SETEMBRO 2006 É Setembro, a cidade de Goiás, no coração do Brasil, arde com o sol. A deseducação da população e a falta de ecovivência aumentam o calor com a fumaça das queimadas nos morros que circundam a cidade em estilo colonial. Juntamente com o calor do clima, há o fervor das campanhas políticas. Somente neste período podemos ter uma visão mais certa de como o desemprego é grande. Centenas de pessoas trabalhando nos empregos temporários de entregadores de panfletos e balançadores de bandeiras de candidatos. Findada as eleições estas pessoas voltarão à rotina de abandono. No Espaço Cultural Vila Esperança, trabalhamos neste mês com estes dois aspectos. Conversamos sobre as campanhas políticas, discutimos a respeito das propostas dos candidatos, assistimos os debates. O Governo Mirim fez suas comparações e tiraram lições importantes do que não se deve seguir, como por exemplo, a questão dos assistencialismos. São tantas as medidas paliativas, como bolsa família, bolsa escola... que recebeu o nome de bolsa esmola, já que essas medidas amenizam por um curto tempo os problemas de algumas famílias carentes, porém não os resolvem, as pessoas continuam desempregadas e dependendo de uma pequena quantia por mês, dada pelo Estado. Já dizia um velho ditado, Não basta dar o peixe, deve-se ensinar a pescar e eu complemento: Não basta dar o peixe, deve-se ensinar a pescar, criando as condições para que se tenham vara, isca e anzol. Voltando a falar do calor, sabe o que tivemos? Piscinada! O Regimar montou a piscina e durante duas semanas as turmas da Escola Pluricultural Odé Kayodê se alternaram nos banhos. As crianças se divertiram muito, se refrescaram, brincaram na água, e depois fizeram piquenique no campinho. Tudo muito divertido, comunitário pois cada criança trouxe um pouquinho de lanche de casa e juntando tudo, virou muito. Todos comeram o que todos trouxeram. Na Vila Esperança as culturas brasileiras estão sempre presentes. Porém, no mês de Agosto e Setembro as pesquisas, estudos e vivências se intensificam na cultura cabocla, caipira, fundida dos elementos indígenas, africanos e europeus. Vivemos concretamente muito do que existe no Brasil, de mitos brasileiros (como Sacy, Uiara e Curupira) a musicas e literatura (Cordel, cantigas de roda e quadrinhas populares). Pra quem não conhece, Sacy é um Ser de uma perna só, negro, de capuz vermelho e que gosta de movimento, por isso aparece nos redemoinhos tirando tudo do lugar e fazendo travessuras. O Sacy conglomera em si características indígenas, africanas e européias e por isso foi o escolhido para ser o 1
representante das culturas brasileiras na semana de 18 a 23 de Setembro em que foi realizada a SACYZADA Semana de estudos e vivências das culturas brasileiras. Antes de falar da Sacyzada, gostaria de contar da segunda, 4 de Setembro. Neste dia vieram vinte crianças no período da tarde para a Brinquedoteca. As crianças ficaram maravilhadas com tantos brinquedos. Uma inclusive falou que só tem um brinquedo em casa e que nunca tinha visto tantos. A tarde foi muito bonita, de reencontro com a infância que a pobreza e o abandono tentam roubar. Voltemos à Sacyzada. Os causos e histórias da Yara, mãe das águas; do Romãozinho, primo goiano do Sacy; e as cantigas de roda e versinhos da cultura goiana se intensificaram na vivência diária das crianças na medida em que a Sacyzada foi se aproximando. Chegou segunda, 18 de setembro. O primeiro evento da semana é o Bingo do Sacy, cuja prenda foi uma Bicicleta Montain Bike doada pela Ariana que é irmã da educadora Adriana. O Circo estava todo enfeitado com laçarotes vermelhos e pegadas do Sacy. O ganhador foi um rapaz que passava na porta da Vila no momento do bingo e que resolveu comprar uma cartela depois que o Máximo, nosso amigo vindo da Itália, lhe ofereceu o bingo vestido de vendedor do circo. Na terça-feira, 19, tivemos o Porancê Poranga, tarde de vivência das culturas indígenas. Uma tarde de festa, danças e cantos da tradição Tupi-Guarani e de diversas etnias. Em roda, com seus Maracás, bastões e taquaras, Curumins e Cunhatãs realizaram um verdadeira roda cultural. Após os cantos, toques e danças, tivemos o Mito Tupi da origem do Sacy, contado pelos quatro Ñanderu (terra, fogo, água e ar) representados por Shirlei, Haroldo, Adriana e Renata. Em seguida as crianças se dirigiram para as diversas vivências: modelagem em barro com Simone e Haroldo; taquaras femininas com Regina e Gustávio; colares com Shirlei e Liandra; tecelagem com Lucia e Adriana, pintura em capangas com Renata e Máximo. O lanche da tarde? Nem te conto... Mandioca com milho. Uma delícia!!! Na quarta-feira, 20, além da vivência da Dançaterapia que sempre acontece, tivemos à noite, no Cinema, o filme O Auto da Compadecida, baseado na obra do pernambucano Ariano Suassuna, e que engloba diferentes aspectos das culturas brasileiras. A sala do cinema estava lotada com cerca de cinqüenta pessoas, pais, pessoas da comunidade e amigos da Vila. A quinta, 21 de Setembro, foi particularmente especial. No Ojó Odé, tarde de vivência das culturas africanas, Robson contou o Mito de Exu que explica porque ele gosta do galo preto. Segundo o mito o Galo Preto foi o animal mais criativo que Exu encontrou em seus caminhos, e ele gosta muito da criatividade. Assim como o Sacy, ele 2
desorganiza pra organizar! Nas oficinas, as crianças fizeram um brinquedo africano chamado Ayó, que envolve inteligência e criatividade. O resultado desta oficina pôde ser exposto na Festa Sacyzada, do sábado à noite. Em outra oficina as crianças também confeccionaram artigos para venda na festa, como Ioiô. Também aconteceram oficinas de Percussão, com Ronaldo e Jonathan; Capoeira, com Gustávio; Estética, com Regina, Natália e Juliana; Modelagem, com Simone e Máximo, Adornos, com Adriana e a Maria, avó da aluna Francielly; Dança, com Pio, Shirlei e Charles. O resultado de tudo isso é inexplicável... Tem que ser visto e admirado, por que saíram trabalhos fantásticos. Muito bonitos, com capricho e arte. Pra encerrar o Ojó Odé, samba de roda e uma deliciosa farofa. Ah! E também o Acarajé, feito pelo Robson. Tudo muito gostoso! Ainda como parte da programação da semana de estudos, na quinta à noite, no Quilombo, aconteceu um encontro com estudantes da Universidade Estadual de Goiás, dos cursos de Letras e História. Num divertido diálogo, Robson Max falou sobre Mitologia Brasileira e Educação, abordando temas como miscigenação brasileira e diferenças entre Mito e Lenda. Na sexta, 22, aconteceu no Espaço Cultural Vila Esperança uma oficina com um arte-educador goiano chamado Pedro Lusz. O tema da oficina foi A arte de contar estórias o teatro na educação. Além dos educadores da escola, foram convidados pessoalmente pela Renata todos os educadores de todas as escolas da cidade. Apareceram apenas três professoras de outras escolas, como exemplo da falta de interesse das pessoas em enriquecer sua cultura e ensino-aprendizagem. No período da tarde, as crianças da Escola Pluricultural Odé Kayodê encontraram com Pedro Lusz. Elas mostraram como estão utilizando os livros que ele escreveu. O Pedro contou causos e cantou cantigas populares. Você deve estar pensando: Quanta coisa pra uma semana só!. Pois é, no mesmo dia ainda tivemos forças e muita animação pra sair nas ruas da cidade estreiando o Mandrongo, o nosso velho caminhão de 1940!!! Adultos e crianças, todos de gorro vermelho, o caminhão enfeitado de Sacyzada, com batucada, fizemos propaganda da festa que aconteceu no sábado, todos animados pra montar uma grande festa na rua da Vila, aberta a toda a comunidade: Sacyzada, festa das tradições populares. A rua estava especialmente linda, enfeitada com laçarotes, com barracas de brincadeiras do Sacy, barracas de comidas, brinquedos e quitutes. O caminhão Mandrongo serviu de palco para as apresentações da noite de sábado, 23 de setembro. Abrindo a noite 3
os Foliões do Grupo Circo Alegria do Povo, cantaram e animaram a festa. Em seguida, o Causo do Sacy com o pequeno José Carlos e Haroldo Nélio, que também era o apresentador da festa. Rosi Martins, da Cia de Teatro Trapaça, apresentou histórias da sabedoria popular como a da mulher que dançou com o Diabo. As crianças da Educação Infantil cantaram e dançaram as músicas do Sacy. O grupo de Capoeira Angola fez uma roda de jogo, representando todo o trabalho que ele realiza com a crianças na capoeira. As crianças da segunda e terceira séries juntamente com os educadores Haroldo, Adriana e Liandra, cantaram quadrinhas populares goianas e outras de suas próprias autorias feitas após a apropriação da cultura que é de seus avôs e avós, e que já não estavam sendo deles. Luan, da quarta série, apresentou o poema Ai se sêsse, do poeta Zé da Luz. Este poeta, cordelista, tem como característica a linguagem matuta, um português incorreto. Adriana e Haroldo cantaram, ao som da viola, um desafio de Repente. Além da apresentação do Luan, tivemos o Cordel Encantado feito pela quarta série após uma ampla pesquisa e estudos sobre a Literatura de Cordel. Pra fechar a noite, o grupo de educadores envolveu as pessoas numa roda de Ciranda, cantigas e brincadeiras. Foi realmente uma noite divertida, que representou a culminância de vários projetos dentro de um só, e uma festa que mais uma vez contou com a ajuda de pais que acreditam na proposta da Vila Esperança. O mês de Setembro termina deixando em todos a certeza da realização, da proposta alcançada. As crianças se enriqueceram da cultura, que é delas, e que a mídia e as empresas do consumo tentam dizer o contrário, com seus produtos, música e arte vazias e cheias de intenções capitalistas. Nestes dias de Sacyzada chegaram Elisa e Marco, cineastas italianos da ETHNOS, enviados pela AIFO para gravar um vídeo sobre os projetos apoiados por ela direcionados às crianças no Brasil. Foram dias muito bonitos! Dia primeiro de Outubro vamos às urnas votar no Presidente, Governadores, senadores e deputados, com a esperança de que o Brasil possa escolher bem seus representantes, e que estes, nos próximos anos, olhem para a saúde, educação e cultura da grande população pobre deste país. Esta é mais uma de nossas Esperanças... Haroldo Para ver a programação da Sacyzada e as fotos, acesse o blog: http://br.geocities.com/sacyzada2006... E além disso tudo: 4
* Em São Paulo, no Curso de Formação em Dançaterapia do Pio, teve a participação da Shirley, que trabalha a dançaterapia com as crianças da Vila Esperança em Goiás. E no domingo deste Módulo teve a palestra/vivência do Robson sobre O Mito e a Dança. * No primeiro domingo do mês, no Bambá e Badulaques, apareceu o Massimo, com o seu Palhaço Mínimo, depois de um ano, voltando ao Brasil chegando da Itália para passar mais um tempo alegre e prazeroso com a gente! * E na metade do mês começou o Projeto Monitoria/Estagio com o Grupo de Jovens, para trabalhar meio período na Vila e começar a assumir a Vila! Ronaldo e Jhonatan Grupo de percussão Juliane Brinquedoteca Charles Memorial Indígena, Memorial Africano e Biblioteca Natalia Estética: penteados e costura Será um período de três meses, de convivência maior e maior compromisso e responsabilidade! * Dia 26 o Pio viajou para Itália: voltará só no início de Novembro. Vai passar um período intenso de cursos de formação em dançaterapia, em Milão, Verona, Trieste, Ragusa, e Pistoia... A Itália inteirinha! * E logo em seguida o Robson viaja para Bahia, para participar do ciclo das Águas de Oxalá na Casa de Candomblé Ilê Axé Opô Afonjá. Axé! 5