AS PERCPÇÕES DE ALUNOS DE UMA ESCOLA PÚBLICA DE PARNAÍBA SOBRE AS (HOMO)SEXUALIDADES

Documentos relacionados
DIVERSIDADE IDENTIDADE DE GÊNERO E ORIENTAÇÃO SEXUAL

DIVERSIDADE SEXUAL E GÊNERO (DSG) NO MEIO ESCOLAR E ORGANIZACIONAL

DIVERSIDADE SEXUAL NA ESCOLA: HOMOFOBIA, PRÁTICAS DISCRIMINATÓRIAS E AÇÕES EDUCATIVAS

ESPAÇO ESCOLAR E PRECONCEITO HOMOFÓBICO: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

EDUCAÇÃO INFANTIL E A SEXUALIDADE: O OLHAR DO PROFESSOR

LGBT: Público ou Privado. Gênero, Orientação Sexual e Identidade de Gênero

TÍTULO: ENTRE OS LIMITES E AS POSSIBILIDADES DE UMA PERSPECTIVA PEDAGÓGICA COM A CRIANÇA TRANSGÊNERO.

PERFORMANCES HOMOAFETIVAS NA MÚSICA AVESSO, DE JORGE VERCILO

EDUCAÇÃO SEXUAL NAS ESCOLAS: AS POLÍTICAS PÚBLICAS E OS OBSTÁCULOS AO COMBATE DA HOMOFOBIA. Resumo:

5ª Jornada Científica e Tecnológica e 2º Simpósio de Pós-Graduação do IFSULDEMINAS. 06 a 09 de novembro de 2013, Inconfidentes/MG

DIVERSIDADE SEXUAL NA ESCOLA: ESTRATÉGICAS DE ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA CONTRA POPULAÇÃO LGBTT NO IFPE RECIFE E NA REDE ESTADUAL DE PERNAMBUCO

Proposta de redação: Em pauta, a homofobia. A omissão pode ser sinal de violência.

GÊNEROS, SEXUALIDADE E EDUCAÇÃO

Código / Área Temática. Código / Nome do Curso. Etapa de ensino a que se destina. Nível do Curso. Objetivo. Ementa.

ENSINO DE HISTÓRIA E TEMAS TRANSVERSAIS: UMA ABORGAGEM PÓS-ESTRUTUTAL A PARTIR DO EIXO NORTEADOR RELAÇÕES DE GÊNERO.

DIVERSIDADE ÉTNICO RACIAL: PERCEPÇÕES DE PROFESSORES E ALUNOS DO 9º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

REPRESENTAÇÕES DE ALUNOS E PROFESSORES SOBRE DIVERSIDADE SEXUAL

Desenvolvendo o Pensamento Matemático em Diversos Espaços Educativos

sexo, sexualidade, gênero, orientação sexual e corpo

Conceito de Gênero e Sexualidade no ensino de sociologia: Relato de experiência no ambiente escolar

DISCUTINDO O CONCEITO DE GÊNERO: O QUE PENSA O EDUCADOR DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL?

militante LGBT e faz parte do Grupo Universitário de Diversidade Sexual Primavera nos Dentes. Atualmente

EDUCAÇÃO FÍSICA PARA O ENSINO FUNDAMENTAL EM GOIÂNIA: UM OLHAR ANTROPOLÓGICO SOBRE A PEDAGOGIA DO CORPO

GÊNERO E EDUCAÇÃO: A IMPLANTAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

CURSO EFA NS TÉCNICO/A ADMINISTRATIVO/A

OS SENTIDOS DA INTERDISCIPLINARIDADE NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO BÁSICA

CONSTRIBUIÇÕES DO PIBID NA FORMAÇÃO DOCENTE

GÊNERO, DIREITOS HUMANOS E POLÍTICAS PÚBLICAS: BREVES APONTAMENTOS 1

DIVERSIDADE SEXUAL NA ESCOLA: UM PROBLEMA POSTO À MESA* Alexandre Martins Joca 1

HOMOFOBIA NA ESCOLA: QUAL O FIM DESSA HISTÓRIA?

Silvani dos Santos Valentim 1 Luna Oliveira 2

Tema: Preconceito na sociedade contemporânea. Temas de redação / Atualidades Prof. Rodolfo Gracioli

INCLUSÃO: UMA PRÁTICA POSSÍVEL NA ESCOLA JOÃO BATISTA LIPPO NETO NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DA CIDADE DO RECIFE.

DISCUTINDO SEXUALIDADE COM ESTUDANTES DO 7º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL. PALAVRAS-CHAVE Sexualidade. Preconceito. Orientação Sexual.

AS IMPLICAÇÕES SOBRE A CONDIÇÃO DE SER DO GÊNERO MASCULINO NO CURSO DE PEDAGOGIA

HOMOFOBIA E SEXISMO NO SISTEMA PRISIONAL E NO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO TOCANTINENSE: UMA ANÁLISE DO PERFIL CURSISTAS DE UM PROJETO DE EXTENSÃO

IDENTIDADES DE GÊNERO, RAÇA E SEXUALIDADE E O ENSINO- APRENDIZADO DE LÍNGUA INGLESA: REFLEXÕES TEÓRICAS

Ei, você trabalhadora e trabalhador do SUAS!

ITINERÁRIOS DE PESQUISA: POLÍTICAS PÚBLICAS, GESTÃO E PRÁXIS EDUCACIONAIS

O debate sobre a diversidade sexual na escola: Reflexões acerca do combate à homofobia no contexto escolar 1

INFORMATIVO PARA A REDE SUAS: Garantia da utilização do Nome Social para as pessoas Travestis e Transexuais.

DIREITOS HUMANOS, GÊNERO E MOVIMENTOS SOCIAIS

VALORES DO PONTO DE VISTA DE PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO

PALAVRAS-CHAVE: Família. Homossexualidade. Direito a saúde.

DIDÁTICA MULTICULTURAL SABERES CONSTRUÍDOS NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM RESUMO

O PAPEL DAS INTERAÇÕES PROFESSOR-ALUNO NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA

CORPO, GÊNERO E SEXUALIDADE NA EXPERIÊNCIA NA ESCOLA CAMPO DO PIBID DE EDUCAÇÃO FÍSICA EM CATALÃO/GO.

Homofobia: preconceito, violência e crimes de ódio

CORPO, GÊNERO E SEXUALIDADE:PARA ALÉM DE EDUCAR MENINAS E MENINOS.

SEMANA 2 A NOÇAO MODERNA DA SEXUALIDADE. Autora: Cristiane Gonçalves da Silva

MOVIMENTOS SOCIAIS. Prof. Robson Vieira da Silva Sociologia 1º ano - UP

GÊNERO E RENDIMENTO ESCOLAR: UM ESTUDO DE CASO DA UNIDADE MUNICIPAL DE ENSINO THEREZINHA DE JESUS SIQUEIRA PIMENTEL, SANTOS (SP)

FORMAÇÃO CONTINUADA COM EDUCADORES: (DES)NATURALIZANDO CORPO, GÊNERO E SEXUALIDADE NA ESCOLA.

AMBIENTE ESCOLAR, ORIENTAÇÕES SEXUAIS E AS NOVAS IDENTIDADES DE GÊNERO

CONCEITOS RELACIONADOS À SEXUALIDADE E GÊNERO DE LICENCIANDOS EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS: ALGUMAS REFLEXÕES.

FRIDAS: UMA PROPOSTA DE GRUPO DE ESTUDOS SOBRE GÊNERO E DIVERSIDADE NO AMBIENTE ESCOLAR.

MATEMÁTICA, QUEM GOSTA? A VISÃO ACERCA DESTA MATÉRIA PELOS EDUCANDOS DO 6º E 9º ANO

SER MULHER NA POLÍCIA CIVIL: DESIGUALDADES DE GÊNERO NO CURSO DE FORMAÇÃO POLICIAL DA ACADEPOL/SC

REGULAMENTO INTERNO DO NÚCLEO DE RELAÇÕES ÉTNICO- RACIAIS E DE GÊNERO- NUREG

A IMPORTÂNCIA DA ESCOLA NO COMBATE AO PRECONCEITO

A EXPERIÊNCIA DE DOIS PIBIDIANOS NO TRABALHO SOBRE GÊNERO E SEXUALIDADE DENTRO DA ESCOLA

SEXUALIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL: CONCEPÇÕES DE PROFESSORAS NO MUNICÍPIO DE CAMPINA GRANDE-PB

A ESCOLA, OS JOVENS E O CONFRONTO ENTRE A HETERONORMATIVIDADE X IDENTIDADE SEXUAL

Cartilha de Prevenção às Violências Sexistas, Homofóbicas e Racistas nos Trotes Universitários

CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

7. Referências bibliográficas

UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA CENTRO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA CEAD PLANO DE ENSINO

FORMAÇÃO DE PROFESSORES: A ATUAÇÃO DO PROFESSOR DE GEOGRAFIA COMO REFLEXO DE SUA FORMAÇÃO

HOMOFOBIA E ESCOLA: UM RELATO DA VIOLÊNCIA NO AMBIENTE ESCOLAR

Autor (1); Tiago Teixeira de Souza Orientador (3); Maria do Socorro de Castro Hage. Universidade do Estado do Pará- UEPA

ENSINO E APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA): PROPOSTA INTERDISCIPLINAR A PARTIR DA PEDAGOGIA DO MOVIMENTO RESUMO

Legislação Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) - 1/5

PERSPECTIVAS DO PLANEJAMENTO NO ENSINO FUNDAMENTAL PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES

O JOGO COMO RECURSO METODOLÓGICO PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA GERAL

A EDUCOMUNICAÇÃO NOS DEBATES SOBRE GÊNERO E SEXUALIDADE

ENSINO MÉDIO: INOVAÇÃO E MATERIALIDADE PEDAGÓGICA EM SALA DE AULA 1. Palavras-Chave: Ensino Médio. Inovação Pedagógica. Pensamento docente.

A SEXUALIDADE NO ÂMBITO EDUCACIONAL: UM DILEMA

A Educação para a paz na formação de professores

HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA NO CURSO DE PEDAGOGIA: FORMAÇÃO INICIAL E INTERVENÇÃO NA ESCOLA BÁSICA

Apêndice I 23 ações programáticas relativas à população LGBT, previstas no Programa Nacional de Direitos Humanos 3 (PNDH 3)

SE EU NÃO SOU INSTRUÍDA PARA FALAR SOBRE ISSO, PORQUE EU VOU FALAR? : GÊNERO E DIVERSIDADE SEXUAL

FORMAÇÃO DE PROFESSORES: IDENTIDADE E SABERES DOCENTE

Tabela 1. Gestoras entrevistadas, por identidade de gênero e tipo de órgão governamental. Órgãos específicos LGBT

A IMPORTÂNCIA DO ESTÁGIO CURRICULAR NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES: VIVÊNCIAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

EXPERIMENTANDO A PRÁTICA E A APLICAÇÃO DE JOGOS NO UNIVERSO INFANTIL NO MÊS DA CRIANÇA: RELATO DE EXPERIÊNCIA

ELAS NAS EXATAS Desigualdades de gênero na educação: o que estamos falando?

Apêndice J - Quadro comparativo do PNDH 2 e do PNDH 3, por ações programáticas voltadas à população LGBT, por área temática.

O COORDENADOR PEDAGÓGICO E A INCLUSÃO DO ALUNO SURDO: conhecendo a realidade da cidade Branquinha/AL

Programa Analítico de Disciplina CIS233 Antropologia da Saúde

PLANO DE APRENDIZAGEM

Políticas Públicas para LGBTs no Centro-Oeste do Brasil

Eixo Temático 3-Currículo, Ensino, Aprendizagem e Avaliação

A 8ª PARADA DO ORGULHO GLBT DE BELO HORIZONTE

PALAVRAS-CHAVE:Comunidades Quilombolas. Práticas Pedagógicas. Diretrizes Curriculares.

COMUNIDADES QUILOMBOLAS: DA ATUAÇÃO DOS PROFESSORES ÀS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA EDUCAÇÃO ESCOLAR QUILOMBOLA

NOME SOCIAL NO SISTEMA DE ATENDIMENTO

FORMAÇÃO INICIAL NOS CURSOS DE LICENCIATURA E PEDAGOGIA: QUAL O SEU IMPACTO NA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DE UM BOM PROFESSOR?

Educação sexual: problematizando sobre a diversidade.

A DISCIPLINA DE DIDÁTICA NO CURSO DE PEDAGOGIA: SEU PAPEL NA FORMAÇÃO DOCENTE INICIAL

Transcrição:

AS PERCPÇÕES DE ALUNOS DE UMA ESCOLA PÚBLICA DE PARNAÍBA SOBRE AS (HOMO)SEXUALIDADES Gislaynne Carla Santos Almeida (Graduanda em Pedagogia-UFPI/Parnaíba) Romário Ráwlyson Nascimento (Mestrando em Educação-UFPI/NEPEGECI) RESUMO O presente trabalho surge de uma observação social a cerca das mudanças nos arranjos familiares que são por sua vez materializações das mudanças das formas de viver e sentir a sexualidade. Desta forma, intencionamos nesta pesquisa discutir a partir das falas de dois alunos de uma Escola Pública de Parnaíba-PI as questões a cerca das (homo)sexualidades no cotidiano escolar. Metodologicamente, optamos por realizar um estudo qualitativo com o uso de técnicas como o levantamento bibliográfico, observações participante e entrevista aberta. A partir da discussão dos dados podemos identificar que embora a escola se constitua num espaço onde os alunos sentem liberdade para expressar suas identidades sexuais ainda existem lacunas principalmente a cerca da formação docente para um tratamento mais qualificado das questões ligadas as (homo)sexualidades. Palavras-chave: (homo)sexualidade; escola; homofobia INTRODUÇÃO 1

As famílias do século XXI não estão com a mesma organização como nos séculos passados: pai, mãe e filhos, ou seja, uma organização heteropatriarcal 1. Hoje, existem na sociedade diferentes constituições familiares. Entretanto, nem todos estão preparados para respeita-las. Nesse contexto de rupturas, acreditamos que a escola como espaço de construção dos sujeitos e de suas subjetividades desempenha um papel central na produção de saberes e fazeres que rompam com o constante preconceito contra essas variadas formas de organizações familiares. A família heteropatriarcal encontra-se em fragmentação. Desde meados do século XX estão sendo constituídas novas formas de ser família que são materializações de outras formas de viver e sentir a sexualidade, que fogem a norma heterosexista: homem X mulher, além de estarem também situados no contexto da emancipação feminina. Mesmo com a fuga a norma, a homoafetividade 2 está presente nos contextos escolares a partir de seus sujeitos, constantemente associados a rótulos, no caso de meninos com trejeitos afeminados, chamados de bichas e das meninas com trejeitos masculinos, chamadas de maria-sapatão. Estes termos pejorativos são parte da excessiva carga de preconceito e discriminação vivenciada dentro e fora dos muros da escola. O preconceito, discriminação e violência surgem quando a orientação sexual, as identidades ou expressões de gênero se opõem as normas estabelecidas pela sociedade heteronormativa 3, família e pela religião, tais práticas sexuais divergentes são vistas como crime, aberração, desvio, doença, perversão, imoralidade ou pecado. Desta 1 O termo hetero se refere a organização familiar que se baseia na relação afetivo-sexual entre os sexos opostos (homem e mulher). O termo patriarcal refere-se a autoridades que podem ser exercida pelo homem. 2 Refere-se a relações entre pessoas do mesmo sexo que criam laços afetivos e constituem formas de relações sociais e amorosas, podendo implicar ou não em vivência sexual (PRADO; MACHADO, 2008). 3 Conjunto de práticas e valores que estabelecem como norma a ser seguida a relação heterossexual, ou seja, a relação entre pessoas de sexos biológicos e gêneros diferentes, homem (masculino) e mulher (feminino). Desta maneira as outras formas de vivência da sexualidade como a homossexualidade e a bissexualidade são marginalizadas/inferiorizadas. 2

feita, ao tempo que apresentamos nossas considerações iniciais apontamos também as intenções de pesquisa deste trabalho, que busca evidenciar as percepções associadas à homofobia 4 na escola, e maneira pela qual os alunos de uma Escola Pública de Parnaíba-PI constroem suas identidades sexuais. HOMOFOBIA NA ESCOLA: ALGUMAS QUESTÕES Embora a Constituição Estadual proíba expressamente a discriminação em razão da orientação/identidade sexual, a Fundação Perseu Abramo através da pesquisa Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil: intolerância e respeito às diferenças sexuais, realizada em 2009, aponta que 92% da população reconheceram que existe preconceito contra LGBT 5 e que 28% reconheceram e declarou o próprio preconceito contra pessoas LGBT, este percentual é cinco vezes maior que o preconceito contra negros e idosos, também identificado pela Fundação. O estudo "Revelando Tramas, Descobrindo Segredos: Violência e Convivência nas Escolas", publicado em 2009 pela Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana, baseada em uma amostra de 10 mil estudantes e 1.500 professores(as) do Distrito Federal, e apontou que 63,1% dos entrevistados alegaram já ter visto pessoas que são (ou são tidas como) homossexuais sofrerem preconceito; mais da metade dos/das professores(as) afirmam já ter presenciado cenas discriminatórias contra homossexuais nas escolas; e 44,4% dos meninos e 15% das meninas afirmaram que não gostariam de ter colega homossexual na sala de aula. Os dados estatísticos apresentados demostram com nitidez o cenário discriminatório vivenciado pelas pessoas homoafetivas dentro e fora da ambiência escolar. Isto por que a parte das análises de Foucault (1993), Loiola (2009) Nunes e 4 Ódio, medo, aversão a pessoas homossexuais/homoafetivas. 5 Significa: lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros. Esta terminologia foi aprovada no Brasil durante a I Conferência Nacional de Políticas Públicas LGBTT em 2008. Este termo será utilizando, pois congrega genericamente variadas identidades sexuais. 3

Silva (2006) e Louro (2001; 2004) compreendemos que instituições sociais como o Estado, a família, a Igreja e a escola estabelecem através de técnicas e estratégias, eminentemente pedagógicas, a heterossexualidade com norma a ser seguida, fazendo desta o único caminho possível para a sexualidade. Assim, Um trabalho pedagógico contínuo, repetitivo e interminável é posto em ação para inscrever nos corpos o gênero e a sexualidade legítimo. Isso é próprio da viagem na direção planejada. (LOURO, 2004, p. 16). Outras possibilidades de vivenciar a sexualidade sempre estiveram presente na história da sexualidade ocidental, contudo dada à intensa opressão/controle exercida sobre a sexualidade, elas foram ocultadas, haja vista a garantia de uma heteronormatividade. Somente a partir de meados do século XX, estas outras possibilidades aos poucos puderam se afirmar. Este movimento de emancipação sexual foi impulsionado por três fatores que se correlacionam: a) um intenso processo democratização ocorrido em diversos países; b) o desenrolar do processo de globalização que possibilitou uma maior interação entre culturas; c) a organização politizada de segmentos historicamente marginalizados, como mulheres os segmentos LGBTT. Neste novo cenário torna-se evidente a existência de variadas identidades. Somos sujeitos de muitas identidades. Essas múltiplas identidades sociais podem ser, também, provisoriamente atraentes e, depois, nos parecerem descartáveis; elas podem ser, então, rejeitadas e abandonadas. Somos sujeitos de identidades transitórias e contingentes. Portanto, as identidades sexuais e de gênero (como todas as identidades sociais) têm caráter fragmentado, instável, histórico e plural, [...]. (LOURO, 2001, p. 12). Atualmente a sexualidade apresenta-se permeada por limites, possibilidades e desafios, inerentes ao um contexto multicultural. Neste cenário de múltiplas identidades sexuais esperamos que a escola no cumprimento de suas atividades educativas crie tempos e espaços nos quais as questões acerca da sexualidade sejam discutidas. Assim, acreditamos que a escola pode e deve contribuir para a redução dos índices de violência e discriminação que afetam as pessoas homoafetivas. 4

PERCURSO METODOLÓGICO No tangente a abordagem metodológica, optamos por realizar uma pesquisa qualitativa, posto que este possibilita uma maior interação entre pesquisador e os sujeitos da pesquisa, assim como o contexto social na qual estes se inserem. Qualitativa porque se contrapõe ao esquema quantitativista de pesquisa (que divide a realidade em unidades passíveis de mensuração, estudando-as isoladamente), defendendo uma visão holística dos fenômenos, isto é, que leve em conta todos os Para este trabalho traremos componentes de uma situação em suas interações e influências recíprocas. (ANDRÉ, 1995, p. 17) Na abordagem qualitativa é a análise subjetiva da situação pesquisada e dos sujeitos nela envolvidos que deve prevalecer, posto que a realidade social é mais rica que qualquer teoria, qualquer pensamento e qualquer discurso que possamos elaborar sobre ela (MINAYO, 1994 p. 15). Para a concretização da pesquisa foram utilizas duas técnicas coleta de dados, o levantamento bibliográfico, observações-participante e entrevistas abertas. Como lócus de investigação delimitamos uma Escola Pública Estadual de Fundamental Maior. O recorte deste trabalho trará as falas de dois alunos, Aquiles (15 anos) e Heitor (14 anos), tais nomes são fictícios para a preservação das identidades dos discentes. Os dois alunos foram escolhidos após observações e conversas nas quais ficou evidenciado alguns aspectos como gestos, verbalizações e outras características sociais associados a identidades homoafetivas. No quadro abaixo estão relacionadas algumas características sociais dos referidos alunos, coletadas a partir das entrevistas e das observações participante: Nome Aquiles Características Sociais Este aluno vestia o uniforme da escola igual a todos os 5

Heitor outros meninos. Um de seus gestos que nos chamou atenção era a maneira como ele mexia o cabelo, sempre tentando enrolar uma mexa coloca-la atrás da orelha, era curioso esse trejeito feminino, pois ele tinha o cabelo curto. Suas mãos eram bem femininas, com unhas grandes e limpas, mas não estavam pintadas. Ao falar usava as mãos para se expressar. No começo da entrevista o aluno aparentou-se calmo e objetivo com as respostas, no entanto ao longo da mesma, percebemos que ele ficou um pouco tenso devido à dificuldade de encontrar as palavras certas. O aluno entrevistado era muito tímido, porém não se recusou a responder as perguntas solicitadas, desde o início exprimiu apreensão, através das mãos e dos dedos que ele apertava uns contra os outros. Tinha unhas bem feitas e grandes; usava brinco, cabelo curto e um corte moderno. Seu uniforme era semelhante ao dos outros garotos, calça jeans e tênis masculino e blusa da escola. Seu material escolar era feminino. AS (HOMO)SEXUALIDADES NAS FALAS DOS ALUNOS Uma das reflexões importantes foi apontada pelos alunos, que discordam em certo ponto com nossas análises bibliográficas, nas quais ficou evidenciado a partir de Louro (2001) que a escola é um difícil espaço para se assumir as identidades sexuais. Ao afirmamos isso, não queremos assinalar que a escola é livre de sanções sociais, mas esta quando comparada com a família, acaba por se tornar um local em que distante dos olhares maternos/paternos o aluno pode expressar sua (homo)sexualidade de maneira mais livre. Como segue o relato: 6

E aqui na escola, como é? Ah! Aqui eu sou doido, eu intimo com a professora, com o diretor, com a diretora, com todo mundo. Você se sente a vontade aqui na escola? Me sinto. Entre a sua escola e sua casa, onde você acha melhor? A escola!. Tem certeza? Ãhan! Qual a diferença entre a sua escola e sua casa? Aqui na escola eles me aceitam, eles deixam brincar, eu brinco na sala de aula. Mas eu tenho medo de fazer lá em casa. Como você age em casa? Como homem, em casa eu reencarno. Você se sente obrigado a ser homem? É. Então, quando você chega em casa que você precisa mudar? É...fico calmo.. O único lugar onde você fica a vontade é aqui na escola? Não, e lá na sede da quadrilha onde eu danço. (Entrevista realizada em novembro de 2010). Assim como a escola, Heitor também aponta outro espaço distante da família, a sede da quadrilha. Esse receio com a família também pode ser observado nas falas de Aquiles. Perguntamos: Qual o lugar que você se sente a vontade? Ele nos respondeu: Na sede da quadrilha e a casa da minha tia. Continuamos a indagar: Como é na casa da sua tia? Ele então nos respondeu: Lá eu sou livre, sou do jeito que sou. Ela me apoia. Tanto para Heitor como para Aquiles há uma maior liberdade de assumir-se fora do espaço familiar paterno/materno. Na cidade de Parnaíba a Cultura Popular Junina é bastante forte, alguns bairros constituem quadrilhas para se apresentar no Festival de São João da Parnaíba que tradicionalmente ocorre em junho. As quadrilhas passam meses ensaiando, nesses espaços de sociabilidades juvenis, acreditamos que dado o clima festivo, descontraído os alunos investigados, sentiam-se a vontade comportar-se como gostam. Como já apontamos anteriormente embora à escola, na opinião dos alunos, se constitua num espaço possível de para a afirmação de suas identidades sexuais, também foi registrado a partir das falas dos mesmos, cenas de discriminação. Como observamos no seguinte relato de Aquiles: Perguntamos: A sua relação com os professores, você acha que eles te dão atenção? Quando você precisa, assim quando está com dificuldade em alguma coisa? E já sofreu alguma discriminação por algum (a) professor (a) pelo fato de ser gay? E ele respondeu: Sim, me dão atenção. Eu já sofri com a professora de história. E foi ano passado, 7

toda vez que eu chegava perto dela, ela me mandava sair e dizia assim: ai, você fede, você é veado e fede. E que se ela tivesse um filho veado ou sapatão, ela matava. E eu disse que quando ela tivesse um neto, ele será veado ou sapatão porque a língua paga. (Entrevista realizada em novembro de 2010). Neste exemplo encontramos um aspecto comum aos estudos bibliográficos realizados, como em Louro (2001), Joca (2009) e Nunes e Silva (2006) que é a falta de preparo docente para lidar didaticamente com as questões da (homo)sexualidade. Estes discursos revelam, de fato, a existência de problemas no encontro da sexualidade com as práticas educativas escolares. Problema que consiste em o educador não saber o que fazer. Problema que, no contexto escolar, da prática pedagógica, deve voltar-se não às atitudes dos jovens, mas às posturas e abordagens do educador frente às manifestações da sexualidade. (JOCA, 2009, p. 154). Assim um dos importantes pontos a serem trabalhados é a formação docente, inicial e continuada. No âmbito da legislação houve um avanço com o lançamento e divulgação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN, 1997), que abordam a sexualidade como Tema Transversal intitulado Orientação Sexual. Registramos o avanço no que tange a autorização governamental para o trabalho dentro da escola com as questões da sexualidade. Contudo, em nossas análises dos PCNs consideramos essa política educacional superficial no que tange a homossexualidade, além de não ter comtemplado atividades essenciais para a implementação de suas propostas, como a formação docente. Além desse episódio homofóbico entre Aquiles e uma de suas professoras, Heitor relatou também casos de bullyng 6. Quando questionamos se ele se sentia discriminado na escola Heitor afirmou que não, mas ponderou que em alguns momentos é chamado de veado fresco. Assim, os relatos nos demostram que embora os alunos 6 Palavra de origem inglesa e sem tradução ainda no Brasil que é utilizada para qualificar comportamentos violentos no âmbito escolar, tanto de meninos quanto de meninas. Dentre esses comportamentos podemos destacar as agressões, os assédios e as ações desrespeitosas, todos realizados de maneira recorrente e intencional por parte dos agressores. (SILVA, 2010) 8

considerem a escola um local acolhedor, esta ainda precisa sofrer mudanças para propor discussões a cerca das diferenças, para que estas longe e hierarquizar negativamente os sujeitos possam apenas ser expressões de nossas singularidades. CONSIDERAÇÕES FINAIS A escola inserida no contexto social amplo não se coloca a parte das transformações familiares e das identidades sexuais. Essas questões atravessam o cotidiano escolar através das sociabilidades discentes, e a escola sempre se envolve nessas questões seja punindo, refletindo, ou se omitindo dentre outras atitudes. Acreditamos que a escola deve voltar-se para estas demandas acerca das (homo)sexualidades pois, estas se constituem em preocupações centrais nas vivências dos alunos. Assim embora a escola se constitua num espaço onde os alunos sentem liberdade para expressar suas identidades sexuais ainda existem lacunas principalmente a cerca da formação docente para um tratamento mais qualificado das questões ligadas as (homo)sexualidades, contribuindo desta feita para a construção de uma sociedade livre de preconceitos e intolerâncias. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRÉ, Marly E. D. A. de. Etnografia da prática escolar. Campinas: Papirus, 1995. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: pluralidade cultural, orientação sexual. v. 10. Brasília: MEC/SEF, 1997. 9

FOUCALT, M. A história da sexualidade. v. 1: A vontade de saber. 11ª Ed. Rio de Janeiro: Graal, 1993. JOCA, Alexandre Martins. Formação continuada para educadores/as sobre gênero e diversidade sexual: a experiência do Grupo de Resistência Asa Branca. IN: COSTA, Adriano H. C.; JOCA, Alexandre M.; LOIOLA, Luís P. (Org.). Desatando nós: fundamentos para uma práxis educativa sobre gênero e diversidade sexual. Fortaleza: Edições UFC, 2009. LOIOLA, Luís Palhano. Sexualidade, gênero e diversidade sexual. IN: COSTA, Adriano H. C.; JOCA, Alexandre M.; LOIOLA, Luís P. (Org.). Desatando nós: fundamentos para uma práxis educativa sobre gênero e diversidade sexual. Fortaleza: Edições UFC, 2009. LOURO, Guacira Lopes. Pedagogias da Sexualidade. IN: (Org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Trad. Tomaz T. da Silva. 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.. Um corpo estranho: ensaios sobre a sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. MINAYO, Maria C. de S. Ciência, técnica e arte: o desfio da pesquisa social. IN:. (Org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 19ª edição. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. NUNES, César; Silva, Edna. A educação sexual da criança: subsídios teóricos e proposta práticas para uma abordagem da sexualidade para além da transversalidade. 2ª ed. Campinas-SP: Autores Associados, 2006. 10

PRADO, Marco A. M.; MACHADO, Frederico V. Preconceito contra homossexualidades: a hierarquia da invisibilidade. São Paulo: Cortez, 2008. SILVA, Ana B. B. Bullying: mentes perigosas nas escolas. Rio de Janeira: Objetiva, 2010. 11