ANALYSIS OF MAIN MYCOSES FOUND IN A CLINICAL LABORATORY ANALYSIS ROUTINE IN JATAÍ GOIÁS, BRAZIL



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Transcrição:

SaBios: Rev. Saúde e Biol., v.9, n.1, p.108-114, jan./abr., 2014 ISSN:1980-0002 ANÁLISE DAS PRINCIPAIS MICOSES ENCONTRADAS NA ROTINA DE UM LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS NA CIDADE DE JATAÍ, ESTADO DE GOIÁS, BRASIL Christie Ataides Pereira 1 ; Natália Moraes Sousa 1 ; Pablo Igor Ribeiro Franco 1 ; Arlete Ferreira dos Reis 2 e Mônica Santiago Barbosa 3 Ar tigo Completo RESUMO Este trabalho teve como objetivo, avaliar a frequência das principais micoses encontradas na rotina de um laboratório de médio porte, na cidade de Jataí, sudoeste do Estado de Goiás. Foram avaliados 79.563 exames durante o período de 01 de julho de 2010 a 29 de fevereiro de 2012, dentre os quais 191 foram exames micológicos, perfazendo um total de 0,24% da rotina laboratorial durante o período estudado. Dentre estes, 88 apresentaram diagnóstico positivo representando 46% da amostragem. Os sítios anatômicos no diagnóstico foram axila, face, virilha, abdome, braço, couro cabeludo, unhas e pequenas pústulas no dorso. Quanto ao gênero, o sexo feminino foi o mais acometido, perfazendo um total de 51 (58%) casos confirmados, enquanto que o sexo masculino representou 42%. Poucos dados foram obtidos a respeito da classificação dos gêneros e espécies. Considerando que as micoses não constituem doenças de notificação compulsória e que existe uma relevante lacuna de informação sobre o tema na região, este estudo evidencia a importância de analisar as principais micoses identificadas na rotina laboratorial. Palavras-chave: prevalência; micoses; epidemiologia. ANALYSIS OF MAIN MYCOSES FOUND IN A CLINICAL LABORATORY ANALYSIS ROUTINE IN JATAÍ GOIÁS, BRAZIL ABSTRACT This study aimed to assess the prevalence of fungal infections in the routine of a midsized clinical laboratory, in Jataí, southwest of Goias. 79,563 examinations were evaluated from July 01, 2010 to February 29, 2012. Among them, 191 were mycological examinations, corresponding to 0.24% of the laboratory routine during the studied period. Among the 191 mycological tests performed, 88 showed positive diagnosis (46% of the sample). The anatomical sites used for diagnosis were: armpit, face, groin, abdomen, arms, scalp, nails and small pustules on the back. Regarding gender, females were most affected; corresponding to a total of 51 confirmed cases (58%), while males accounted 42%. Few data were obtained regarding the classification of these species. Considering that fungal infections are not compulsory notification diseases and that there is a significant information gap in the region, this study highlights the importance of analyzing the main mycoses identified in laboratory routine. Keywords: prevalence; mycoses; epidemiology. INTRODUÇÃO As micoses apresentam grande interesse na prática médica pela frequência com que acometem a população, assim como por simularem outras patologias, principalmente aquelas que afetam áreas expostas do corpo como a pele. Estima-se que cerca de 10 a 15% da população mundial, pode ser infectada por esses tipos de micose no decorrer de suas vidas (1). As lesões decorrentes das infecções fúngicas manifestam-se, do ponto de vista clínico, nas mais diferentes formas, podendo ser classificadas de acordo com o sítio anatômico acometido no hospedeiro organismo, em micoses superficiais e cutâneas, representadas principalmente pelas dermatofitoses e a Pitiríase versicolor. As subcutâneas como, por exemplo, a Esporotricose e a Cromoblastomicose, e profundas e sistêmicas como a Paracoccidioidomicose e Histoplasmose (2). 1 Acadêmico de Biomedicina, Universidade Federal de Goiás, Jataí GO. 2 Laboratório Santa Clara, Jataí GO. 3 Docente da Universidade Federal de Goiás, Jataí-GO.

Micoses em Jataí Goiás, Brasil 109 Além disso, também são observadas micoses cujos agentes etiológicos são essencialmente oportunistas como é o caso da candidíase e a criptococose e de outras consideradas emergentes, devido a pouca frequência com que seus agentes são encontrados na rotina micológica (1). As micoses mais graves desenvolvem- se nos indivíduos imunossuprimidos como aqueles submetidos a terapêuticas antibióticas de longo prazo (que alteram o equilíbrio entre fungos e bactérias) e nos que tomam corticosteroides ou imunossupressores (que deprimem as defesas naturais) (3). A maior incidência de micoses superficiais e cutânea deriva de vários fatores, incluindo: condições bioclimáticas favoráveis ao desenvolvimento de fungos em vida saprobiótica, promiscuidade, sudorese, contato prolongado com animais de estimação (cães e gatos), uma vez que constituem reservatórios potenciais de certos dermatófitos, além de água contaminada em piscinas (4). As infecções fúngicas ganharam considerável importância ao longo da última década, como resultado de aumento significativo na incidência de agentes oportunistas, elas ocasionam um problema sanitário mundial devido a sua alta prevalência. A epidemiologia dos agentes etiológicos varia de acordo com o clima e com as características culturais e socioeconômicas da população (5). Apesar de variados fungos fazerem parte da microbiota normal, quando encontram fatores locais ou sistêmicos predisponentes podem invadir tecidos tornando-se patogênicos (2). O papel patogênico de infecções fúngicas invasivas (IFI) aumentou durante as últimas duas décadas. Com o aperfeiçoamento das ferramentas utilizadas no diagnóstico clínico e o aumento do número de pacientes imunossuprimidos (HIV, pacientes submetidos à quimioterapia para o câncer, doenças e pacientes transplantados), médicos e cientistas começaram a olhar mais profundamente sobre os mecanismos da doença e sua relação com populações suscetíveis. Hábitos de trabalho (agricultura, pecuária) e lazer também foram o cerne de atenção das autoridades de saúde pública, uma vez que o número de focos de micoses endêmicas, está diretamente relacionado a exposição do paciente a uma alta quantidade de inoculo do microrganismo em seu habitat natural (8,9). O número de publicações científicas também aumentou mundialmente, embora isso não seja o caso da América Latina, onde apenas alguns grupos de cientistas (no Brasil, Colômbia e Argentina) relataram suas experiências, principalmente discutindo vigilância epidemiológica (incidência, prevalência, morbidade e taxas de mortalidade e fatores de riscos) (10). O Brasil é um dos países que possui altos índices de infecções causadas por fungos, principalmente as micoses superficiais, tal fato ocorre pelo clima tropical, por isso, este e outros fatores são determinantes para o aparecimento de microepidemias (4). Estas infecções não constituem doenças de notificação compulsória, assim não se tem ideia exata da extensão do problema. Tal fato mostra a necessidade da realização periódica de levantamentos da frequência das micoses e de seus agentes etiológicos, em função dos fatores socioeconômicos, geográficos e climáticos, como medida de prevenção epidemiológica (4). Vários autores têm relatado dados epidemiológicos em diferentes regiões do Brasil, como nos Estados de São Paulo, Mato Grosso, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Minas Gerais, Distrito Federal, Amazonas, Paraná e Ceará. Entretanto, poucos dados sobre a prevalência de micoses no sudoeste Goiano foram publicados nos últimos anos e nenhum registro encontrado na cidade de Jataí, apesar do fato das condições bioclimáticas serem extremamente favoráveis para o aparecimento de tais infecções fúngicas (4). Por essas razões, torna-se inquestionável a necessidade de pesquisas epidemiológicas, clínicas e laboratoriais que relatem dados reais, no tocante a incidência das micoses no nosso meio. Neste contexto, este estudo objetivou coletar os dados referentes à rotina do setor de micologia do laboratório de um hospital particular de médio porte, na cidade de Jataí, localizada no sudoeste do Estado de Goiás, no período de junho de 2010 a fevereiro de 2012, para avaliar a frequência de micoses no diagnóstico laboratorial. MATERIAL E MÉTODOS As amostras analisadas consistiram de espécimes clínicos colhidos de pacientes com suspeita de micose, que foram atendidos no Laboratório Santa Clara, situado no Município de Jataí, Goiás, no período compreendido entre 01 de junho de 2010 a 29 de fevereiro de 2012. SaBios: Rev. Saúde e Biol. v.9, n.1, p.108-114, jan./abr., 2014

110 CHRISTIE ATAIDES PEREIRA, NATÁLIA MORAES SOUSA, PABLO IGOR RIBEIRO FRANCO, ARLETE FERREIRA DOS REIS & MÔNICA SANTIAGO BARBOSA Fizeram parte da amostragem os pacientes de todas as idades e ambos os sexos, e excluídos os que fizeram uso de antimicóticos, seja tópico ou sistêmico. Após a coleta as amostras foram submetidas ao exame micológico direto, e após clarificação em solução a 20% de hidróxido de potássio, foi evidenciada a presença de estruturas de natureza fúngica. O diagnóstico das infecções fúngicas de todos os pacientes deste estudo foi realizado pela Farmacêutica Bioquímica responsável pelo setor de micologia do Laboratório Santa Clara e os resultados foram armazenados no sistema operacional do laboratório. O presente trabalho realizou um estudo descritivo do tipo retrospectivo, realizado a partir dos registros dos resultados dos exames oferecidos pelo Laboratório. Dentre os aspectos analisados, destacam-se a distribuição por sexo, sítio anatômico acometido e frequência dos exames micológicos. Foi aplicado o teste t de Student para checar a diferença entre os sexos quanto aos resultados de exames devido aos dados não serem pareados. O programa estatístico utilizado foi o Sistema para Análise Estatística (SAEC- versão 9.1) que realiza o teste de homogeneidade de variâncias para comparação de médias, entre outros (11). O fluxograma representativo das metas experimentais está descrito na figura 1. Laboratório Santa Clara Registro de exames 2010 a 2012 Exames micológicos Resultados dos exames laboratoriais Estatística Descritiva Figura 1. Fluxograma representativo das metas experimentais realizadas neste trabalho. RESULTADOS E DISCUSSÃO No presente estudo foram avaliados prontuários de 79.563 pacientes atendidos no Laboratório Santa Clara, Município de Jataí/GO durante o período de 01 de julho de 2010 a 29 de fevereiro de 2012. Foram identificados 191 exames micológicos, representando 0,24% da rotina laboratorial no período estudado, Figura 2. SaBios: Rev. Saúde e Biol. v.9, n.1, p.-114, jan./abr., 2014

Micoses em Jataí Goiás, Brasil 111 100,00% 90,00% 80,00% 70,00% 60,00% 50,00% 40,00% 30,00% 20,00% 10,00% 0,00% Outros Micológicos Total 99,76% 0,24% Figura 2. Porcentagem de exames micológicos em relação ao total de exames laboratoriais. O diagnóstico das infecções fúngicas foram realizados através do raspados de lesões localizadas nos dedos, unhas, pés, couro cabeludo, pele dos braços, dorsos, entre outros. Foi possível observar que os sítios anatômicos mais infectados foram dedos (24%), seguido de pés (16%) e em unhas (10%) (Figura 3). Estes dados podem ser atribuídos a algumas atividades profissionais que podem favorecer a ocorrência desta micose, principalmente mulheres que mantêm maior contato com água (cozinheiras e lavadeiras) e alguns homens que desempenham atividades como lavadores de louças, manipuladores de frutas, jardineiros e operários de curtume (9). A presença de fungos em unhas dos pés, denominado Onicomicose, também pode ser influenciada pelo uso de calçados fechados, provocando ambiente quente e úmido (9). 35% 24% Dedo Unha 16% Pé 7% 8% 10% Couro cabeludo Braço Outros Figura 3. Representação gráfica dos principais locais para a coleta de amostras submetidas ao exame micológico no Laboratório Santa Clara, Jataí/GO. SaBios: Rev. Saúde e Biol. v.9, n.1, p.108-114, jan./abr., 2014

112 CHRISTIE ATAIDES PEREIRA, NATÁLIA MORAES SOUSA, PABLO IGOR RIBEIRO FRANCO, ARLETE FERREIRA DOS REIS & MÔNICA SANTIAGO BARBOSA Em relação ao sexo, pode-se afirmar que dentre 191 exames micológicos, 68 foram exames feitos de pacientes masculinos (35,6%) e 123 de pacientes femininos (64,4%). Em relação a estes dados, pode-se dizer que há uma maior preocupação recorrente da população feminina em buscar atendimento médico laboratorial, seguindo uma possível linha de precaução. Dentre os 191 exames micológicos diretos realizados, 88 apresentaram diagnóstico positivo representando 46,07% da amostragem (Figura 4). 46% 54% Exames negativos Exames positivos Figura 4. Porcentagem de resultados positivos e negativos dos exames micológicos diretos para ambos os sexos. Dos 88 exames com resultados positivos, 37 (42%) foram exames de pacientes masculinos e 51 foram exames de pacientes femininos representando 58% (Tabela 1). Como os resultados foram variáveis contínuas e não pareadas, utilizou-se o teste t de Student para checar a diferença entre os sexos quanto aos resultados dos exames, de acordo Ribeiro et al. (11). O resultado foi significativo com probabilidade de 0,0136 (p< 0,05), que é o valor limite para que a hipótese nula seja aceita. No caso do presente artigo, a hipótese nula foi que o sexo feminino mostrou-se mais acometido mesmo tendo uma maior quantidade de exames realizados em amostras de pacientes deste gênero. Portanto, o teste t de Student foi de grande relevância para evitar uma afirmação tendenciosa das amostras. Com base nos dados acima e no cálculo estatístico realizado para comparação de médias, pode-se afirmar que o sexo feminino foi mais acometido, corroborando com as conclusões descritas por outros autores (9,12). A susceptibilidade do sexo feminino pode ser explicada pelos hábitos diários, como o uso de calçados com salto alto que podem levar a ocorrência de traumas ou o uso de roupas muito justas e de fibras sintéticas, bem como por fases inerentes a mulher em que a imunidade está em baixa, como a gestação, ou tratamento com hormônios, como a estrogenoterapia, além do fato das mulheres estarem mais expostas a agressões por produtos de limpeza facilitando o processo de patogênese dos dermatófitos nas onicomicoses (2). SaBios: Rev. Saúde e Biol. v.9, n.1, p.-114, jan./abr., 2014

Micoses em Jataí Goiás, Brasil 113 Tabela 1. Distribuição dos resultados obtidos em relação ao gênero. Gênero Positivos Negativos Total Masculino 37 31 68 Feminino 51 72 123 Total de exames micológicos 191 Fonte. Laboratório Santa Clara. Através deste estudo, não foi possível caracterizar as espécies, visto que a metodologia empregada para o diagnóstico foi o exame direto, que envolve a observação microscópica de estruturas fúngicas, após a clarificação com KOH a 20% (9). Apesar da evidente relevância da positividade do exame direto, principalmente em ocasiões nas quais a cultura pode representar pouca sensibilidade, o uso desse método como único indicador do diagnóstico laboratorial é desaconselhado, pois um exame direto negativo não descarta a possibilidade de uma infecção, visto que algumas espécies parecem necessitar de uma maior quantificação das estruturas fúngicas, presentes na amostra clínica, para que seja detectada ao exame direto (13). O exame direto é considerado positivo quando se observa presença do fungo em parasitismo, no entanto, a confirmação do diagnóstico é baseada no crescimento do agente etiológico em meio de cultura. A identificação das espécies fúngicas é realizada com base nas características macromorfológicas e micromorfológicas das colônias que cresceram nos meios de cultura e, em alguns casos, realização de provas bioquímicas adicionais (9). No presente trabalho não foi possível identificar as espécies, pois o laboratório em estudo não realiza a cultura de espécies fúngicas como exame de rotina. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente estudo descreveu a frequência de exames micológicos na rotina de um laboratório particular de análises clínicas na cidade de Jataí Goiás. As infecções fúngicas foram mais frequentes nos dedos, unhas e pés, sendo o sexo feminino mais acometido, mesmo este gênero possuindo um maior número de exames realizados. Em um total de 191 exames micológicos nenhum apresentou qualquer informação quanto a gênero ou espécie devido não ter sido realizado exames de cultura. Porém, de acordo com a literatura é necessário à realização deste exame para comprovar o gênero e a espécie do microorganismo, e assim fazer o uso de fármacos específicos, visto que na investigação clínica e na rotina laboratorial esses fungos assumem caráter relevante quando correlacionados aos agravos à saúde pública, principalmente no que diz respeito às micoses oportunistas e sistêmicas. Esse estudo evidencia a relevância do diagnóstico micológico na rotina laboratorial, por permitir o tratamento específico do agente causal. Além disso, a identificação das espécies fúngicas contribui para o estudo da frequência das micoses e de seus agentes etiológicos, em função dos fatores socioeconômicos, geográficos e climáticos, como medida de prevenção epidemiológica. SaBios: Rev. Saúde e Biol. v.9, n.1, p.108-114, jan./abr., 2014

114 CHRISTIE ATAIDES PEREIRA, NATÁLIA MORAES SOUSA, PABLO IGOR RIBEIRO FRANCO, ARLETE FERREIRA DOS REIS & MÔNICA SANTIAGO BARBOSA Recebido em 17/08/2012 Revisado em 01/07/2013 Aceito em 26/08/2013 Christie Ataides Pereira, Natália Moraes Sousa, Pablo Igor Ribeiro Franco, Arlete Ferreira dos Reis, Mônica Santiago Barbosa. Endereço para correspondência: BR 364, km 192, nº 3800 - Parque Industrial, Jataí GO CEP:75801-615. Coordenação do curso de Biomedicina- Sala 04. (64) 3606-8286. E-mail: santiagosant@gmail.com REFERÊNCIAS (1) COELHO, M.P.P.; MENDES, B.G.; SOPRANA, H.Z.; SANTOS, L.F.V.; NAPPI, B.B.; SANTOS, J.I. Micoses observadas em pacientes atendidos no Hospital Universitário. RBAC, Florianópolis, Santa Catarina, v. 37, n.1, p. :27-30, 2005. (2) SOUZA, E.A.; ALMEIDA, L.M.M.; GUILHERMETTI, E.; MOTA, V.A.; ROSSI, R.M.; SVIDZINSKI, T.I.E. Frequência de onicomicoses por leveduras em Maringá, Paraná, Brasil. An Bras Dermatol, v. 82, p. 151-156, 2007. (3) SOMENZI, C.C.; RIBEIRO, T.S.; MENEZES, A. Características Particulares da Micologia Clínica e o Diagnóstico Laboratorial de Micoses Superficiais. NewsLab, v. 77, p.106-118, 2006. (4) ARAÚJO, S.M.; FONTES, C.J.F.;, LEITE, J.D.P.; HAHN, R.C. Fungal agents in different anatomical sites in public health services in Cuiabá, state of Mato Grosso, Brazil. Rev. Inst. Med. Trop. São Paulo, v.54, n.1, p.:5-10, 2012. (5) WILLE, M.P.; ARANTES, T.D.; SILVA, J.L.M. Epidemiologia das dermatomicoses em população da periferia de Araraquara SP. Rev. Bras. Clin. Med, v. 7, p295-298, 2009. (6) COLOMBO, A.L.; TOBÓN, A.; RESTREPO, A. Epidemiology of endemic systemic fungal infections in Latin America. Med. Mycol., v. 49, n. 8, p. 785 98, 2011. (7) LORTHOLARY, O.; GANGNEUX, J.P.; SITBON, K. Epidemiological trends in invasive aspergillosis in France: the SAIF network. Clin. Microbiol. Infect, 2011. (8) ORSONIO, J.S.; DORA, E.C.L.; PONCE, L.A. Epidemiology of Invasive Fungal Infections in Latin America. Curr. Fungal Infect. Rep., v. 6, p. 23 34, 2012. (9) LIMA, K.M.; RÊGO, R.S.M.; MONTENEGRO, F. Diagnósticos clínicos e laboratoriais das onicomicoses. News Lab, v. 83, p. 186-196, 2007. (10) RIBEIRO, L.C.; HAHN, R.C.; FAVALESSA, O.C.; TODANO, T.; FONTES C.J.F. Micoses sistêmicas: fatores associados ao óbito em pacientes com infecção pelo vírus da imunodeficiência humana, Cuiabá, Estado de Mato Grosso, 2005-2008. Rev. Inst. Med. Trop. São Paulo, v. 42, n.6, p.698-705, 2009. (11) SAEG Sistema para Análises Estatísticas, Versão 9.1: Fundação Arthur Bernardes - UFV - Viçosa, 2007. (12) SCHOELER, A.P.; SGUISSARDI, C.H.; BERNARDI, E.; CEMBRANEL, L.R.; FUENTEFRIA, A.M. Prevalência de dermatófitos na rotina de micologia em hospital particular de médio porte na cidade de Chapecó, estado de Santa Catarina, Brasil. Rev. Ciên. Farm. Bras. Apl., v. 31, p.103-106, 2010. (13) BRILHANTE, R.S.N.; PAIXÃO, G.C.; SALVINO, L.K.; DIÓGENES, M.J.N.; BANDEIRA, S.P.; ROCHA, M.F.G.; SANTOS, J.B.F.; SIDRIM, J.J.C. Epidemiologia e ecologia das dermatofitoses na cidade de Fortaleza: o Trichophyton tonsurans como importante patógeno emergente da Tinea capitis. Rev. Soc. Bras. Med. Trop., v. 33, n. 5, p. 417-425, 2000. SaBios: Rev. Saúde e Biol. v.9, n.1, p.-114, jan./abr., 2014