Acórdão 5a Turma EMENTA: Recurso da Reclamada. NULIDADE. PRODUÇÃO DE PROVAS EM SIGILO. Inadmissível, na hipótese, o anonimato na realização da prova pericial. Recurso provido. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso ordinário em que são partes: 1) SEBASTIÃO MANOEL GONÇALVES e 2) VIAÇÃO ITAPEMIRIM, como recorrentes, e OS MESMOS, como recorridos. Insurgem-se as partes contra a decisão proferida pela Vara do Trabalho de Três Rios que, julgou procedente em parte a pretensão autoral (fls. 360/373). Opostos embargos de declaração pela reclamada às fls. 375/377, foram os mesmos julgados improcedentes, à fl. 378, verso e anverso. A reclamada, às fls. 381/401, apresenta suas razões de inconformismo. Alega cerceio de defesa, sob o fundamento de que a prova pericial - prova emprestada - foi realizada sem sua participação, sequer intimação para acompanhamento e resposta aos quesitos formulados. Aduz ser impossível sua utilização na presente reclamação. Afirma que o laudo pericial não informa a metodologia utilizada para se chegar a conclusão de chegada antecipada de 3h e 28min. Alega contradição entre o laudo e as fichas de controle apresentadas. Acresce que não há pedido de condenação ao pagamento de horas extras referentes ao período de antecedência. No tocante as horas extras e ao intervalo intrajornada, diz ser indevida a condenação. Sustenta o caráter indenizatório do pagamento do intervalo intrajornada. Alega ser indevida a multa do art. 477, 8º, da CLT. Diz ser indevida a condenação em honorários advocatícios. Por fim, alega ser desnecessário perícia para apuração das horas extraordinárias. fl. 402/403. Comprovação do recolhimento das custas e depósito recursal às O reclamante, adesivamente, apresenta suas razões às fls. 411/413. Diz que deve ser afastada a justa causa aplicada, condenando a ré ao pagamento das verbas resilitórias, indenização de 40% e seguro desemprego. 20048 1
Contrarrazões do reclamante às fls. 416/419, defendendo a manutenção do julgado. justa causa. Contrarrazões da reclamada às fls. 426/430, renovando a tese de Os autos não foram remetidos à douta Procuradoria do Trabalho, por não ser hipótese de intervenção legal (Lei Complementar n. 75/1993) e/ ou das situações arroladas no ofício PRT/1º Região nº 27/08-GAB, de 15/01/2008, ressalvando o direito de futura manifestação, caso entenda necessário. É o relatório. V O T O Conhecimento Conheço de ambos os recursos ordinários, por preenchidos seus pressupostos legais de admissibilidade. M É R I T O Preliminar de nulidade por cerceamento de participação na produção da prova pericial realizada em outro processo - emprestada Quanto a denominada prova emprestada (fls. 266/314), cujo laudo foi produzido na ação trabalhista nº 00139.2001.541.01.00.0, ajuizada por Celso Barbosa em face da reclamada, registro que dentre os requisitos de sua admissibilidade é imprescindível de que a parte contra a qual vai ser usada esta prova tenha sido parte no processo onde a referida prova foi produzida. Vale dizer, a prova emprestada não tem eficácia em relação à parte contrária, que não participou de sua produção, em regular contraditório. No caso, o juízo de primeiro grau converteu o feito em diligência, aguardando a conclusão da perícia realizada nos autos do processo 139/01, a fim de utilizar o laudo como prova emprestada. (verso de fls. 248) O despacho proferido nos autos do processo indicado (139/01) foi determinada a notificação das partes para ciência do dia e hora da perícia, observando-se os quesitos formulados (fl. 257). Não há prova da intimação das partes para o acompanhamento da prova pericial, seja nestes autos, seja no outro, 00139.2001.541.01.00.0, ajuizada por Celso Barbosa em face da reclamada. 20048 2
No referido laudo pericial só há respostas aos quesitos formulados pelo juízo (fls. 268/272). E mais, o perito, ao explicar a metodologia da perícia, esclarece que não comunicou às partes, realizando no anonimato. (fls. 274 e 279) A recorrente suscitou o vício na primeira oportunidade (fls. 320/327) e ressalvou a ausência de resposta aos quesitos formulados. Intimado para esclarecimentos, o i. expert diz que ao realizar seus trabalhos sem comunicar previamente às partes, no anonimato, contribuiria para conhecer, de fato, a realidade dos fatos. (fl. 331) A leitura da sentença revela que o laudo pericial foi essencial na condenação da ré quanto as horas extras e intervalo intrajornada. Como dito linhas antes, a prova emprestada não tem eficácia em relação à parte contrária, que não participou de sua produção, em regular contraditório. No caso, não há prova de que a recorrente tenha sido intimada para ciência do dia e hora para perícia, conforme expressamente determinado na decisão de fls. 257 dos autos da reclamação trabalhista 00139.2001.541.01.00.0. Diante da ausência de intimação, do anonimato adotado pelo perito, e do alegado e provado prejuízo sofrido pela recorrente, declaro nula a valoração da prova emprestada nos presentes autos, dando provimento ao recurso para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à Vara de origem, resguardando o direito da reclamada da ciência do dia e hora para o início de eventual prova pericial nos presentes autos, se designado for, nos termos do art. 431-A do Código de Processo Civil: As partes terão ciência da data e local designados pelo juiz ou indicado pelo perito para ter início a produção da prova. Sobre o tema, Sérgio Cruz Arenhart e Luiz Guilherme Marinoni advertem: O novo art. 431-A tem o propósito de explicitar a necessidade de contraditório pleno na realização da prova pericial. Ora, a produção válidade de qualquer prova exige a possibilidade de que as partes possam participar da colheita do material e, consequentemente, influir na avaliação judicial dos elementos obtidos. (Comentários ao CPC. SP, RT, 2ª ed.,vol. 5, tomo II, 2005, p. 594; no mesmo sentido: WAMBIER, Luiz Rodrigues e outros. Breves comentários à nova sistemática processual civil. SP, RT, 3ª ed., 2005, p. 212; ASSUMPÇÃO NEVES, Daniel A. e outros. Nova reforma processual civil. SP, Método, 2ª ed. 2003, p. 192) No mesmo sentido, a lição do juslaboralista, Manoel Antonio 20048 3
Teixeira Filho: É necessário, ainda, que o perito comunique ao juiz, ocm razóavel antecedência, a data, o horário, o local em que dará início às diligências. Essa providência é indispensável para que o juiz possa mandar intimar as partes a este respeito. É oportuno observar que as partes e seus advogados têm o direito de acompanhar a realização dos trabalhos periciais; para isso, como dissemos, é fundamental a cientificação do dia, do horário e do local em que o exame, a avaliação ou a inspeção será realizada. Sem que as partes ou seus advogados sejam intimados para o fim mencionado, o ato da perícia poderá ser inquinado de nulo. (Curso de direito processual do trabalho. SP, LTr, vol. II, 2009, p. 1140) No mesmo sentido, destaco a atual jurisprudência do C. TST: RECURSO DE REVISTA. NULIDADE PROCESSUAL POR CERCEAMENTO DE DEFESA. I. A Recorrente argui nulidade processual por cerceamento de defesa em relação a duas questões distintas: (a) realização de perícia sem intimação de sua data e horário e (b) indeferimento da oitiva de testemunhas. II. Quanto ao primeiro tema (realização de perícia sem intimação da data de horário), o recurso de revista merece conhecimento e provimento. Os registros constantes do acórdão recorrido permitem concluir que a perícia foi realizada sem que a Reclamada fosse intimada de sua data e horário. O Tribunal Regional entendeu que isso não constitui nulidade processual por cerceamento de defesa e a Recorrente demonstrou a existência de dissenso jurisprudencial. Nos termos do art. 431-A do CPC (aplicável subsidiariamente ao Processo do Trabalho, conforme dispõe o art. 796 da CLT), as partes devem ser intimadas da data designada para a realização da perícia. Realizada a prova técnica sem que a parte tenha sido previamente intimada da data e horário designados, inegável o cerceamento do direito à ampla defesa garantido no art. 5º, LV, CF/88. III. Quanto ao segundo tema (indeferimento do pedido de oitiva de testemunhas), o recurso de revista também merece conhecimento e provimento. O Tribunal Regional rejeitou a nulidade processual por cerceamento de defesa, arguída no recurso ordinário interposto pela Reclamada. Declarou que o ônus probatório relativo à jornada de trabalho era da Reclamada, mas entendeu que o indeferimento do pedido de 20048 4
produção de prova testemunhal, por ela formulado, não constitui cerceamento do direito à ampla defesa. O acórdão recorrido revela (a) que os controles de jornada foram declarados imprestáveis e, por isso, o ônus probatório foi atribuído à Reclamada, (b) que foi indeferida a oitiva de testemunhas por ela requerida e (c) que os horários de trabalho foram fixados de acordo com as alegações constantes da petição inicial. É certo que a lei estende ao magistrado a prerrogativa de indeferir a produção de provas inúteis ou protelatórias (arts. 130 do CPC e 765 da CLT). Também é certo que o indeferimento dessas provas não constitui cerceamento do direito à ampla defesa. Porém, se a Reclamada é impedida de produzir prova oral - e se, posteriormente, atribui-se a ela o encargo probatório e se fixa a jornada de acordo com os horários apontados na inicial justamente porque não houve prova a esse respeito - evidente que a oitiva de testemunhas requerida era relevante e pertinente ao deslinde da controvérsia. Exceto se a prova requerida for manifestamente inútil ou protelatória (hipótese não verificada no presente caso), a atribuição do encargo probatório à parte litigante é incompatível com o indeferimento do pedido de produção de prova por ela formulado. É que, neste caso, tal indeferimento impede que ela tenha oportunidade de tentar se desonerar do encargo probatório que lhe foi atribuído, o que caracteriza cerceamento do direito à ampla defesa e ofensa ao art. 5º, LV, da CF/88. IV. Recurso de revista conhecido e provido para declarar a nulidade processual por cerceamento de defesa - e, por conseguinte, a nulidade das decisões proferidas no presente feito -, determinando a remessa dos autos à Vara do Trabalho de origem, para que reabra a instrução processual, produza a prova oral requerida pela Reclamada e prossiga no julgamento dos pedidos, como entender de direito. (4ª Turma, RR 105700-15.2004.5.15.0120, Rel. Min. Fernando Eizo Ono, j. 27/04/2011, pub. 06/05/2011) RECURSO DE REVISTA - NULIDADE DA PERÍCIA - CERCEAMENTO DE DEFESA - VÍCIO DE 20048 5
INTIMAÇÃO. É nula a perícia produzida sem a regular intimação das partes quanto ao dia e local de realização da prova. Recurso de Revista conhecido e provido. (8ª Turma, RR 31540-71.2002.5.12.0023, Red. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, j. 04/08/2010, pub. 06/08/2010) Ressalvo que o direito de ciência prévia fica resguardado para eventual determinação de prova pericial, não obstando que seja proferida nova decisão com base em outras provas. E mais, houve diversos quesitos formulados pela recorrente que resultaram sem respostas, nos presentes autos - veja-se fl. 442. Houve cerceio ao direito de defesa. Deve, pois, ser desconsiderado laudo pericial utilizado como prova emprestada, reabrindo-se a instrução, permitindo-se às partes que produzam as provas que venham a indicar, desde que úteis a solução do litígio. Dou provimento. Prejudicado o exame das demais matérias do recurso da reclamada e o recurso adesivo do reclamante. A C O R D A M os componentes da 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região0, por unanimidade, conhecer do recurso ordinário do Reclamante e DAR-LHE provimento, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à Vara de origem, desconsiderando-se a prova pericial, tida por emprestada, reabrindo-se a instrução, prosseguindo-se regularmente com o feito e proferindo-se nova decisão, como se entender de direito, nos termos do voto do juiz relator. Rio de Janeiro, 28 de Junho de 2011. Juiz do Trabalho Bruno Losada Albuquerque Lopes Relator 20048 6