Los Grobo: o futuro da agricultura?



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H A R V A R D B U S I N E S S S C H O O L 9-511-088 R29, 2 010 Los Grobo: o futuro da agricultura? Da janela do 8º andar de seu escritório no centro de Buenos Aires, de calça jeans, Gustavo Grobocopatel (Gustavo) refletia sobre o êxito e os desafios da empresa familiar liderada por ele agora. Los Grobo era a segunda companhia produtora de grãos da América Latina, cultivando cerca de 250.000 hectares, 1 comercializando aproximadamente 2,6 milhões de toneladas de grãos por ano e gerando U.S. $550 milhões 2 de receita tudo isto sem serem proprietários da terra. (Vide no Anexo 1 a resenha corporativa.) A empresa não se dedicava apenas à produção da terra; a Los Grobo também contava com o apoio de uma rede de provedores terceiros para oferecer insumos, ferramentas de gestão de riscos e outros serviços; operando com algumas unidades de produção downstream dedicadas à moagem de grãos para a fabricação de farinhas. Graças à sua extensa rede, a Los Grobo era uma empresa notavelmente com poucos ativos. Em vez de investir em terras ou mesmo em maquinaria agrícola, a companhia reinvestiu a maior parte de seus lucros em recursos humanos e em tecnologia da informação - ativos "blandos" (intangíveis) frequentemente relacionados a um empreendimento de cunho intelectual e nem tanto a uma empresa agrícola. Para a surpresa de muitos tradicionalistas, Gustavo afirmou que o conhecimento era a ferramenta mais poderosa de um produtor. Gustavo tinha a certeza de que um modelo de rede baseado no conhecimento de sua companhia desenvolvido e aprimorado na Argentina era o futuro da agricultura ao longo de toda a América do Sul e também além de suas fronteiras. Mas, seria assim mesmo? À medida que a Los Grobo ia avançando em direção ao Paraguai, Uruguai e Brasil (vide o mapa no Anexo 2), Gustavo se deu conta de que as leis e a cultura local, em certa medida, podiam afetar a implementação de seu modelo. Trabalhando conjuntamente com seus parceiros locais a fim de captar a visão local, Gustavo batalhou para adaptar "o jeito da Los Grobo" a fim de se adequar aos novos contextos, introduzindo mudanças quando era necessário. Seria este modelo de terceirização que tinha servido tanto o negócio familiar de Gustavo realmente adequado para ser implementado fora das fronteiras de sua Argentina nativa? Era um modelo para o mundo como acreditava Gustavo? Os primeiros anos Há quase um século atrás, Abraham Grobocopatel chegou à Argentina a partir da Rússia Imperial junto com sua esposa e cinco filhos sendo que um deles era um menino de dez anos chamado Bernardo. Vieram de Bessarábia, mais tarde a República de Moldávia para nunca mais regressar. 1 1 hectare = 2.471 acres 2 Todos os montantes neste documento são expressos em dólares norte-americanos, a não ser que seja especificado o contrário. Em 25 de agosto de 2010, $1.00 dólar norte-americano equivalia a 3,95 pesos argentinos (ARS). O presente caso prático foi preparado pelo Professor David E. Bell e Cintra Scott, Pesquisadora Associada do Centro de Pesquisa para América Latina de Harvard Business School (Escola de Negócios da Universidade de Harvard), em colaboração com Gustavo Herrero, Diretor Executivo do Centro de Pesquisa para América Latina de HBS. Os casos de HBS foram preparados exclusivamente para servir de base de discussão em aula. Os casos práticos não têm por objetivo servir como promoção, fontes de dados primários ou exemplos de administração eficaz ou ineficaz. Direitos de autor 2010 de President and Fellows of Harvard College. Para ordenar cópias ou solicitar autorização para reproduzir os documentos, por favor, ligue para: 1-800-545-7685, escreva para a Harvard Business School Publishing, Boston, MA 02163, ou viste a página Web www.hbsp.harvard.edu/educators Esta publicação não poderá ser digitalizada, fotocopiada, reproduzida nem publicada ou transmitida por qualquer outra forma ou meio sem a autorização da Harvard Business School.

511-088 Los Grobo: o futuro da agricultura Embora não tivessem uma relação prévia com a agricultura, Los Grobocopatel (ou a Los Grobo, como eram conhecidos) tinham recebido um modesto lote de terra de cultivo 15 hectares graças ao Barão Maurice de Hirsch que havia adquirido terras para agricultura nas Américas para ajudar os imigrantes judeus a escapar da perseguição religiosa na Rússia Czarista. A Los Grobo e seus companheiros gauchos judeus integravam uma colônia agrícola estabelecida em Carlos Casares na província de Buenos Aires. Por volta de 1920, Bernardo, o filho de Abraham de 15 anos de idade, trabalhava para um produtor vizinho que tinha 2.000 hectares. Muito trabalhador e empreendedor, Bernardo foi crescendo de mão-de-obra no campo a líder de equipe enquanto os novos empregos comerciais do girassol 3 enriqueciam a região. Em torno de 1962, Bernardo e seus três filhos (de 26, 23 e 16 anos) arrendavam 1.000 hectares de terra para plantios e gado. Bernardo morreu em 1967; seus três filhos adultos continuaram cultivando juntos até 1979. Naquele momento, os irmãos Grobocopatel dividiram os 4.500 hectares de plantio que lhe pertenciam. Adolfo, o segundo filho de Bernardo (e o pai de Gustavo), sempre media o sucesso em hectares: Sempre quis ser um grande fazendeiro, comentou Gustavo. 4 Em 1984, Adolfo, de 45 anos, possuía 3.500 hectares próprios e quatro filhos de 23, 20, 18 e 15 anos. E, naquele ano também, Gustavo, o mais velho deles, com 23 anos de idade se formava como Engenheiro Agrônomo pela Escola de Agronomia da Universidade de Buenos Aires (UBA) sendo o primeiro membro da família a conseguir um diploma profissional. Um ano mais tarde, Andrea, a irmã de Gustavo, tendo obtido uma licenciatura em Economia, também estava pronta para fazer parte do Grupo. Paula Marra, a nova esposa de Gustavo, a quem conheceu na Faculdade de Agronomia da UBA no final dos anos 80, também se juntou à companhia. Sucesso na Argentina com tradições argentinas Tendo sua origem na Argentina, o grupo Los Grobo foi, em grande parte, modelado por sua história. Há uma longa tradição de terceirização de produtores na Argentina, disse Gustavo. Segundo Gustavo, foram muitos os fatores que ajudaram a Argentina a atingir a maturidade para a subcontratação. Um deles foi a existência de uma grande proteção aos direitos de propriedade, garantidos pelo Código Civil escrito por Dalmacio Vélez Sarsfield na segunda metade do século XIX. A isto se deve acrescentar ainda o simples fato de que a terra para cultivo na temperada Argentina era produtiva e valiosa: a tendência era que seus proprietários se aferravam a ela. Além disso, a Argentina aplicou o princípio dos herdeiros forçosos" a fim de assegurar que o parente mais próximo de uma pessoa falecida pudesse receber seu quinhão de uma herança. Em decorrência disso, as valiosas propriedades de cultivo, com frequência, eram divididas e cedidas a crianças com pouco ou nenhum interesse agrícola; muitos preferiam arrendar suas terras em vez de vendê-las. Um contrato de arrendamento tradicional podia produzir 80 quilos de carne de gado por hectare ao ano. Um acordo mais moderno poderia conter uma combinação de dinheiro efetivo (em dólares norte-americanos) e/ou uma porcentagem de produção talvez $50 a $80 por hectare e 30% da produção por ano, ou $200 a $400 por hectare pelo arrendamento em dinheiro efetivo dos melhores campos para o cultivo de soja. O conhecimento como poder Nós não inventamos o modelo, contou Gustavo. Mas quando entrei neste negócio, sabia algumas coisas desconhecidas pelo mercado. Na década de 80, Gustavo dedicava seu tempo entre o empreendimento familiar (sediado em Carlos Casares, onde seu bisavô tinha se assentado) e a docência na Universidade de 3 Os introdutores do cultivo de girassol foram os colonos judeus da Europa do Leste, onde este era produzido para confeitos, torrando suas sementes. Na década de 20, a produção do óleo de girassol incrementou seu valor. (Los Grobo, Los Grobo: 1984-2009, pp. 56-7, http://www.losgrobo.com.ar/novedades/los-grobo-25-anos/127-los-grobo-25-years-english-version/download.html, data de acesso: janeiro de 2011.) 4 Entrevistas dos autores do caso, 23 de agosto de 2010. As posteriores citações diretas de Gustavo também fazem parte das entrevistas dos autores do caso realizadas de 23 a 25 de agosto de 2010. 2

Los Grobo: o futuro da agricultura 511-088 Buenos Aires, onde foi professor de agronomia especializado na conservação de solos. Por exemplo, entre 1985 e 1987, houve uma inundação na província de Buenos Aires; muita terra de cultivo ficou de baixo d'água. Na universidade, estudei a dinâmica dos sais nos solo, explicou Gustavo. Com base em meus estudos, sabia que a terra se recuperaria. Portanto, arrendei terra inundada para produtores e deu certo. Os produtores que arrendaram as terras de Gustavo puderam dividir parte do risco da recuperação e Gustavo pôde arrendar rapidamente uma grande extensão de terra. Los Grobo arrendou 4.000 hectares em 1987 e rapidamente passaram a 10.000 hectares em 1989. Gustavo achava que seu sucesso precoce tinha a ver com o fato de haver sido beneficiado por dois mundos. Como filho de produtor, falava o idioma dos produtores e também aprendi a falar o idioma do âmbito acadêmico, disse. Depois de uma viagem durante um mês pelos Estados Unidos, no final da década de 80, Gustavo chegou à conclusão de que o plantio direto daria maiores rendimentos aos cultivos, conservando melhor o solo. (Vide o Anexo 3 para uma descrição do sistema de plantio direto.) O crescimento da companhia foi particularmente significativo a partir de 1989 ano em que, pela primeira vez, Gustavo empregou o sistema de plantio direto até 1994/95. A adoção do plantio direto cresceu rapidamente. Já para a safra de cultivos 1991/92, 100% da área plantada pelo Grupo Los Grobo foi mediante o sistema de plantio direto. Rapidamente passamos de 10.000 hectares em 1989 para 20.000 e 30.000 e depois pulamos de 30.000 a 75.000 hectares em 1994, lembrou Gustavo. Esses 75.000 hectares foram um grande passo, um ponto de inflexão para a Los Grobo, ligado ao primeiro milhão da companhia. Naquela altura, a Los Grobo ainda era, em grande parte, uma empresa familiar, com Gustavo e Paula nos campos, agindo da forma mais rápido possível já que os elevados preços das commodities ajudavam a impulsionar o crescimento a meados dos anos 90. Éramos nós mesmos que limitávamos nosso próprio crescimento, disse Andrea em relação àquela época. 5 A Los Grobo começava a se tornar grande demais para que fosse administrado apenas pelos membros da família: então, foram contratados os primeiros profissionais externos em 1996. O crescimento terminou afetando o negócio familiar de muitas maneiras. Nos anos 80, utilizávamos nossas próprias máquinas. Na década de 90, registrando um grande crescimento, não podíamos comprar suficiente maquinaria e terceirizamos a questão convocando contratistas, explicou Gustavo. Naquele momento da história argentina, a economia crescia, a hiperinflação 6 tinha sido controlada, mantendo a cotação do peso argentino igual a do dólar norte-americano, 7 os preços das commodities eram altos, bem como os investimentos em agricultura. Com os preços mais elevados em 94 e em 95, os incentivos para crescer eram maiores, recordou Gustavo. Os profissionais não ligados à agricultura começaram a ingressar cada vez mais no campo, como no caso dos contadores e engenheiros. De acordo com Gustavo, a agricultura argentina foi beneficiada pela entrada de profissionais. Os entendidos contratistas terceiros se tornaram nossos parceiros, disse Gustavo. Não pagávamos a eles um honorário fixo, mas sim uma parte da produção: Nascia nossa rede. A rede na teoria e na prática Na rede do Grupo Los Grobo, os parceiros eram capacitados e posteriormente auditados para garantir o cumprimento dos padrões de qualidade e para que respeitassem a metodologia da companhia. A metodologia da companhia foi cuidadosamente registrada e revisada como parte integrante do processo da Los Grobo, tornando-se a primeira companhia agrícola no mundo 8 em ser ISO 9001 certificada 9 ou seja, com processos formalizados, registrados e auditados atendendo aos requisitos da certificação de qualidade ISO. 5 Entrevista dos autores do caso, 24 de agosto de 2010. As posteriores citações de Andrea Grobocopatel também fazem parte das entrevistas dos autores do caso. 6 A hiperinflação na Argentina atingiu seu índice máximo em 1989, com preços ao consumidor subindo até 200% em um mês. 7 O processo de manter a cotação do peso argentino equivalente a do dólar norte-americano, conhecido como conversibilidade, foi implementado por Domingo Cavallo, Ministro de Economia do Presidente Carlos Menem. A relação 1:1 do peso em relação ao dólar foi mantida até dezembro de 2001. 8 Este marco foi alcançado em novembro de 2000. 3

511-088 Los Grobo: o futuro da agricultura A partir deste esforço, foi criado um programa de software chamado GroboSoft para permitir aos membros da rede do Grupo Los Grobo inserir dados críticos de crescimento in situ, aceder às recomendações de otimização de cultivos e compartilhar relatórios seletos com clientes. GroboSoft também ajudou o Grupo Los Grobo a aproveitar todo aquilo que o GPS 10 oferecia aos clientes e agrônomos de sua rede. Mediante o GPS, a Los Grobo podia medir as características dos solos em uma quadrícula de cinco hectares. Tendo como base esses resultados, a densidade precisa dos insumos era calculada (sementes, fertilizantes e outros químicos) para aumentar a produtividade. Era possível imprimir um relatório na hora, utilizando telefones inteligentes que tinham acesso ao sistema GroboSoft. (Vide Anexos 4 e 5 para exemplos da tecnologia de produção.) Beneficiados com treinamento e tecnologia da Los Grobo, as empresas parceiras de pequeno e médio porte concorriam entre si e de forma direta com Los Grobo, mas esse era um risco que Gustavo estava disposto a assumir. A companhia passou a ser a coordenadora de sua rede de provedores, com um alto padrão de qualidade com o suporte de uma visão compartilhada: Sermos líderes mundiais de uma rede agroalimentar graças a nossa capacidade de entender o novo paradigma para proporcionar serviços inovadores. 11 Nessa posição, compartilhar informação que pudesse ajudar a concorrência colocava, acima de tudo, o Grupo Los Grobo em uma condição potenciadora. Impulsionava a inovação. Esta ideia teve influência do autor/consultor Peter Drucker, que criou o termo "trabalhador do conhecimento, tal como a Los Grobo via os empreendedores em sua rede de empresas de pequeno e médio porte. Gustavo viu a agricultura se transformando em uma indústria baseada no conhecimento bem diferente do tradicional campo familiar administrado com base no trabalho árduo e em antigas e estabelecidas rotinas. Através de seu amor pela teoria da administração, além do trabalho ativo em diversos grupos industriais e mais de 70 palestras públicas por ano, Gustavo era considerado cada vez mais por seus colegas como uma espécie de produtor filósofo, promovendo sua visão de novo paradigma" da agricultura. Pensando sobre a administração de sua companhia em crescimento, também captou a atenção de Gustavo as ideias dos economistas americanos Ronald Coase e Oliver Williamson. Coase e Williamson, focadas em uma questão básica: Por que existem as companhias? 12 Em outras palavras, por que as pessoas não podem simplesmente realizar operações entre si nos mercados e, quando precisam trabalhar juntas, redigem um contrato no qual pormenorizam a forma em que vão implementá-lo? Estas perguntas nortearam um setor influente da economia denominada a teoria da empresa. Isto fez com que Grobocopatel pensasse muito sobre que tipo de atividades, operações e bens deveriam fazer parte da Los Grobo (em outras palavras, o que deveria ficar dentro dos limites da companhia ) e o que poderia ficar do lado de fora. Gustavo descobriu que era preferível deixar tudo aquilo que fosse possível fora dos limites de sua companhia. Acreditava que a maior terceirização possível era a melhor maneira de serem competitivos. Colocado isto na prática, significava arrendar 100% da terra produtiva da Los Grobo e 100% da maquinaria avançada. O debate sobre a terra Nem todos estavam de acordo. Adolfo, o pai de Gustavo, acreditava na ideia de serem donos da terra. Nos primeiros 15 anos da companhia, Adolfo possuía suficiente poder dentro do negócio familiar para exigir que os lucros fossem reinvestidos na compra de terras. 9 A Organização Internacional de Padronização (ISO) administra um conjunto de requisitos para certificar em conformidade com a ISO 9001, que inclui o registro e a auditoria de todos os processos chave de um negócio. A certificação ISO 9001 não garante a qualidade dos serviços ou produtos finais: certifica se estão sendo aplicados os processos comerciais formalizados. 10 O Sistema de Posicionamento Global (GPS) utilizava satélites para traçar mapas das massas de terra. 11 Los Grobo, Los Grobo: 1984-2009, p. 16, http://www.losgrobo.com.ar/novedades/los-grobo-25-anos/127-los-grobo-25- years-english-version/download.html, data de acesso: janeiro de 2011. 12 Este parágrafo foi adaptado do caso Los Grobo" por Andrew McAfee and Alexandra de Royere, Caso HBS No. 9-606-014 (Boston: Harvard Business School Publishing, 2005). 4

Los Grobo: o futuro da agricultura 511-088 Tradicionalmente, a terra era considerada como um lugar seguro para investir. Afinal de contas, o fato de aplicar práticas de cultivo de vanguarda possuía o potencial de incrementar não apenas os rendimentos dos cultivos, mas também o valor de mercado da própria terra. No entanto, Gustavo acreditava firmemente que o investimento nos ativos blandos (intangíveis) por exemplo, talento, capacitação 13 e tecnologia de vanguarda era o melhor investimento para o crescimento futuro no século vinte. Em 2003, Adolfo concordou em deixar o futuro da empresa familiar para a próxima geração, separando seus 4.500 hectares iniciais para seu próprio uso. Creio que meu pai (Adolfo) vê sua fortaleza no trabalho da terra, transformando-a em melhor, refletiu Gustavo. Eu, em compensação, acho que meu ponto forte reside em trabalhar com as pessoas para convencêlas de que as novas ideais são o melhor caminho. Recuando no tempo, Gustavo também observou: Sim, discutiria com meu pai: ele queria comprar terras e eu queria comprar outros ativos para o crescimento... Mas depois de 15 anos de trabalho tínhamos terras que valiam $50 milhões [cerca do ano 2000]. E agora somos um dos principais produtores de grãos da América Latina e isto vale muito mais. Pois bem, digamos que é uma discussão aberta com meu pai. (Vide Anexo 6 para os valores da terra para cultivo ao longo do tempo.) A era moderna Gustavo explicou suas ideias por detrás da moderna Los Grobo e seu caminho rumo ao futuro (vide Anexo 7, resenha da empresa moderna): No futuro, a agricultura será ainda mais especializada. O processo da agricultura está ficando cada vez mais parecido a uma linha de montagem de um automóvel, com a aplicação de ferramentas especializadas. Hoje o produtor agrícola coordena o processo contratando, por exemplo, John Deere e Monsanto, mas o produtor agropecuário constitui apenas uma parte deste processo. Pode agregar valor coordenando bem, no entanto, é preciso também considerar mais detidamente a porcentagem de plantio, a fertilização, o regime de rotação de culturas e as condições do mercado. Isto serve bem para a terceirização. Por exemplo, contratar o serviço de um terceiro com equipamentos e conhecimentos especializados, atualizados. É ali onde encaixa a Los Grobo como empresa de serviços. Como empresa de poucos ativos, a Los Grobo por si próprio não oferecia todas as ferramentas de última geração, mas seus parceiros de negócios, sim. Na rede de parceiros, Gustavo descobriu que a Los Grobo podia prestar quase qualquer tipo de serviço que pudesse beneficiar seus potenciais clientes. Oferecer mais serviços era considerado como uma vantagem competitiva dentro de um ambiente muito povoado. Dentre os concorrentes da Los Grobo, pode ser mencionado El Tejar, que possuía em torno de 1,1 milhão de hectares de produção em quatro países (Argentina, Bolívia, Brasil e Uruguai). El Tejar era aproximadamente quatro vezes tão grande quanto a Los Grobo, embora não fosse tão diversificado dentro da cadeia de valor; seu modelo de negócios punha o foco na originação. 14 (Vide Anexo 8 resenha do conceito todos os serviços em apenas um lugar ( one-stop shop ). Sendo seu principal negócio, a Los Grobo não apenas geria a produção agrícola sua atividade principal de elevada margem e alto risco mas também fornecia insumos, manejava grãos e proporcionava os respectivos serviços logísticos, ajudando assim a diversificar seus fluxos de receitas. A produção agrícola representava 30% das receitas da empresa e 13 Em 2003, houve um ponto de inflexão para a empresa, a Los Grobo investiu em uma nova sede para su produção argentina em Carlos Casares que incluía uma conexão à Internet segura, de alta velocidade (sendo raro na Argentina rural) e um grande auditório de multimídia para apresentações e cursos de capacitação para seu pessoal. 14 Depois de El Tejar e a Los Grobo (em primeiro e segundo lugar), Cresud, SLC Agrícola, MSU, e Adecoagro completaram a lista dos seis produtores de grãos mais importantes da América do Sul. Os concorrentes menores incluíam pools de plantio, que eram organizações que arrendavam e administravam terras para cultivo pertencentes a pequenos proprietários. Os típicos pools de plantio assinavam contratos anuais, garantindo os pagamentos em espécie. Todos os custos operacionais eram assumidos por eles, bem como o risco dos rendimentos das propriedades arrendadas, dividindo o risco do preço dos cultivos com os proprietários. 5

511-088 Los Grobo: o futuro da agricultura 50% do EBITDA 15, enquanto que os insumos (vendas de sementes, fertilizantes e outras substâncias químicas) representavam 10% das receitas e 15% do EBITDA. Por outro lado, a comercialização de grãos representava 60% das receitas da Los Grobo e 35% do EBITDA. Prosseguindo nesse processo, a Los Grobo se expandiram com ferramentas de gestão de riscos (oferecendo aos produtores instrumentos de cobertura) e usinas de produção downstream, a saber, moagem de grãos para a obtenção de farinhas. Logo se propôs oferecer macarrões prontos para o consumo (vide Apéndice A, no final, resenha corporativa). Este tipo de diversificação ajudou a mitigar o impacto de riscos incontroláveis, como, por exemplo, aqueles provocados por fenômenos climáticos e agitação política. Além disso, ajudou também Los Grobo a captar mais valor de cada novo cliente. A Los Grobo entrou em uma região (ou micro-região) arrendando ou contratando terras para cultivar soja, trigo, milho e outros cultivos. Desse modo, por cada hectare utilizado pela Los Grobo para sua própria produção, procurava também oferecer serviços em outros dois hectares da região. Aproveitar o conhecimento adquirido sobre o mercado e as interações com produtores locais constituíram os pilares do modelo da Los Grobo. Na prática, isto significava para a Los Grobo operar em diversas propriedades de médio porte (com um total de 5.000 a 6.000 hectares) próximo ao centro de um ecossistema, o qual incluía a área de influência de sua rede (totalizando outras 10.000 a 12.000 hectares). Gustavo também procurou fazer com que a Los Grobo estivesse mais diversificado geograficamente ingressando em novos países. Gustavo via que as futuras oportunidades de crescimento da Argentina estavam limitadas por uma concorrência acirrada 16 que incrementou os preços do arrendamento de terras, somado aos riscos políticos e climáticos. (Vide Anexo 9 para uma comparação das estruturas de custos por país). Como se isso não bastasse, o índice de inflação na Argentina era de cerca de 25% anual em 2009/10. Depois de haver registrado um tipo de câmbio favorável, a Los Grobo precisava ainda incrementar seus lucros em 15% anual, simplesmente para continuar na corrida, disse o CEO de LGA Alejandro Stengel. 17 Gustavo esperava manter o rápido crescimento da empresa ingressando em novos países, enquanto mitigava os riscos específicos de cada país. Uruguai A empresa entrou no Uruguai em 2004. Uruguai, sendo o vizinho mais próximo e parceiro comercial da Argentina, possuía um índice de alfabetismo muito elevado 98% dos 3,5 milhões de habitantes do país sabiam ler e escrever e uma classe média grande. Embora houvesse muitas semelhanças culturais entre a Argentina e o Uruguai, Gustavo se sentiu poderoso ao poder contar com um parceiro local a partir do Primeiro Dia, porque ele sentia que uma grande fonte de sua própria fortaleza competitiva na Argentina consistia no fato de conhecer os produtores locais crescendo entre eles. Através de uma pessoa conhecida no âmbito corporativo, Gustavo conheceu Marcos Guigou, um experiente produtor agrícola, nascido e criado em um campo em Dolores, Uruguai. Como no caso de Gustavo, Guigou adotou práticas agrícolas de última geração para aumentar os rendimentos e conservar o solo a longo prazo. Guigou foi o fundador da Agronegócios Del Plata (ADP) com o respaldo de Gustavo em 2004. Levando sistemas de plantio direto e soja para seus hectares em produção no Uruguai, a ADP se tornou, sob a liderança de Guigou, no segundo produtor de soja do país. 15 EBITDA = Lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização. 16 Estima-se que 70% a 80% da terra cultivável da Argentina já tinha sido terceirizada para a Los Grobo ou para seus concorrentes por volta de 2010. 17 Entrevista dos autores do caso de estudo, 24 de agosto de 2010. 6

Los Grobo: o futuro da agricultura 511-088 Paraguai. Estimulado pelo sucesso obtido no Uruguai, a Los Grobo ingressou no Paraguai e constituiu Tierra Roja em 2005. O Paraguai, sem ter saída para o mar, embora oferecesse terras que não estavam plenamente desenvolvidas, também apresentava maiores desafios culturais. O índice de alfabetismo do país era de 93%, mas a classe média profissional não estava bem estabelecida. Gustavo não achou neste país um parceiro local que compartilhasse com ele a mesma visão, como no caso de Guigou no Uruguai. Então, Guigou ficou sendo o responsável pela gestão do modelo no Paraguai. Transferir nosso modelo de negócios para o Paraguai continua sendo um grande desafio, assinala Andrea. É frustrante, admitiu Guigou. 18 Fica difícil não estando lá, eles têm diferentes formas de fazer negócios. Por exemplo, ter que trabalhar nos fins de semana ou feriados se fosse preciso nos cultivos não era uma norma no Paraguai como no caso da Argentina e do Uruguai. As oportunidades de parcerias eram limitadas caso a Los Grobo tivesse que manter estritamente seus níveis de controle de qualidade. Brasil. Apesar dos impasses no Paraguai, as aspirações de Gustavo no Brasil eram ambiciosas. Brasil era a maior economia do Mercosul 19 e oferecia o maior número de terras cultiváveis sem desenvolver ou não plenamente desenvolvidas (na forma de terra para pastagens degradadas) na América do Sul ou no mundo, para esta finalidade. Diante de uma oportunidade tão importante, juntamente com seus quase 25 anos de experiência, Gustavo se propôs a conseguir, em apenas cinco anos no Brasil, aquilo que a Los Grobo tinha conseguido em 25 anos na Argentina. A Los Grobo precisava de dinheiro para entrar no Brasil. Gustavo continuava achando que era melhor ter parceiros locais no território para desenvolver as redes de uma maneira mais sólida. Em 2007, surgiu uma oportunidade para fazer uma parceria com Pactual Capital Partners (PCP) do Brasil. PCP era um fundo de investimento e desenvolvedor de negócios composto por membros anteriores do Banco Pactual do Brasil, que tinha sido vendido ao banco suíço UBS. Basicamente, havia duas coisas em relação ao PCP que eram interessantes para nós: Uma delas era que administravam seu próprio dinheiro, não o de terceiros, e a outra era que queriam participar na gerência, explicou Gustavo. A Los Grobo e PCP redigiram um contrato para vender uma participação minoritária na Los Grobo em troca de $100 milhões em dinheiro. A injeção de $100 milhões seria utilizada para o crescimento do fundo. Gustavo se deu conta que o PCP oferecia um maior custo de capital quando comparado com o oferecido por outro banco, mas dividir o risco gerencial fazia com que valesse a pena. PCP, agora chamada de Vinci, tornou-se assim o primeiro acionista fora da família Grobocopatel. Então, interessados em alinhar os interesses da empresa e recompensando seu parceiro uruguaio, Marcos Guigou também se tornou acionista. (Vide Anexo 10 estrutura societária atual e Anexo 11 biografias selecionadas da diretoria). Procuramos conceder aos nossos parceiros locais suficiente autonomia para que dirijam suas empresas, mas, por outro lado, também queremos alinhar seus interesses com o Holding Los Grobo, disse Gustavo. Em 2008, com um contrato formal assinado com a Vinci, a Los Grobo começou a procurar empresas para comprar no Brasil, para começar a produzir o mais rápido possível. Na região central, nos estados de Maranhão, Piauí e Tocantins (conjuntamente conhecidos como Mapito), o crescimento dos agronegócios era considerado muito promissor. Lá, a maior companhia cerealista que ainda operava de forma independente (ou seja, sem haver se juntado ainda com alguma multinacional) se chamava Ceagro. Ceagro possuía uma capacidade de armazenamento estática de 120.000 toneladas e produzia aproximadamente 220.000 toneladas anuais. A Los Grobo investiu BRL 25 milhões ($14,6 milhões) para adquirir uma participação minoritária (35%) da Ceagro. Após a Ceagro, a Los Grobo encontrou Sementes Seleta, uma empresa cerealista localizada nos estados de Goiás e Minas Gerais que enfrentava um processo por falência. A Selecta possuía uma capacidade de armazenamento estática de 300.000 toneladas e produzia 800.000 toneladas de grãos. Em julho de 2008, a atividade de originação de grãos da Selecta passou a fazer parte do Grupo Los Grobo Brasil, recentemente constituído. Naquela mesma época, a Los Grobo assinou um acordo de gerenciamento com Sollus Capital, uma empresa off-shore brasileira da qual Vinci Partners era acionista minoritário (20%). Sollus se dedicava a identificar, adquirir e a desenvolver terras aptas para a agricultura e a vendê-las para obter lucros. Este fato era considerado complementar para a atividade de produção agrícola da Los Grobo sem ser proprietário de terras. 18 Entrevista dos autores do caso de estudo, 25 de agosto de 2010 19 Mercosul foi um Acordo de Comércio Regional (RTA) entre a Argentina, o Brasil, o Paraguai e o Uruguai fundado em 1991 pelo Tratado de Assunção para promover o livre comércio e a livre circulação de bens, pessoas e moeda.

511-088 Los Grobo: o futuro da agricultura O acordo consistia no seguinte: A Los Grobo possuía o direito de subscrição preferente para administrar as propriedades da carteira de terras agrícolas de Sollus; por sua vez, Sollus tinha o direito de subscrição preferente quanto às oportunidades criadas pela Los Grobo em adquirir terras. Enquanto isso, os concorrentes da Los Grobo, como por exemplo El Tejar, Cresud, SLC Agrícola, MSU, e Adecoagro, estavam todos comprando terras no Brasil para procurar captar a parte positiva do potencial incremento do valor das terras. Os holdings imobiliários podiam ser vistos como outra forma de capitalizar a experiência das empresas em agricultura. Apesar da barreira idiomática, o Brasil era o lugar ideal para a Los Grobo porque lá a agricultura estava atraindo profissionais competentes, inteligentes, como na Argentina. Da Vinci Partners Los Grobo adquiriu vários executivos especialistas na matéria, incluindo o CFO da empresa, Antônio Neto. Fazendo parcerias no Brasil, podemos apreciar melhor a idiossincrasia de fazer negócios lá, disse Gustavo. Não podemos simplesmente impor nosso modelo de negócios no Brasil. Devemos adaptá-lo. Por exemplo, os cálculos da produção agrícola eram bem diferentes no Brasil: os arrendamentos de terra tinham um custo mais baixo, mas os insumos - fertilizantes e sementes - e a logística eram muito mais caros. Além disso, no Brasil, as empresas costumam operar de uma maneira muito mais hierárquica do que na Argentina, disse Gustavo, fazendo com que o conceito de parceria em uma rede não hierárquica fosse um pouco mais difícil de vender. Ao mesmo tempo, a terceirização das empresas de pequeno e médio porte de terceiros e empreendedores era vista como algo suspeito, uma tática por parte daquelas pessoas que queriam sonegar impostos trabalhistas. Além disso, os agricultores que estavam dispostos a arrendar suas terras, às vezes, não queriam destinar seus investimentos na compra de maquinarias. Em decorrência disso, a Los Grobo aprendeu a oferecer uma retribuição pela terra e uma retribuição separada para alugar as maquinarias do agricultor. A oportunidade no Brasil é grande, disse Gustavo. Se pudermos triunfar aqui, creio que podemos tirar proveito de nossa plataforma para chegar a outros continentes. Mas se não deslancharmos dentro de dois a três anos, deveremos reconsiderar nossa estratégia de expansão, disse Gustavo. (Vide Anexos 12, 13, e 14 para os resultados e projeções para 2015/16). O grande desafio do futuro Há diversas inquietudes disse Gustavo em seu escritório urbano de Buenos Aires, longe dos campos onde cresceu. Primeiro: Implementamos a estrutura correta? Segundo: Como geramos capital enquanto avançamos? Terceiro: Nosso modelo de rede pode se adaptar a novos contextos? Durante os próximos 20 a 30 anos, os alimentos serão realmente importantes, prosseguiu Gustavo. Queremos criar a plataforma que possa entregar alimentos de forma produtiva. Queremos atrair novos talentos para a indústria e prestar novos serviços. Gustavo citou estatísticas estimando que a metade do crescimento agrícola do mundo durante os próximos 20 a 30 anos ocorrerá na América do Sul, especificamente no Mercosul. Se forem precisos 50 milhões a mais de hectares de terra cultivável, 25 milhões virão da América Latina e 10 milhões da África, disse Gustavo. Ele espera que a Los Grobo saiba aproveitar a experiência latino-americana para ingressar na África no momento apropriado. Se tudo for bem no Brasil, Gustavo acha que poderá aproveitar seu talento com o idioma português para considerar a possibilidade de entrar em Moçambique e/ou Angola. Ao festejar o 25º aniversário em 2008, Gustavo contou que tinha sonhado estar em uma cafeteria em Moçambique com sua esposa Paula, escutando seus habitantes perguntarem qual seria a origem do ubíquo nome Los Grobo. Seriam capazes de adivinhar algum dia que este nome era proveniente de agricultores argentinos que exportavam sua plataforma para uma rede de agricultura baseada no conhecimento a partir da América do Sul para a África e para o resto do mundo? Terá sido realmente verdadeiro o sonho de Gustavo? 8

Los Grobo: o futuro da agricultura 511-088 Anexo 1 Resenha corporativa da Los Grobo Resultados para as safras 2009/10 Los Grobo Área de produção Originação de grãos Vendas de insumos Moagem Brasil 55.000 hectares 800.000 toneladas US $50 milhões 90.000 toneladas Argentina 90.000 hectares 1.000.000 toneladas US $25 milhões 80.000 toneladas Uruguai 90.000 hectares 440.000 toneladas US $15 milhões - Paraguai 16.000 hectares 35.000 toneladas - - Total 251.000 hectares 2.275.000 toneladas US $99 milhões 170.000 toneladas Fonte: Documentos da empresa. Anexo 2 Resenha da Los Grobo: Presença geográfica Nota: No Brasil, o mapa aparece dividido em estados. MA = Maranhão, PI = Piauí, TO= Tocantins, BA = Bahia, GO = Goiás e MG = Minas Gerais. Fonte: Documentos da empresa. 9

511-088 Los Grobo: o futuro da agricultura Anexo 3 Descrição do sistema de plantio direto Extrato de Los Grobo por Andrew McAfee e Alexandra de Royere (2005, revisado 2007), Caso HBS No. 9-606-014: Durante grande parte do século XX, os produtores da Pampa Argentina cultivaram a terra para plantar suas sementes, eliminar ervas daninhas e introduzir uma mistura de aditivos como os fertilizantes. Com o cultivo apareceram os problemas, como a erosão e a compactação da terra, levando a muitos campos argentinos a adotarem um ciclo de rotação de cultivos de 7 anos, no qual nenhuma cultivo é colhido durante quatro anos. O plantio direto, originado na Inglaterra na década de 40, é um sistema mediante o qual os cultivos são plantados, crescem e são colhidos sem alterar o solo. Este sistema oferece vantagens evidentes, embora inicialmente tenha sido bem complexo. Para combater as ervas daninhas que possam destruir um cultivo jovem, os produtores que utilizam este sistema, devem formular uma combinação adequada de herbicidas e aplicá-la no momento certo. Tal como foi mencionado por Grobocopatel, Para ser bemsucedido com o antigo sistema de plantio direto, a gente realmente deve ser um químico. Um novo método de cultivo de soja com plantio direto surgiu a partir da introdução no mercado da soja resistente ao Roundup. Roundup é um potente herbicida desenvolvido pelo gigante da indústria agrícola Monsanto; é altamente tóxico para as plantas em crescimento, mas não para os animais. O ingrediente ativo do Roundup é o glifosato, um produto químico. Em 1991, os cientistas da Monsanto alteraram o genoma de uma planta padrão de soja introduzindo nela genes que lhe proporcionam resistência ao glifosato; desta maneira, o Roundup não afeta estas plantas. Suas sementes também produzem plantas resistentes ao Roundup. Este avanço fez com que o cultivo de soja mediante o plantio direto se tornasse mais prático, produtivo e rentável, conduzindo à terceira revolução de las Pampas durante a qual a produção agrícola Argentina foi triplicada em uma década. Os produtores já não precisam mais fazer combinações exatas de herbicidas; simplesmente fumigam com o Roundup sempre que as ervas daninhas passam a ser um problema. Após a colheita de um cultivo, deixa-se as plantas murcharem e caírem ao solo para fertilizá-lo e depois as sementes da seguinte estação são injetadas diretamente na terra. O plantio direto permite aos produtores argentinos trocarem a rotação tradicional de cultivos por uma sequência de plantio mais produtiva. De fato, o bom clima e as longas estações de cultivo na região dos Pampas permitem safras anuais de dois cultivos. O plantio direto exige menos trabalho e combustível comparados com os métodos tradicionais, reduz a compactação da terra, despejando uma quantidade menor de químicos no meio ambiente. No entanto, o plantio direto ainda exige muito em termos técnicos: os produtores precisam ter conhecimentos e experiência para conseguirem ter êxito. Ao longo do tempo, os produtos e as práticas relacionadas com o plantio direto melhoraram a qualidade das terras para cultivo. Em decorrência disso, um proprietário pode arrendar seus campos para um produtor de plantio direto e ter a certeza de que, ao finalizar o período de arrendamento, suas terras estarão melhores e não danificadas. Isto é fundamental para a Argentina, onde a maioria de seus habitantes sente que seu país não oferece bons mecanismos para a resolução de controvérsias. Caso o proprietário considere que o arrendador não tenha cumprido os termos e condições do arrendamento, por exemplo, fumigando com um herbicida daninho, este proprietário provavelmente não confiará no sistema judicial no que tange a lhe proporcionar uma forma rápida e efetiva de resolver o conflito. Esta falta de confiança no sistema legal formal se propagou por toda a América Latina. No início de 1993, começou o boom do plantio direto na Argentina. Em 2004, 60% da totalidade das terras de cultivo da Argentina eram de plantio direto (comparado 15% nos Estados Unidos e 1% na Europa) e mais de 90% da soja plantada aqui era resistente ao Roundup. [Fim extrato.] 10 Fonte: Andrew McAfee and Alexandra de Royere, Los Grobo, HBS No. 606-014, (Boston: Harvard Business School Publishing, 2005), pp. 2-3.

Los Grobo: o futuro da agricultura 511-088 Anexo 4 Tecnologia da informação da Los Grobo: Capturas de tela selecionadas Fonte: Documentos da empresa. 11

511-088 Los Grobo: o futuro da agricultura Anexo 5 Tecnologia no campo: recibo gerado por telefone inteligente (smartphone) Fuente: Documentos da empresa. Anexo 6 Valores da terra para cultivo na Argentina, 1977 a 2010* Moeda: dólares norte-americanos por hectare * estimados a meados de 2010 Zona de plantação de milho: Pergamino, Rojas, Colón (Província de Buenos Aires); Zona de invernada: Trenque Lauquen, Rivadavia, Villegas (Província de Buenos Aires); Zona de criação: Ayacucho, Rauch, Las Flores (Província de Buenos Aires) Fonte: Adaptado de Márgenes Agropecuarios. 12

Los Grobo: o futuro da agricultura 511-088 Anexo 7 A Companhia: indicadores chave em 25 anos Indicadores chave 1984 2009/10 Número de empregados 4 membros da família 900 empregados mais 5.000 produtores e 4.100 provedores de bens e serviços na rede Área de produção 3.500 hectares perto de Carlos Casares, Província de Buenos Aires 255.000 hectares na Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai Usinas de 1 silo 44 silos próprios e alugados armazenamento Grãos armazenados 1.000 toneladas 2,6 milhões de toneladas Descrição do empreendimento Fonte: Documentos da empresa. Uma empresa familiar Empresa em rede 13

Anexo 8 O conceito Apenas um lugar para todos os serviços 511-088 -14- Fuente: Documentos da empresa.

511-088 -15- Anexo 9 Custos comparativos de cultivos de soja e trigo Soja Brasil Argentina Uruguai Paraguai Exposição principal Custo (US$ por hectare) $790 $420 $480 $560 Sementes 7% 10% 11% 9% Preços da soja Químicos 15% 9% 10% 12% US$ Fertilizantes 22% 5% 17% 16% US$ Arrendamento de terras 19% 45% 32% 28% Preços da soja Geral e administrativo 6% 11% 6% 9% Moeda local Mão de obra / maquinaria 22% 10% 14% 15% Moeda local Colheita 9% 10% 11% 11% Preços da soja Trigo Argentina Uruguai Exposição principal Custo (US$ por hectare) $400 $515 Sementes 10% 9% Preços do trigo Químicos 9% 5% US$ Fertilizantes 14% 26% US$ Arrendamento de terras 33% 28% Preços do grão/trigo Geral e administrativo 9% 5% Moeda local Mão de obra / maquinaria 15% 15% Moeda local Colheita 10% 12% Preços do trigo Fuente: Documentos da empresa.

511-088 -16- Anexo 10 Estrutura corporativa e acionária atual Sollus Fonte: Documentos da empresa.

Los Grobo: o Futuro da Agricultura 511-088 Anexo 11 Biografias selecionadas da Diretoria da Los Grobo Gustavo Grobocopatel, Diretor Executivo de Los Grobo Holding, Engenheiro Agrônomo, formado pela FAUBA (Escola de Agronomia da Universidade de Buenos Aires). Possui uma trajetória de 25 anos na indústria. Antônio Neto, Diretor Financeiro de Los Grobo Holding, trabalhou durante 13 anos na área de finanças corporativas antes de ingressar na Vinci Partners, em 2008. Foi designado CFO do projeto da Los Grobo na região central do Brasil e depois passou a ser o CFO do grupo. Economista, formado pela PUC-RJ e possui um MBA em Finanças Corporativas pela IBMEC-RJ. Alejandro Stengel, Diretor Executivo da Los Grobo Agropecuaria (LGA), ingressou na companhia em 2006. Previamente, foi Sócio de Booz Allen, assessorando corporações multinacionais e grandes grupos locais em estratégia, organização e operações em toda América e Europa. Obteve um MBA pela Escola de Negócios Wharton da Universidade da Pensilvânia e é Engenheiro Industrial formado pela Universidade de Buenos Aires. Juan Goyeneche, Diretor da Divisão Industrial, é Contador Público formado pela Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade de Buenos Aires. Obteve um Mestrado Internacional em Administração Tributária pelo Instituto de Estudos Fiscais de Madrid. Macros Guigou, Diretor Executivo de Agronegócios Del Plata (ADP) a segunda empresa produtora de soja do Uruguai. Possui uma ampla experiência na produção agrícola e, em 2004, fundou ADP. Paulo Fachim, Diretor Executivo da Los Grobo Brasil, possui uma trajetória de 20 anos na produção agrícola. Em 1994, fundou a Ceagro. Fonte: Adaptado pelo autor com base nos documentos da companhia. 17

Anexo 12 Hectares em produção Em milhões de hectares 511-088 -18- Nota: LGA e UPJ operam na Argentina, ADP no Uruguai, TR no Paraguai e Ceagro no Brasil. Fonte: Documentos da empresa.

Anexo 13 Resultados das vendas com receitas históricas em milhões de dólares norte-americanos desde as campanhas 2001/02 até 2009/10. 511-088 -19- A Los Grobo Agropecuária (LGA), UPJ, e Indústria (moagem) operam na Argentina, Agronegócios Del Plata (ADP) no Uruguai, Tierra Roja (TR) no Paraguai, e Ceagro no Brasil. Nota: Receitas em 2008/09, de acordo com as Normas Internacionais de Informação Financeira (NIIF), em 30 de abril de 2009; Receitas em 2009/2010 de acordo com as NIIF em 30 de abril de 2010. Fonte: Documentos da empresa.

511-088 -20- Anexo 14 Os resultados do EBITDA histórico em milhões de dólares norte-americanos desde as campanhas 2001/02 até 2009/10. Tierra Roja (TR) no Paraguai registrou um impacto negativo em termos de EBITDA em 2008-10. ADP no Uruguai contribuiu de maneira positiva - como a divisão industrial /moagem (denominada Indústria ). Nota: O EBITDA em 2008/09, de acordo com as Normas Internacionais de Informação Financeira (NIIF) em 30 de abril de 2009; EBITDA em 2009/2010 de acordo com as NIIF em 30 de abril de 2010. Fonte: Documentos da empresa.