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Transcrição:

PÚBLICO economia Edição especial Dados fornecidos por 500maiores empresas não financeiras portuguesas As firmas que comandam o país, por vendas e mais seis indicadores 24 sectores em análise As líderes de cada distrito O DIAGNÓSTICO, AS SOLUÇÕES E OS EXEMPLOS DE SUCESSO + ENTREVISTA COM MURTEIRA NABO PRESIDENTE DA COTEC A inovação em Portugal Esta revista faz parte integrante do PÚBLICO 4995 e não pode ser vendida separadamente

Editorial É proibido falhar! A inovação é uma das coisas mais difíceis onde estive até hoje a trabalhar. A confissão é de Murteira Nabo, o gestor que aceitou presidir à Cotec depois de uma carreira profissional de mais de 30 anos, os últimos dos quais à frente do grupo PT. É um projecto difícil de agarrar, reforça o número um da recém criada Associação Empresarial para a Inovação na entrevista que publicamos nesta edição das 500 maiores empresas portuguesas não financeiras por vendas em 2002, que tem como tema de capa precisamente a inovação. Percebe-se porquê. A inovação - entendida como a aplicação de novos conhecimentos, resultando em novos produtos, processos ou serviços, ou na melhoria significativa de alguns dos seus atributos é a única estratégia sustentável para Portugal conseguir atingir os níveis de desenvolvimento dos países mais avançados. Nesta matéria, a edição que tem nas suas mãos traz boas e más notícias. Começando pelas más notícias, a economia portuguesa revela um fraco desempenho relativamente à média comunitária em quase todos os indicadores associados à ciência, tecnologia e inovação, concluem Catarina Selada e José Rui Felizardo, da Inteli Inteligência em Inovação, uma das poucas, infelizmente, instituições portuguesas a pensar esta área, no artigo de diagnóstico que (re)publicamos na página 12 desta edição. Em 2002, as despesas de investigação & desenvolvimento (I&D) nacionais não ultrapassam 0,83 por cento do produto interno bruto (PIB), contra 1,88 por cento de média da União Europeia (UE). Comparando com países do nosso campeonato, estamos à frente da Grécia (0,68 por cento em 2000), mas atrás da Espanha (0,96 por cento). Nos países nórdicos que, segundo a Cotec, são o modelo a seguir, as despesas em I&D ultrapassam os três por cento do PIB, meta fixada pela UE para 2010, como são os casos da Finlândia (3,37 por cento) e da Suécia (3,78 por cento). Acresce que a maior parte da factura da I&D em Portugal é paga pelo Estado. As empresas contribuem com menos de um terço (32,5 por cento), praticamente metade da média comunitária (65,5 por cento). Passando às boas notícias, o crescimento das despesas em I&D em percentagem do PIB, em Portugal, acelerou nos últimos anos. No período 1995-2001, o rácio I&D/ PIB progrediu a um ritmo médio anual de 6,6 por cento. Contudo, para atingir a meta de três por cento do PIB em I&D, em 2010, precisaríamos de crescer 15 por cento/ano a partir de 2000. CARLOS ROSADO DE CARVALHO Estamos perante uma situação típica de falha de mercado (ou melhor de falha de sistema) que exige a intervenção das políticas públicas, sendo necessário um conjunto de apoios que empurrem as empresas para o círculo virtuoso da produtividade e competitividade, alertam Catarina e José Rui, no segundo artigo que assinam nesta edição. Num texto dedicado às soluções para o problema da inovação em Portugal, os dois especialistas apontam para a necessidade de focalizar a política de inovação, estabelecendo prioridades em termos de programas e acções, sob pena de prevalecer a dispersão de esforços e a sobreposição de iniciativas. A questão é quem vai liderar o processo de implementação da estratégia e do plano de acção para a inovação. Ao nível da política pública, o actor encontra-se formalizado do ponto de vista da estrutura organizativa no Governo, respondem Selada e Felizardo. Já do lado das estratégias empresariais essenciais para o sucesso do processo em construção, existem várias alternativas de liderança desde as empresas-âncora até aos centros tecnológicos empresariais, passando por redes de cooperação inter-empresariais e associações empresariais. A inovação é a única estratégia de desenvolvimento sustentável para Portugal. Como remata Murteira Nabo na entrevista que abre esta edição, apesar de difícil de agarrar, o projecto é muito estimulante, porque por aí pode passar a mudança do país, se tivermos sucesso. Temos de ter, concluo eu Independentemente do modelo que vier a ser escolhido, existem já no país estratégias empresariais de sucesso nesta matéria. O PÚBLICO seleccionou para si alguns mestres portugueses da inovação (ver página 22 e seguintes), cujo exemplo deve ser seguido. Como remata Murteira Nabo na entrevista que abre esta edição, apesar de difícil de agarrar, a inovação é um projecto muito estimulante, porque por aí pode passar a mudança do país, se tivermos sucesso. Temos de ter, concluo eu. FICHA TÉCNICA DIRECTOR José Manuel Fernandes EDITORES Carlos Rosado de Carvalho, José Manuel Rocha e Manuel Abreu. REDACÇÃO Anabela Campos, Clara Teixeira, Cristina Ferreira, Dulce Furtado, Inês G. Sequeira, João Ramos de Almeida, Luís Miguel Viana, Luísa Pinto, Lurdes Ferreira, Rita Siza e Rosa Soares. COLABORAÇÕES ESPECIAIS Catarina Selada e José Rui Felizardo (Inteli - Inteligência em Inovação), Fátima Azevedo e Rui Nunes. FOTOGRAFIA Adriano Miranda, Carlos Lopes, Daniel Rocha, David Clifford, Isabel Amorim, Luís Ramos, Miguel Madeira, Miguel Silva, Nuno Santos, Pedro Cunha e Rui Gaudêncio. SECRETARIADO Isabel Anselmo BANCO DE DADOS Servitrade GRAFISMO Gil Lourenço e Marco Neves PAGINAÇÃO Marco Neves INFOGRAFIA João Lázaro DIGITALIZAÇÃO Departamento de Digitalização do PÚBLICO EMAIL publico@publico.pt; economia@publico.pt LISBOA Rua Viriato, nº 13 1069-315 Lisboa TELEF. 210111000 (PPCA) FAX Dir. Empresa 210111005; Dir. Editorial 210111006; Agenda 210111007; Redacção 210111008; Publicidade 210111013/ 210111014 PORTO Rua João de Barros, 265 4150-414 Porto TELEF. 226151000 (PPCA)/ 226103214 FAX Redacção 226151099/ 226152213; Publicidade, Distribuição 222151011 ALGARVE Avenida da República Federal Alemã Bloco C2-8000-084 Faro TELEF. 289806656 FAX 289806655 AVEIRO Rua Engº Silvério Pereira da Silva, 16-A, 2º Tr. 3800-175 Aveiro TELEF./FAX 234382507 BRAGA Rua de S. Marcos, 126, 1º esq. Fr. 4700-328 Braga TELEF. 253202650 FAX 253617983 COIMBRA Avenida Fernão de Magalhães, 153/ 157, 2º Dto, sala 6 3000-171 Coimbra TELEF. 239829554 FAX 239829648 MADEIRA Rua dos Ferreiros, 55, 2º Dto - 9000-082 Funchal TELEF. 291231611 VILA REAL Rua 31 de Janeiro, 41, 3º Sala 303-5000-603 Vila Real TELEF. 259326262 FAX 259326265 PROPRIETÁRIO Público, Comunicação Social, SA SEDE Rua João de Barros, 265 4150-414 Porto IMPRESSÃO Mirandela, Rua Rodrigues Faria, 103 1300 Lisboa TELEF. 213613400 FAX 213163469 DISTRIBUIÇÃO Midesa Portugal Distribuição de Publicações, S.A., Rua da República da Coreia, 34, Ronholas, 2714-526 Sintra TELEF. 219267800 FAX 219267850 ASSINATURAS 808200095 CAPA Gil Lourenço 1

SUMÁRIO 1EDITORIAL Carlos Rosado de Carvalho TEMA DE CAPA 12Diagnóstico Como vai a inovação em Portugal? Catarina Selada e José Rui Felizardo 16Soluções Roteiro para um país que quer ser inovador Catarina Selada e José Rui Felizardo 22Exemplos Mestres a inovar Clara Teixeira, Cristina Ferreira, Dulce Furtado, Rita Siza e Rosa Soares 6Entrevista Murteira Nabo, presidente da Cotec Investigação nacional está desligada da realidade Clara Teixeira AS 500 MAIORES GRANDES NÚMEROS 30Quanto Valem as 500 Carlos Rosado de Carvalho ANÁLISE SECTORES 35Comércio Inês Sequeira Comércio, Alimentar, Bebidas e Tabaco Anabela Campos 36Comércio Automóvel Lurdes Ferreira Comércio Farmacêutico, Higiene e Limpeza Rui Nunes 37Comércio Material Eléctrico e Electrónico Inês Sequeira Comércio Produtos Petrolíferos Lurdes Ferreira 41Indústria Farmacêutica Rui Nunes Indústria Madeira, Cortiça e Móveis Fátima Azevedo 42Indústria de Material Eléctrico e Electrónico Fátima Azevedo Indústria Metalúrgica e Metalomecânica Fátima Azevedo 43Indústria Minerais Não Metálicos Anabela Campos 44Indústria Química Fátima Azevedo Indústria Têxtil, Vestuário e Couro Fátima Azevedo 45Media Anabela Campos 38Comunicações Clara Teixeira Construção e Obras Públicas Luísa Pinto 46Serviços Rui Nunes Transportes Inês Sequeira 39Electricidade, Gás e Água Lurdes Ferreira Indústria Alimentação, Bebidas e Tabaco Rui Nunes 40Indústria Automóvel Lurdes Ferreira Indústria de Celulose, Papel e Artes Gráficas Anabela Campos 47Outros Rui Nunes LISTAS 49As 500 por Vendas em 2002 69As 500 de A a Z 4

TEMA DE CAPA / ENTREVISTA Portugal precisa de duas ou três apostas do tipo Ford/Volkswagen e de mais inovação do tipo radical, como o foram a Via Verde ou o Mimo, para criar patentes mundiais e ultrapassar fronteiras, defende Murteira Nabo, presidente da Cotec, a recém-constituída associação de empresas para a Inovação. Até final de 2004, a Cotec deverá definir pelo CLARA TEIXEIRA (Texto) CARLOS LOPES (Fotos) Murteira Nabo, presidente da Cotec Investigação nacional está desligada da realidade Grande parte da investigação aplicada que é feita nas universidades acaba no vale da morte, queixa-se o líder da recém-constituída agência de empresas para a inovação. Por isso, unir as escolas às empresas é um dos objectivos do gestor, que tem como modelo os países nórdicos. A inovação é das coisas mais difíceis, mas também das mais estimulantes que encontrou em 30 anos de carreira profissional. Por aqui pode passar a mudança do país, garante. menos mais três clusters, para além das florestas, onde seja necessário boa vontade para agregar, tentando dar consistência a algumas ideias que por aí há, sem que haja quem as junte. As tecnologias de informação, o sector automóvel e biotecnologia são algumas das áreas em estudo. Confrontado com o modelo de desenvolvimento que Portugal deve adoptar, Murteira Nabo defende uma solução mista, que possa dotar de alta tecnologia as indústrias tradicionais e, em simultâneo, apostar nas chamadas indústrias do futuro, susceptíveis de fazerem a inovação radical que cria valor para o país. A Cotec está a definir clusters para a inovação em Portugal. Como está o processo? Definimos já as florestas. O nosso compromisso é definir mais três clusters até final de 2004. Estamos a estudar os automóveis e as tecnologias de informação, também temos estudos na área da biomedicina. São soluções que estamos a analisar, mas não sei se daí resultarão propostas. No âmbito das florestas, até final do ano estaremos em condições de propor soluções ligadas à questão dos incêndios. O reordenamento e o repovoamento são questões de longo prazo. No curto prazo, o importante são os incêndios. Podemos aproveitar a experiência da Galiza na prevenção do fogo. Dez por cento da floresta ardia todos os anos, mas esse valor desceu para um por cento, através de uma fortíssima aposta num plano de ataque aos incêndios. Mas onde é que a Cotec vai definir os clusters? Nos sectores tradicionais ou nos sectores de futuro, que envolvam alta tecnologia? O conceito de cluster é algo que de forma agregada cria valor substancial. A Cotec vai escolher as áreas que precisam de ser ligadas e eventualmente criar clusters novos, onde ainda não há apostas mas que entendemos que podem ser clusters de futuro. Li há dias que os finlandeses adoptaram a biotecnologia como uma grande aposta para o futuro. Se vamos definir uma coisa desse tipo não sei. O que nos preocupa é aquilo em que pensamos que podemos contribuir para que se crie valor. Então alguns deles serão mais um projecto de cluster do que um cluster Sim, mas não nos propomos estudar todos os clusters do país nem os que já estão estudados. As cortiças por exemplo não precisam. É um sector autónomo, está bem lançado, não precisa de apoio. Não precisa da Cotec para nada. Os moldes também não precisam de nós e ainda bem. Procuramos 6

volvimento, onde é preciso boa vontade para agregar, tentando dar consistência a algumas ideias que por aí há, sem que haja quem as junte. Não estou a ver a Cotec a criar um cluster que ninguém inventou. Se formos para fórmulas muito utópicas, muito ideais, acabamos por não fazer nada. Provavelmente a Cotec não será tão ambiciosa como se poderia pensar. Quando aceitou ser presidente da Cotec disse que o objectivo era que a despesa em Investigação & Desenvolvimento (I&D) aumentasse dos actuais 0,8 por cento para três por cento do PIB. Quando e como é que vai atingir essa meta, que é ambiciosa? Os objectivos da Cimeira de Lisboa indicam que essa meta deve ser atingida até 2010. Investimos em I&D 0,8 por cento do PIB, Espanha um por cento e a média europeia é de dois por cento. O nosso índice de investimento é baixo, mas visto isoladamente o do sector privado é ainda mais baixo. A maior parte é investimento público. A Cotec reúne 102 empresas associadas, e é junto delas que será feita a promoção do investimento em I&D. É suficiente? Não necessariamente. Os nossos associados representam 20 por cento do PIB e temos que começar por eles, mas eu diria que é um problema nacional. O nosso discurso, de que a inovação é essencial para a criação de valor e para a mudança da composição do nosso produto, passa por todo o sector empresarial. Os nossos associados já hoje são o motor desse investimento, mas no contexto europeu o esforço é muito baixo. Temos um programa que passa por fazer encontros, discussões de um ou dois dias, sobre como é que a inovação pode ser uma peça fulcral na criação de valor. Qual é a melhor prática europeia no investimento privado em I&D? São os países nórdicos. Desde há muitos anos que a Finlândia, que é o caso que conheço melhor, investe em I&D. Dos dez países mais avançados no índice de inovação, cinco são nórdicos. Todos estão acima da média europeia. Os países nórdicos são o modelo de referência da Cotec? São, em termos de ambição, mas não é possível replicarem-se estruturas produtivas. Somos cada vez mais um país de serviços. Temos de apostar em sectores de alto valor acrescentado, sejam os de alta ou média tecnologia. Hoje sabe-se que são as apostas em alta tecnologia as que criam mais valor, mas não quer dizer que as outras não o criem. Num país como o nosso, muito baseado em baixa e média tecnologia, não vamos pô-las de lado. Temos de tentar maximizar o valor acrescentado independentemente da indústria. Quais os valores que os países nórdicos gastam em I&D? Estão muito próximos dos cinco por cento do PIB, e o sector privado assegura a maior parte. Na média europeia, os privados atingem 50 por cento da despesa total, mas em Portugal é de apenas 25 por cento. [A Cotec procura] ajudar onde há espaço potencial de desenvolvimento, onde é preciso boa vontade para agregar, tentando dar consistência a algumas ideias que por aí há, sem que haja quem as junte Porque é que os privados não investem mais em I&D em Portugal? Porque acham que não precisam, porque não querem? Temos um problema crucial que é aquilo a que se chama vale da morte. Há

TEMA DE CAPA / ENTREVISTA muita investigação nas nossas universidades, mas muito desligada da realidade empresarial. Quem define em Portugal grande parte das teses de doutoramento na investigação aplicada é o lado da oferta e não o lado da procura. Por outro lado, o sector empresarial está muito desligado das universidades. E grande parte da investigação que é feita ou demora muito tempo ou não chega a ser comercializada. Chama-se a isso o vale da morte. A segunda razão é que baseámos o nosso modelo de desenvolvimento em baixa tecnologia e mão-de-obra barata. Precisamos de aumentar as apostas em média e alta tecnologia porque temos já pessoas qualificadas. Um terceiro problema é a escala. Somos um país de micro-indústrias. Como temos um mercado doméstico pequeno, para conseguirmos escala, para nos internacionalizarmos, precisamos de associações, de parcerias empresariais. Não há muitas, mas temos experiências como a da mglass [vidros da Marinha Grande], a dos componentes automóveis e algumas novas nos têxteis e calçado. Diria que escala, baixa qualificação orientada para baixa tecnologia e falta de ligação entre quem investiga e quem comercializa são três factores cruciais que explicam o baixo investimento em I&D. Em entrevista recente ao PÚBLICO, A escala consegue-se ou com mercado e nós não temos mercado interno suficientemente forte ou então com alianças que permitam, juntamente com os parceiros, ganhar mercado. Quando me dizem que Portugal não tem hipótese, eu digo o contrário Agência Portuguesa para o Investimento é parceiro privilegiado A Agência Portuguesa para o Investimento (API) é associada da Cotec. Como é que explica essa presença? A Cotec é uma associação de empresas, não necessariamente privadas. O estatuto da API é o de uma empresa de capitais públicos. Tem condições para ser sócia. Por outro lado, as ligações que tem aos quatro ou cinco sectores estruturantes em que queremos apostar fazem dela um parceiro privilegiado. Qual o papel que a API pode ter na Cotec? É o mesmo papel que a Cotec pode ter, por exemplo, no desenvolvimento do projecto de turismo no Douro. A Cotec pode ter aí um papel de ligação dos nossos associados da área do turismo. O mesmo acontece com a área das energias alternativas, as eólicas, em que a API também está a trabalhar. A API procura trazer para Portugal investimento estrangeiro e parceiros internacionais. Nós podemos arranjar parceiros nacionais para desenvolverem projectos de dimensão, tipo Ford/Volkswagen. Em conjunto, podemos montar esse tipo de operação. o presidente da Efacec focou o problema da dimensão do mercado e o da falta de massa crítica das empresas, mas disse também que se não equipar primeiro os metros de Lisboa e Porto não consegue ganhar o de São Paulo O partenariado é a única via. O proteccionismo acabou. Mesmo que se faça a defesa do comprar português, isso é temporário. Se adjudicarmos sempre a uma entidade portuguesa é bom, mas a tendência não vai nesse sentido. A Efacec e outras têm de especializar-se, entrar em consórcios com capacidade de ganhar. Se não for assim, desaparecem. Mas é ou não verdade que se não ganhar primeiro o metro de Lisboa e do Porto não ganhará o de São Paulo? É, porque não consegue massa crítica nem experiência. Mas o que a Efacec tem de fazer é arranjar condições para ser competitiva, que é aliás o que está a fazer. É uma questão que se coloca a todas as empresas. Se não tenho escala tenho de me juntar, e quando me junto especializo-me. A Siemens Portugal é um bom exemplo porque especializou-se num produto que lhe garante um mercado, que é o próprio grupo Siemens. Claro que têm vantagem em serem parte de uma multinacional. A escala consegue-se ou com mercado e nós não temos mercado interno suficientemente forte ou então com alianças que permitam, juntamente com os parceiros, ganhar mercado. Quando me dizem que Portugal não tem hipótese, eu digo o contrário. Uma Finlândia, uma Suécia, uma Irlanda, uma Suíça, são países pequenos. Uma Islândia e uma Dinamarca também. A sociedade do conhecimento é uma oportunidade para estes países. É preciso que os decisores entendam que a inovação é uma forma de ver o negócio e não apenas a grande descoberta. Parece defender para Portugal um modelo misto, baseado na modernização dos sectores tradicionais mas também na introdução da alta tecnologia. Tenho uma realidade económica que não posso ignorar. Depois tenho uma realidade nova, que é uma utopia: os sectores de alta tecnologia. Demora muitos anos a fazer uma coisa desse tipo. Mas é aí que está o valor acrescentado. Há já 180 casos identificados de empresas start up em Portugal, algumas delas associadas a parceiros internacionais, outras de capital nacional, só na área das novas tecnologias, biomedicina, etc. Só que representam muito pouco no PIB e algumas delas nem vão sobreviver. Há dois movimentos que têm de ser feitos em simultâneo: fazer com que o nosso sector produtivo seja mais competitivo, através de soluções do tipo Agrupamentos Complementares de Empresas (ACE), e apostar ao mesmo tempo em sectores de futuro. Vou dar o exemplo da biotecnologia: em Portugal há imensos casos, alguns muito curiosos. O mesmo se passa na área da biomedicina. Simplesmente vai demorar muito tempo até à comercialização dessas experiências. Não posso desligar-me de uma realidade concreta, da que compõe o produto. Defendo por isso os dois movimentos: uma aposta forte em áreas novas, nas chamadas indústrias de futuro, mas também nas indústrias que temos, de baixa tecnologia, através de modelos de organização associativa. 8

TEMA DE CAPA / ENTREVISTA A Universidade da Carolina do Norte [criou] um modelo de associação entre investigadores, empresários e capital de risco que lhes permite transformar conhecimento residente em start ups e ajudar a ultrapassar o vale da morte O tempo se encarregará de recompor o nosso produto nacional. Os clusters onde já somos fortes têm de se adaptar a uma lógica que permita reter mais valor acrescentado residente, quer na produção quer na exportação. Gostava de ter patentes de residentes. Temos imensos sábios mas não temos patentes registadas nem produtos no mercado. Essa criação de valor acrescentado residente é independente da manutenção dos centros de decisão? É importante termos centros de decisão. As pessoas vivem melhor ou pior em função da riqueza que fica no país e da sua distribuição. Quanto melhores forem os centros de decisão nacionais, mais riqueza se distribui e melhor vivem os portugueses. Porque é que a Finlândia é rica? Porque os centros de decisão finlandeses são poucos mas bons. A Nokia não vende só para a Finlândia, vende para todo o mundo. Centros de decisão fortes são fundamentais, mas não devem ser protegidos. Têm que resultar da competitividade, dos modelos de gestão e dos modelos de negócio que conduzam à criação e à retenção de valor em Portugal. A origem do capital é importante? O que é importante é o valor que fica retido cá. O centro de decisão da Siemens Portugal é aqui porque é dona de um centro de excelência que vende o produto a outros. O que é importante é que o capital residente, desejavelmente nas mãos de portugueses, fique cá e seja repartido pela população portuguesa. Seria bom que os centros de decisão e os centros de excelência estivessem todos nas mãos de portugueses. Não podendo ser, o que é importante é que os centros de decisão estejam cá. Se não forem todos portugueses, diria que do mal, o menos. Como é que os protocolos firmados com o Madan Parque [Almada] e com a Universidade da Carolina do Norte ajudam a estratégia da Cotec? O protocolo com o Madan Parque é orientado para a criação de ACE, só para o cooperativismo empresarial. Permite-nos criar, com as empresas e entidades envolvidas em determinados sectores, as condições para desenvolver ACE. Com a Universidade da Carolina do Norte, estamos a tentar importar um modelo para criar start ups. Eles criaram um modelo de associação entre investigadores, empresários e capital de risco que lhes permite transformar conhecimento residente em start ups e ajudar a ultrapassar o vale da morte, procurando envolver todas as partes no processo de decisão. Quais foram os resultados desse modelo na Carolina do Norte? É um dos casos de sucesso na comunicabilidade entre quem investe e o mercado. Tiveram uma taxa de sucesso de 80 por cento. É o caso de maior sucesso nos EUA. Vamos fazer um projecto conjunto para Portugal, tentando criar um pólo tecnológico baseado nesse modelo. O modelo da Carolina do Norte ajuda a resolver dois problemas: a falta de empreendedorismo e a transformação de conhecimento residente em negócio. Mas nenhum destes protocolos serve a outra missão da Cotec, que é a de convencer os empresários a investirem mais dinheiro em I&D... Estes convencem as pessoas a investirem e a envolverem-se em projectos de start ups. Até final de 2004, vamos tentar criar um modelo de sensibilização para a inovação e vamos fazer um encontro de associados para os convencer de que a inovação é a aposta de futuro. Essa é a parte que pressupõe uma acção de lobby Essa é a parte da evangelização para a inovação [risos]. Queremos contribuir através de propostas concretas para que as pessoas invistam na inovação em todas as suas componentes. Embora eu esteja convencido, e aqui sou muito prático, que 10

inovação é mercado e é produto. O conceito de inovação é integral, envolve tudo, mas o grande problema nacional está no facto de que muito do que se faz em Portugal não se transforma. Se eu não tenho produto nem mercado não consigo criar valor nem aumentar a minha riqueza. Tenho de investir no produto e depois arranjar alguém que o compre. Sempre se falou e sempre se inovou em Portugal. Agora mais do que antes. Só que o nosso ritmo de inovação é mais lento que o dos nossos parceiros europeus. Os outros inovam a um ritmo mais avançado porque têm condições. É a chamada inovação incremental. É um trabalho diário e permanente. Depois há a chamada inovação de ruptura, a inovação radical, que é a que muda qualitativamente e no curto prazo as coisas. São as Vias Verdes, os Multibancos e os Mimos. Essa inovação é que é crucial. A incremental faz-se todos os dias e há muita gente a fazê-la em Portugal. Está é mal estudada. Vamos também lançar um programa de conhecimento de case studies, porque as pessoas não conhecem o que está a acontecer. Em relação à inovação que classificou de radical parece que não se passou mais nada em Portugal depois da Via Verde e do Mimo Essas são as mais conhecidas. São as que efectivamente mudam a curto prazo. Portugal tem de ter duas ou três apostas do tipo Ford/Volkswagen, tipo Via Verde ou tipo Mimo, em que se cria uma patente mundial e se ultrapassam fronteiras. A biomedicina e a biotecnologia são também áreas de grandes potencialidades. Não sei se vão gerar a riqueza que gerou uma Via Verde, mas há muita coisa a ser feita. As pessoas têm a ideia de que nada está a ser feito, mas está. O que não se vê é investimento estrangeiro a chegar a Portugal. Como o nosso modelo económico mudou, a economia de mão-de-obra barata deixou de existir, há muitas empresas a saírem de Portugal, sem que sejam substituídas por investimentos novos ou por modelos baseados na média e alta tecnologia e na qualificação. Não escondo que a inovação é das coisas mais difíceis onde estive até hoje a trabalhar, em 30 anos de carreira como gestor. É um projecto difícil de agarrar. Mas é muito estimulante. Por aqui pode passar a mudança do país, se tivermos sucesso.

TEMA DE CAPA / DIAGNÓSTICO PAULO PIMENTA As Jornadas de Inovação do Presidente Jorge Sampaio chamaram a atenção para a necessidade de reorientar o modelo de desenvolvimento da economia portuguesa Indicadores Como vai a inovação em Portugal? A economia portuguesa revela um fraco desempenho relativamente à média comunitária em quase todas as variáveis associadas à ciência tecnologia e inovação. O longo período do Estado Novo e a adesão retaradada à CE são os principais factores que marcam o atraso estrutural do país. Só nos anos 80 e 90 emergiu uma verdadeira política de inovação que explica o recente crescimento. Nunca se falou tanto em inovação em Portugal como nos últimos tempos, em muito devido à necessidade de reorientação do modelo competitivo da economia portuguesa de um modelo Recursos Intensivo para um modelo Conhecimento Intensivo. Os acontecimentos recentes corroboram esta situação, com as Jornadas de Inovação realizadas pelo Presidente da República que culminaram com a cerimónia de lançamento da COTEC Portugal, onde foi apelado como novo desígnio nacional Fazer de Portugal um País de Inovadores e de Inovação. O peso do atraso estrutural Nos anos 60 e 70 imperavam concepções lineares do processo de inovação, sendo CATARINA SELADA E JOSÉ RUI FELIZARDO* que na primeira década a tecnologia era vista como gerada num sistema externo à economia e na segunda emergiu a necessidade de repensar a relação entre a ciência e a tecnologia. Existia uma fraca coordenação entre políticas e uma ténue ligação inter-institucional. É nos anos 80 e 90 que emerge uma verdadeira política de inovação. A ciência passa a ser encarada como fonte de oportunidades estratégicas e a tecnologia é vista como endógena à economia. Com a consideração do processo de inovação como interactivo, surge o conceito de sistema nacional de inovação. Em Portugal, toda esta evolução tem lugar com um grande desfasamento temporal. O longo período do Estado Novo e a adesão retardada à CE são os principais factores que marcam o atraso estrutural do nosso país, sendo que o desenvolvimento do sistema científico e tecnológico viria a resultar de um conjunto de tensões e hesitações entre a afirmação de um sistema nacional e a integração na comunidade europeia e internacional. Assim, imperou sempre em Portugal uma forte dicotomia entre as intervenções do lado da ciência e ensino superior e da tecnologia e indústria, tendo as verdadeiras políticas de inovação vindo apenas a emergir - de forma tímida - nos anos mais recentes, por exemplo com o PROINOV. O que dizem os números Os indicadores associados à ciência, tecnologia e inovação revelam um fraco desempenho da economia portuguesa em relação à média comunitária face à fraca posição de partida do país; apesar disso, o crescimento recente tem-se mostrado bastante significativo. Será de assinalar a necessidade de aperfeiçoamento da bateria dos indicadores de inovação produzidos a nível nacional e europeu. No que concerne aos indicadores de 12

TEMA DE CAPA / DIAGNÓSTICO O ex-primeiro-ministro, António Guterres, na foto com o presidente da Comissão Europeia, Romano Prodi, foi o anfitrião do Conselho Europeu de Lisboa que definiu como objectivo fazer da UE o espaço mais competitivo do mundo numa década input, a economia portuguesa apresenta valores de 0,83 por cento em despesa de I&D em relação ao PIB (contra 1,88 por cento da média da UE), sendo que países como a Espanha detêm números de 0,96 por cento, a Irlanda de 1,21 por cento e a Finlândia de 3,37 por cento. A percentagem de despesa executada pelas empresas em Portugal ainda continua a ser diminuta apesar de ter sofrido um salto importante de 1999 (22,7 por cento) para 2001 (32,5 por cento). A média da UE é de 65,5 por cento contra valores de 54,3 por cento para a Espanha e 72,9 por cento para a Irlanda, ficando apenas a Grécia numa posição inferior com 28,5 por cento. Portugal detém 4,4 por mil de recursos afectos à I&D em relação à população activa contra 9,9 por mil da média comunitária. No que concerne aos novos licenciados em ADRIANO MIRANDA ciência e engenharia em por cento da classe etária 25-64 anos, Portugal detém um valor de 6,2 por cento contra 10,3 por cento da média da UE, sendo que a Espanha apresenta um número de 9,9 por cento, a Irlanda de 23,2 por cento e a Grécia situa-se numa posição inferior com 3,8 por cento. No entanto, o capital humano é um dos factores essenciais para o aumento da produtividade, pelo que importa analisar o indicador População com Diploma de Ensino Superior em por cento da Classe Etária dos 25-64 Anos, onde Portugal apresenta uma posição desfavorável situando-se em último lugar na Europa dos 15 com 10,17 por cento. Em termos de indicadores de output, podemos falar da percentagem das PME s industriais que realizam inovação interna, sendo que Portugal detém um valor de 21,8 por cento contra 44 por cento da média comunitária, com a Irlanda a apresentar 62,2 por cento e a Suécia 44,8 por cento. Além do mais, de acordo com os dados provisórios do III CIS a proporção total de empresas que introduziram inovação em 1998-2000 foi já de 43,9 por cento, sendo de considerar cerca de 44 por cento empresas inovadoras na indústria e 50 por cento nos serviços, panorama mais favorável que o encontrado no II CIS de 1995-1997. Como comparação, podemos apresentar a Irlanda com cerca de 72 por cento empresas inovadoras na indústria e 60 por cento nos serviços. Apesar da inovação ocorrer em todos os sectores, desde os tradicionais aos de alta tecnologia, podemos observar o indicador de peso do emprego em indústrias de alta e média intensidade tecnológica, sendo que Portugal apresenta também uma fraca performance com uma por cento de emprego nestas indústrias de 3,44 por cento contra uma média da UE de 7,6 por cento. Apesar desta breve análise de alguns indicadores que demonstram um baixo desempenho relativo de Portugal, o que é certo é que temos vindo a assistir a um crescimento significativo das actividades de ciência, tecnologia e inovação nos últimos anos. A taxa média anual de crescimento do investimento em I&D 1995-2000 foi de 9,9 por cento em Portugal, taxa apenas superada pela Grécia (12 por cento) e Finlândia (13,5 por cento). A análise detalhada doutros indicadores corrobora este facto com taxas médias anuais no mesmo período de 5,87 por cento para a despesa de I&D em relação ao PIB; 11,92 por cento para a I&D financiada pelas empresas em por cento do output industrial; 13,60 por cento para o n.º de patentes submetidas ao EPO por milhão de habitantes; e 7,33 por cento para o valor acrescentado nas indústrias de média e alta intensidade tecnológica em percentagem do output total. Após dois anos do Conselho Europeu de Lisboa ter definido como objectivo estratégico tornar-se o espaço económico mais dinâmico e competitivo do mundo baseado O MAPA DA INOVAÇÃO Portugal Espanha Grécia Irlanda Finlândia Suécia Média UE Despesa em I&D em % do PIB 0,83% 0,96% 0,68%* 1,21%** 3,37%* 3,78%** 1,88% % da Despesa em I&D Executada pelas empresas 32,50% 54,30% 28,50%** 72,90%** 70,90%* 75,10%** 65,50% % da Despesa em I&D Executada pelo Estado 21,40% 15,50% 21,70%** 5,90%** 10,60%* 3,40%** 13,80% I&D Financiada pelas empresas como % do Output industrial 0,26%** 0,58%** 0,28%** 0,98%** 3,17%* 4,27%** 1,49% Pessoal Total em I&D (ETI) em da População Activa 4,40 7,10 * 5,90 ** 7,30 ** 20,20 * 15,20 ** 9,90 Novos Licenciados em Ciência Engenharia em % da Classe Etária 25-64 anos 6,20%* 9,90%* 3,80%**** 23,20%* 17,80%** 11,60%* 10,30% Nº de Patentes submetidas ao EPO por milhão de habitantes 4* 21* 6* 70* 283* 306* 139 Inovação interna nas Empresas (% de PMEs Industriais) 21,80%**** 21,60%*** 20,10%**** 62,20%**** 27,40%**** 44,80%**** 44,00% PMEs que participam em actividades em cooperação (% de PMEs Industriais) 4,50%**** 7,00%*** 6,50%*** 23,20%**** 19,90%**** 27,50%**** 11,20% Capital de risco nas fases Semente e Start-up em do PIB 0,13 0,17 0,24 0,33 1,03 1,02 0,45 % de Valor Acrescentado das Indústrias de Alta e Média Teconologia como % do Output Total 4,00%** 5,56%* 1,74%* n.d. 9,99%* n.d. 7,77% Emprego em Indústrias de Alta e Média Teconologia como % do Emprego Total 3,44%* 5,37%* 2,20%* 6,94%* 7,22%* 7,90%* 7,60% *2000; **1999; ***1998; ****1996 Fonte: CE (2002), Key Figures 2002 - Science, Technology and Innovation ; OCT, Inquéritos ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional; Inquéritos Comunitários à Inovação em Portugal; CE (2002), Painel Europeu de Inovação 14

no conhecimento..., a UE vem estabelecer uma meta para a despesa de I&D em por cento do PIB de 3 por cento para 2010 contra os cerca de 1,9 por cento da média comunitária em 2000. No entanto, de acordo com uma análise linear (e apesar de investigação não se confundir com inovação), para que Portugal atinja tal objectivo, o indicador despesa de I&D/PIB terá que crescer a uma taxa média anual de cerca de 15 por cento entre 2000-2010! Sendo que a taxa média anual de crescimento de 1995-2001 rondou os 6,6 por cento (apesar da tendência de crescimento notória com uma taxa de 9,2 por cento de 2000-2001). Apesar de algumas tendências positivas expressas nas estatísticas, muito há ainda por fazer em matéria de inovação em Portugal. E não basta estabelecer metas, é necessário traçar o caminho para as atingir... Pistas para a Política de Inovação É necessária uma política de inovação assumida como transversal à economia e à sociedade e que reconheça a sistematicidade e abrangência do conceito de inovação. É essencial que seja uma política focalizada e selectiva para evitar dispersão de esforços e sobreposição de iniciativas. Deve ter ênfase empresarial e promover estratégias de mercado, através da valorização de clusters induzidos por dinâmicas sectoriais ou tecnológicas chave da economia. Deve promover o relacionamento internacional da economia portuguesa no contexto europeu e global, valorizando em simultâneo especificidades regionais. Deve interagir com outros domínios políticos, nomeadamente com a política industrial e de desenvolvimento regional, exigindo uma forte coordenação de políticas. Por fim, é uma política que ocorre numa escala temporal relativamente longa, não devendo depender de ciclos políticos. Esta política de inovação deve ser coordenada ao mais alto nível político, através da UMIC, e deve ser suportada numa estratégia e num plano operacional para a inovação. A aposta no desenvolvimento de novos e melhores produtos deve ser o alvo essencial do plano de acção para a inovação, sendo o termo produto entendido de forma ampla, incluindo aspectos de concepção, fabrico e comercialização. Para atingir, em 2010, a meta de três por cento do produto interno bruto para a despesa em investigação e desenvolvimento, Portugal precisa que esse indicador cresça a uma taxa média anual de 15 por cento, contra os 6,6 por cento registados no período entre 1995-2001 Se esta política de inovação for efectiva, com uma correcta coordenação de instrumentos e articulação de actores, talvez Portugal consiga recuperar o atraso estrutural... e fazer da inovação o suporte do seu modelo de desenvolvimento. *INTELI Inteligência em Inovação artigo publicado no suplemento de Economia do PÚBLICO de 12/05/2003 A razão industrial, A paixão automóvel A Faurecia é um dos maiores fornecedores de equipamentos para a indústria automóvel e um dos líderes mundiais nos seis principais módulos: bancos; painéis de instrumentos e cockpit; painéis e módulos de porta; revestimentos acústicos e tapetes; bloco frontal e sistemas de escape. O Grupo realizou em 2002 um volume de vendas de 9.9 biliões de euros, está presente em 27 países e emprega mais de 50 000 colaboradores, repartidos por 150 fábricas. FAURECIA Assentos de Automóvel, L.da Rua Comendador Raínho, 44 Apartado 61 Tel. 256 839 200 Fax 256 839 207 3701-953 São João da Madeira Portugal www.faurecia.com

TEMA DE CAPA / SOLUÇÕES PEDRO CUNHA O calçado português soube mudar e inovar através de um processo de acção colectiva, com forte contributo da associação e do centro tecnológico do sector Prioridades Roteiro para um país que quer ser inovador Os desafios da política de inovação passam por apostar na intersecção de sectores horizontais na lógica do produto e da tecnologia e que detêm maior desempenho e força mobilizadora para levar a cabo projectos estruturantes. O objectivo é a criação de novos produtos, valorizados e credibilizados no exterior, como concebidos em Portugal Portugal contínua a apresentar um nível de produtividade, medido pelo PIB per capita, de cerca de 75 por cento da média da União Europeia. Este facto baseia-se numa baixa produtividade horária quando comparada com as outras economias da comunidade e numa elevada utilização extensiva de recursos. Neste sentido, de acordo com a análise de Conceição (2003), mesmo o processo de catching-up que o nosso país tem atravessado ao longo dos últimos 15 anos deveu-se menos a um aumento da produtividade (que ocorreu em menor escala do que noutros países) mas mais a uma utilização extensiva dos recursos disponíveis. Este CATARINA SELADA E JOSÉ RUI FELIZARDO* trajecto começa agora a apresentar rendimentos decrescentes, senão mesmo a esgotar-se. O modelo de desenvolvimento da economia portuguesa tem vindo a basear-se, desta forma, num modelo recursos intensivo com ênfase na produção e no investimento (material), cuja especialização internacional se centra em actividades de transformação de baixo e médio valor acrescentado e de fraca qualificação, onde as redes de subcontratação são determinantes e as actividades de investigação e desenvolvimento têm tido um papel secundário. A aposta na inovação é a única estratégia sustentável para Portugal poder desenvolver- se a um ritmo que lhe permita atingir os níveis de desempenho económico dos países mais desenvolvidos. De acordo com o 2º Relatório sobre a Coesão Económica e Social (CE, 2000), a inovação é o meio mais eficaz através do qual as regiões menos desenvolvidas se podem adaptar às condições de competitividade da economia global. O Painel Europeu de Inovação vem corroborar esta afirmação sugerindo a existência de uma relação positiva entre o desempenho inovador de uma região e o seu desempenho económico. Por fim, a comunicação recente da Comissão sobre Política de Inovação (CE, 2003) fala de uma...insuficiência da actividade inovadora como um factor chave subjacente ao desempenho inferior em termos de crescimento da produtividade e competitividade. Torna-se, assim, premente a reorientação do modelo de desenvolvimento da economia portuguesa para um modelo conhecimento intensivo baseado na inovação e na qualificação e centrado na criação e adopção de novos produtos, serviços e tecnologias (Ver figura pág. 18). Apesar das tendências positivas assinaláveis nos últimos anos, é já unanimemente reconhecido o fraco desempenho relativo de Portugal em matéria de inovação expresso quer nos inquéritos ao potencial científico e tecnológico nacionais (IPCTN) e nos inquéritos comunitários à inovação (CIS) quer nos resultados recentes do Painel Europeu de Inovação (CE, 2002) de notar o reconhecimento, já expresso pela CE, da necessidade de aperfeiçoamento das estatísticas de inovação existentes. 16

Estamos perante uma situação típica de falha de mercado (ou melhor, falha de sistema ) que exige a intervenção das políticas públicas, sendo necessário um conjunto de apoios que empurrem as empresas para o circulo virtuoso da inovação e do aumento da produtividade e competitividade. Política pública de apoio à inovação A Política de Inovação traduz-se num conjunto de iniciativas públicas orientadas para aumentar o volume e a eficiência das actividades inovadoras, sendo estas a criação, a adaptação e a adopção de novos ou melhores produtos, processos ou serviços (CE, 2000). A natureza multidimensional do processo de inovação caracterizada pelo seu carácter sistémico e abrangente - tem uma influência decisiva na política de inovação que nem sempre tem sido compreendida aquando da sua concepção e implementação. Além do mais, a empresa encontra-se no centro do processo de inovação, pelo que o efeito final da política de inovação deve reflectir-se nas empresas: no seu comportamento, nas suas capacidades e no seu quadro operacional. (CE, 2003). Existem três dimensões essenciais nas políticas públicas com reflexos importantes em termos de inovação e que devem ser tomadas em conta no debate acerca do crescimento da produtividade e competitividade (CE, 2003), a saber: - A política que influencia as capacidades de inovação e o comportamento das empresas pode ser determinada a nível local, nacional, comunitário ou mesmo global ( governância política ); - Muitos elementos que afectam a inovação são comuns a diversos sectores industriais, embora o seu peso relativo varie de acordo com as respectivas características particulares: no entanto, alguns sectores detêm especificidades tão marcadas que exigem respostas políticas peculiares; - Frequentemente, a política de inovação tem que ser induzida através de outras políticas, por forma a ter em conta a diversidade de factores que influenciam a inovação nas empresas. Os desafios actuais da política de inovação em Portugal, enquanto política transversal, prendem-se essencialmente com a ausência da interiorização das noções de sistematicidade e abrangência da inovação e da ênfase empresarial, dimensão sectorial, governância política e interacção com outros domínios políticos da política de inovação. Apesar da mudança entretanto operada, há que recorrer à história para perceber o passado e perspectivar o futuro: de facto, imperou sempre no nosso país uma forte dicotomia entre as intervenções do lado da ciência e ensino superior e as intervenções do lado da tecnologia e indústria em termos do fomento da inovação, tendo as verdadeiras políticas de inovação vindo apenas a emergir de forma tímida nos últimos anos com a noção de sistema nacional de inovação. As políticas de inovação podem ser aferidas em termos de três vectores essenciais, a saber: coordenação e convergência de actores, estratégia de inovação com prioridades e eixos de intervenção e programas ou planos de inovação e respectivos instrumentos de suporte. Observando os primeiros factores, podemos tentar classificar as políticas de inovação ao nível da União Europeia, como forma de perceber a evolução e posicionar Portugal, segundo Os desafios actuais da política de inovação em Portugal, enquanto política transversal, prendem-se, essencialmente, com a ausência da interiorização das noções de sistematicidade e abrangência da inovação e da ênfase empresarial, dimensão sectorial, governância política e interacção com outros domínios políticos da política de inovação o nível de coordenação da política e o grau de agregação da estratégia (UMIC, 2003). Ver figura pág.20 Neste sentido, em termos de coordenação, teremos desde um modelo disperso onde assumem a coordenação da política várias

TEMA DE CAPA / SOLUÇÕES entidades e Ministérios responsáveis (maior parte dos países candidatos à adesão); um modelo repartido, com a coordenação geralmente a cargo de dois Ministérios como a Economia/Indústria e a Ciência/Tecnologia ou do Governo Central e estruturas regionais (França e Alemanha); e um modelo do actor dominante, onde a coordenação é exercida na dependência do Primeiro Ministro ou de um Ministério/Conselho (Irlanda, Reino Unido e Finlândia). No que concerne ao grau de integração da estratégia, podemos ter um modelo de medidas dispersas de inovação (maior parte dos países candidatos à adesão); um modelo de programas ministeriais (Alemanha e Holanda); e um modelo de criação de programas nacionais de inovação (Irlanda, Reino Unido e Finlândia). Conforme afirmou recentemente a CE (2003),... a UE aconselha que os Estados Membros devem constituir e reforçar as suas estratégias de inovação nacionais, adoptando uma abordagem de coordenação com todos os órgãos da Administração Pública cujas áreas de responsabilidade tenham implicações para as condições necessárias para a inovação (...) devendo ser assegurada a coordenação ao mais alto nível político.... Portugal tem vindo a desenvolver esforços no sentido de conseguir atingir formalmente um modelo de coordenação ao mais alto nível aliado a uma estratégia nacional de inovação. Neste sentido, foi criada a Unidade de Missão Inovação e Conhecimento (UMIC), na dependência directa do Ministro Adjunto do Primeiro Ministro, que tem como objectivo operacionalizar os mecanismos e instrumentos de efectiva promoção e criação de um ambiente favorável à inovação. Além do mais, foi conceptualizado um Programa Integrado de Apoio à Inovação (PROINOV) que apresenta um conjunto de eixos estratégicos e medidas prioritárias a nível As alterações não se conseguem por decreto. Torna-se necessário passar à actuação junto dos agentes económicos e sociais e, essencialmente, do tecido empresarial, com a produção e demonstração de resultados concretos nacional de promoção da inovação. No entanto, as alterações não se conseguem por decreto. Torna-se necessário passar à actuação junto dos agentes económicos e sociais e, essencialmente, do tecido empresarial, com a produção e demonstração de resultados concretos. Prioridades de política e clusters de inovação No sentido de passar da conceptualização da estratégia e da acção formal e administrativa à intervenção no sistema nacional de inovação, urge destacar a importância da focalização da política de inovação. De facto, torna-se necessário estabelecer prioridades em termos de programas e acções de inovação, sob pena de prevalecer a dispersão de esforços e a sobreposição de iniciativas. Isto é particularmente importante numa situação de transição de modelo de política de inovação e de tentativa de convergência de actores no sentido da prossecução de objectivos e metas comuns. Ao nível da focalização da política de inovação, gostaríamos de destacar três factores determinantes na definição das linhas essenciais de um plano de acção para a inovação e que, de certa forma, se encontram associados aos conceitos e dimensões da política pública já referidas e destacadas pela CE, a saber: - A inovação tem uma natureza sistémica e está ligada à geração e criação de valor quer a nível tecnológico como organizacional e empresarial, sendo as empresas o actor central do processo de inovação. - A inovação deve ser contextualizada num determinado espaço local, regional e/ou nacional em articulação com a vertente europeia e a sua interacção global, sendo as parcerias internacionais um aspecto essencial da promoção da inovação. - A inovação ocorre mais frequentemente através do estabelecimento de ligações, acordos de cooperação e redes entre um vasto leque de empresas e outras entidades, dado que a competitividade dos sectores reside na capacidade de aceder e usar conhecimento e tecnologia desenvolvido numa ampla e alargada gama de instituições que se constituem como bases distribuídas de conhecimento (Heitor, 2003). Por todos estes motivos, a abordagem de clusters traduz-se numa metodologia importante de estímulo à inovação e, consequentemente, à competitividade das regiões e economias. A OCDE (2001) define clusters como redes de empresas fortemente interdependentes, ligadas entre si numa cadeia de produção de valor acrescentado. Podem também integrar alianças estratégicas com universidades, REORIENTAÇÃO DO MODELO DE DESENVOLVIMENTO DA ECONOMIA PORTUGUESA Características Modelo Recursos Intensivo Modelo Conhecimento Intensivo Investimento Inovação Aquisição e adopção de tecnologia disponível Produção e desenvolvimento de tecnologia Acumulação de capacidade produtiva Criação e desenvolvimento de novos produtos Tecnologia e Ênfase na engenharia de processo/produção Ênfase na engenharia do produto/concepção Competitividade Predomínio de grandes empresas Criação de novas empresas Importância da escala dos investimentos materiais Importância dos investimentos imateriais complementares Recursos Humanos e Valorização da experiência dos gestores/ trabalhadores Valorização da criatividade e energia dos gestores/ trabalhadores Qualificações Importância do baixo custo de mão de obra Importância da qualificação dos recursos humanos Reduzido grau de diferenciação dos recursos Elevada especialização dos recursos humanos Dinâmica de Especialização Especialização assente em sectores tradicionais Especialização centrada em sectores estruturantes Baixa intensidade tecnológica, mão de obra intensiva e competitividade assente Elevada intensidade tecnológica, horizontalidade, carácter pluritecnológico no baixo custo salarial e multisectorialidade Reduzidos efeitos multiplicadores para a globalidade do tecido empresarial Efeitos multiplicadores para sectores de menor intensidade tecnológica Estado e Centros de decisão nas empresas e universidades (concertação estratégica Estado-empresas) Centros de decisão em parcerias público-privadas Empresas Estado protector das empresas e dos mercados Estado regulador/facilitador e empreendedor Proteccionismo dos mercados Funcionamento dos mecanismos concorrenciais Individualismo empresarial Cooperação inter- empresarial Papel tradicional das universidades, institutos tecnológicos e associações Espaço para actuação de novos actores na sociedade civil em parceria público-privada Políticas e Desarticulação entre a política industrial, de ciência e tecnologia e de desenvolvimento regional Promoção da articulação entre a política industrial, de ciência e tecnologia Instrumentos e de desenvolvimento regional Captação de investimento directo estrangeiro de forma reactiva e pouco selectiva Atracção e ancoragem de IDE estruturante de forma proactiva e criação de e sem ligações à economia local condições de atractividade a montante Justificação contabilística das contrapartidas associadas às grandes compras públicas Dinamização de sistemas de contrapartidas enquanto instrumentos de política pública Inexistência ou dispersão de mecanismos eficazes de capital de risco Criação de redes de capital de risco Fragmentação dos mercados Promoção de mecanismos de fusões e aquisições inter-empresas Sociedade de Informação como um fim em si mesmo Sociedade de Informação como um meio (instrumento de competitividade e inovação) 18

institutos de investigação, serviços às empresas intensivos em conhecimento, instituições de interface e clientes. De acordo com A. Mateus (DE, 17/02/03), um cluster é um modelo de eficiência colectiva em que um conjunto de empresas, instituições e uma certa forma de articulação entre os sectores público e privado têm influência económica, considerando-o um fenómeno territorializado. Neste sentido, os clusters poderão funcionar como o palco privilegiado para a dinamização de uma política de inovação. Numa lógica de focalização, estes poderão emergir ou desenvolver-se a partir do cruzamento de dinâmicas sectoriais, tecnológicas e regionais, que: - Tenham tido ao longo da história ou venham a demonstrar um desempenho assinalável em matéria de competitividade, produtividade, ligação internacional e inovação através da disseminação de casos de sucesso e que apresentem uma força mobilizadora interna. Podemos falar de sectores novos ou da transformação dos já existentes (desfazendo a ilusão da dicotomia sectores de ponta vs. sectores tradicionais). Neste âmbito, será de assinalar a dinâmica do calçado enquanto sector denominado tradicional, mas que teve capacidade para mudar e inovar através de um processo de acção colectiva e com forte contributo da associação do sector e do centro tecnológico. - Apresentem características intrínsecas que potenciem e exponenciem a rapidez da difusão dos efeitos demonstradores e de arrasta- Pistas para projectos e acções de inovação Programas de apoio a intervenções sectoriais estruturantes Pretendem facilitar a identificação pelos sectores críticos, nomeadamente horizontais na lógica do produto e da tecnologia, das suas fragilidades e potencial endógeno com vista ao lançamento de projectos mobilizadores de investigação e desenvolvimento tecnológico, formação de recursos humanos e promoção da indústria nacional, em ligação com parcerias internacionais. Programas de valorização de produtos inovadores portugueses Abrangem o apoio e incentivo à valorização e credibilização de produtos portugueses no exterior através da afirmação de marcas nacionais. O teste de tais produtos no mercado nacional como mercado piloto, caso tal seja possível, poderá ser uma ideia a explorar, criando oportunidades de negócio internas por exemplo, através da promoção de uma contratação pública eficiente aberta e competitiva, assumindo-se o Estado como consumidor importante de produtos e serviços inovadores (CE, 2003). O EURO 2004 teria sido uma boa oportunidade para a aquisição pública de produtos e serviços portugueses e para o estimulo à inovação. Outro instrumento essencial será a utilização dos sistemas de contrapartidas como forma de facilitar a integração de produtos nacionais em redes de distribuição internacional. Programas de apoio à valorização de áreas tecnológicas horizontais Abrangem o apoio ao desenvolvimento e valorização do conhecimento associado a áreas tecnológicas horizontais com vista à sua integração em produtos de empresas de sectores industriais mais maduros. Inclui-se aqui o suporte a arranjos organizacionais como a criação de novas empresas proprietárias de tecnologia, a promoção de consórcios ou parcerias tecnológicas entre empresas industriais e novas empresas proprietárias de tecnologia, entre outras formas de apropriação com vista à criação de novos ou melhorados produtos. Programas de apoio a pólos de inovação e conhecimento regionais Integram o apoio ao desenvolvimnto de pólos regionais de inovação e conhecimento, onde interagem empresas âncora de sectores integradores numa lógica de produto, novas empresas proprietárias de tecnologia; investimento directo estrangeiro; infra-estruturas tecnológicas e de inovação; instituições de ensino e formação; e entidades financeiras (rede de capital de risco). Estes pólos traduzem-se em ambientes privilegiados de geração, valorização e difusão de conhecimento com vista à promoção da inovação e da competitividade das regiões e das economias numa lógica sectorial. A política e o plano de inovação deverão ainda actuar ao nível dos instrumentos de apoio à inovação, como a qualificação de recursos humanos para a inovação, o fomento do financiamento à inovação e a promoção de redes de cooperação para a inovação, aqui não abordadas de forma directa.

TEMA DE CAPA / SOLUÇÕES mento para a globalidade do tecido empresarial. Tais especificidades integram sectores de natureza horizontal na lógica do produto e que sejam, por excelência, integradores de tecnologias. Este é o caso típico do sector automóvel que se traduz numa indústria que atravessa horizontalmente diversos sectores de actividade desde o têxtil à metalomecânica - lidando com uma multiplicidade de tecnologias, competências e processos organizacionais com vista à produção de componentes, módulos e sistemas numa lógica de produto complexo e global. - Derivem de áreas tecnológicas horizontais que possam ser integradas e/ou valorizadas em ou como produtos, como é o caso das tecnologias de informação e comunicação. As aplicações destas tecnologias têm um potencial amplo e abrangente nas mais variadas indústrias, desde a têxtil aos moldes, através da respectiva incorporação nos seus produtos ou produção de bens de equipamento. Outro exemplo situase ao nível da aplicação da biotecnologia nas áreas da saúde. Além do mais, são tecnologias emergentes que podem ser, elas próprias, valorizadas como produtos através da criação de novas empresas proprietárias de tecnologias. De destacar a da ocorrência da inovação não só através da ligação entre empresas do mesmo sector de actividade, mas também através da interacção sectorial, isto é, quando uma empresa aproveita uma ideia de outro sector empresarial, adaptando-a para a utilizar nos seus processos de produção ou no seu mercado (CE, 2003). Os exemplos dados pela Comissão referem a utilização na indústria automóvel de materiais de elevado desempenho, originalmente desenvolvidos para aplicações aeroespaciais, assim como a difusão dos projectos assistidos por computador nas indústrias têxtil e de vestuário. Apostar em dinâmicas com as características referidas natureza horizontal numa lógica de produto e tecnologia - e estando cumprida a primeira condição bom desempenho e força mobilizadora não significa hierarquizar sectores, mas sim encurtar o processo de desenvolvimento da capacidade de inovação, produtividade e competitividade da economia portuguesa. Ainda falando de focalização, não é possível falar de dinâmica de inovação sem apostar, no seio de cada cluster (ou dinâmica sectorial), num Projecto Estruturante para o seu desenvolvimento, anulando as respectivas fragilidades e potenciando o alcançar dos seus objectivos estratégicos. Tratam-se de iniciativas mobilizadoras de actores e indutoras da convergência de instrumentos de políticas. A título de exemplo, poderemos destacar iniciativas desta natureza no sector automóvel com o Projecto P3 Captação de Investimento Directo Estrangeiro Estruturante no Sector Automóvel e na área das tecnologias da informação e comunicação com o Projecto Cidades e Regiões Digitais. No entanto, uma questão se levanta: Sendo as empresas os actores centrais do processo de inovação mas existindo aí a nível individual uma falha de mercado, quem liderará o processo de implementação da estratégia e do plano de acção para a inovação? Se ao nível da política pública o actor se encontra formalizado do ponto de vista da estrutura organizativa do Governo, onde estará a força o mobilizadora de que falávamos do lado das estratégias empresariais e que se constitui como essencial para o sucesso deste processo em construção? Nas empresas âncora? Nas redes de cooperação inter-empresariais? Nas associações empresariais? Nos centros tecnológicos sectoriais?... Agora escolha e que desta vez prevaleça o mérito e a vontade de mudar as empresas, as instituições e o país. *Inteli Inteligência em Inovação, Centro de Inovação Referências CE (2000), 2.º Relatório da Coesão Económica e Social, CE CE (2002), Painel Europeu de Inovação, CE CE (2003), Política de Inovação: Actualizar a Abordagem da União no Contexto da Estratégia de Lisboa, CE Conceição, P. (2003), Produtividade e Inovação: Teoria e Alguma Evidência Relativa a Portugal, Economia e Prospectiva, GEPE- ME, Mar. 2003 Filipe, C. (2003), Em Portugal as Políticas Públicas são Definidas com Pouco Rigor e Competência, in Diário Económico, 17 de Fev. 2003 OCDE (2001), Innovative Clusters: Drivers of National Innovation Systems, OCDE