Brazil Water Learning Series: Gestão de Recursos Hídricos no Brasil: Desafios e Novas Perspectivas



Documentos relacionados
- Dezembro, Organismos de Bacia Estado da arte, Brasil

Gestão de Recursos Hídricos no Brasil VISÃO GERAL Nelson Neto de Freitas Coordenador de Instâncias Colegiadas do SINGREH Agência Nacional de Águas

INTEGRAÇÃO DOS INSTRUMENTOS DE GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS COM O PLANO DE BACIA

Panorama da Gestão de Recursos Hídricos no Brasil

Gestão Participativa e os Comitês de Bacias

ASSEMBLÉIA GERAL DA RELOB AS ESTRUTURAS DE GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NAS BACIAS PCJ

MESA REDONDA ÁGUA: ESCASSEZ, USO RACIONAL

3º Congresso Científico do Projeto SWITCH. Belo Horizonte, MG, Brasil 30 de novembro a 04 de dezembro

A Construção de um Programa de Revitalização na Bacia do rio São Francisco

GIRH como Ferramenta de Adaptação às Mudanças Climáticas. Adaptação em Gestão das Águas

A CRISE HÍDRICA E SEUS REFLEXOS

Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional

Crise da Água em São Paulo Balanço e Propostas contribuição para o debate

PROPOSTA DE PROGRAMAS E AÇÕES PARA O PNRH

ENQUADRAMENTO DE CORPOS COMO INSTRUMENTO DE PLANEJAMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL REGIONAL

Curso de Gestão de Águas Pluviais

Recursos Hídricos - Uma abordagem de desenvolvimento para o semiárido nordestino

Enquadramento dos Corpos de Água em Classes segundo os Usos Preponderantes. Correlação com Plano de Bacia, Sistema de Informação e Monitoramento

10.3 Cronograma de Implantação e Orçamento

INDICADORES DE GESTÃO AMBIENTAL

INSTRUMENTOS FINANCEIROS E ECONÔMICOS PARA GIRH. Aplicação de instrumentos financeiros

"Experiências Internacionais de Gestão de Recursos Hídricos: lições para a implementação da Lei sobre Cobrança pelo Uso da Água no Brasil".

XVIII Congresso Brasileiro de Recursos Hídricos

ESTADO DOS CADASTROS DE USUÁRIOS NAS BACIAS PCJ NO ANO DE 2013

AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS

RESOLUÇÃO Nº 5, DE 10 DE ABRIL DE

No presente estudo foram consideradas as seguintes premissas:

As Lições da Crise Hídrica na Região Metropolitana de São Paulo João Alberto Viol

Simpósio Estadual Saneamento Básico e Resíduos Sólidos: Avanços Necessários MPRS

Water resources management and metering regulation A gestão de recursos hídricos e a regulação da medição de água Gisela Forattini

MUDANÇAS DO CLIMA E OS RECURSOS HÍDRICOS. São Carlos, 25 de fevereiro de 2010

Rio São Francisco ERROS DA TRANSPOSIÇÃO

Crise da água: Desafios e Soluções

4º Fórum Internacional Habitat do Cidadão

MINISTÉRIO DAS CIDADES CONSELHO DAS CIDADES RESOLUÇÃO RECOMENDADA N 75, DE 02 DE JULHO DE 2009

- SEMINÁRIO SEGURANÇA HÍDRICA - CENÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Perspectivas. Uma Agenda para o SINGREH

Perspectivas do Setor de Saneamento em relação à Cobrança

RESOLUÇÃO Nº 131, DE 11 DE MARÇO DE 2003

Órgão de Coordenação: Secretaria de Estado da Ciência e Tecnologia e do Meio Ambiente SECTMA

Crise de água e segurança hídrica no Estado do Rio de Janeiro

Mesa Redonda 5: Monitoramento de Águas Subterrâneas, Estratégias para Implantação de um Modelo Cooperativo

Gestão da Demanda de Água Através de Convênios e Parcerias com o Governo do Estado de São Paulo e Prefeitura da Cidade de São Paulo SABESP

Mudanças Climáticas: Efeitos Sobre a Vida e Impactos nas Grandes Cidades. Água e Clima As lições da crise na região Sudeste

PLANEJAMENTO DA GESTÃO DE RSU

As Interfaces entre os Processos de Licenciamento Ambiental e de Outorga pelo Uso da Água. Campo Grande - MS

Desenvolvimento de Pessoas na Administração Pública. Assembléia Legislativa do Estado de Säo Paulo 14 de outubro de 2008

Observando os Rios. Programa de Educação Ambiental e Mobilização para Gestão em Recursos Hídricos, desenvolvido pela Fundação SOS Mata Atlântica

MÓDULO I Gerenciamento Integrado de Recursos Hídricos Conceitos

O ESTADO DA ARTE DAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS E O SEU CONTEXTO DIANTE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

2ª Reunião Ordinária do Plenário 04 de abril de 2013.

MEIO AMBIENTE RECURSOS HÍDRICOS BEM CUIDAR PARA PERENIZAR

A OUTORGA DE DIREITO DE USO DOS RECURSOS HÍDRICOS NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO CAPIBARIBE, PERNAMBUCO- BRASIL.

Gestão de Recursos Hídricos

O Impacto da seca na produção de alimentos em São Paulo

EVOLUÇÃO INSTITUCIONAL DO SETOR DE ÁGUA EM SÃO PAULO. Edson Giriboni Secretário de Saneamento e Recursos Hídricos

FINANCIAMENTO DO DESENVOLVIMENTO URBANO

Água e Floresta As lições da crise na região Sudeste

Desafios e metas do Estado de São Paulo

META NACIONAL 20- ampliar o investimento público em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do Produto

DESENVOLVIMENTO DAS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS, GERAÇÃO DE EMPREGO E INCLUSÃO SOCIAL. XII Seminario del CILEA Bolívia 23 a 25/06/2006

[415] 11. INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO

ESTUDO TÉCNICO DE VIABILIDADE DE PAGAMENTO POR SERVIÇOS AMBIENTAIS PARA PROTEÇÃO DA ÁGUA PARA O SUB-SISTEMA CANTAREIRA

EDUCAÇÃO AMBIENTAL E GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

Manejo de Recursos Hídricos no Semi-árido. Julho de 2004 BNDES Rio de Janeiro

INVESTIMENTOS, ABORDAGENS E ESFORÇOS COMUNS NO SANEAMENTO RURAL

(Publicada no D.O.U em 30/07/2009)

Compromissos com o Meio Ambiente e a Qualidade de Vida Agenda Socioambiental para o Desenvolvimento Sustentável do Amapá

Em busca da sustentabilidade na gestão do saneamento: instrumentos de planejamento

Projeto Prominp IND P&G 75 Propostas de Política para Mobilização e Desenvolvimento de APLs para o Setor de Petróleo, Gás E Naval

DELIBERAÇÃO NORMATIVA Nº 15, DE 14 DE ABRIL DE 2011

PORTARIA SERLA N 591, de 14 de agosto de 2007

A Lei de Diretrizes da Política

Desafios do enquadramento e Objetivos da oficina

Outorga do Sistema Cantareira Renovações de 2004 e Rui Brasil Assis Assessor do Gabinete da SSRH

INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 12, DE 03 DE SETEMBRO DE 2008.

Cobertura de saneamento básico no Brasil segundo Censo Demográfico, PNAD e PNSB

METODOLOGIA PARA ANÁLISE DA REVISÃO ORDINÁRIA DA PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA FIRMADA ENTRE O MUNICÍPIO DE RIO CLARO E A FOZ DE RIO CLARO S/A.

DE SANEAMENTO *ESTRUTURA DA LEI *TITULARIDADE GESTÃO. Eng. Luiz Corrêa Noronha

Agência Nacional de Águas

Mesa Redonda Universalização do saneamento e mobilização social em comunidades de baixa renda

CARTA DO PARANÁ DE GOVERNANÇA METROPOLITANA

Saneamento Básico e Infraestrutura

A Sabesp STATUS: Fundada em 1973 como sociedade de (Governo do Estado de São Paulo, acionistas privados e municípios) ATRIBUIÇÕES:

Programa de Capacitação em RPP- Relação Público Privadas

Gestão Integrada de Águas Urbanas

Água. Restauração Florestal para Gestão da Água. Mata Atlântica e Serviços Ambientais

SISTEMA ESTADUAL DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL - SEHIS

DIÁLOGOS SOBRE A QUESTÃO METROPOLITANA NO BRASIL BRASÍLIA - 12 DE JUNHO DE 2015

Termo de Referência nº Antecedentes

Encontro Gestão Eficiente de Água e Energia

Governança Corporativa. A importância da Governança de TI e Segurança da Informação na estratégia empresarial.

Conteúdo Específico do curso de Gestão Ambiental

DEPARTAMENTO DE MEIO AMBIENTE - DMA/FIESP. Crise Hídrica-Realidade e Reflexos. Setor Industrial. Priscila Rocha Especialista Ambiental- Fiesp

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO AMBIENTAL

PROGRAMA COOPERAÇÃO TÉCNICA FUNASA. twitter.com/funasa

Plataforma Ambiental para o Brasil

COPASA COMPANHIA DE SANEAMENTO DE MINAS GERAIS

SEMINÁRIOS TEMÁTICOS. Mesa 1: Produção Habitacional : programas de financiamento da habitação de interesse social

Vulnerabilidade Regional às Mudanças do Clima

Transcrição:

Brazil Water Learning Series: Gestão de Recursos Hídricos no Brasil: Desafios e Novas Perspectivas Abril Junho, 2014 Crédito: ANA Rosa Maria Formiga Johnsson Professora Adjunta Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ/DESMA) Diretora de Gestão das Águas e do Território, Instituto Estadual do Ambiente (INEA-RJ) Banco Mundial Agua

Sumário 1. Recursos hídricos: disponibilidade, pressão e demanda 2. Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos: proposição das leis das águas 3. Panorama nacional das práticas de gestão integrada 4. Algumas experiências de gestão integrada em nível local/regional 5. Considerações finais

Recursos hídricos: disponibilidade, pressão e demanda

Disponibilidade Hídrica Disponibilidade hídrica superficial (vazão média): ~ 180,000 m3/s 12% da disponibilidade do planeta Região Amazônica = 81% Bacia do rio Amazonas Polígono das secas Disponibilidade hídrica subterrânea (reserva explotável): ~11,500 m3/s Região Amazônica = 62% Precipitação média: 1,761mm (de 500 mm no Semiáridos a mais de 3.000 mm na Região Amazônica) Disponibilidade de água doce (m3/s) Fonte: Relatório Conjuntura dos Recursos Hídricos (ANA, 2013).

Disponibilidade de água & Densidade Demográfica Bacia Amazônica: 558.000 m 3 /hab/ano Disponibilidade per capita: 31,000 m3/hab/ano (200 milhões de habitantes, 84% urbanos) < 2 habitantes/km 2 25-50 habitantes/km 2 > 100 habitantes/km 2 Mas algumas bacias do Semiárido: 500 m 3 /hab/ano

Principais Usos Consuntivos no Brasil Demanda de água para uso industrial (outorgas) Áreas irrigadas no Brasil, por microbacia Demanda urbana de água Hydrographic region Public Irrigation IRRIGATED AREA (ha) 0-100 101-500 501-1,000 1,001-2,500 2,501 5,000 5,001-15,223 Evolução da área irrigada no Brasil 1970 2012 Fonte: Relatório Conjuntura dos Recursos Hídricos (ANA, 2013). Fonte: IBGE, 2011.

Demandas de água situação em 2012 Total water withdrawal in Brazil in 2010: 2.373m 3 /s 17% 22% Source: ANA, 2013. 6% 1% 54% Navegação, turismo, lazer e proteção dos ecossistemas aquáticos ainda buscam seu espaço na agenda de água no Brasil Irrigation Urban supply Industrial supply Animal needs Others 9% 7% Hidroenergia - Capacidade instalada: 81 GW - Potencial: 260 GW Total water consumption in 2010: 1.161 m3/s 11% 1% 72% Irrigation Urban supply Industrial supply Animal needs Rural supply Source: ANA, 2013.

Qualidade de Água: Poluição Orgânica Principais fontes de poluição: Poluição urbana Poluição industrial Poluição agrícola Saneamento (IBGE, 2011): Esgotamento sanitário: 52,5% do esgoto urbano coletado Tratamento: somente 34% do esgoto coletado Fonte: Relatório Conjuntura dos Recursos Hídricos (ANA, 2013). Regiões Metropolitanas tem a maior concentração de poluição orgânica remanescente no Brasil

Eventos Críticos em 2012 Cheias/inundações: 754 municípios (14%) Secas/estiagens: 1.985 municípios (36%) Fonte: Relatório Conjuntura dos Recursos Hídricos (ANA, 2013).

Desafios Principais no Brasil por Região Inundações em áreas urbanas de todas as regiões, inclusive Nordeste Déficit hídrico (semiári do) Poluição da água Déficit hídrico (irrigação) Crédito: ANA (Paulo Libâneo)

Crise da água em 2014 Estiagem severa no Sistema Cantareira Forte estresse hídrico na Bacia Paraíba do Sul Cheia histórica do rio Madeira Estiagem/seca no Nordeste, novamente.

Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos: proposição das leis das águas

Domínio das águas no Brasil Todas as águas são de domínio público Águas estaduais Águas federais Águas federais: rios que atravessam ou fazem fronteira entre estados e outros países Águas estaduais: águas subterrâneas e rios inteiramente situados no território de um único Estado, exceto quando reservados em obras da União Dois níveis de gestão = dois níveis de reforma para a gestão integrada de recursos hídricos! (5.565 municípios são gestores do uso e ocupação do solo)

Contexto histórico Até a emergência das reformas nos anos 1990 e 2000, a gestão das águas no Brasil era um subsetor de energia (hidroeletricidade) No Nordeste semiárido, a ênfase da Grande Hidráulica era o combate às secas Outorgas emitidas anteriormente em alguns estados eram documentos de pouco valor legal As leis das águas propõem profundas mudanças nas práticas de gestão, com base nos princípios e normas da Gestão Integrada de Recursos Hídricos (IWRM)

Dinâmica na aprovação das leis das águas São Paulo: estado pioneiro Lei federal das águas (1997) 1991 1994 1997 São Paulo inspirou os modelos de gestão de todo o país, a exemplo do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, etc. e do próprio Sistema Nacional de Gestão das Águas. 2003 2007 Estados com lei de recursos hídricos Fonte: Relatório Conjuntura (ANA, 2013).

Leis das águas: federal e estaduais Objetivos das Políticas Nacional e Estaduais: Assegurar à atual e às futuras gerações a disponibilidade de água, em qualidade adequada aos respectivos usos A utilização racional e integrada dos recursos hídricos A prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos

Leis das águas: federal e estaduais (cont.) Os fundamentos/princípios: Água, um bem de domínio público Reconhecimento da água como um bem finito e vulnerável de valor econômico Em situações de escassez, o uso prioritário é o consumo humano e animal Usos múltiplos da água Bacia hidrográfica é a unidade de planejamento e gestão Gestão integrada, descentralizada e participativa

Leis das águas: federal e estaduais (cont.) Instrumentos de gestão: Planos de Recursos Hídricos; Outorga dos direitos de uso de recursos hídricos; Cobrança pelo uso de recursos hídricos; Enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os usos preponderantes da água; Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos

Leis das águas: federal e estaduais (cont.) Instituições : Conselhos Nacional e Estaduais de Recursos Hídricos Secretaria Nacional de Recursos Hídricos (SNRH/MMA) Agência Nacional de Águas (ANA/MMA) autoridade gestora em nível federal* Órgãos gestores estaduais* Comitês de bacia Agências de água (quase sempre) Órgãos federais, estaduais e municipais relacionados à gestão das águas * A ANA e alguns órgãos gestores estaduais foram criados posteriormente, por outras leis

Leis das águas: federal e estaduais (cont.) Outros atores-chave para a gestão das águas: Instituições responsáveis pelo meio ambiente e controle da poluição (p.e., órgãos ambientais estaduais) Instituições responsáveis pela infraestrutura hídrica de combate às secas, irrigação e defesa civil (destaque para o Ministério da Integração Nacional, suas secretarias e vinculadas) Instituições relacionadas ao setor de hidroenergia e diferentes setores usuários (pesca, navegação, etc.)

Maior complexidade do Sistema: gestão integrada de bacias interestaduais Estado A Estado Federal Estado B Em geral, os modelos de gestão são de forte inspiração francesa, calcado no tripé comitê/agência cobrança - plano de bacia. Há exceções. Gestão extremamente complexa e de difícil operacionalização em bacias compartilhadas entre a União (ANA) e os Estados. Implementação mais fácil nas bacias com águas inteiramente estaduais.

Panorama nacional das práticas de gestão integrada

Primeiro desafio: instituições para implementar a gestão integrada Poucos estados dispunham de um órgão gestor de recursos hídricos, a exemplo de São Paulo e Rio de Janeiro. Alguns criaram uma instituição gestora estadual, mas poucas são robustas ou tem independência financeira, a exemplo do Ceará. A COGERH (Ceará) foi criada em 1994 (lei de 1992), com características diferenciadas: Gestor de recursos hídricos E responsável pela O&M de infraestrutura hídrica (114 funcionários próprios + 538 terceirizados) Tarifação de água bruta = recursos próprios (R$268 mil em 1996 e R$68 milhões em 2013 => pessoal, custeio e O&M) Apoio técnico e administrativo aos comitês de bacia (funções de agência de bacia)

Primeiro desafio: instituições para implementar a gestão integrada (cont.) Em nível federal, existia somente uma estrutura da administração direta (SRH/MMA). ANA foi criada em 2000. É uma autarquia especial, com autonomia administrativa e financeira, vinculada ao MMA. Competências em gestão das águas. Sua diretoria colegiada é formada pelo Diretor-Presidente e mais 4 diretores, com mandato de 4 anos. A ANA possui quadro técnico permanente, altamente especializado: ~ 230 técnicos, ~500 funcionários (~R$75 milhões/ano, Orçamento União) Principal receita para custeio e investimentos: cobrança pelo uso da água do setor elétrico (R$ 191 milhões em 2012, R$ 220 milhões em 2013) Problema: contingenciamento (até 2011)

Diversidade de ritmos e práticas de gestão Profunda diferença entre Estados: Poucos Estados encontram-se em estágio avançado de implementação dos seus sistemas de gestão (Ceará, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, etc.) Alguns Estados ainda nem iniciaram uma implementação efetiva. Muitos encontram-se em estágio intermediário. A maior parte dos órgãos gestores estaduais carece de estrutura administrativa, recursos humanos e financeiros para o exercício de suas funções. Em nível federal, a ANA vem implementando seletivamente a gestão em bacias interestaduais.

Comitês de bacia (estaduais e interestaduais) Lei das Águas (1997) Criação da ANA (2000) - 174-10 SOMENTE 17 comitês com agências de água delegatárias!! Em 2011, somente 1 Estado (Acre) não tinha Conselho Estadual de Recursos Hídricos Conselho Nacional funciona regularmente desde 1998

Cobrança pelo uso da água Cobrança de rios federais (por comitês interestaduais): Paraíba do Sul (RJ/SP/MG) - 2003 Piracicaba, Capivari e Jundiaí PCJ (SP/MG) 2006 São Francisco (PE/AL/SE/BA/MG/DF/GO) - 2010 Doce (MG/ES) 2011 Cobrança de águas estaduais (por comitês estaduais): Rio de Janeiro: todas as 9 regiões hidrográficas do estado - 2003 São Paulo: bacias PCJ, Paraíba do Sul e bacias dos rios Sorocaba e Médio Tiête. Minas Gerais: bacias Piracicaba-Jaguari, dos rios das Velhas e Araguari Metodologia e critérios variáveis (captação, consumo e DBO). Usuários-pagadores: saneamento, indústrias, mineração e às vezes irrigantes. Valores praticados são bastante baixos.

Cobrança pelo uso da água (cont.) Total da cobrança pelo uso de águas federais e estaduais (acumulado até dez 2012): R$ 532 milhões de reais, sendo R$ 170 milhões da cobrança de águas federais. Ainda: Ceará (tarifa de água bruta) + cobrança do setor elétrico ANA (0,75% do valor da energia gerada). Baixo nível de desembolso (utilização dos recursos), variando de cerca de 20% a 50% do total arrecadado por bacia. Em geral, a arrecadação anual da cobrança atende à pequena parcela dos investimentos previstos nos planos de recursos Limite de custeio de delegatárias (7,5% do arrecadado) é um problema hoje.

Outorgas de direitos de uso Mais de 200,000 autorizações de uso de água foram concedidas (usos consuntivos) até julho de 2012 Evolução do numero de outorgas no Brasil (ANA, 2012) Mais de 70% da vazão outorgada (7.400 m3/s) para irrigação, seguida do abastecimento urbano e industrial Estima-se cerca de 350,000 poços sendo utilizados no país Fonte: ANA, 2011.

Outorgas de direitos de uso (cont.) Em geral, a alocação de água se baseia em critérios conservadores/restritivos: Somente uma pequena fração da vazão mínima de referência é outorgável; São outorgadas as vazões máximas instantâneas; Não há flexibilidade sazonal; Grande segurança hídrica aos usuários estabelecidos e regularizados; Novos usuários são admitidos se não comprometer os préexistentes. Este sistema de outorga funciona bem somente em bacias sem estresse hídrico quali-quantitativo.

Planos de recursos hídricos Situação em DEZ/12 8 planos elaborados e 1 em elaboração em bacias interestaduais Dezenas de planos de bacias estaduais, elaborados pelos Estados e/ou comitês de bacia Plano Nacional (2006, rev. em 2010). 19 Planos Estaduais (total de 27) Avaliação da experiência: Diagnósticos robustos; Cenarização tímida (p.e. sem cenários associadas às mudanças do clima, de maior incerteza) Pouca dedicação à fase de ações e investimentos => deve-se buscar maior compromisso para sua implementação efetiva (cobrança ainda modesta).

Algumas experiências de gestão integrada em nível local/regional

Alocação negociada de água no Ceará Ceará inventou a figura de Comissões de Usuários de Vale Perenizado e Associação de Usuários de Açudes, organismos locais cuja criação antecedeu à formação dos CBHs Atribuição principal: alocação negociada de água, todos os anos, com o apoio técnico da Cogerh Dos 144 reservatórios monitorados em todo o Estado, 70 são geridos mediante alocação negociada de água (2013)

Alocação negociada de água no Ceará: principais resultados Envolvimento de usuários de água e sociedade civil Maior flexibilidade e eficiência na alocação de água Maior transparência => maior segurança hídrica MAS... o processo de alocação ainda não é traduzido em regularização de usos há espaço para aperfeiçoamento metodológico em estiagens/secas severas, o processo não é suficiente para evitar grandes perdas.

Gestão de bacias estaduais Comitê Guandu (RJ): Universalização de projetos de saneamento e planos municipais de saneamento para a Bacia; Proteção dos mananciais/psa; Contingência para acidentes ambientais. Comitê Lagos São João (RJ): Principal ação: recuperação da Lagoa de Araruama, mediante pacto de gestão envolvendo serviços de água e esgoto, usuários, sociedade civil, ERJ e municípios (coleta de tempo seco).

Gestão de bacias interestaduais Comitês PCJ (SP/MG): Mobilização regional significativa Forte atuação na alocação de água macro-regional, envolvendo a RMSP Resultados significativos em esgotamento sanitário Bacia interestadual com maior integração entre os diferentes organismos de bacia

Gestão de bacias interestaduais Cobrança: cerca de 12,5 milhões por ano Investimentos: ~R$ 3 bilhões em 20 anos, ou R$ 150 milhões anuais. CEIVAP e comitês estaduais (SP/RJ/MG): Pioneira no país (comitê, regularização, outorga, plano de bacia..) Alta complexidade de gestão: 8 comitês, delegatária não é agência única, 5 órgãos gestores (qualidadequantidade) Dificuldades de integração A cobrança corresponde a cerca de 10% do montante de investimentos necessários para a proteção e recuperação da Bacia. Dificuldades na utilização dos recursos: média de 30% do valor acumulado total.

Considerações finais

Principais resultados Resultados bastante positivos em termos de processo: Novas práticas de gestão, Mobilização social (comitês de bacia), Fortalecimento institucional (em nível estadual e sobretudo federal) e Bases técnicas de gestão. De modo geral, resultados ainda modestos em termos de proteção e recuperação dos recursos hídricos, mas (muito) importantes em algumas experiências locais/ regionais: Ceará (alocação negociada), São Paulo (PCJ), Rio de Janeiro (Lagos São João), entre muitos outros.

Maiores avanços observados Maior conhecimento sobre a água, seu uso e orientações estratégicas, em grande parte por iniciativa da ANA: Ampliação significativa do monitoramento de quantidade e qualidade da água. Ampliação significativa do conhecimento sobre os usos e usuários de água. Maior controle sobre as condições hidrológicas de bacias com infraestrutura hídrica, segurança de barragens, entre outros. Produção e disseminação da informação técnica para a gestão. Destaques ANA: Relatório de Conjuntura, Atlas de Abastecimento Urbano, etc. Planejamentos estratégicos, a exemplo do Plano Nacional de Segurança Hídrica, em preparação (MI e ANA).

Problemas de origem das leis das águas Instituições gestoras: => Leis das águas não trataram desta questão (inspiração paulista). ANA e COGERH vieram cobrir esta lacuna.=> Problema ainda grave na maior parte dos estados. Aspectos financeiros para o IWRM: => Demasiada confiança na cobrança pelo uso da água bruta. É preciso cranear outras soluções complementares. Implementação conjunta dos instrumentos de gestão: => Faltou planejamento para a implementação conjunta de comitês de bacia & instrumentos de gestão. Dezenas de comitês estão impossibilitados de cumprir sua missão. O Sistema de Gestão de Recursos Hídricos tem pouca ou nenhuma governabilidade sobre o problema de inundação e cheias, um dos objetivos da Política das águas.

Problemas de origem das leis das águas (2) Modelo de gestão das leis brasileiras, baseado na iniciativa paulista (de inspiração francesa), parece pouco adaptável à Bacia Amazônica ou ao semiárido brasileiro. Ceará encontrou um bom equilíbrio na adaptação do IWRM às regiões semiáridas (centralização & descentralização/participação), Região amazônica deve buscar um modelo adaptado às suas características. A complexidade da gestão de bacias interestaduais, a exemplo do Paraíba do Sul e São Francisco.

Alguns desafios (1): aperfeiçoar a gestão em bacias úmidas Mesmo em bacias úmidas e mais ricas, o ritmo de implementação do IWRM é lento e enfrenta desafios de porte: Cobrança (1): universalizar e aumentar sua significância; ampliar o universo de benefiados. Cobrança (2): mais eficácia na utilização dos recursos da cobrança => delegatária. Delegatária: limbo institucional (nem pública nem privada). Plano de bacia: diagnósticos mais orientados, mais robustez na construção dos cenários e sobretudo na pactuação de ação e investimentos. Sistemas de Informação: pouco desenvolvidos => é preciso utilizar melhor e dar mais transparência aos dados disponíveis. Enquadramento: embrionário, de difícil aplicação.

Alguns desafios (2): alocação de água em todo o Brasil Alocação de água: há necessidade e grandes possibilidade de avanços Outorga: ainda burocrática, e pouco adaptada às regiões com estresse ou escassez hídrica. Macro-alocação de água em bacias críticas ou com estresse hídrico: pactos de água envolvendo Estados e sub-bacias (tipo Marco Regulatório) são absolutamente fundamentais. Papel da ANA. Importância de mecanismos de mitigação de conflitos em momentos de escassez de água, a exemplo da alocação negociada no Estado do Ceará (ou mesma da experiência Águas do Vale, de 2001)

Alguns desafios (3): infraestrutura hídrica No cenário atual de variabilidade e mudanças do clima, com mais incertezas, há uma tendência de aumentar a capacidade de reservação e adução de água. Transposição de água entre bacias Interligação de bacias hidrográficas. Gestão, O&M de infraestruturas complexas Usos múltiplos & Infraestrutura hídrica Reservatórios & custos ambientais e sociais

Alguns desafios (4): abastecimento de metrópoles, transposição & outras questões A Crise SP-RJ em torno da Bacia Paraíba do Sul tem levantado questões muito interessantes para a Federação, em particular: Quais são as autonomias e os limites de cada unidade da Federação na gestão de bacias compartilhadas? Qual é o papel do Sistema de Gestão (ANA, Comitês, CNRH)? Dupla dominialidade é um problema? Qual seria a solução? Como planejar e pactuar o atendimento à demanda de água em Regiões Metropolitanas? Necessidade de regras de convivência em âmbito macro-regional: pacto de gestão, marco regulatório ou similar. Até quando poderemos gerir recursos hídricos nessas áreas sem enfrentar os problemas de saneamento básico? Gestão da demanda? Outros mecanismos de uso racional? Mudanças do clima?

Water reform requires a complex mixture of impatience and patience. Impatience is required to make paradigm shifts, but progress is measured in decades, not years. MAKING REFORM HAPPEN IN WATER POLICY: Reflections from a practitioner* John Briscoe OECD Conference Centre, Paris, 2011

Grata! formiga.uerj@gmail.com