categoria educação. Por isso a importância de compreender o trabalho como fundante da sociabilidade humana e o papel de outros complexos sociais que auxiliam no processo de existência do ser social. Ainda como afirma Tonet (2010, p.12), [...] a problemática da educação deve ser precedida, necessariamente, de uma teoria geral do ser social ou, como Lukács a denominou, de uma ontologia do ser social. Só na medida em que se responder à questão o que é o ser social é que se poderá responder satisfatoriamente a pergunta o que é educação, já que esta é apenas um momento do ser social em seu conjunto. Nesta direção acrescenta esse mesmo autor: [...] nascemos com potencialidades para nos tornarmos indivíduos humanos, mas não nascemos já como indivíduos humanos. Tornamo-nos humanos na medida em que nos apropriamos do patrimônio humano universal. É neste processo de nos tornarmos membros do gênero

humano que a educação tem um papel importantíssimo. No seu sentido mais geral, a educação cumpre a função de permitir aos indivíduos essa apropriação dos conhecimentos, habilidades, valores e comportamentos que lhes permitam inserir-se no processo social. Pode-se, deste modo, perceber, que a educação tem um papel fundamental na reprodução do ser social (TONET, 2010 p.10). Portanto, a relação trabalho e educação só pode ser compreendida se analisada no interior do sistema capitalista, de suas contradições, de como o ser social se constitui por meio do trabalho, do seu caráter teleológico, da transformação das relações sociais. Da mesma forma é preciso analisar o uso e sentido que o modo de produção capitalista faz do processo educativo e de como faz a utilização das potencialidades dos trabalhadores em benefício de sua reprodução e acumulação. Portanto, como afirma Antunes (2011, p.70), trata-se de uma relação ineliminável. [...] O acumulo sócio histórico dos avanços do trabalho tanto em suas formas mais imediatamente materiais quanto nas mais complexas e abstratas manifestações espirituais, da arte à filosofia - que constitui o cerne de todo o processo formativo, educacional da humanidade. Isto é, só é possível que haja humanidade por intermédio de um processo de abstração social a partir do caráter inerentemente histórico dos resultados dos trabalhos acumulados e relacionados. Processo este que, obviamente, tem seu início exatamente nos processos de generalização individual, sem que todos os avanços e aquisições individuais se perdessem ao final da vida daquele ser humano que os elaborou. É, então, exatamente em função destas características constitutivas do complexo do trabalho - tanto como aquilo que desencadeia o processo de humanização como aquilo que garante e assegura a continuidade e complexificação deste processo por meio da transmissão de suas aquisições históricas - que o processo formativo educacional do ser humano não pode do trabalho ser separado; ou seja, existe uma relação ineliminável, ontológica, entre as esferas do trabalho e da educação. Daí a importância de compreender a educação em suas múltiplas dimensões, observando que, [...] a concepção de trabalho enquanto práxis humana, material e nãomaterial, que constitui o trabalho como princípio educativo e que portanto não se encerra na produção de mercadorias -, exige que a educação seja compreendida em suas múltiplas determinações, conforme o estágio do desenvolvimento das forças produtivas e das relações de produção (CIAVATTA, 2003, p.144). Além disso, como indica o mesmo autor, duas questões são importantes para compreender a relação trabalho e educação: [...] a pedagogia que se desenvolve nas relações sociais e produtivas no modo de produção capitalista e identificar os aspectos de contradição que engendram a construção de uma nova pedagogia comprometida com os

interesses da classe trabalhadora (CIAVATTA, 2003, p. 143).Contribuindo com essa discussão Frigotto (s/d, p. 247), aponta que, Na sua dimensão mais crucial, ele [o trabalho] aparece como atividade que responde à produção dos elementos necessários e imperativos da natureza. Concomitantemente, porém, responde às necessidades que, por serem históricas, assumem especificidades no tempo e no espaço. [...] Nessa dimensão, o trabalho engendra um princípio formativo ou educativo. Esse princípio educativo deriva do fato de que todos os serem humanos são seres da natureza e, portanto, têm a necessidade de se alimentar, de se proteger das intempéries e criar seus meios de vida. É fundamental socializar, [...] o princípio de que a tarefa de prover a subsistência e outras esferas da vida pelo trabalho é comum a todos os seres humanos, evitando-se, desta forma, criar indivíduos ou grupos que exploram e vivem do trabalho de outros e se constituem, na expressão de Gramsci, em mamíferos de luxo. O trabalho como princípio educativo, então, não é em Marx e Gramsci uma técnica didática ou metodologicamente no processo de aprendizagem, mas um pressuposto ontológico e ético-político no processo de socialização humana. Tais argumentos demostram que outra lógica foi sendo engendrada na sociedade capitalista quando se observa que a utilização do trabalho como princípio educativo e da educação como condição da emancipação humana tomaram outra direção, ou seja, a educação e a formação humana terão [tiveram] como sujeito definidor as necessidades, as demandas do processo de acumulação do capital sob as diferentes formas históricas de sociabilidade que assumir. Ou seja, reguladas e subordinadas pela esfera privada, e à sua reprodução (FRIGOTO, 2003. p. 30). Para o capital o ser humano deve ser reproduzido, isto é, formado, educado, somente e no máximo até os estreitos limites de sua condição de trabalhador. Ou seja, do ponto de vista amplo, o máximo de humanidade a que o trabalhador pode e deve ter acesso é tão somente aquilo que lhe permita, do ponto de vista estrito, atingir aquilo que Marx chamou de o grau médio de habilidade, destreza e rapidez reinantes na especialidade em que [seu trabalho] se aplica. Portanto, a subsunção real do trabalho ao capital está presente no modo de produção capitalista onde, a burguesia procura engendrar a conformação ética e moral do trabalhador em torno do consenso da concepção de mundo burguesa e consolidar a naturalização da lógica de mercado. Portanto, no campo educacional, a ação do capital tem se manifestado por meio de ações que visam reformular o sistema educacional a fim de que este atenda novas demandas, por vezes preparando o trabalhador para assumir postos de trabalho em condições flexíveis, ou formando o passivo excedente da força de trabalho, dotado de precariedade e informalidade. Tem-se, portanto, um processo de

formação/qualificação no seio do sistema capitalista sob o ditame da burguesia. Assim, mediante a ótica do capital, a formação para o trabalho está baseada na diferenciação existente entre a formação para o trabalho manual destinada à grande maioria dos trabalhadores e a formação para o trabalho intelectual, reservada a uma elite privilegiada. Muito embora exista, também, algo em comum nestas duas vertentes, o que pode ser perceptível quando Souza (2010, p.143) frisa que [...] para ambas as parcelas da força de trabalho, a educação tem como objetivo a constituição de um novo tipo de trabalhador voltado para o mercado, quer como sujeito empreendedor, quer simplesmente como sujeito de consumo. Nessa perspectiva, a formação para o trabalho vem atender aos mecanismos sociais e políticos de reprodução das relações sociais fundadas na estrutura de dominação de classe. A solidificação do capitalismo e a estruturação dos sistemas educacionais trazem consigo a premissa que reforça a divisão de classes quando gesta e permite a distinção e segmentação do processo educacional. Escola disciplinadora e adestradora para os filhos dos trabalhadores e escola formativa para os filhos das classes dirigentes (FRIGOTTO, 2003, p. 34). Interesses antagônicos, necessidade de manter a reprodução da força de trabalho e de garantir a concentração da riqueza, exige a continuidade de tal premissa. Essa vertente do pensamento está presente também em Tonet (2010, p. 12) quando este destaca que: As atividades humanas já existentes serão modificadas e outras surgirão para fazer frente a novas exigências. No caso da educação, ela será privatizada, vale dizer, organizada para atender a reprodução da sociedade de modo a privilegiar os interesses das classes dominantes. Uma forma de educação para aqueles que realizam o trabalho manual e que são as classes exploradas e dominadas (a ampla maioria). Outra forma para aqueles que realizam o trabalho intelectual e que fazem parte das classes exploradas e dominantes (uma pequena minoria). Frente a isto, Tonet (2010, p.14) também destaca a contradição existente no bojo da sociedade burguesa. Diz ele: [...] a teoria educacional burguesa se vê enredada em uma contradição insolúvel entre o discurso e a realidade objetiva. Ela enfatiza a universalidade do direito à educação e a necessidade da formação integral do ser humano. No entanto, o processo real, objetivo, impede o acesso universal à educação e desmente a possibilidade de uma formação integral. Incapaz de compreender a relação íntima entre subjetividade e objetividade, essa teoria torna-se um discurso vazio, mas convenientemente funcional à reprodução dos interesses das classes dominantes.

3 CONCLUSÃO Necessário se faz, portanto, romper com o pensamento da linearidade dos vínculos entre o processo educativo e o sistema produtivo; antes é preciso situar mediações fomentadoras de processos sociais concretos, ampliando o conceito da educação para além de uma visão reprodutora do capital. Pode-se concluir que, no contexto do sistema capitalista, é impraticável a educação e o trabalho fora da exploração do capital, o que instiga a pensar na perspectiva da revolução, da superação do capital, para que a verdadeira emancipação possa ser consolidada. REFERÊNCIAS ANTUNES, Caio. Trabalho, Educação e Reprodução Social: as contradições do capital no século XXI. São Paulo: Práxis. 2011. CIAVATTA, Maria; TREIN, Eunice. O Percurso Teórico e Empírico do GT Trabalho e Educação: Uma Análise Para Debate. 2003. CZERNISZ, Eliane Cleide da Silva; NOMA, Amélia Kimiko. Trabalho, Educação e Sociabilidade. Trabalho, Educação e Sociabilidade na Transição do Século XX para o XXI: o Enfoque das Políticas Educacionais. São Paulo, Práxis, 2010. FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e crise do capitalismo real. 5ª ed. São Paulo, Cortez, 2003. LARA, Ricardo. Trabalho, Educação e Sociabilidade. Da Atividade Humana Sensível à Ciência Real Unificada. São Paulo, Práxis, 2010. MARX, K. O Capital: crítica da economia política. São Paulo, Abril Cultural, 1985.. Manuscritos Econômicos-Filosóficos. São Paulo, Boitempo, 2004. MÉSZÁROS, I. A Teoria da Alienação em Marx. São Paulo: Boitempo, 2006. SOUZA, José dos Santos. Trabalho, Educação e Sociabilidade. Trabalho, Educação e a Luta de Classes na Sociabilidade do Capital. São Paulo, Práxis, 2010. TONET. I. Marxismo e Educação. (In): Marx está vivo! Maceió. 2010. Disponível em: www.ivotonet.com.br/arquivos/marxismo_e_educação.pdf. Acesso em 01 de janeiro de 2012.