Célula Unitária e 14 Retículos de Bravais

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Transcrição:

Universidade de São Paulo Instituto de Química de São Carlos Departamento de Química e Física Molecular Célula Unitária e 14 Retículos de Bravais SQM 409 - Cristalografia Prof. Dr. Maria Teresa do Prado Gambardella

1. Cristais e Célula Unitária A principal característica de um cristal é a repetição periódica de íons, átomos ou moléculas no espaço, ou seja, em três dimensões. Robert Hooke foi o primeiro a sugerir que a regularidade da aparência externa de um cristal era a um reflexo de um alto grau de regularidade interna, em 1664. Nicolaus Steno em 1671 observou que a variação na forma de cristais de uma mesma substância não está relacionada com a variação de estrutura interna, mas sim com o fato de algumas direções de crescimento se desenvolvem mais que as outras. A Lei de Steno diz que apesar das formas geométricas das faces do cristal serem alteradas pelo crescimento irregular, os ângulos entre as faces de determinada forma tendem a permanecer iguais. A constância dos ângulos interfaciais reflete a ordem interna. A célula unitária é a menor unidade que permite descrever a estrutura completa pela sua repetição no espaço. De acordo com a disposição espacial dos pontos reticulares as células unitárias podem ser: P célula unitária primitiva, ou simples: todos os pontos reticulares estão localizados nos vértices do paralelepípedo que constitui a célula; F célula unitária centrada nas faces, apresenta pontos reticulares no centro das faces além dos localizados nos vértices; A, B ou C célula unitária centrada em uma das faces: apresentam pontos reticulares nos vértices e no centro em uma das faces. São designadas pelas letras A, B ou C, conforme as faces que contêm os pontos reticulares; I célula unitária centrada no corpo: apresenta além dos pontos que determinam os vértices, um ponto reticular no centro da célula. Para pode entender os retículos cristalinos analisaremos como se formam a partir de translações em uma, duas e três dimensões.

2. Retículo Linear No retículo linear os pontos estão arranjados de modo periódico, linear e equi-espaçados (Figura 1) Figura 1. Reticulo linear. O retículo linear possui apenas uma variável que é a translação t 1. 3. Retículo Plano ou Rede No retículo plano ou rede bidimensional os pontos também estão arranjados de modo periódico propagando-se em duas direções (Figura 2). Figura 2. Retículo plano. Neste caso temos três variáveis: as translações, t 1 e t 2, e o ângulo entre elas, γ. Imaginemos que uma translação t 1 cria uma rede linear e esta através de uma translação t 2 dará origem à rede plana. Existem cinco tipos de rede plana possíveis:

São elas: Rede Oblíqua: t 1 t 2 e γ 90 o Rede Retangular: t 1 t 2 e γ = 90 o

Rede Retangular Centrada: t 1 t 2 e γ = 90 o ; cos γ = t 1 /2t 2 Rede Quadrada: t 1 = t 2 e γ = 90 o Rede Hexagonal: t 1 = t 2 e γ = 60 o

4. Retículo Espacial No retículo espacial os pontos também estão arranjados de modo periódico propagando-se em três direções (Figura 3). Figura 3. Retículo espacial. A rede espacial pode ser vista como o empilhamento de redes planas através uma translação t 3 criando como unidade repetitiva o retículo espacial ou célula unitária. Temos então seis variáveis t 1, t 2, t 3, α, β e γ. Há apenas catorze formas de célula unitária que podem ser empilhadas para formar os sistemas cristalinos no espaço tridimensional. Elas são conhecidas como 14 Retículos de Bravais, por terem sido demonstradas em 1848 por Auguste Bravais. Sistema Cúbico O empilhamento de redes quadradas (t 1 = t 2 e γ = 90 o ) com t 3 = t 1 = t 2 e α = β = 90 o, gera células unitárias compatíveis com o sistema cúbico (a=b = c e α = β = γ = 90 o ). As Figuras 4, 5 e 6 mostram as células P, I e F respectivamente.

Figura 4. Retículo primitivo (P). Figura 5. Retículo centrado no corpo (I). Figura 6. Retículo centrado nas faces (F).

Celas do tipo A, B ou C (centradas em uma só face) são proibidas no sistema cúbico pela presença do eixo de ordem 3 na diagonal de corpo, que relaciona as faces A, B e C (Figura 7). Figura 7. Eixo de ordem 3. Sistema Tetragonal O empilhamento de redes quadradas (t 1 = t 2 e γ = 90 o ) com t 3 diferente de t 1 e t 2 e α = β = 90 o, gera células unitárias compatíveis com o sistema tetragonal (a=b c e α = β = γ = 90 o ). A Figura 8 mostra as células P e I para o sistema tetragonal. As células do tipo C e F não existem porque podemos obter células P e I (menores e do mesmo sistema), como pode ser visto na Figura 9 e 10. Figura 8. Células P e I do sistema tetragonal.

Figura 9. Transformação de uma célula C em P. Figura 10. Transformação de uma célula F em I. Uma das faces foi pintada de cinza para facilitar a visualização. Sistema Monoclínico O empilhamento de redes retangulares (t 1 t 2 e γ = 90 o ) com t 3 diferente de t 1 e t 2 e α = 90 o e β 90 o, gera células unitárias P com o sistema monoclínico (a b c e α = γ = 90 o β 90 o ) e o empilhamento de redes retangulares centradas gera células unitárias do tipo C (Figura 11).

Figura 11. Células P e C do sistema monoclínico. As células unitárias do tipo A, B, I e F não são possíveis no sistema monoclínico com β 90 o. Sistema Ortorrômbico O empilhamento de redes retangulares (t 1 t 2 e γ = 90 o ) com t 3 diferente de t 1 e t 2 e α = β = 90 o, gera células unitárias P e I compatíveis o sistema ortorrômbico (a b c e α = β = γ = 90 o ) como mostra a Figura 12. O empilhamento de redes retangulares centradas gera células unitárias do tipo C e F (Figura 13). Figura 12. Células P e I do sistema ortorrômbico.

Figura 13. Células C e F do sistema ortorrômbico. Sistema Triclínico O empilhamento de redes oblíquas (t 1 t 2 e γ 90 o ) com t 3 diferente de t 1 e t 2 e α β 90 o, gera célula unitária P compatível o sistema triclínico (a b c e α β γ 90 o ) como mostra a Figura 14. Figura 14. Célula P do sistema triclínico. Qualquer tentativa de centragem de células unitárias do sistema triclínico gera sempre células P menores, portanto o sistema triclínico admite apenas células unitárias primitivas.

Sistema Hexagonal e Trigonal O empilhamento de redes hexagonais (t 1 = t 2 e γ = 60 o ) com t 3 diferente de t 1 e t 2 e α = β = 90 o, gera célula unitária P compatível o sistema hexagonal e trigonal (a = b c e α = β = 90 o γ = 120 o ) como mostra a Figura 15. Figura 13. Célula P do sistema hexagonal e trigonal. A centragem do retículo hexagonal gera células unitárias romboédricas como está mostrado na Figura 14. Figura 14. Célula unitária R (romboédrica). Os 14 Retículos de Bravais estão mostrados juntos na Figura 15.

Figura 15. Os 14 Retículos de Bravais.