CMVM investiga negociações da Caixa na guerra da Cimpor



Documentos relacionados
GRANDES OPÇÕES DO PLANO 2008 PRINCIPAIS ASPECTOS

ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA. site do programa, comunicou a suspensão, a partir de 11 de Fevereiro de 2011, de

Declaração ao país. António José Seguro. 19 de Julho de Boa tarde. Durante esta semana batemo-nos para que:

ASSEMBLEIA LEGISLATIVA REGIONAL DOS AÇORES SESSÃO PLENÁRIA DE 11 a 13 NOVEMBRO DE 2002 Intervenção do Deputado Cabral Vieira

As Estatísticas do Banco de Portugal, a Economia e as Empresas

Cresce o numero de desempregados sem direito ao subsidio de desemprego Pág. 1

Perguntas e respostas frequentes. Extinção das Tarifas Reguladas Eletricidade e Gás Natural

Freguesia de Tabuadelo e São Faustino. Concelho de Guimarães

Debate Quinzenal Economia Intervenção do Primeiro-Ministro José Sócrates

GOVERNO UTILIZA EMPRESAS PUBLICAS PARA REDUZIR O DÉFICE ORÇAMENTAL, ENDIVIDANDO-AS E ARRASTANDO-AS PARA A SITUAÇÃO DE FALENCIA TÉCNICA

Projeto de Lei n.º 703/XII-4ª. Estabelece restrições à penhora e execução de hipoteca sobre a habitação. Exposição de motivos

Direita admite mudanças na lei para criminalizar a má gestão. Direita admite mudanças na lei para criminalizar a má gestão

1. Greve no Metro de Lisboa, Antena 1 - Notícias, Greve no Metro de Lisboa, Antena 1 - Notícias,

Programa de Estabilidade e Programa Nacional de Reformas. Algumas Medidas de Política Orçamental

Restituição de cauções aos consumidores de electricidade e de gás natural Outubro de 2007

NEWSLETTER Nº 9 SETEMBRO CONHECIMENTO INOVAÇÃO CRIATIVIDADE EFICIÊNCIA VALOR POTENCIAMOS O VALOR DAS ORGANIZAÇÕES

Resumo de Imprensa. Quinta-feira, 16 de Julho de 2009

PLANO DE PROMOÇÃO DA EFICIÊNCIA NO CONSUMO (PPEC) REVISÃO DAS REGRAS

PROJETO DE LEI Nº./XII/3.ª REFORÇA A PROTEÇÃO DE DEVEDORES DE CRÉDITO À HABITAÇÃO EM SITUAÇÃO ECONÓMICA MUITO DIFÍCIL

Rendas. Idosos e deficientes podem ser despejados se não pagarem renda

Informação necessária à avaliação do Programa da Coligação Portugal à Frente

Índice. Como aceder ao serviço de Certificação PME? Como efectuar uma operação de renovação da certificação?

O incumprimento por parte dos compradores, consequências e soluções, a perda de habitação e das poupança das famílias

PROSPECTO SIMPLIFICADO (actualizado a 31 de Dezembro de 2008) Designação: Liberty PPR Data início de comercialização: 19 de Abril de 2004

traçam 'plano de ataque'

REU IÃO I FORMAL DOS CHEFES DE ESTADO E DE GOVER O DE 7 DE OVEMBRO VERSÃO APROVADA

Fiscalidade no Sector da Construção

Neste artigo iremos dedicar especial atenção às novas regras do. IRS, introduzidas pela Reforma levada a cabo pelo Governo no final

Educação Financeira. Crédito Consignado. Módulo 3: Gerenciamento de dívidas

PROBLEMAS E PERSPECTIVAS ORÇAMENTAIS DA C&T EM PORTUGAL

Esclarecimento. De entre as acções dadas em garantia destacam-se as acções Cimpor, correspondentes a 9,58% do respectivo capital social.

COMO INVESTIR PARA GANHAR DINHEIRO

Terça-feira, 5 de Maio de 2015 I Série A Número 2. da Assembleia Nacional REUNIÃO DA 3.ª COMISSÃO ESPECIALIZADA PERMANENTE DE 4 DE MAIO DE 2015

Assembleia Popular Nacional

Plano e Orçamento para Políticas de Promoção de Emprego e Empregabilidade

Pergunta. Anúncio do Governo de uma pretensa devolução aos portugueses, em 2016, de um montante da Sobretaxa paga em 2015.

PROJETO DE LEI N.º 378/XII/2.ª INTRODUZ O REGIME FACULTATIVO DE CONTABILIDADE DE CAIXA DO IVA PARA AS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS

GOVERNO. Orçamento Cidadão 2015

REUNIÃO EXTRAORDINÁRIA DA CÂMARA MUNICIPAL DE S. JOÃO DA MADEIRA

Projeto de Resolução n.º 565/XII/2.ª

Simplificar as operações de reestruturação empresarial: ajudar as empresas a ultrapassar a crise internacional e a manter postos de trabalho

Senhor Presidente. Senhoras e Senhores Deputados. Senhoras e Senhores Membros do Governo

Apresentação e Discussão do Orçamento Retificativo para 2012

O PÚBLICO fez um guia explicativo para as cinco grandes mudanças deste regime.

PROJECTO DE LEI N.º 179/IX ALARGA O REGIME DE INCENTIVOS FISCAIS À I&D EMPRESARIAL. Exposição de motivos

Projecto de Lei n.º 408/ X

DIREÇÃO NACIONAL DA CUT APROVA ENCAMINHAMENTO PARA DEFESA DA PROPOSTA DE NEGOCIAÇÃO DO SALÁRIO MÍNIMO, DAS APOSENTADORIAS E DO FATOR PREVIDENCIÁRIO

MENSAGEM DE ANO NOVO DE SUA EXCELÊNCIA O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

INOVAÇÃO PORTUGAL PROPOSTA DE PROGRAMA

1. António Costa promete mudança política, Antena 1 - Notícias,

MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS

1. (PT) - i, 02/10/2012, Construção civil. Empresas "fogem" para o estrangeiro 1

COMENTÁRIOS DA UGT AO DOCUMENTO PACTO PARA O EMPREGO GRUPO DE TRABALHO PARA A QUALIFICAÇÃO E O EMPREGO

Apresentação de Teresa Ter-Minassian na conferencia IDEFF: Portugal 2011: Coming to the bottom or going to the bottom? Lisboa, Jan.31-Fev.

Evolução do Número de Beneficiários do RSI

Perguntas e Respostas Alteração no rendimento da caderneta de poupança. 1) Por que o governo decidiu mudar as regras da caderneta de poupança?

(85/577/CEE) Tendo em conta o Tratado que institui a Comunidade Europeia e, nomeadamente, o seu artigo 100º,

Medidas de Revitalização do Emprego

S. R. MINISTÉRIO DAS FINANÇAS e da ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

PVP Programa de Valorização de Património. Apresentação à CML Helena Roseta

ÁREA A DESENVOLVER. Formação Comercial Gratuita para Desempregados

CORPORATE GOVERNANCE E RESPONSABILIDADE SOCIAL

Novas regras para insolvência avançam em Maio, mas falta regular actividade dos gestores.

fui acompanhando pelo site da DHL o estado da encomenda. Como se pode aferir na figura

Senhor Presidente da Assembleia, Senhoras e Senhores Deputados, Senhor Presidente, Senhora e Senhores membros do Governo.

Proposta de ACORDO DE GOVERNO E DE COLABORAÇÃO POLÍTICA ENTRE O PSD E O CDS/PP

M U N I C Í P I O D E V A L E N Ç A C ÂM ARA MUNIC I PAL

EVOLUÇÃO DO SEGURO DE SAÚDE EM PORTUGAL

Fundo de Pensões BESA OPÇÕES REFORMA

CORRENTES CAPITAL TOTAL RECEITAS DESPESAS

Projeto de resolução n.º 308/XII Recomenda ao Governo a criação de um Fundo de Garantia ao Crédito à Habitação. Exposição de motivos

Fundo de Apoio às Micro e Pequenas Empresas no Concelho de Sines

Entrevista com BPN Imofundos. António Coutinho Rebelo. Presidente. Com quality media press para LA VANGUARDIA

LUZ AO FUNDO DO TÚNEL TALVEZ SÓ EM As previsões do Euroconstruct para o sector da construção e da reabilitação em Portugal.

Fundo de Investimento Imobiliário Aberto. ES LOGISTICA (CMVM nº 1024)

Estratégia Europeia para o Emprego Promover a melhoria do emprego na Europa

Condições de acesso ao Programa de Passageiro Frequente TAP Victoria para Clientes do Banco Popular

Secção II 1* Fundos e sociedades de investimento imobiliário para arrendamento habitacional

PROJETO DE LEI N.º 837/XII/4ª. Determina as taxas de juro aplicáveis aos mutuários de crédito num contexto de taxa de referência negativa

REGULAMENTO DE OCUPAÇÃO MUNICIPAL TEMPORÁRIA DE JOVENS

Incentivos a Microempresas do Interior

ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES TRABALHOS DA COMISSÃO

Ficha de informação 1 POR QUE RAZÃO NECESSITA A UE DE UM PLANO DE INVESTIMENTO?

SEMANA DA RESPONSABILIDADE SOCIAL REGENERAÇÃO URBANA E RESPONSABILIDADE SOCIAL NA INTERNACIONALIZAÇÃO

Incentivos à contratação

Decreto-Lei n.º 142/99 de 30 de Abril

GUIA PRÁTICO SUBSÍDIO DE DESEMPREGO PARCIAL

Acabar com as disparidades salariais entre mulheres e homens.

1. Tradicionalmente, a primeira missão do movimento associativo é a de defender os

Perspectiva de um Emitente Soberano República de Portugal

CARTILHA EDUCAÇÃO FINANCEIRA

Promover emprego e trabalho com qualidade: dinamizar a contratação colectiva, valorizar e proteger

1. Objectivos do Observatório da Inclusão Financeira

- Reforma do Tesouro Público

RELATÓRIO E CONTAS BBVA BOLSA EURO

Comemorações do 35º Aniversário do Banco de Cabo Verde. Conferência internacional sobre A mobilização de oportunidades no pós-crise

CONTRIBUTO DA UGT SOBRE O PROGRAMA INTEGRADO DO REFORÇO DO COMBATE À EVASÃO E À FRAUDE FISCAL

Legislação MINISTÉRIO DAS FINANÇAS

SISTEMA DE CERTIFICAÇÃO DE ENTIDADES FORMADORAS ASPECTOS PRINCIPAIS DA MUDANÇA

Transcrição:

PUB www.economico.pt mobile.economico.pt SEXTA-FEIRA, 22DEJANEIRO2010 Nº4802 PREÇO (IVA INCLUÍDO): CONTINENTE 1,60 EUROS DIRECTOR ANTÓNIO COSTA DIRECTOR EXECUTIVO BRUNO PROENÇA DIRECTORA-ADJUNTA CATARINA CARVALHO SUBDIRECTORES FRANCISCO FERREIRA DA SILVA E PEDRO SOUSA CARVALHO Obama e os banqueiros Depois da derrota no Massachussets, Obama declara guerra à banca. P20 Grande Reportagem Três retratos de gente como a Marta que ficou desempregada e regressou à faculdade. P18 Descubra os pacotes mais baratos de Internet, TV e telefone A oferta de pacotes de triple play em Portugal é vasta e os preços podem variar entre 10 e 249 euros por mês. Saiba o que vale a pena comprar. CMVM investiga negociações da Caixa na guerra da Cimpor Polícia dos mercados quer apurar se a CGD tem estratégia concertada para derrotar a OPA dos brasileiros da CSN. A CMVM, presidida por Carlos Tavares, decidiu investigar o banco público e a sua conduta na OPA que está a decorrer. O regulador quer saber se a Caixa Geral de Depósitos tem uma estratégia concertada com outros accionistas para a Cimpor. A Caixa Geral já admitiu ter sido abordada para estabelecer um acordo que promovesse a estabilidade accionista da Cimpor. P28 Brasileiros da Votorantim em contactos com o banco público Conheça ainda as ofertas das agências para ir ao Mundial ver a selecção portuguesa. A Deco explica por que é difícil negociar os spreads no crédito à habitação. Sócrates está mais perto de viabilizar Orçamento O Governo está cada vez mais próximo de fechar acordos para garantir a viabilização do Orçamento do Estado para2010.alémdocds,opsdtambém já deu sinais de que não quer ficardeforadoacordoeamanhã,sábado, Manuela Ferreira Leite vai reunir com José Sócrates. P4A8 PSI 20 IBEX 35 FTSE 100 Dow Jones Euro Brent PUB -1,16% -2,26% -1,58% -1,99% -0,14% -2,36% Alegre tem apoio garantido no interior do PS 8.241,21 11.444,00 5.335,10 10.392,45 1,4090 74,51 Vários dirigentes do PS vão assumir o apoio a Manuel Alegre nos próximos dias. P15 Operadoras ameaçam subir preço das chamadas móveis CONSULTÓRIO FISCAL Coloque as suas questões em www.economico.pt PT, Vodafone e Optimus ameaçam subir os preços das chamadas móveis, depois de a Anacom ter feito uma proposta de tarifas que pode afectar as receitas das operadoras. P26 As respostas aos leitores na página 12

2 Diário Económico Sexta-feira 22 Janeiro 2010 A NÃO PERDER SOCIEDADE ABERTA 22.01.10 Marta Rebelo Jurista Daniel Amaral Economista A negociação entre o Governo eos sindicatos da função pública sobre o diploma da ponderação curricular deverá fechar na próxima semana, afirmou ontem o secretário de Estado Castilho dos Santos. O diploma deverá vigorar já este ano. P13 O Resort Pestana Tróia começa aser construído este verão, anunciou aos jornalistas Dionísio Pestana, presidente do grupo hoteleiro. Passados mais de dez anos, arranca finalmente o primeiro ecoresort do grupo em Portugal. P30 A privatização da ANA vai incluir os aeroportos Sá Carneiro, no Porto, os dos Açores e de Beja, além do novo aeroporto de Lisboa, em Alcochete. O diploma que aprova as bases da concessão foi ontem aprovado em Conselho de Ministros. P32 Apple negoceia com a Microsoft a utilização do motor de busca Bing nos respectivos telemóveis em substituição do Google, noticia a Business Week. Um sinal da crescente rivalidade da fabricante do iphone e do gigante das buscas. P34 Constâncio recebe clientes do BPP organizados no Movimento de Empresas e Particulares de Retorno Absoluto, na próxima semana. O objectivo é discutir a actual situação do banco, disse o presidente do MEPRA. P37 As oito corretoras independentes identificadas no site do Banco de Portugal apresentaram nos primeiros nove meses de 2009 um resultado líquido acumulado de 36%, tendo passado de 1,79 milhões de euros para 2,73 milhões. P38 Simão Sabrosa será o embaixador da próxima campanha Europoupança da McDonald s. A campanha arranca no próximo dia 25 com um passatempo paralelo, cujo vencedor poderá assistir a um jogo do Mundial da África do Sul. P40 Se as marcas TMN, MEO ou Sapo protagonizarem um filme criado por si, que não tenha mais de cinco minutos e for carregado na página de videos da Sapo, poderá, se vier a ser o eleito, integrar a próxima campanha publicitária da PT. P41 A Galeria Baginski inaugurou oseu novo espaço no Beato com exposições dos artistas Paulo Brighenti e Gonçalo Sena. Proença de Carvalho, Leonor Beleza, Vasco Pereira Coutinho e Luís Champalimaud, entre outros, estiveram presentes. P43 Voltas em Portugal As negociações sobre o orçamento do Estado continuam, sobre o olhar atento de instituições e investidores. Com a Grécia em pré-falência, e os cálculos sobre o nosso défice a serem revistos em sentido ascendente, a expectativa é grande. Que mensagem político-financeira revelará este orçamento? E que estabilidade conhecerá a nossa vida política durante o seu período de execução? Eis as questões. O PSD revelou-se um péssimo negociador, regateando impossíveis e perdendo o jogo para o parceiro da cadeira ao lado, à direita. Manuela Ferreira Leite não foi astuta o suficiente para perceber que o preço do CDS-PP seria menor, e que o tempo urgia. O PSD poderia fazer valer nesta negociação orçamental uma de duas posições: rejeitar interacções com o PS, e afastar-se da mesa negocial com uma posição firme de descrédito face ao documento apresentado pelo governo; ou ser o parceiro privilegiado, obrigando Teixeira dos Santos à introdução de um conjunto sólido de bandeiras social-democratas na proposta de OE. Duas posições, nenhuma mais. Mas Ferreira Leite encontra-se num meio termo que se assemelha a um limbo orçamental, com o CDS-PP a recolher os créditos políticos e a líder laranja a lamentarse e a solicitar ao primeiro-ministro que receba o PSD em São Bento. Para queixar-se do rumo das coisas? O PS que eventualmente apoie Manuel Alegre, não será um PS inteiro. O CDS-PP mais não fez do que negociar a inclusão das suas máximas na proposta de orçamento: pensões, segurança, defesa do contribuinte. Só que estas máximas, que são apenas parcelares face aos sectores enunciados, importam um acréscimo de despesa incomportável para quem tem de realinhar os carris da consolidação das contas públicas. Qual pescadinha de rabo na boca, sem orçamento não há reorientação da política financeira, e sem que essa inclua as soluções do partido de Portas não há orçamento O PS, por seu turno, tenta manter as atenções no momento parlamentar, que Manuel Alegre tenta ofuscar com o anúncio da sua candidatura. José Sócrates foi lesto a avisar que antes da aprovação do OE não haveria lugar para discussões internas relativamente às presidências. Mas igualmente rápido foi Vitalino Canas, a expressar o que muitos pensam dentro do Partido Socialista. Também para Alegre o caminho da alegria era dúbio: alegrar a esquerda, perder a direita. Se o Bloco o apoia e o PCP provavelmente apoiará, e ainda que seja muito difícil ao PS calçar outra bota e desdenhar a candidatura do poeta, o PS que eventualmenteapoiemanuelalegre,nãoseráumpsinteiro. E Cavaco Silva? Mantém-se no seu silêncio. No que respeita ao orçamento ou às eleições de 2011. Ou, naturalmente, à complexa vida interna do seu PSD. Ontem, Pedro Passos Coelho apresentou em livro as suas soluções para Portugal. E não pude deixar de lado a dúvida: um PSD de Passos Coelho em que moldes apoiará o (re)presidente Cavaco? AFRASE O que me interessa é que o OE possa passar. Mário Soares, ex-presidente da República O também antigo primeiro-ministro de Governos PS-CDS e do bloco central mostra-se convicto de que o OE/2010 passaráevêcombonsolhos todososacordos,sejacom quem for, com a direita e com a esquerda. P5 Chover no molhado O Boletim de Inverno do Banco de Portugal provocou-me dois sentimentos. Um de resignação: a retoma económica vai ser muito lenta, ponto final. O outro de surpresa: esperava que o emprego caísse, não esperava que caísse tanto. Os números agora publicados, ainda mais violentos do que os anteriores, sugerem a ideia de que entrámos numa câmara de horrores. Só não sei como sair dela. Peguemos em 2009. Cruzando o emprego do Banco de Portugal, de 5.052 milhares, com a taxa de desemprego do Eurostat, de 10,3%, chegamos a uma população activa de 5.632 milhares, muito próxima da de 2008. Admitindo que esta população se mantenha, e com o emprego a cair mais 1,3% em 2010, o número de desempregados subirá para 646 mil, 11,5% da população activa uma loucura. Atenção! Podemos estar à beira de um colapso social de consequências imprevisíveis. Se as empresas ainda vão dispensar 66 mil pessoas este ano não é por prazer, mas por necessidade. É porque as suas estruturas estão sobredimensionadas face aos mercados em que actuam. E qualquer outra solução seria prejudicial para os dois lados: para as empresas, que aumentariam os custos relativos; e para os trabalhadores, que teriam um desemprego ainda maior. Só nos resta uma solução: criar os mecanismos que façam aumentar a procura. A procura interna pode aumentar de duas maneiras: ou melhorando os rendimentos disponíveis ou baixando os preços de venda. Os primeiros exigem acréscimos substanciais de salários; os segundos pressupõem cortes violentos nos custos. Já o aumento da procura externa só conhece um caminho: a baixa de preços. Mas, entre as duas, creio que a escolha é hoje consensual: a aposta deve ser feita na procura externa, através da dinamização das exportações. Uma outra forma de baixar os custos seria a via fiscal. Mas tem duas limitações: por um lado, é menos eficaz do que a anterior e, por outro, colide com o objectivo em curso de consolidação orçamental. E voltamos ao princípio. Quer dizer, por mais voltas que dermos à imaginação, e por mais inputs que introduzirmos no modelo, o resultado não se altera: a saída da crise passa pela eficiência empresarial e pelos custos unitários de produção. Como diriam os brasileiros, está a chover no molhado. d.amaral@netcabo.pt CÂMARA DE HORRORES Crise económica 2 Variação (%) Emprego PIB 1 0-1 -2-3 2005 06 07 08 09* 10** 11** arrasta desemprego 12 11 10 Desemprego, % pa Zona euro Portugal 9 8 7 6 2005 06 07 08 09* 10** 11** *Estimativas. **Previsões. Em períodos de recessão, há um desfasamento entre a queda do produto e a queda do emprego, por efeito da inércia. Quando chega a retoma, o problema mantém-se, agora por reajustamento da estrutura. É por isso que, em 2010, o PIB já deverá crescer, enquanto o emprego continuar a cair. E assim chegaremos a 646 mil desempregados, 11,5% da população activa - uma loucura. Fontes: Eurostat, Banco de Portugal. O NÚMERO 5,3 mil milhões Em Novembro de 2009 era este o volume do crédito malparado das empresas. Ou seja, o dobro do montante registado um ano antes, em Novembro de 2008, quando atingia 2,7 mil milhóes de euros. Mais grave: segundo os economistas, a tendência promete manter-se nos próximos meses. P10/11

Sexta-feira 22 Janeiro 2010 Diário Económico 3 A FACE VISÍVEL EDITORIAL Nacho Doce/Reuters Miguel Coutinho miguel.coutinho@economico.pt PARAOANO, HÁ MAIS LIEDSON, CLARO Há um tipo de actores que desempenha sempre o mesmo papel. O Fundo Monetário Internacional, quando analisa Portugal, lembra um desses actores canastrões: diz sempre o mesmo, no mesmo tom. Por parecer um disco riscado, haverá a tentação de desvalorizar a mensagem. E pelo teor da conversa, há tendência para tapar os ouvidos. A leitura do relatório do FMI é, de facto, um bocado mal passado: a economia portuguesa não crescerá acima de 1% nos próximos anos; o desemprego tenderá a aumentar; o país está e estará endividado; e a situação em Espanha, nosso principal parceiro comercial, é a cereja estragada em cima do bolo com bolor. Um susto! Qualquer economista lúcido dirá que a solução passa por aumentar substancialmente a receita ou diminuir drasticamente a despesa. Um lúcido em Portugal é um pessimista. E os pessimistas não amam a pátria. Para o ano, o FMI escreve-nos outra vez O único ismo de que padeço não me tem reservado grandes alegrias. Pior: boa parte das minhas perplexidades têm a sua raiz no meu sportinguismo. Esforço-me sinceramente mas não entendo o racional das decisões do clube que supostamente tem os melhores profissionais de gestão. Para ser sincero, não entendo nem as decisões, nem as indecisões. Não atinjo a política de reforços nem a ausência dela; não compreendo a insistência num treinador nem o critério para a escolha de outro. O Sporting tornou-se esquizofrénico e, por isso, não admira o mais recente espectáculo dos balneários. Pode ser que não fique pedra sobre pedra mas, ao menos, que haja bom senso para preservar Liedson, o único activo que mobiliza os sportinguistas. UM LÍDER, RÁPIDO No PSD parece reacender- -se o velho confronto entre bases e barões. O que faz mais falta ao partido: ouvir os militantes, através do voto, ou as personalidades, numa assembleia magna? Oqueparecefazer realmente falta é, como diz a canção, animar amalta.eestaquercoisas simples e básicas. Alguém que mande, por exemplo. E rápido Em defesa do mercado O mercado de capitais tem duas regras basilares: a transparência e a simetria de informação. São pressupostos essenciais para que os accionistas sintam a confiança necessária para investirem as suas poupanças e financiarem as empresas. Se os aforradores se apercebem que há informações que lhes são sonegadas e que há outros accionistas com informação privilegiada, a tendência é para desconfiarem e colocarem o dinheiro noutras paragens. O respeito pelas regras de mercado é ainda mais importante quando estamos a falar de uma OPA, uma operação de mercado onde todos, sem excepção, devem ser tratados de forma igualitária. Por isso é que o P da OPA significa Pública e não Privada. No caso da OPA à Cimpor, a CMVM tem mostrado uma grande intransigência na defesa das regras do mercado: i) quando os brasileiros da CSN fizerem o registo preliminar da OPA, o regulador exigiu mais e maior clareza na informação; ii) quando as notícias davam conta de negociações para a Camargo comprar a posição que a Lafarge tem na Cimpor, a CMVM obrigou os franceses a desfazerem as suspeitas; iii) quando a Camargo fez uma proposta da fusão, a entidade presidida por Carlos Tavares obrigou-a a protelar a decisãooualançarumaopa concorrente; e finalmente, iv) quando a Caixa, um banco público, disse que foi abordada para estabelecer um acordo quepromovesseaestabilidade accionista, o polícia dos mercados desencadeou um processo de averiguações. Só assim, com esta atitude de defesa dos mercados, é que os milhares de pequenos accionistas da Cimpor, que têm mais de 18% do capital, se sentem tratados de forma equitativa face à meia dúzia de grandes accionistas com assento no board da empresaecomacessoainformação mais privilegiada. PUB

4 Diário Económico Sexta-feira 22 Janeiro 2010 DESTAQUE DESTAQUE ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2010 OCALENDÁRIODAAPRESENTAÇÃODAPROPOSTADOOE/2010 O Governo vai reunir na próxima segunda-feira com os vários grupos parlamentares para apresentar as orientações da Proposta de Orçamento do Estado para 2010 (OE/10). As reuniões terão lugar na Assembleia da República e vai contar com o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos e dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão. Os encontros têm início às 09h00 com os Verdes, seguindo-se o PCP às 09h45 e o Bloco de Esquerda às 10h30. A partir das 11h45 é a vez do CDS, principal parceiro do Governo na negociação do OE/10. Por último, às 12h00, será ouvido o partido de Manuela Ferreira Leite. CDS-PPquerprovarqueémelhor Reuniões entre o Governo e o CDS prolongaram-se e já deram frutos. Próximo encontro é o de José Margarida Peixoto margarida.peixoto@economico.pt CUSTO 443 milhões É o custo para este ano das propostas já apresentadas pelo CDS para viabilizar o Orçamento do Estado para 2010. Depois do PSD ter regressado às contas da aprovação do Orçamento do Estado, o CDS reuniuse ontem pela quarta vez com o Governo, frisando que as negociações vão no bom caminho e que até já estão a dar os primeiros frutos, prevendo fechar as negociações durante a noite passada. A ordem de trabalhos dos populares previa o debate de cinco temas antes de ser apresentada a proposta de Orçamento do Estado à Assembleia da República: impostos, saúde, segurança, pensões e rendimento mínimo e agricultura. O último encontro seria guardado para rever as matérias mais importantes e chegar a uma conclusão. A expectativa do CDS era que a reunião de ontem fosse a última. Quando chegou ao Ministério das Finanças, o tom do vice-presidentedocdseradeoptimismo. Luís Queiró já tinha sublinhado que o CDS está determinado em provar que é possível governar melhor em maioria relativa do que absoluta, dando como exemplo o acordo a que os partidos chegaram para a redução dos prazos de reembolso do IVA. Em Julho as empresas vão passar a receber o IVA ao fim de 60 dias, em vez dos actuais 90 dias. Isto mostra a importância de trabalhar em equipa, frisou Luís Queiró. A proposta inicial do CDS era reduzir o prazo para 30 dias, mas a cedência não significa descaracterizar os partidos. O reparo serve como uma luva de resposta às observações de Manuela Ferreira Leite, no dia anterior, à saída do encontro com o Governo que recolocou o partido nas negociações do Orçamento. A líder sublinhou que para ela o essencial não é discutir as medidas A ou B uma estratégia que tem sido seguida pelo CDS e de que o maior partido da oposição se tem tentado distanciar, evitando situações em que seria obrigado a ceder em algumas iniciativas, para atingir os restantes objectivos. Ferreira Leite preferiu pedir uma audiência ao primeiro-ministro marcada para amanhã de forma obter garantias de que o Orçamento terá como linha orientadora a redução do endividamento do país. Até ter o documento final em mãos o PSD não decide o seu sentido de voto. Emboratudoindiquequeoterrenoestáaserpreparadoparaa abstenção. Entretanto, e para jogar pelo seguro, o Executivo tem sublinhado a importância de chegar a um acordo alargado: Neste momento esse processo de diálogo comospartidoscontinuaeoque podemos dizer é que [o Governo] está esperançado em que produza condições que permitam a viabilidade do Orçamento e das políticas governativas, como é essencial para que o país enfrente as suas dificuldades, disse ontem Pedro Silva Pereira, ministro da Presidência, no final do Conselho de Ministros onde ficou marcado um encontro extraordinário para segunda-feira, para a aprovação do Orçamento do Estado. Com o CDS o Governo já conseguiu desbloquear a maior parte das questões-chave. A lei das Finanças Regionais matéria em que o Governo não quer mexer

Sexta-feira 22 Janeiro 2010 Diário Económico 5 PONTOS-CHAVE O CDS reuniu ontem à noite com o Governo. Os populares chegaram ao Ministério das Finanças com a ideia de que do encontro poderia sair um acordo. Ferreira Leite vai ser recebida no sábado de manhã pelo primeiro-ministro. A líder do PSD quer ouvir de Sócrates garantias de que o Orçamento terá o que ela quer. As contas das autarquias e regiões autónomas ameaçam fechar o ano de 2009 com um défice elevado. O Governo previa um saldo positivo. Paulo Alexandre Coelho Ferreira Leite quer garantias da boca de Sócrates governar em minoria Sócrates com Manuela Ferreira Leite já amanhã. nãoécavalodebatalhadocdse por isso o PS conseguiu acordo para adiar a votação das alterações, evitando que o PSD as aprovasse esta semana. Os prazos de reembolso do IVA já estão resolvidos e a introdução dos juros de mora sempre que o Estado se atrasar a fazer pagamentos também estará perto do consenso, apurou o Diário Económico. Em aberto está ainda a definição do novo montante do pagamento especial por conta que será reduzido e não suspenso, como inicialmente o CDS pedia e as matérias de desemprego e pensões, que implicam, por exemplo, um aumento de 10 euros para os reformados com pensões mais baixas e uma alteração no rendimento social de inserção para compensar o aumento de despesa que daí decorra. Soares diz que é tempo de acordos Já foram feitos acordos interessantes, a situação dos sindicatos deixou de estar crispada, os professores entenderam-se com a ministra, isso foi uma coisaboa.logo,se deixou de haver essa tensão é por aí que devemos caminhar. Oantigopresidente da República Mário Soares mostrou-se ontem convicto de que o Orçamento do Estado para 2010 vai passar e que Mário Soares defende acordo no OE, seja à direita ou à equerda. haverá um acordo possível entre as várias forças políticas. Soares olha com bons olhos para todososacordos,sejacom quem for, com a direita e com a esquerda. O que me interessa é que o Orçamento possa passar porque seria péssimo para Portugal se tivermos de entrar noutras eleições porque o Orçamento não passou e ficar a governar em duodécimos, afirmou Mário Soares. Líder do PSD vai reunir com primeiro ministro amanhã. Catarina Madeira catarina.madeira@economico.pt A audiência, pedida por Manuela Ferreira Leite, depois de mais uma ronda de conversações com o Governo, na quarta-feira, foi marcada para amanhã às 11 horas da manhã. Numa altura em que as negociações começam a correr contra o tempo e a entrega do Orçamento marcada para a próxima terça-feira se aproxima, a líder do PSD quer ouvir da boca do primeiro-ministro as garantias de que o Governo vai levar a cabo um plano para pôr termo ao aumento da dívida externa e para reduzir o défice. O líder parlamentar do PS, Francisco Assis apressou-se a considerar positiva a iniciativa de Ferreira Leite. Cada um segue o caminho que considera mais adequado, eu vejo como algo positivo essa vontade da líder do maior partido da oposição de conversar com o primeiro-ministro em relação a uma questão tão importante como o Orçamento de Estado, afirmou ontem o líder parlamentar do PS. Dentro do partido e junto da direcção do PSD a ideia que vigoraéadequeavotação está em aberto, dependendo ainda da conversa que Ferreira Leite terá com José Sócrates e do documento em si. Ter o Orçamento nas mão é muito diferente das declarações públicas do ministro das Finanças, explica o deputado madeirense Guilherme Silva. No entanto, responsabilidade é uma qualidade que Aguiar-Branco não se cansa dechamarasieaopsd.ainda ontem, à saída do plenário, o líder parlamentar invocou o interesse nacional e o sentido de Estado que as negociações em curso exigem. Aguiar-Branco acrescentou ainda que a estratégia do partido é absolutamente consensual na bancada, com os parlamentares a continuarem a ser uma referência de unidade. Uma ideia que, segundo o líder parlamentar, ficou bem visível no final da reunião semanal do grupo parlamentar do PSD. Negociar o Orçamento do Estado é uma coisa, discutir a lei da Finanças Regionais é outra completamente diferente. Guliherme Silva, deputado do PSD, dizqueaquestão das finanças regionais regionais foi artificialmente montada pelo PS. PS e PSD sabem disso, garante Guilherme Silva, apesar de se ter instalado a ideia de que o maior partido da oposição fazia depender a viabilização do Orçamento da revisão desta legislação. Essa foi uma questão artificialmente montada pelo Governo e pelo PS, arrastar esse debate para a questão orçamental, aponta o deputado do círculo eleitoral da Madeira. AS PRIORIDADES DO PSD Inverter a trajectória de crescimento galopante do endividamento externo. Corrigir a trajectória de desequilíbrio insustentável nas contas públicas. Conferir uma total transparência no que respeita às contas públicas.

6 Diário Económico Sexta-feira 22 Janeiro 2010 DESTAQUE DESTAQUE ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2010 Contas das autarquias e regiões em derrapagem O aumento do número de desempregados tem motivado a oposição a avançar com alterações ao subsídio de desemprego. O endividamento do poder local e regional somava 718 milhões de euros em Novembro. O Governo espera para 2009 um excedente. Marta Moitinho Oliveira marta.oliviera@economico.pt As contas das autarquias e regiões autónomas deverão ter fechado o ano de 2009 com uma forte derrapagem face ao ano anterior, bem como em relação ao previsto pelo Executivo. O descontrolo das contas deste sector coloca o défice do Sector Público Administrativo mais perto dos 9% do PIB. Os dados divulgados ontem no Boletim Estatístico do Banco de Portugal indicam que entrejaneiroenovembroasautarquias e as regiões autónomas dos Açores e da Madeira se endividaram em 718 milhões de euros, um valor 43% acima do défice de há um ano. O indicador fornecido pelo banco central dá uma ideia muito aproximada do que poderá vir a ser o saldo final das contas das autarquias e regiões, já que o banco recolhe os dados sobre o crédito líquido (ou seja, descontadas as amortizações de empréstimos). Assim sendo, este agravamento coloca em perigo a previsão do Executivo. Isto porque, o Ministério das Finanças contava que no conjunto de 2009 o sector regional e local apresentasse um saldo positivo nas contas de 41,6 milhões de euros, seguindo a tendência que aconteceu nos anos mais recentes. E era preciso que as câmaras e as regiões fizessem uma elevada amortização em Dezembro para que aquele valor regressasse a um saldo positivo. CES defende mais apoios sociais O Conselho Económico e Social (CES) defende o alargamento dos apoios sociais em vigor e diz que a situação social deverá mesmo piorar em 2010, é referido no parecer ontem divulgado sobre as Grandes Opções do Plano (GOP) para 2010-2013. Na análise, o CES, quecriticafortementeo documento, desde a forma ao conteúdo, faz várias recomendações ao Governo, concluindo que o Executivo deve preparar programas de médio prazo, com os respectivos encargos, que dêem substância àquilo que considerar realmente prioritário. Entre as recomendações, além do alargamento das medidas de apoio social em vigor, o CES diz que é fundamental que as medidas anti-crise sejam AUTARQUASEREGIÕES 718 milhões de euros Os dados do Banco de Portugal indicam que as autarquias pediram mais 43% que há um ano atrás. DÉFICE DO ESTADO 8,3% a 8,6% Os dados da Direcção-Geral do Orçamento indicam que o défice terá fechado ao ano nestes valores. A derrapagem das contas das autarquias e regiões até Novembro carrega aquele défice em mais 0,4%. avaliadas, reformuladas, quando necessário, e reforçadas. Deve ainda ponderar antes e depois de atribuir os investimentos públicos. Esta análise deve ser realizada tanto na componente de investimento como de exploração, mediante a consideração e avaliação de todos os seus diferentes efeitos, diz o CES. O conselho defende ainda que sejam tomadas medidas no sentido da consolidação das finanças públicas mas considera desaconselhável terminar prematuramente com as medidas de apoio à actividade económica e ao emprego que foram instituídas para combater os impactes da crise internacional. Entre as medidas anti-crise a manter, o CES destaca os apoios às pequenas e medias empresas. Este deslize nas contas do poder local e regional representa cerca de 0,4% do PIB a somar ao défice do Estado. De acordo com os dados do Boletim de Execução Orçamental divulgado na quarta-feira pela Direcção-Geral do Orçamento, o défice na óptica da contabilidade pública (de caixa) fecha o ano entre os 8,3% e os 8,6%. Se o endividamento das autarquias terminar o ano num valor próximo do que já acumula em Novembro, o défice atirase então para 8,7% a 9%. No entanto,estenãoéovalorem contabilidade nacional, o que interessa nas comparações europeias e que regista os compromissos passados e futuros. O agravamento da situação fica a dever-se mais às autarquias do que às regiões. É que nos primeiros 11 meses do ano, as autarquias financiaram-se em 554 milhões, o que compara com um endividamento de 36 milhões um ano antes. Já as regiões pediram 165 milhões, menos que os 465 milhões pedidosháumano. Nos últimos anos as autarquias têm apresentado contas controladas. Isto depois de em 2001 o governo de Sócrates ter sido surpreendido com uma derrapagem das contas das câmaras, que ultrapassaram os limites do endividamento em ano de eleições. A situação parece ser em tudo idêntica ao que se arrisca a ter acontecido em 2009, também ano de ida às urnas no poder local. Educação foi o ministério que mais gastou Contenção foi a palavra de ordem do ministro Teixeira dos Santos junto dos restantes ministros durante o ano passado. O ministério das Finanças conseguiu reduzir a despesas global dos 15 ministérios. As contas partem da estimativa de despesas para os ministérios inscritas no primeiro orçamento de Estado para 2009 e a respectiva execução, agora anunciada pela Praça do Comércio. Mas nem todos os ministros conseguiram conter a despesas e a Educação, Administração Interna e Defesa Nacional conseguiram ainda gastar mais que o previsto. Já os que gastaram abaixo do previsto foram agricultura, ambiente e obras públicas. Nestes casos, os ministros usaram 83%, 87% e 88% das verbas previstos no início ano, respectivamente. A.A., L.R.P. Linha de crédito para técnicos de contas A Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas quer uma linha de crédito de apoio aos técnicos oficiais de contas para ajuda na adaptação ao Sistema de Normalização Contabilística no âmbito do Orçamento do Estado para este ano (OE/10). A proposta foi ontem entregue ao secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Sérgio Vasques. O presidente da OTOC, Domingues Azevedo, quer uma linha de cerca de 420 mil euros para ajuda na compra de hardware, software e para formação profissional. O responsável estima que a medida ajude 20 mil técnicos, com um montante de 21 mil euros cada. A proposta prevê que o montante seja reembolsável em 50% do valor a quatro anos. P.C.S Debate O PS esperava ontem o desfecho das negociações para saber como votar as propostas de hoje. Cristina Oliveira da Silva e Margarida Peixoto cristina.silva@economico.pt Os socialistas ainda não sabiam ontem, ao final da tarde, como iriam votar as propostas de alteração ao subsídio de desemprego, que a oposição discute hoje no Parlamento. Em declarações ao Diário Económico, o deputado socialista Jorge Strecht disse que esperava o desfecho das reuniões entreogovernoeospartidospara decidir o seu sentido de voto. Em causa estão as propostas do CDS-PP, Bloco de Esquerda e PCP que, a serem aprovadas, ainda terão de ser discutidas na especialidade.deforaficaaproposta do PSD, que acabou por ser retirada por o grupo considerar queogovernojáteve umainiciativa igual à que o PSD tinha em cima da mesa. Trata-se do alargamento do subsídio social de desemprego em seis meses. Mas

Sexta-feira 22 Janeiro 2010 Diário Económico 7 Paulo Alexandre Coelho Risco da dívida volta a subir Os investidores internacionais estão a exigir mais juros. Eudora Ribeiro eudora.ribeiro@economico.pt sobre desemprego preso pelo OE para o Bloco, esta opção do PSD vai no sentido dos acordos já perfilados com o Governo para o Orçamento de Estado. Apesar de o Governo ter reunido apenas com o CDS-PP ontem, Jorge Strecht escusou-se a comentar o sentido de voto dos socialistas em relação às restantes propostas. Imagine que o Governo aceita esta despesa como razoável, disse o deputado. Nesse caso, acrescentou, não faz sentido que o partido que suporta o Governo rejeite a discussão das alterações. Além disso, salientou Jorge Strecht, é preciso saber quais as contrapartidas de cada partido. Mas as dúvidas sobre o sentido de voto não eram, ontem, exclusivas do PS. O PCP não quis comentar enquanto o Bloco de Esquerda apenas garantiu que aprovariaasuapropostaeado PCP. Em relação ao projecto do CDS, estava tudo em aberto. Já o PSD, em princípio, votará favoravelmente o projecto do CDS e contra os do PCP e Bloco. Mas a decisão não era final. O deputado Jorge Strecht explicou que o sentido de voto da bancada socialista será decidido em função das negociações entre Governo e oposição. Não contem com o Governo para aprovar medidas que colocariam em causa a sustentabilidade das contas públicas, disse a ministra Helena André. Propostas custam mais de 800 milhões de euros Se o Governo dissesse sim a todas as propostas de alteração das regras do subsídio de desemprego, os cofres do Estado ficariam desfalcados em mais 800 milhões de euros. Esta foi a estimativa feita peloexecutivo,nahoradeponderar as sugestões da oposição. As medidas apresentadas pelo PCP são as mais caras e chegam a 381 milhões de euros. As iniciativas avançadas pelos vários partidos foram todas agregadas na conferência de líderes desta semana e estarão hoje mesmo em debate na Assembleia da República. Entretanto, o assunto também tem vindo a ser debatido entre o ministro das Finanças e a oposição de direita, no âmbito das negociações prévias à apresentação da proposta de Orçamento do Estado para este ano. Teixeira dos Santos já comunicou aos partidos que as contas públicas não comportam a adopção de muitas das propostas. Contudo, o Diário Económico sabe que o Governo está aberto a negociar algumas das propostas apresentadas. Sinal disso mesmo foiapresençadoprimeiro-ministro, José Sócrates, na sessão de debate da interpelação do CDS ao Governo, sobre desemprego. Helena André também recordou aí queestáaserestudadaacriação de um apoio no desemprego para pequenos empresários. As medidas que forem aceites serão consideradas no Orçamento do Estado, cuja linha orientadora terá de ser de contenção das despesas. Por um lado, o próprio ministro das Finanças já disse que quer reduzir o défice orçamental já este ano. Por outro lado, esta é a única forma de viabilizar o Orçamento junto do maior partido da oposição uma meta que poderá não ser indispensável caso oacordosejafechadocomo CDS, mas que seria vista como um sinal de estabilidade pelas instituições internacionais. Quanto às outras medidas, o Governo está convicto de que os partidos não vão chegar a acordo e de que acabarão por nunca chegar a votação final global. A percepção de risco por parte dos investidores em relação à dívida pública portuguesa continua a aumentar e ontem os CDS sobre Obrigações do Tesouro a cinco anos subiram para máximos de Fevereiro do ano passado. No dia seguinte ao IGCP ter realizado uma nova emissão de bilhetes do tesouro, no valor de 1.250 milhões de euros, com a taxa média ponderada mais elevada desde Junho último e uma procura que mais do que duplicou a oferta, os investidores voltaram a dar sinais de alerta em relação à dívida nacional. O spread das obrigações portuguesas a 10 anos, que é o prémio que os investidores cobram para comprarem dívida portuguesa em vez das obrigações alemãs, que são a referência no mercado, subiu ontem para 109 pontos, o valor mais elevado desde Maio do ano passado. Também os CDS, uma espéciedeseguroparaocasodeo Estado português entrar em incumprimento, estiveram a negociar nos 147 pontos, o valor mais elevado desde Fevereiro do ano passado. Isto significa que, por cada 10 milhões de euros investidos em obrigações portuguesas, o investidor tem de pagar anualmente um seguro de 147 mil euros. Mas os CDS gregos estão a negociar a mais do dobro do preço dos portugueses, nos 349,75 pontos, e o spread face às bunds alemãs está nos 311 pontos base, um novo recorde na época do euro. CDS SUPERAM 140 PONTOS Evolução dos credit default swaps sobre Obrigações do Tesouro a 5 anos. 150 120 90 60 30 0 21 Dez 09 Fonte: Bloomberg. 21 Jan 2010

8 Diário Económico Sexta-feira 22 Janeiro 2010 DESTAQUE ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2010 Jo\ao Paulo Dias Governo reforça apoios sociais O Governo quer apoiar as famílias em altura de crise, quando o desemprego bate máximos. O Orçamento para 2010 vai ter reforço do combate ao desemprego e da protecção social. Cristina Oliveira da Silva cristina.silva@economico.pt O desemprego vai continuar a ser ocavalodebatalhadogoverno este ano e já obrigou o Executivo a rever as medidas de apoio ao emprego, a reforçar os apoios sociais às famílias e até a avançar com uma alteração ao subsídio de desemprego. Ainda assim, medidas insuficientes para reunir o apoio da oposição. As propostas para alargar as prestações de desemprego sucedem-se no Parlamento mas contaram sempre com a rejeição do Governo. Hoje, serão votadas iniciativas do Bloco de Esquerda, PCP e CDS-PP. Mas ainda esta semana a ministra do Trabalho voltou a frisar, no Parlamento, que o nível de protecção social do subsídioéelevado.edeixoudeparte um conjunto de propostas do CDS, nomeadamente o alargamento da prestação no caso de casais desempregados. Para Helena André, não há razões para novas medidas. Este ano, pela primeira vez desdeoiníciodacrise,edepois de críticas cerradas de alguns quadrantes da sociedade, o Governo anunciou o alargamento da principal prestação de desemprego. Assim, em 2010, édeesperararedução, em três meses, do número de meses de trabalho necessários para ter a prestação. A medida já foi anunciada e constará do próximo Orçamento. ParaosociólogoPedroAdãoe Silva, o aumento do subsídio de desemprego reclamado pela oposição colocaria uma pressão orçamental muito grande e também não é aí que reside a principal questão. O problema está no grupo de pessoas que acabam o subsídio de desemprego ou que nem sequer têm direito à prestação, avança o especialista. Para estas pessoas, o Governo reforçou os estágios comparticipados (ver caixa). Esta medida integra um pacote de iniciativas de combate à crise que, apesar de terem sido criadas em 2009, serão reforçadas este ano. Também aqui se inclui o alargamento do subsídio social de desemprego, destinado a agregados mais pobres. Apoios sociais reforçados em 2010 OprogramadeGovernodoPS anunciava o reforço dos apoios sociais às famílias, nomeadamente a criação do imposto negativo, ou seja, a criação de um subsídio para famílias trabalhadores e com filhos, que vivam abaixo do limiar de pobreza. As Grandes Opções do Plano 2010-2013 tambémespelhamas intenções apresentadas pelo socialistas, que prometeram reforçar, durante a legislatura os abonos das famílias monoparentais e aumentar extraordinariamente a prestação para agregados com dois ou mais filhos. Prevê ainda a criação de uma conta Poupança-Futuro, a atribuir por altura de cada nascimentoeoreforçodosapoiosaoutros grupos frágeis, nomeadamente idosos e deficientes. Oquevai marcar o Orçamento: Prestações Para Pedro Adão e Silva, o problema não passa pelo nível de subsídio de desemprego existente mas antes pelas pessoas que não têm acesso à prestação. O QUE SE ESPERA DO ORÇAMENTO 1. Salário mínimo aumenta para 475 euros em 2010 O Governo voltou a forçar a subida do salário mínimo este ano, fixandoo em 475 euros. Este valor não tem relevância directa nas contas do Estado (uma vez que já não se relaciona com o aumento das pensões ou das prestações sociais) mas é um contributo para combater a pobreza. Quem não gostou da medida foram as empresas, que temem que este aumento de custos resulte no encerramento de empresas. 2. Medidas anti-crise prolongadas por mais um ano Os apoios criados o ano passado para apoiar a manutenção de emprego e a contratação de públicos frágeis vai ser continuada este ano. Algumas das medidas tiveram uma execução manifestamente fraca e obrigou o Governo a reavaliar a sua implementação. Jovens e desempregados de longa duração continuam a ser prioridade e o Governo alarga os apoios a contratações a prazo. 3. Governo afasta alargamento ao subsídio de desemprego Depois do alargamento do subsídio social de desemprego e da alteração prometida à prestação principal, o Governo afasta novas mudanças ao regime em vigor. A oposição já avançou com uma série de iniciativas nesse sentido mas nenhuma recolheu o apoio do Executivo. Esta semana, a ministra do Trabalho afastou as iniciativas do CDS, dizendo que não são necessárias novas medidas. 4. Novo apoio para famílias abaixo do limiar de pobreza OprogramadeacçãodoPSaponta para a criação, durante a legislatura, de uma prestação social para famílias trabalhadoras com filhos, que vivam abaixo do limiar de pobreza. Os socialistas também querem garantir que nenhuma pessoa com deficiência fique abaixo do limiar de pobreza e avançam aqui um apoio semelhante. A inserção profissional de beneficiários do Rendimento Social de Inserção também é uma prioridade. 5. Reforçar abonos de família e prestações para idosos Na legislatura, o Governo quer reforçar o abono para famílias monoparentaiseaaumentaraprestação para famílias com dois ou mais filhos. Prevê o reforço do complemento solidário para idosos e da protecção social de trabalhadores com carreiras mais longas. Também dá prioridade ao melhoramento do regime de acumulação de prestações de deficiência com rendimentosdetrabalho.

PUB

10 Diário Económico Sexta-feira 22 Janeiro 2010 ECONOMIA PS quer acesso mais fácil ao Porta 65 Jovem O grupo parlamentar do PS apresentou ontem um projecto de resolução com o objectivo de alterar as regras do programa ao apoio ao arrendamento jovem - Porta 65 Jovem, com o objectivo de facilitar o acesso dos jovens a este apoio. As alterações agora propostas pelo PS vão de encontro às mudanças anunciadas pelo Ministério do Ambiente e que o Diário Económico noticiou a 29 de Dezembro. O objectivo das novas regras é aumentar o número de jovens apoiados e fomentar a mobilidade. ANTÓNIO SARAIVA TOMOU ONTEM POSSE COMO PRESIDENTE DA CONFEDERAÇÃO DA INDÚSTRIA PORTUGUESA António Saraiva tomou ontem posse como presidente da Confederação da Indústria Portuguesa (CIP) para o triénio 2010-2012. O sucessor do patrão dos patrões Francisco Van Zeller propõe a criação de uma estrutura associativa empresarial que junte todas as confederações patronais em pé de igualdade e critica a sobranceria e arrogância com que a CEP surgiu. A proposta de Saraiva passa por impedir que a CEP (entidade resultante da fusão da AEP e AIP) se assuma como a cúpula dos patrões e pretende que todas as confederações fiquem ao mesmo nível. Recorde-se que a candidatura de António Saraiva foi apoiada pela antiga direcção da CIP, tendo o novo presidente sido eleito a 7 de Janeiro com 90%dos votos. Malparado das empresas duplicou Incumprimento à banca soma já mais de 5,3 mil milhões de euros. Famílias também continuam com Luís Reis Pires luis.pires@economico.pt Um ano foi o suficiente para as empresas nacionais duplicarem o nível de incumprimento à banca. Entre Novembro de 2008 e Novembro de 2009, o crédito malparado das empresas passou de quase 2,7 mil milhões de euros, para mais de 5,3 mil milhões. As famílias também continuam a ter dificuldades para pagar as suas dívidas. Uma tendência que promete manter-se durante os próximos meses, dizem os economistas. No penúltimo mês do ano passado, mostram os dados do Banco de Portugal, o montante que as empresas não conseguem PALAVRA-CHAVE Malparado O crédito malparado representa empréstimos cuja incobrabilidade é quase total. Há várias razões para o crédito se considerar malparado. Por exemplo, o crédito em causa estar em mora há mais de seis meses. Ou todos os créditos do cliente titular desse empréstimo estarem em mora há mais de 24 meses. pagar à banca ascendeu a mais de 5,3 mil milhões de euros. Um valor que significa um acréscimo de pouco mais de 98% face a igual período de 2008. Mais: representa quase 5% do total dos empréstimos às sociedades não financeiras. A evolução [dos níveis de incumprimento das empresas] não é favorável, reconhece Teresa Gil Pinheiro, economista do BPI, segundo a qual é possível que esta tendência se mantenha durante algum tempo, apesar do pior já se ter verificado. O crédito concedido pelas instituições financeiras às empresas, esse, continua a crescer num ritmo muito lento. Em Novembro,osempréstimosàsem- presas totalizaram pouco mais de 118 mil milhões de euros. O querepresentaumcrescimento de pouco menos de 0,6% face aomêsdeoutubroede5,8% em termos homólogos. A justificação para o fraco ritmo de crescimento dos empréstimos continua a residir em duas vertentes. Por um lado, explica Teresa Gil Pinheiro, reflecte o facto da banca estar mais restritiva na concessão de crédito. Além disso, reflecte também alguma incerteza das empresas, que ainda não se sentem confortáveis para investir e contratar, dispensando o recurso ao financiamento bancário. Uma situação que deverá durar até que se concretizem os sinais de melhoria económica que têm surgido desde o final do ano passado. Famílias continuam a endividarse junto da banca Não são só as empresas que têm dificuldades para cumprir com as suas obrigações. O crédito malparado das famílias ascendeu aos 3,8 mil milhões de euros emnovembro,umaumentode 1,3% face a Outubro e de 26% face ao período homólogo. O facto do incumprimento aumentar não surpreende Natália Nunes, coordenadora do Gabinete de Apoio ao EndividamentodaDECO(verentrevista ao lado). Há cada vez mais famílias em dificuldades, diz,

Sexta-feira 22 Janeiro 2010 Diário Económico 11 EURO face ao dólar PETRÓLEO valor em dólares TAXA EURIBOR a seis meses AGENDA DO DIA São publicados os indicadores de conjuntura do Banco de Portugal 1,4097 74,61 0,968 Eurostat divulga novas encomendas à indústria registadas em Novembro Paula Nunes TRÊS PERGUNTAS A... MALPARADO DISTRIBUÍDO POR TIPO DE CRÉDITO 1,1 mil milhões CONSUMO 826 milhões OUTROS FINS num ano dificuldades para pagar os empréstimos. O crédito malparado das famílias ascendeu aos 3,8 mil milhões de euros em Novembro. com perdas de rendimento provocadas por situações de desemprego ou extinção de horas extraordinárias. Nesses casos, conta, muitas vezes o primeiro que as pessoas fazem é recorrer ao cartão de crédito. A grande maioria das famílias que recorre à DECO, por exemplo, já se encontra em situação de incumprimento. O ritmo de crescimento dos empréstimos às famílias, por seu lado, continua a desacelerar. Em Novembro, os empréstimos totalizavam cerca de 137 mil milhões de euros. O que representa um crescimentode0,4%faceaoutubro edeapenas2,8%emtermos homólogos. NATÁLIA NUNES Coordenadora do Gabinete de Apoio ao Endividamento da DECO É expectável que o malparado continue a subir em 2010 Natália Nunes não se mostra surpreendida com a subida do malparado das famílias nacionais, dados os problemas de desemprego e de perda de rendimentos que se verificam há mais de um ano. A maioria das famílias que recorrem à DECO, diz, já o fazem em situação de incumprimento. O malparado das famílias continua a subir... O facto de ter aumentado, infelizmente, não é surpreendente, porque cada vez há mais pessoas em dificuldades. Em 2009 houve um grande aumento do número de famílias em dificuldades, por causa de perdas de rendimentos relacionadas com desemprego e extinção de horas extraordinárias. Nesses casos, muitas vezes, a primeira coisa que fazem é recorrer ao cartão de crédito. A maior parte das famílias, quando recorreàdeco,jáestáem incumprimento. É expectável que o malparado continue a subir? Sim, tendo em conta que a principalcausaéadiminuiçãode rendimentos provocada pelo desemprego, é expectável que o malparado continue a subir durante2010.atéporqueas pessoas continuam a endividarse, a recorrer ao cartão de crédito. Mas a banca concede cada vez menos empréstimos... Sim, mais o mais importante é que se conceda cada vez mais crédito de forma responsável. Os bancos têm que olhar para a taxa de esforço de um cliente candidato ao crédito. E não é isso que acontece. Os bancos olham só para se a família tem rendimentos e para a informação disponível na central de responsabilidade de crédito do Banco de Portugal. Isso não é suficiente. E haver menos crédito não quer dizer que ele esteja a ser concedido de forma responsável. O incumprimento no crédito ao consumo continua a subir, dada a facilidade com que as famílias com perdas de rendimentos utilizam o cartão de crédito para conseguir ir fazendo as suas compras. Em Novembro, o total do crédito ao consumo somava 15,6 mil milhões de euros. Desses, quase 1,1 mil milhões representam crédito de cobrança duvidosa. HABITAÇÃO 1,5 mil milhões CONSTRUÇÃO As empresas de construção civil são das que estão com mais dificuldades para pagar as suas dívidas. O crédito malparado das sociedades não financeiras, com origem na construção, ascendia em Novembro a pouco mais de 1,5 mil milhões de euros. O total dos empréstimos somava 22,9 mil milhões. Pior só mesmo as empresas do ramo imobiliário, o sector com maior nível de incumprimento face à banca. O crédito malparado no ramo imobiliário somou mais de 1,5 mil milhões de euros no penúltimo mês do ano passado. O total de crédito concedido ao sector atingiu os 41,9 mil milhões. Os empréstimos aos particulares, com outros fins que não habitação e consumo, totalizam já 12,4milmilhõesdeeuros-cerca de 9% do total do crédito concedido às famílias nacionais. O nível de incumprimento neste tipo de empréstimos atingiu, em Novembro, 826 milhões de euros. O ritmo de incumprimento está a acelerar. 1,9 mil milhões O crédito à habitação representa a esmagadora maioria - perto de 80% - dos empréstimos da banca a particulares. E é também no crédito à habitação que se regista o maior nível de incumprimento das famílias nacionais. Do total de empréstimos à habitação, o montante que as famílias não conseguem pagar à banca atingiu 1,9 mil milhões de euros nos mês de Novembro. 108 mil milhões DEPÓSITOS Os depósitos das família nacionais na banca continuaram a subir em Novembro, para pouco mais de 108 mil milhões de euros. Os depósitos na banca estiveram a recuar durante boa parte do ano passado, mas em Outubro voltaram a subir, mantendo a tendência no penúltimo mês do ano. A diferença face ao período homólogo, porém, não vai além dos dois mil milhões.

12 Diário Económico Sexta-feira 22 Janeiro 2010 ECONOMIA ANDORRA Foi celebrado acordo de troca de informação fiscal com Portugal No seguimento do compromisso político assumido por Andorra de troca de informação fiscal que motivou a sua exclusão da lista de jurisdições não cooperantes definida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), foi assinado recentemente um acordo para troca de informações de natureza fiscal com Portugal. Estes acordos bilaterais visam implementar os padrões de transparência e troca de informação em matéria fiscal definidos pela OCDE. A Finlândia alterou a tributação dos desportistas e artistas não residentes. FINLÂNDIA Alterada a tributação dos desportistas e artistas não residentes No seguimento da notificação recebida da Comissão Europeia, a Finlândia alterou recentemente a sua legislação no que respeita à tributação dos artistas e desportistas não residentes, a qual entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2010. O regime fiscal aplicável aos artistas e desportistas não residentes foi equiparado ao aplicável aos residentes, passando a ser possível a dedução das despesas relacionadas com a obtenção dos rendimentos. Mantém-se, contudo, a taxa de 15% de retenção na fonte. Novidades em sede de preços de transferência: Orientações da OCDE Paula Nunes Todas as casa vendidas depois de 2003 têm de ser avaliadas pelas Finanças. As Orientações da OCDE em sede de preços de transferência têm sido monitorizadas e actualizadas com alguma frequência, datando a última actualização do ano de 2009. A referida revisão, para além de contemplar alterações efectivas no seu Capítulo IV (Medidas administrativas para mitigar ou resolver os diferendos de preços de transferência), abre a discussão (até Janeiro de 2010) relativamente a alterações significativas propostas na estrutura dos Capítulos I, II e III. Relativamente às alterações já em vigor no Capítulo IV, e que visam reflectir as novas orientações introduzidas na Convenção Modelo da OCDE, importa fazer especial referência, entre outros, ao alargamento do âmbito dos procedimentos amigáveis e delimitação dos prazos a estes associados, à imposição de um prazo às autoridades competentes para a resolução de conflitos, à maior importância dada pelas autoridades fiscais aos ajustamentos e à esquematização dos acordos prévios de preços de transferência. Já no que respeita às alterações propostas nos Capítulos I a III, estas revelam-se mais estruturantes e demonstram uma maior aproximação à realidade actual. Neste âmbito, destacam-se como principais alterações (para discussão) a nova hierarquia dos métodos de preços de transferência easistematização das análises de comparabilidade a efectuar em sede de preços de transferência. Consultório fiscal As novidades reflectem sobretudo alterações às Orientações da OCDE, com vista a uma maior adaptabilidade das mesmas à realidade das transacções vinculadas que se verificam actualmente. No que respeita aos métodos em concreto, é sugerida a aplicação do método mais apropriado, e no que concerne aos métodos transaccionais, apresentam-se exemplos práticos da sua aplicabilidade. Quanto à sistematização das diferentes fases das análises de comparabilidade, são sugeridos dez passos a seguir para a sua concretização, sendo dado relevo aos assuntos mais sensíveis e passíveis de um maior escrutínio por parte das Autoridades Fiscais, nomeadamente no que respeita a ajustamentos efectuados e à aplicação de outliers estatísticos. Por fim, importa realçar que estas alterações visam contribuir para uma maior adaptabilidade das Orientações da OCDE à realidade actual das transacções vinculadas, e consequentemente às respectivas análises de preços de transferência, agregando os vários anos de experiência acumulada nesta matéria, tendo em conta as dificuldades com que muitos agentes económicos se deparam nas análises que desenvolvem, quer ao nível da informação disponível (por vezes escassa), quer no que respeita à própria racionalidade económico-financeira que lhe está subjacente. www.kpmg.pt Os prédios vendidos são sempre avaliados pelas finanças. Se o proprietário não concordar pode reclamar. Recebi a notificação relativamente à avaliação do meu imóvel e estou em desacordo com o valor patrimonial determinado. Como poderei reagir? Com a entrada em vigor do Código do Imposto Municipal Sobre Imóveis (IMI), em Dezembro de 2003, verificou-se uma profunda reforma do sistema de avaliações da propriedade imobiliária em Portugal, introduzindo-se um conjunto de regras de avaliação totalmente assentes em factores objectivos, de grande simplicidade e coerência interna. Neste contexto, os prédios urbanos novos e os transmitidos após 1 de Dezembro de 2003 passaram a ser avaliados de acordo com as regras estabelecidas no Código do IMI. Estas regras foram facilmente apreendidas pelos agentes económicos (facilitada pela possibilidade de simular o valor patrimonial tributário de qualquer imóvel), facto que conduziu a uma maior transparência do sistema, possibilitando a identificação de eventuais erros nas respectivas avaliações. Deste modo, caso o sujeito passivo discorde dos valores apurados pela Administração Tributária, poderá requerer uma segunda avaliação no prazo de 30 dias contados da data em que tenha sido notificado daquele resultado. Paralelamente, o resultado desta segunda avaliação pode ainda ser impugnado judicialmentepelosujeitopassivocom fundamento em qualquer ilegalidade praticada, nomeadamente quando houver uma errónea quantificação do valor patrimonial tributário do prédio. Se o sujeito passivo discordar da avaliação das Finanças pode pedir uma nova avaliação noprazode30dias. Às sextas-feiras, as respostas da KPMG aos leitores do Diário Económico. Quais os prazos para a correcção de omissões ou inexactidões na declaração Modelo 22? Caso a correcção a efectuar seja a favor do Estado, daí resultando imposto superior ao liquidado ou prejuízo fiscal inferior ao declarado, o sujeito passivo pode apresentar uma declaração Modelo 22 de substituição a qualquer momento, até ao limite do prazo de caducidade, o qual poderá variar, designadamente, caso tenha havido lugar ao reporte de prejuízos fiscais. Quando da autoliquidação do IRC efectuada pelo sujeito passivo tenha resultado o pagamento de imposto superior ao devido ou o apuramento de um prejuízo fiscal inferior ao efectivamente verificado, o sujeito passivo tem a possibilidade de proceder à entrega de uma declaração de substituição no prazo de um ano a contar do termo legal para a entrega da declaração de rendimentos. Caso o prazo acima referido para a entrega da declaração de substituição não seja cumprido, a Empresa poderá ainda apresentar reclamação graciosa da autoliquidação do IRC no prazo de dois anos após a entrega da declaração que pretende substituir.

Sexta-feira 22 Janeiro 2010 Diário Económico 13 PUB BANCO MUNDIAL Crescimento de 2,7% da economia global é insuficiente para absorver desemprego O Banco Mundial estima que a economia global vai crescer 2,7% em 2010, o que ainda assim é insuficiente para absorver o desemprego. A instituição liderada por Robert Zoellick prevê que depois de um recuo do Produto Interno Bruto (PIB) mundial de 2,2% em 2009, a recuperação mundial continua precária. O crescimento deverá ser de 1,8% nos países de alto rendimento e de 5,2% nos países em desenvolvimento. Na China, a economia deverá crescer mais (9%). Avaliação de 2010 já terá ponderação curricular Negociação entre sindicatos e Governo deverá ficar fechada na próxima semana. Denise Fernandes denise.fernandes@economico.pt Dois mil estágios para as autarquias O Conselho de Ministros aprovou ontem a adaptação à administração local do regime de estágios profissionais na administração pública, abrangendo anualmente dois mil jovens desempregados, à procura de primeiro emprego ou de novo emprego. O novo regime constitui a materialização do compromisso assumido pelo primeiro-ministro, José Sócrates, perante a Associação Nacional de Municípios, especificou o secretário de Estado da Administração Local, José Junqueiro. A remuneração dos estágios, acrescentou José Junqueiro, é idêntica à administração pública (900 euros) e cada programa custará para cada mil estagiários cerca de 11,5 milhões de euros. Gonçalo Castilho dos Santos Secretário de estado da Adm. Publica Até à próxima semana a questão ficará esclarecida, disse Castilho dos Santos, acrescentando que, até ao final da negociação, será sempre possível aperfeiçoar o documento sobre ponderação curricular. A negociação entre Governo e sindicatos da função pública sobre o diploma da ponderação curricular deverá ficar fechada na próxima semana, por forma a estar disponível na avaliação de desempenho de 2010, garantiu ontem o secretário de Estado Gonçalo Castilho dos Santos. O recurso à ponderação curricular está previsto no novo sistema de avaliação de desempenho (SIADAP), em vigor desde 2008, e será aplicado a cerca de 8.000 funcionários da Administração Central que não foram avaliados. Governo e sindicatos estão agora a definir quais os critérios para aplicação da ponderação curricular. Ontem, à margem de mais uma ronda negocial, Castilho dos Santos admitiu à Lusa que a negociação ficará concluída na próxima semana, mas até lá, iria ainda integrar no projecto novas propostas dos sindicatos. Uma das propostas mais difíceis tem a ver com a ponderação curricular dos dirigentes, embora Castilho dos Santos garanta que há já um consenso alargado sobre a matéria. Haverá regras mais claras e transparentes do que as que existem actualmente, sublinhou. Segundo disse ao Diário Económico José Abraão, da Frente Sindical (Fesap), a actual proposta do Governo prejudica os trabalhadores, nomeadamente, os técnicos superiores da função pública. Isto porqueéestabelecidoqueos dirigentes em comissão de serviço passem a ser avaliados pelo SIADAP 2 (avaliação para dirigentes) para efeitos de prémios de desempenho. Mas também passam a ser avaliados pelo SIADAP 3 (avaliação para a maioria dos funcionários) por ponderação curricular para efeitos de progressão na carreira de origem. Isto significa, segundo Abraão, que os dirigentes são avaliados duas vezes e passam a contar para as actuais quotas do SIADAP 3 que permitem progressões e prémios de desempenho aos restantes trabalhadores. Provavelmente, quem irá preencher as quotas serão os dirigentes, já que são mais próximos do patrão, ou seja, de quem os nomeou, critica o sindicalista. A Fesap espera assim que o Governo altereapropostaeatribuaapenas o SIADAP 2 aos dirigentes. Recorde-se que a lei do SIA- DAP estabelece quotas de 5% para atribuição da nota máxima (excelente) e de 20% para a imediatamente a seguir (relevante).

14 Diário Económico Sexta-feira 22 Janeiro 2010 POLÍTICA Ao quarto ano, a dúvida: Cavaco fica em Belém? Em 2006, Cavaco tornou-se o primeiro Presidente de direita. Um mandato difícil faz tremer a reeleição. Márcia Galrão marcia.galrao@economico.pt Quezílias com ogovernoecríticas da esquerda colocam tradição em risco: Cavaco pode ser o primeiro Presidente a não ser reeleito. A 22 de Janeiro de 2006, Aníbal António Cavaco Silva, nascido em Boliqueime, vivia uma emoção muito forte numa noite inesquecível. Foi a noite em cumpriu o sonho de se tornar o primeiro Presidente da República de direita eleito em Portugal. Quatro anos depois, e muitas polémicas passadas, Cavaco está em fim de mandato e tem pela frente uma nova decisão: recandidatase ou não? E a questão que se colocaagoraé:seráqueoprofessor de Economia vai novamente alimentar um tabu? Junto daqueles que o apoiaram e dentro do partido que sempre o viu como o último redutodeconsensointerno-o PSD -, essa recandidatura é dada como certa. Mas a palavra final terá que ser dele próprio. E há uma novidade: recandidato ou não, ao contrário dos anteriores presidentes, essa reeleição não é dada como garantida. De personalidade reservada e pouco espontâneo, Cavaco teve dificuldades em captar o apoio popular e o seu mandato esteve longe de ser fácil. As quedas de popularidade que foi sofrendo ao longo dos últimos anos comprovam que nem sempre o povo o olhou como o referencial da estabilidade que se exige a um Presidente da República. O caso das escutas, como ficou famoso o episódio que trouxe para as primeiras páginas de jornais no Verão passado, em plena campanha eleitoral, suspeitas de vigilância a Belém, foram uma machadada na imagem de Cavaco. Ficou a ideia de que houve descoordenaçã na suacasacivilequeoassuntofoi mal gerido, diz Pedro Magalhães. Ainda assim, o Presidente parece estar a recuperar bem do duro golpe e nas últimas sondagens voltou já aos indíces de popularidade que tinha no passado. Muitoatentoaostemasda economia, como manda a profissão que sempre abraçou, o Presidente teve ao longo destes quatro anos um papel essencial nos alertas que foi dando ao Governo. Escutado com atenção, não se coibiu nunca de fazer passar os recados que quis. Cavaco conseguiu mudar o aeroporto da Ota para Alcochete, impulsionou a demissão de Correia de Campos da pasta da Saúde e, no último discurso de Ano Novo, acabou mesmo por ditar um convite do Governo à oposição para que se sentassem à mesa a discutir o Orçamento do Estado para 2010. Apesar das quezílias que têm sido constantes com o Governo, se Cavaco mostrar que é um referencial de estabilidade, pode capitalizar apoios: O seu contributo para a governabilidade, se houver, irá tornar-se o trunfo para bater Manuel Alegre. Caso contrário, arrisca-se a ser o primeiropresidentedanovarepública que não é reeleito, acredita Viriato Soromenho Marques. A crise económica pode estar também a prejudicar o Presidente, diz Pedro Magalhães: Leva a um ambiente de maior tensão entre Presidente e Governo que lhe é prejudicial. Mas para o politólogo, a colagem de Cavaco à direita é também uma desvantagem.orótulotemlevadosempre ospartidosdaesquerdaeaalaesquerda do PS a fazerem-lhe um combate e uma crítica que, por exemplo, Soares não teve da direita. O empresário António Pires de Lima lembra que recentemente o país votou maioritariamenteàesquerdaeelegerum Presidente que vem da direita democrática é sempre uma grande aventura. Ainda assim, não tem dúvidas de que apesar das enormes dificuldades porque todos temos passados, o professor Cavaco continua a ser o referencial mais sólido do funcionamento das nossas instituições. O seu maior erro, diz Henrique Neto, foi exactamente ter deixado que se institucionalizasse a ideia da cooperação estratégica com o Governo, quando tem de se abster da governação. Uma crítica igual à que Cavaco ouviu recentemente daquele que será provavelmente o seu maior adversáriodaquiaumano:manuel Alegre. Com C.M. CASOS E POLÉMICA A posse A 22 de Janeiro de 2006, os portugueses têm, pela primeira vez na sua história, um Presidente da República da direita. Cavaco venceu mais uma eleição com maioria absoluta (50,1%) e toma posse. Cooperação estratégica No discurso de tomada de posse, Cavaco promete cooperação estratégica com o Governo. Os desafios que Portugal enfrenta exigem uma magistratura presidencial que favoreça consensos alargados. ContraaOTA Cavaco deixa um aviso e diz que é preciso mais informação sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa,previstoparaaOta.Nos bastidores leva o Governo a estudar outras possibilidades, já levantadas, por exemplo, pela CIP. Mário Lino acaba por escolher Alcochete. Saída de Correia de Campos Em Janeiro de 2008, o Presidente mostra preocupação com o clima de crispação que se vive na Saúde. Dias depois, Correia de Campos, então ministro da Saúde, demite-se do cargo. Açores Durante um dia inteiro, 31 de Julho de 2008, Cavaco deixou o país a especular sobre o motivo da comunicação que ia fazer ao país nessa noite. Em nove minutos, lançou duros ataques ao Estatuto dos Açores aprovado pelo Governo. Por duas vezes tentou travá-lo, mas o Executivo conseguiu a sua promulgação. Escutas em Belém Em Setembro de 2009, duas manchetes em dois jornais (DN e Público) fazem mossa na imagem de Cavaco. Suspeitas de vigilância sobre Belém acabam numa comunicação do Presidente ao país desmentindo o caso na demissão do seu assessor de imprensa. Apelo ao entendimento No discurso de Ano Novo, o Presidente apela à concertação política para o Orçamento do Estado. Dias depois o Governo convida a oposição para reunião. Paulo Figueiredo

Sexta-feira 22 Janeiro 2010 Diário Económico 15 Morgado testemunha num caso de violência A procuradora-geral adjunta Maria José Morgado (na foto) vai ser testemunha de acusação no processo contra Carlos Varela, acusado de agressão a dois polícias, na semana passada, no Campus da Justiça de Lisboa. O jovem, de 22 anos, foi detido na sequência de confrontos depois da condenação do homicida do seu irmão, Eucrides Varela, ex-aluno da Casa Pia de Lisboa assassinado à facada no à porta do colégio em Dezembro de 2008. O homicida foi condenado a 16 anos e oito meses de prisão. AGENDA DO DIA Presidente da República na abertura do congresso da ANAFRE. Reunião do Secretariado Nacional da FENPROF. Debate no Parlamento sobre o subsidio de desemprego. Ministra da Cultura inicia visita aos distritos de Évora e Portalegre. Apoio a Alegre garantido no interior do PS São cada vez mais as vozes dentrodopartidoaapoiar a candidatura Márcia Galrão marcia.galrao@economico.pt O PS bem pode dizer que só tomará uma posição sobre as presidenciais no tempo próprio - ou seja depois de aprovado o Orçamento do Estado para 2010 - mas, segundo apurou o Diário Económico, nos próximos dias vários dirigentes socialistas vão assumir o apoio a Manuel Alegre. Internamente já se trabalha para a candidatura do poeta e embora oficialmente ninguém assuma o apoio socialista, nas reuniões internas já é dado como garantido. Ontem mesmo, no encontro do grupo parlamentar, ficaram poucas dúvidas sobre isso. Vários deputados com quem o Diário Económico falou assumem que o apoio do PS a Manuel Alegre é já uma realidade. Ainda assim, ontem, o líder parlamentar, Francisco Assis, pediu moderação aos colegas de bancada e disse que o PS é dono do seu tempo político. Cá fora, aos jornalistas, disse que o grupo vai aguardar pela decisão dos órgãos próprios do partido, independentemente de posições pessoais já formadas. Esta insistência em nada dizer antes de tempo, foi elogiada por Mário Soares anterior opositor de Alegre nas Presidenciais de 2006 que considerou inconveniente entrar nessa discussão e, caso raro, disse até concordar com o Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, de que é muito cedo falar disso, é inconveniente entrar nessa discussão porque isso distrai-nos do essencial. Uma crítica indirecta à tomada de posição de Manuel Alegre, apesar do PS já ter dito que presidenciais serão um assunto só discutido depois do Orçamento. Na reunião do grupo parlamentar, o deputado Marques Júnior,aoqueoDiárioEconómico apurou, deixou a crítica de que o PS não fez nada em relação às presidenciais no tempo certo e que agora está a ir a reboque das circunstâncias. A antecipação de Manuel Alegre, assumindo disponibilidade para ser candidato presidencial, é vista como uma notificação ao PS.Paraosqueestãodoseu lado, ela é legítima, para os que não estão, é uma imposição ao partido, deixando-o sem margem de manobra. Francisco Assis rejeita, ainda assim, que o PS esteja de mãos atadas neste processo: uma eleição presidencial tem as suas próprias regras e características e é natural que quem quer ser Presidente da República comece por manifestar publicamente essa vontade e depois os partidos políticos, no tempo em que eles próprios definem, têm de se pronunciar sobre quem apoiam, foi isso que sempre aconteceu na nossa história democrática. No entanto, o PS corre o risco de apoiar Alegre depois do BE já o ter feito (Louçã já se mostrou disponível). Quem tomou já uma posição oficial foi o líder da Juventude Socialista.Aocontráriodopartido, Duarte Cordeiro assumiu publicamente que a sua estrutura vê com bons olhos a candidatura de Alegre. Declarações proferidas após um almoço com o poeta, segundo apurou o Diário Económico. Anúncio público de Manuel Alegre foi primeiro passo para que nos próximos dias comecem a surgir manifestações de apoio vindas de dentrodops.

16 Diário Económico Sexta-feira 22 Janeiro 2010 POLÍTICA SAÚDE Último doente internado por cegueira teve alta do hospital de Santa Maria Walter Lago, o único dos seis doentes que cegaram em Santa Maria que ainda estava internado, já saiu do hospital e está agora num centro de reabilitação. Ao que o Diário Económico apurou, os médicos consideraram que já não havia mais nada a fazer em tratamento hospitalar. Há seis meses, seis doentes cegaram após uma operação naquele hospital. No âmbito da investigação criminal, o MP acusou dois funcionários da farmácia hospitalar por seis crimes de ofensa à integridade física grave. Dois em cada dez portugueses já compraram remédios pela internet. MEDICAMENTOS Contrafacção de remédios gera negócio paralelo de 50 mil milhões de euros Dois em cada dez portugueses que compram medicamentos na Internet não sabem se o site é seguro e uma em cada quatro não sabe o perigo desses remédios. As conclusões são de um estudo apresentado ontem pelo Infarmed, onde foi também debatido o crescimento deste crime que está em progressão mundial e que gera mais de 50 mil milhões de euros. O presidente do Infarmed, Vasco Maria, anunciou ainda a criação de uma rede nacional para combater a venda de medicamentos falsos na Internet. Passos lança livro em clima de campanha para o PSD 1 Fotos> João Paulo Dias O único candidato à corrida para a liderança lançou Mudar em Lisboa rodeado de notáveis. Catarina Madeira catarina.madeira@economico.pt Passos reuniu uma sala cheia de gente e falou sobretudo de economia e do Orçamento para 2010 Espero que o PSD possa fazer um mudança grande que bem precisa dela disse Pedro Passos Coelho à entrada da cerimónia de lançamento do seu livro Mudar, em Lisboa, onde mais uma vez se mostrou disponível para protagonizar essa mudança. Foi à política económica que Passos dedicou mais tempo da sua apresentação, apontando a necessidade de reformar o quadro fiscal como uma das medidas para enfrentar dificuldades económicas cada vez maiores. Estamos a chegar a um tempo em que aqueles que pagamimpostossãocadavezmenosevamoschegaraumdiaem que aquilo que o Estado recebe de impostos não vai chegar para valer aos que têm mais necessidades, defendeu. O Orçamento do Estado, que tem monopolizado a actividade dos partidos nas últimas semanas também não foi esquecido, numa referência aos investimentos públicos Passos sublinhou que é impossível negociar o OE trocando os próximos 30 anos por um aparente estabilidade em 2010. No final, Passos Coelho foi aplaudido de pé por quase toda a plateia e deu autógrafos, naquele que pode ser considerado olançamentoinformaldasua candidatura à presidência do PSD. Foi numa sala lotada, onde muitas pessoas não conseguiram um lugar sentadas, que Passos Coelho apresentou o seu livro Mudar. Figuras de todas as correntes do PSD ouviram o único candidato assumido à liderança dizer que a obra não é uma moção de estratégia, mas uma avaliação da sociedade portuguesa. Aguiar-Branco, líder parlamentar que vê a possibilidade de entrar nesta corrida ganhar força de dia para dia, marcou presença na primeira fila, com Mota Amaral de um lado e Mira Amaral do outro. Entre os apoiantes antigos que se mantêm desde que se candidatou às últimas directas não faltaram Miguel Relvas, Fernando Ruas, Carlos Carreiras, Nogueira Leite eângelocorreia.oantigoministro de Cavaco Silva deixou elogios a Passos: novo, disciplinado, sério, viveu toda a vida do trabalho e não do Estado, tem ideais. Paula Teixeira da Cruz, que também se sentou na filadafrenteaoladodemedina Carreira, acrescentou que Pedro Passos Coelho está a fazer o que deve ser feito. Mudar é a palavra-chave para o país. Convidado para fazer a apresentação do livro, o politólogo Rui Ramos defendeu que o livro de Passos é uma ajuda para encontrar uma saída para a situação problemática em que nos encontramos e defendeu que os protagonistas da mudança que o país precisa fazem parte da geração democrática, a geração de que Passos faz parte. 2 3 1 Passos Coelho tinha atrás dele um cartaz que parecia de campanha eleitoral; 2 Mira Amaral, do banco BIC, marcou presença, ao lado de Mota Amaral e do opositor de Passos, Aguiar Branco. 3 O empresário António Mota também esteve na cerimónia.

Sexta-feira 22 Janeiro 2010 Diário Económico 17 JUSTIÇA Pinto Monteiro investiga divulgação das escutas do processo Apito Dourado nainternet A Procuradoria-Geral da República anunciou ontem a abertura de um inquérito à divulgação na internet das escutas telefónicas do processo Apito Dourado, o que só pode acontecer com autorização dos visados. As escutas envolvem o presidente do Futebol Clube do Porto, Pinto da Costa e o autarca de Gondomar. O advogado de Valentim Loureiro lamentou que as escutas ainda não tenham sido destruídas. Já o bastonário dos Advogados, Marinho Pinto, disse que o segredo de justiça é uma farsa. Francisco Assis acredita na constitucionalidade do diploma. PARLAMENTO PS admite fazer pequenas alterações à lei do casamento homossexual Francisco Assis disse ontem estar convencido da constitucionalidade da lei que vai permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Mas o líder parlamentar do PS admitiu introduzir pequenas alterações na redacção da proposta aprovada no Parlamento, desde que não ponham em causa o essencial. A lei foi aprovada com clara maioria no Parlamento, estamos convencidos da constitucionalidade dessa mesma lei, disse o Assis aos jornalistas, à saída de uma reunião da bancada. COLUNA VERTEBRAL Cepa torta JOÃO PAULO GUERRA A publicação pelo INE dos 50 Anos de Estatísticas da Educação veio confirmar o que já toda a gente sabia: que no último meio século a educação em Portugal registou um aumento quantitativo explosivo. Mas a análise das estatísticas confirma, por outro lado, que sob o ponto de vista qualitativo o país não saiu da cepa torta. E a culpa é precisamente das estatísticas. Ou, melhor dizendo, a responsabilidade é dos políticos que encaram a educação como um mero objectivo estatístico. De maneira que para ter muito mais, para apresentar números que não envergonhem tanto, as políticas de educação têm em geral a quantidade como fim, enquanto a qualidade se perde pelo meio. Uma análise possível destes 50 Anos de Estatísticas da O país não saiu da cepa torta. Eaculpaé precisamente das estatísticas. Educação também confirma que o obscurantismo salazarista, em cima de uma herança de trevas inquisitórias, traçou um destino trágico por longos anos para este país. Leva décadas a recuperar o atraso de um país cujo sistema educativo excluía da escola 99 por cento da população. E essa digam o que disserem os saudosistas mais ou menos disfarçados foi a maior obra do salazarismo: a implantação da ignorância, da desconfiança e do preconceito em relação ao saber. E se isto foi dramático, passou a trágico quando, já em democracia, alguns ilustres ministrantes não se coibiram de exibir e pôr em prática um absoluto desprezo pelo saber, embora sempre atento aos sinais quantitativos. Portugal, para sua vergonha, chegou a ter ministros e secretários de Estado da área da Educação que falaram e escreveram com erros de português. O que é que pode esperar-se mais? E assim tá o país tal como tá a Educação. Ou será que ainda não deram pela institucionalização do verbo tar no discurso político e mediático? joaopaulo.guerra@economico.pt PUB

18 Diário Económico Sexta-feira 22 Janeiro 2010 REPORTAGEM REPORTAGEM DESEMPREGADOS COM NOVA VIDA Voltar à Escola Três retratos de gente que ficou desempregada e resolveu não se render, fintou o destino e regressou à faculdade. Quero a minha vida adulta, não quero dinheiro para tabaco, queixa-se Marta. Ana Sofia Fonseca anasofia.fonseca@gmail.com Olga Santos, Hugo Brás e Marta Bernardo engrossam a fileira do desemprego em Portugal. Desde que a crise rebentou, a taxa de desemprego não parou de crescer. No último mês de Novembro atingiu 10,8 por cento, tornando-se a quarta maior da Europa. A realidade está contadaeosalertasnãoparamde soar - a subida pode ainda não ter chegado ao fim. Entre os países da Zona Euro, Espanha está no topo dos piores resultados (19,4 por cento). A Holanda, essa, toma a dianteira da esperança cabe-lhe 3, 9 por cento. Por estas bandas, ser doutor já não é garantia de futuro certo. Apesar de já serem licenciados, Olga, Hugo e Marta regressaram à escola. Decidiram estudar para ocupar o tempo. Sobretudo, para ganhar outros saberes e novas hipóteses de entrar no mundo do trabalho. Olga está a completar mais uma licenciatura.hugoempenha-senomestrado. Marta também. Estar desempregado acarreta muito mais do que dificuldades económicas. O pior é suportar o tempo vazio. A angústia de ver o futuro no penhor. Em Portugal, ser doutor já não garante futuro certo. Quem volta à universidade tenta um novo curso, com mais possibilidade de emprego. DESEMPREGO EM FLECHA Número de desempregados (em milhares) 550 475 400 Número de inactivos (em milhares) 5075 5025 1T 2008 4975 1T 2008 Fonte: INE 3T 2009 3T 2009 Um curso com sabor a tempo perdido MARTA BERNARDO 30 ANOS Marta conhece bem o peso das propinas. Quando decidiu retomar os estudos, ouviu comentários: Então, não trabalhas e ainda vais gastar dinheiro?. Não estivesse tão saturada de ver a vida num beco sem saída, teria cedido. Assim, encheu-se de coragem e matriculou-se no ISCTE, no mestrado em Comunicação, Cultura e Tecnologias da Informação. Até então, apenas conhecia o estatuto de trabalhador-estudante. Sinal dos tempos, daí em diante, viu-se numa nova categoria: desempregada-estudante. Certo é que, nos melhores dias, até volta a acreditar num futuro. Não dá asas a grandes sonhos, basta-lhe um emprego que não seja precário. Desde que terminou a licenciatura de professora do 1º Ciclo, já fez de tudo: Coisas horríveis, em que me pagavam para deixar o cérebro à porta e pôr um sorriso bonito. De todos os trabalhos que teve, o melhor foi substituir uma professora: Foi a única vez que ganhei mais de 500 euros.... O rosto sereno esconde a revoltaqueaconsome.tem30 anos, o caminho obstruído pelos escombros da crise, da recessão. Obrigada a adiar os sonhos: Écomosecontinuassea ter 18 anos. Não posso ser independente, quanto mais pensar em ter filhos. Estou farta, quero a minha vida adulta e não dinheiro para tabaco e concertos de verão. Conhece como a palma da mão a verdade dos últimos anos: Antes da crise, era a preguiçosa que queria começar por cima. Agora, sou a coitadinha. Não se revê em nenhum dos lados do espelho, culpa o curso que tirou. O mestrado devolve-lheasensaçãodeestar activa, mas o tempo que sobra é ainda demasiado. Tem o travo amargo do desperdício. Na faculdade como se estivesse a trabalhar HUGO BRAZ 29 ANOS A mesma revolta trespassa o olhar de Hugo Braz. Avança pelo ISCTE como quem corre para o trabalho, mala de computador a tiracolo e BlackBerry em punho. Está matriculado no mestrado de Executive Sales Management, espera acabar com louvores. Na véspera do dia em que foi despedido, se o avisassem, diria que era impossível. Há menosdeummês,forapromovido. Maiores responsabilidades, direito a carrinha de muitosluxos.e,derepente,numa só frase, o mundo a desabar: Gostamos muito do teu trabalho, mas estamos a fazer a uma reestruturação. O teu posto vai ser extinto. Nessa tarde, Hugo descobriu o avesso do destino. Desde miúdo, sonhava ser gestor. A vocação cresceu com ele e, na faculdade, indicou-lhe o trilho do marketing. Ainda o diploma brilhava de fresco, já ele encontrava trabalho. Estreou-se nahenkelaos21anoscomo estagiário; saiu aos 29, era já responsável de marketing na área de detergentes de lar: Numa multinacional, quando se é competente, sobe-se depressa. Nunca olhava para trás, era feliz. Nas primeiras manhãs de desemprego, não se preocupou de sobra. Tinha currículo e contactos suficientes para regressar ao mercado. Mas a crise económica estoirou, arrasando todas as possibilidades de voltar a trabalhar naquela área, naquelas condições. Já lá vão quase dois anos e Hugo só agora começa a despir a camisola: É uma grande evolução conseguir dizer eles em vez de nós. Maior progresso é ter descoberto que existe vida para além da profissão. Trabalhava horas a fio: Aos poucos, comecei a ver que antes do gestor existe o homem. Agora, até lhe faz estranheza ver as pessoas confundirem o que fazem comquemsão. Osponteiroscruzamasseis da tarde. É sexta-feira. Na rua, o frio apressa os estudantes. Cá dentro, no bar da faculdade, Hugo desfia a sua história. Pertence aos milhares de inactivos que figuram nas estatísticas do INE - pessoas com mais de 15 anos, que não têm emprego e nem o procuram. A taxa de inactividade alcançou o valor mais alto dos últimos oito anos, reflecte o papel dos estudantes e dos reformados. No último trimestre de 2009, a população estudantil disparou mais de sete por cento Grande reportagem são muitos os que continuam ou voltam a estudar para fugir à condição de desempregado. Hugo deposita esperanças no mestrado, regressou à faculdade para ocupar o tempo mas, acima de tudo, para aumentar conhecimentos e rede de

Sexta-feira 22 Janeiro 2010 Diário Económico 19 Paulo Alexandre Coelho Paula Nunes Se fosse a pagar teria hesitado (em fazer o mestrado), diz Hugo. João Paulo Dias Sempre achei que só não trabalhava quem não queria, afirma Olga. contactos. Quer usar as novas valências para abrir um negócio, criar o seu próprio posto de trabalho. Faz parte do grupo de mestrandos com direito a isençãodepagamento: OISCTE abriu vagas gratuitas para desempregados e eu aproveitei. Confesso que, se fosse a pagar, tinha hesitado. No último trimestre de 2009, a população estudantil disparou mais de 7%. Efeito dos desempregados que regressaram à escola. Investir em ser umanovapessoa OLGA SANTOS 32 ANOS A porta do Gabinete de Inserção Profissional de Algés está entreaberta, ela cruza-a. Passos curtos, olhar perdido. As botas a soarem no chão, o caminho decorado sem gosto: Bom-dia, venho fazer a apresentação quinzenal. Há quatro meses, é esta a sua sina. Tem o Bilhete de Identidade?, pergunta a funcionária, na palidez da rotina. Olga Santos deixa escapar um suspiro: Está aqui. Quem diria que ela, logo ela, 19 valores no final do secundário, ficaria desempregada? A licenciatura tirada em Biologia Marinha; a parte curricular do mestrado completa; saberes em informática. Sim, quem diria que Olga acabaria desempregada? Sempre achei que só não trabalhava quem não queria... Não sei se é azar, só sei que é um pesadelo. O gabinete cheira a burocracia. O rumor de uns dedos num teclado, a impressora a soltar papéis. A funcionária carimba os documentos, Olga despede-se: Obrigada, até daqui a 15 dias. Sacode o cabelo como quem afugenta fantasmaseosseus32anosre- gressam à rua. Inseguros. Os mesmos passos curtos, o mesmo olhar perdido: Nunca pensei que me acontecesse. Finda a licenciatura, o mais que conseguiu foi um estágio comobolseira-aalegriadurou um par de meses, faltavam vagas para contratar gente. Sem emprego, calou quanto sabia e aceitou trabalhar como administrativa. Mais tarde, deu formação de informática. Depois, encontrou postonocolégiopinamanique da Casa Pia de Lisboa. Habituouse às funções, à rotina: Gostei bastante. Sempre dei catequese, já lidava com jovens. Mas o desemprego parecialhecoladoàsombra-paraonde fosse, acompanhava-a. Em Agosto, viu-se de novo sem trabalho, mais um algarismo na imensidão da estatística. Os últimos dados do Eurostat, referentes a Novembro, garantem que a taxa de desemprego atingiu 10,3 por cento. Mais de 540 mil portugueses. Olga quer livrar-se destes números. O ano passado decidiu voltar à escola. Enterrou de vez os sonhos de adolescente e investiu num novo curso. Em rigor, numa nova Olga. Cada vez mais longe, ficou a rapariguinha que se imaginava bióloga. A mulher que aceitava ser formadora para sobreviver. Agora, o seu maior sonho cabe em duas palavras: emprego certo. Confia nas lições on-line da Universidade Aberta, na licenciatura em Informática. Quer garantir lugar nos quadros do Ministério da Educação: O grupo de Biologia está cheio, é mais fácil em Informática. Ainda assim, quando o desespero se lhe apega à ideia, lança a interrogação que acompanha a dor: Porquê eu?.

20 Diário Económico Sexta-feira 22 Janeiro 2010 MUNDO Obama limita operações dos bancos Depois da derrota no Massachussets, Obama volta a atacar os bancos, mais uma vez. A estratégia é criticada. Tom Braithwaite Exclusivo Financial Times O presidente americano, Barack Obama, anunciou ontem que tenciona reforçar a regulação dos bancos de Wall Street. É a segunda vez este mês que a administração limita as actividades de proprietary trading, isto é, a comercialização de acções, obrigações e outros instrumentos financeiros a favor da carteira do banco. Obama fez o anúncio depois de se reunir com Paul Volcker, conselheiro da Casa Branca e antigo presidente da Reserva Federal americana. A estratégia de Volcker, assente na redução das actividades de risco da banca, tem sido preterida pelas reformas gizadas pelo Tesouro. O presidente iniciou uma ronda de conversações com os seus conselheiros económicos há já alguns meses sobre a necessidade de incluir uma reforma financeira mais específica e de adoptar provisões mais restritivas para limitar a dimensão e alcance das instituições financeiras eassimreduziratomadaderisco em excesso, declarou uma fonte oficial da administração Obama esta quarta-feira. A proposta estipula limites à dimensão e complexidade das actividades de proprietary trading. A Casa Branca vai trabalhar em conjunto comacâmaradosrepresentantes e com o Senado para que daqui resulte nova legislação, refere a mesma fonte. O anúncio poderá evitar um ANÁLISE DESEMPREGO E ECONOMIA CONDICIONAM O que ele precisa de fazer para ser reeleito VASCO RATO Professor universitário Não há duas sem três. Depois das derrotas dos candidatos democratas ao cargo de governador da VirgíniaedoNovaJersey,em Novembro passado, o Partido Democrataacabadesernovamente humilhado em Massachusetts, onde apenas 12 por cento dos eleitores são republicanos registados. Obama, que fez campanha pela candidata derrotada, parece, finalmente, ter percebido que os seus problemas políticos estão no início. Em Novembro deste ano, aquando das eleições intercalares, os democratas certamente Obamaestáaser pressionado pela esquerda do seu partido que diz que é preciso evitar uma nova crise financeira e conquistar mais popularidade. perderão mais senadores, o que torna o cumprimento da agenda legislativa de Obama virtualmente impossível de cumprir. Será um presidente paralisado. Perante a iminência do desastre, a resposta da Casa Branca não é difícil de decifrar: acentuar o populismo, mobilizar o ressentimento. Por isso, elege Wall Street e os banqueiros como os vilões a abater. São, neste momento, alvos fáceis. Mas para que Obama possa conquistar um segundo mandato,asculpaspelodesemprego e a insegurança económica terão de ser atribuídas a alguém. E ninguém melhor dos que os financeiros. Um sério aviso para quem ainda insiste que a economia comanda a política. regresso à separação forçada entre investimento bancário de risco e os serviços da banca comercialederetalhoconsignadano Glass-Steagall Act. O Goldman Sachs, cujo negócio de proprietary trading se reveste de particular importância, vai analisar todososdetalhesatentamente. As novas medidas serão mais restritivas para as instituições com grandes operações retalhistas e comerciais que negoceiem a favor da sua carteira. Os reguladores, graças às propostas submetidas ao Congresso, poderão obrigar as grandes instituições que se encontrem interligadas a vender divisões que constituamumaameaçaparaosistema financeiro. Depois da derrota dos Democratas no Massachusetts esta terça-feira, Obama terá de tomar novamente as rédeas da dinâmica legislativa a um partido republicano que rejubila com a sua vitória no Senado e que retirou a maioria qualificada aos democratas. Obama eosecretáriodotesouro, Tim Geithner, estão a ser pressionados pelos membros mais à esquerda do Congresso para aplicarem medidas draconianas à banca. Uns defendem queéprecisoevitarumanova crise financeira, enquanto outros preferiam uma abordagem mais populista para inverter a perda de influência e de popularidade dos Democratas. No início do mês, a administração Obama anunciou um projecto de tributação sobre os grandes bancos e instituições para recuperar 90 mil milhões de dólares ( 64 mil milhões) nos próximos dez anos valor mínimo a devolver ao Estado por ter salvo o sistema. Alguns grupos industriais já procuraram aconselhamento jurídico para poderem contestar o novo imposto junto dos tribunais. O anúncio de ontem será bem recebido por alguns economistas independentes e por políticos dos dois quadrantes. Uma reacção oposta à do sector bancário, desagradado com as posições políticas da administração Obama e com a sua crescente imprevisibilidade. Tradução de Ana Pina Barack Obama tem uma nova frente de batalha: a banca. AS GUERRAS QUE OBAMA COMPROU COM O SECTOR FINANCEI 1. Redução de 90% dos salários dosexecutivosdetopo Os salários astronómicos são, desde a chegada à Casa Branca, o grande cavalo de batalha de Obama. Em Outubro, foi exigido às instituições resgatadas que cortassem em 90% os salários dosseusexecutivosdetopo. 2. Pressão para uma maior concessão de crédito Depois das ajudas recebidas chegou a altura dos bancos retribuírem. Foi com este objectivo que Obama se reuniu emdezembrocomos12maiores bancos do país para pressioná-los a conceder mais crédito.