BOLSAS DE VALORES EA TENTATIVA DE DEMOCRATIZAÇÃO DO MERCADO BRASILEIROl



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Transcrição:

,/ BOLSAS DE VALORES EA TENTATIVA DE DEMOCRATIZAÇÃO DO MERCADO BRASILEIROl Tatiana Neves SMOLENTZOV2 Resumo: O presente trabalho tem como escopo analisar a tentativa que a Bolsa de Valores tem feito nos últimos anos para desenvolver e democratizar o mercado de capital brasileiro. Tal tentativa pode ser evidenciada através de lançamento de novos produtos no mercado (e.g. home broker) e de incentivo para que companhias adotem regras que enfatizem (i) uma maior transparência de informações com relação aos negócios realizados, e (ii) vantagens adicionais ao pequeno investidor. Palavras-chave: Bolsa de Valores. Democratização. Transparência de informações. INTRODUÇÃO As Bolsas de Valores exercem um papel fundamental no mercado de capitais brasileiro ao garantir a transparência e igualdade de informações aos investidores. Mesmo atuando como órgãos auxiliares da Comissão de Valores 1Parte da monografia jurídica apresentada na disciplina de Mercado Financeiro e de Capitais, ministrada pelo Prof. Dr. FERNANDO ALBINO, para a obtenção de crédito parcial no curso de Mestrado em Direito Comercial da pontifícia UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO - PUCSP, no 10 semestre de 2004. 2 Mestranda em direito comercial e pós-graduada em direito empresarial pela PUC-SP. Graduada em direito pela PUCSP e advogada em São Paulo/SP com atuação na área societária. mercado de capitais, fusões e aquisições. Email smolent@uol.com.br 96 Econ. Pesqui., Aroçatuba, v.8, n.8, p. 96-106, ago. 2006

Mobiliários (CVM), elas têm um importante papel disciplinador e fiscalizador das operações financeiras realizadas em seus recintos. O presente trabalho tem como escopo analisar sucintamente o surgimento, estrutura e o funcionamento das Bolsas de Valores, bem como os poderes que exercem de regulamentação e fiscalização sobre os seus entes. O enfoque desse trabalho é o esforço adicional das Bolsas de Valores e, no caso específico da BOVESPA, na implementação de regras rígidas de transparência nas operações financeiras, como parte de uma estratégia de atrair um maior número de investidores. Tais práticas, jálargamente utilizadas empaíses desenvolvidos como os Estados Unidos da América, são empregadas, por exemplo, pela BOVESPAcomo uma forma de promover e fomentar o mercado de capitais e consolidar a sua importância tanto no mercado de capitais nacional como internacional. 1.1. Breve histórico das Bolsas de Valores A origem das Bolsas de Comércio remonta aos períodos mais antigos. As bolsas surgiram espontaneamente como locais de concentração de oferta e de procura de mercadorias e valores comerciais. No que se refere à palavra "bolsa" ela parece vir da cidade flamenca de Bruges, através de uma família nobre (Van der Burse) que, no século XIII possuía no alto de sua habitação um escudo de armas onde figuravam três bolsas, passando a palavra burse a ser aplicada à reunião e local onde ela se realizava (BARRETO FILHO, 1958, p. 7). Outros encontram a origem da palavra em um costume que havia em Firenze, na Itália, de chamar a reunião de cidadãos para escolher um chefe, através de eleição feita por meio de votos colhidos numa bolsa, de "borsa dei cittadini" (CARVALHO DE MENDONÇA, 1939, p. 280). ABolsa de Antuérpia foi criada em 1531, depois da Bolsade Bruges Econ. Pesqui. Araçatuba, v.s, n.s, p.96-106,ago. 2006 97

e serviu de modelo para a primeira Bolsa de Londres, que foi a mais importante do mundo durante o século XVI. (IbM, p. 282). No Brasil, as bolsas de valores foram institucionalizadas no século XIX mediante a atuação de corretores e sob o controle do Estado. No entanto, somente em 1845 (através do Decreto na 417, de 14.06.1845) foi definida juridicamente a figura do corretor, estabelecendo-se que a patente seria concedida pelo Ministério da Fazenda e teria um caráter vitalício (EIZIRIK, 1987, p. 179). Em 1848 foi constituída a Junta dos Corretores de Fundos Públicos da Corte, que pode ser considerada o embrião da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. E, em 24 de dezembro de 1896 foi criada a Bolsa de Fundos Públicos de São Paulo e de Santos pela lei na 479 cujo regimento interno vigorou até 1928, quando foi aprovado o novo regimento interno da bolsa de São Paulo pelo então Secretário da Fazenda (MENDONÇA, 1939, p. 301). As bolsas de valores, em sua evolução histórica, sempre foram associações de corretores e comerciantes, tendo como função a realização de mercadorias e títulos em geral. São pessoas jurídicas de direito privado, caracterizadas como delegadas de função pública possuindo um caráter de órgão que auxilia a Comissão de Valores Mobiliários possuindo uma atividade pública 3 No cenário internacional atual, as bolsas de valores estão protagonizando uma integração com o intuito de aumentar a competitividade, a liquidez das ações negociadas e a diminuição nos custos de corretagem. As bolsas de valores no Brasil se situam entre a autonomia pri vada e o forte intervencionismo estatal. Ressalta-se que esse regime peculiar das bolsas de valores (de pessoas jurídicas privadas exercendo serviço público) não é exclusivo do sistema brasileiro. 3 Celso Antonio Bandeira de Meno. Revista de Direito Público, n 85. Janeiro-Março de 1987, ano XX 98 Econ. Pesqui., Araçatuba, v.8, n,8, p. 96-106, ago. 2006

Na França, a Bolsa de Valores é de competência exclusiva do Ministro da Economia e das Finanças sendo a profissão de corretor um ofício público e seus titulares nomeados por decreto ministerial. Na Itália, as atividades exercidas pelas bolsas de valores também são consideradas um serviço público. Mesmo no modelo norte-americano de regulação de bolsas, freqüentemente apontado como não tendo interferência estatal, elas são submetidas à supervisão da Securities and Exchange Comission (SEC). (COMPARATO, 1990, p. 319). No Brasil, o órgão que tem competência para regular e fiscalizar o mercado de capitais 4 é a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), uma entidade autárquica vinculada ao Ministério da Fazenda, com personalidade jurídica e património próprios, que foi criada pela lei 6.385n6. Essa autarquia é dotada de autoridade administrativa independente, ausência de subordinação hierárquica, autonomia financeira e orçamentária (artigo 50 da lei 6.38Sn 6). 1.2. Poder regulamentar e disciplinar das Bolsas de Valores o poder regulamentar das bolsas de valores é detalhadamente previsto na Resolução CMN n 2.690, e posteriores alterações, segundo ao qual compete às bolsas de valores, dentre outras funções, criar mecanismos regulamentares e operacionais que possibilitem o atendimento, pelas sociedades membros, de quaisquer ordens de compra e venda dos investidores (artigo 10, inc. IV); impor padrões éticos de comportamento paraos seus membros; traçar a política geral a ser seguida em suas atividades (artigo 18, inc. I); fixar periodicamente os valores das contribuições a serem cobradas dos emissores e 4 As atividades de regulação e fiscalização exercidas pela CVM são dirigidas às Companhias Abertas, instituições financeiras e aos demais entes e pessoas que participam da distribuição e intermediação dos valores mobiliários. Econ. Pesqui., Araçatuba, v.8, n.8, p.96-1 06, ago. 2006 99

títulos de valores mobiliários negociados em seu recinto ou no sistema mantido pela bolsa (artigo 18, inc. XVI); e regulamentar o acesso de pessoas a seus pregões (artigo 30). Mas, o dispositivo de maior relevância com relação ao poder regulamentar das bolsas de valores é o artigo 21, 4 da Lei 6.385/1976, que dispõe que elas poderão estabelecer requisitos próprios para que os valores sejam admitidos à negociação em seus recintos ou sistema, desde que previamente aprovados pela CVM. Já o poder disciplinar implica na fiscalização das normas vigentes e das expedidas, bem como punições por quaisquer violações. Esse poder se manifesta (i) nos atos de fiscalização, através dos quais se supervisiona o cumprimento dos atos normativos; e (ii) atos de efetividade e aplicação das leis e atos normativos, com alcance específicos. A infraçãodas normas 6 sujeita seus autores às seguintes penalidades: (i) advertência, (ii) multa, (iii) suspensão, (iv) exclusão da sociedade membro, e (v) inabilitação para o exercício do cargo de membro do Conselho de Administração, administrador e representante de sociedade membro. 1.3. Produtos BOVESPA Pelo exposto, entende-se como autonomia administrativa, financeira e patrimonial, a capacidade que têm as bolsas de valores de estabelecerem as regras próprias para o seu funcionamento, com poderes para decidir sobre quaisquer assuntos inerentes àsua autonomia. Portanto, conclui-se que a bolsa de valores, e no caso específico a BOVESPA, pode criar produtos e meios que S Eduardo Alfred Taleb Boulos e Fernando Szterling. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, ano XLI, n 125, janeiro - março de 2002. Malheiros Editores Ltda. 6 Cabe à bolsa de valores instaurar inquérito e processo administrativos para apurar e julgar as infrações às normas a que incumbe fiscalizar. 100 Econ. Pesquí., Araçatuba, v.8, n.8. p. 96-106. ago. 2006

possibilitem as operações de compra e venda de títulos e valores mobiliários, bem como criar mecanismos regulamentares e operacionais para possibilitar o atendimento pelas sociedades membros de quaisquer ordens de compra e venda dos investidores. Por ter essa autonomia, a BOVESPA tenta "desesperadamente" lançar novos produtos para expandir os negócios que nela são realizados, com o intuito de aprimorare desenvolver o mercado de capitais e, conseqüentemente, aumentar a captação de recursos das companhias nela listadas favorecendo a economia brasileira. Alguns dos produtos criados pela BOVESPA foram às práticas de govemançacorporativa e o home broker. São chamadas de boas práticas de govemança corporativa uma série de regras societárias muito mais rígidas que as presentes na legislação aplicável. Tais regras ampliam os direitos dos acionistas, melhoram a qualidade de informações usualmente prestadas e determinam a resolução de conflitos através de uma Câmara de Arbitragem. A adesão às práticas de governança corporativa distingue uma companhia aberta como sendo Nível 1, Nível 2 ou Novo Mercad0 7 dependendo do grau de compromisso assumido por ela. Para que uma companhia faça parte, por exemplo, do Novo Mercado é necessário 7 Nível!: práticas diferenciadas de govemança corporativa, contendo regras de transparência e dispersão acionária. Nível 2: além das regras exigidas no Nível 1, contém regras de equilíbrio dos direitos entre acionistas controladores e minoritários. Novo Mercado: conjunto bem amplo de práticas de governança corporativa. A grande diferença do Novo Mercado para os outros níveis é a proibição de emissão de ações preferenciais (as companhias possuem somente ações ordinárias). Ecoo. Pesquí., Araçatuba, v.s, 0.8, p.96-106, ago. 2006 101

que ela se submeta às práticas de governança corporativas e disclosure 9 adicionais em relação ao que é exigido pela legislação aplicável. A principal inovação do Novo Mercado é a proibição de ações preferenciais. No entanto, a companhia aberta participante do Novo Mercado possui também outras obrigações, tais como, realização de ofertas públicas de colocação de ações por meio de mecanismos que favoreçam a dispersão do capital; manutenção emcirculação de uma parcela mínima de ações representando 25% (vinte e cinco por cento) do capital; extensão para todos os acionistas das mesmas condições obtidas pelos controladores quando da venda do controle da companhia; mandato de 1 (um) ano para todos os membros do conselho de administração; obrigatoriedade de realização de uma oferta de compra de todas as ações em circulação, pelo valor econômico, nas hipóteses de fechamento de capital ou cancelamento do registro no Novo Mercado; cumprimento de regras de disclosure em negociações envolvendo ativos emitidos pela companhia por parte de acionistas controladores ou administradores dacompanhia, entre outros. Para uma companhia fazer parte das regras do Novo Mercado é necessário que um contrato seja firmado entre a BOVESPA e a companhia, com a participação dos controladores e administradores. Assim, pode-se entender que com o Novo Mercado, a BOVESPA visa "ademocratização do capitalismo" (HOBSBAWN, 2000, p. 77) ao tentar desenvolver o mercado de capitais brasileiro, através de criação de regras rígidas e protetoras para os aplicadores evitando-se eventuais abusos. 8 Governança Corporativa é a união de diretrizes para melhorar o desempenho de uma companhia e seus aspectos mais importantes são: (a) a transparência de informações; (b) a eqüidade no tratamento dos acionistas; (c) a freqüente prestação de contas; e (c) a adoção de procedimentos éticos com concorrentes, investidores, mercado, etc. 9 Disclosure é a divulgação de informações por parte de uma companhia, possibilitando uma tomada de decisão consciente pelo investidor e aumentando sua proteção. 102 Econ. Pesqui.. Araçatuba, v.8, n.8, p. 96-106, ago. 2006

Apesar desse esforço da BOVESPA, atualmente, ainda impera no..~ pensamento do pequeno e médio investidor brasileiro a idéia de que investir no mercado de capitais é equivalente a jogar em um cassino, independente das regras existentes, levando-se em consideração somente "a sorte de jogador". Provavelmente esse pensamento é resultante da notória impunidade existente do mercado de capitais brasileiro. Já o home brokeré um sistemaque permite ao investidor encaminhar através da Internet ordens de compra e venda de ações e de opções, por meio de corretoras de valores mobiliários credenciadas pela BOVESPA para tal finalidade. Tal sistema foi implantado em março de 1999 pela BOVESPA e se assemelha aos serviços de home banking oferecidos pelos bancos funcionando como um canal de relacionamento entre os investidores e as corretoras da BOVESPA. As ordens inseridas pelos investidores em seus computadores passam pelos sistemas informatizados das Corrretoras (home brokerdas Corretoras) e são encaminhadas para o sistema eletrônico de negociação da BOVESPA, conhecido como mega bolsa lo O objetivo do home broker foi agilizar e simplificar as atividades de compra e venda de ações e opções permitindo uma maior participação de pessoas físicas no mercado de valores mobiliários. O sistema de home broker tem como principais vantagens: (i) acesso às cotações on Une (lembrando que o investidor pode ter acesso às cotações com algum atraso), (ii) recebimento com maior rapidez da confirmação das ordens executadas, (iii) agilidade e praticidade no cadastramento e no trâmite dos ocumentos, (iv) disponibilidade de obter um resumo financeiro de todas as 10 O mega bolsa é um conjunto de softwares e hardwares que juntos formam a base tecnológica do sistema eletrônico de negociação, que gerencia e controla as informações nele inseridas pelos operadores das Corretoras, registrando de forma automática todas as operações realizadas por elas por conta e ordem de seus clientes. Econ. Pesqui., Araçatuba. v.s, n.8, p.96-1 06, ago. 2006 103

operações executadas, (v) possibilidade de consulta a posições financeiras e de custódia pelo investidor, (vi) envio de ordens imediatas de compra e venda de ações, e (vii) acompanhamento imediato da carteira de ações. Por fim, algumas regras específicas devem ser obedecidas para se ter acesso ao home broker BOVESPA, a Corretora deve estar autorizada pela BOVESPA e possuir mecanismos de proteção contra acessos indevidos (jirewall) e o investidor deve estar previamente cadastrado na Corretora, bem como assinar contrato específico para a realização de operações via Internet. Um aspecto curioso que se observou foi um campeonato patrocinado por um veículo de comunicação (jornal "Folha de São Paulo"), em que os participantes simulavam virtualmente investimentos no mercado acionário através do mecanismo do home broker. Ao final de um determinado período de tempo, o participante que tivesse uma carteira de ações com maior rentabilidade era o vencedor recebendo um prêmio relacionado ao mercado de capitais, como uma viagem à bolsa de valores de Nova Iorque (NYSE), nos Estados Unidos daamérica. Considerações finais Dentro desse cenário do mercado de capitais brasileiro, a BOVESPA se destaca em importância por sua preocupação adicional em lançar novos produtos e regulamentá-los, com o propósito de democratizar e incentivar o mercado de capitais, através do ingresso de pequenos e médios investidores, pessoas físicas, além de atrair para o centro de suas operações, investidores internacionais. A finalidade dessa estratégia de ação é a de garantir um maior investimento financeiro para fomentar ações de ampliação e crescimento do mercado de capitais, corno fonte de atração de novos investimentos dentro do país, estimulando a aplicação de financiamento nas empresas e estimulando o 104 Econ. Pesqui., Araçatuba, v.8, n.8, p. 96-106, ago. 2006

que Hobsbawn chama de democratização do capitalismo, por ser capaz de alavancar o crescimento dapoupança interna do país e gerar melhores condições de financiamento interno das empresas, garantindo-lhes possibilidades de crescimento, melhoria de empregos e de qualidade de vida a seus habitantes. SMOLENTZOV, Tatiana Neves. Stock exchange and the attempt ofthe Brazilian market democratization. Economia & Pesquisa, Araçatuba, v.8, n.8, p. 96 106, ago. 2006. Abstract: The scope of this present paperwork is to analyze the attempt that the Stock Exchange has made in recent years to develop and democratize the Brazilian stock market. Such attempt can be evidenced by means of launching new products in the market (e.g. home broker) and the motivation for the corporations to adopt mies which emphasize (i) even more the disc10sure of information related to their businesses performed, and (ii) additional advantages to the minority investor. Key words: Stock Exchange. Democratization. Disc10sure ofinformation. Referências bibliográficas BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Natureza jurídica das bolsas de valores. Revista de Direito Público. São Paulo, Revista dos Tribunais, n. 81, p. 217-222, 1987. BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Princípios gerais do direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1969. BARRETO FILHO, Oscar. Naturezajurídicadas bolsas de valores, no direito brasileiro. Revista dos Tribunais. São Paulo, Revista dos Tribunais, n. 48, p. 7-30, 1959. Ecoo. Pesqui., Araçatuba, v.8, n.8, p.96-1 06, ago. 2006 105

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