PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. Marcelo Victor de Carvalho Ferreira



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Transcrição:

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social Marcelo Victor de Carvalho Ferreira IMITANDO UM REAL INEXISTENTE: os efeitos visuais na construção da narrativa cinematográfica Belo Horizonte 2014

Marcelo Victor de Carvalho Ferreira IMITANDO UM REAL INEXISTENTE: os efeitos visuais na construção da narrativa cinematográfica Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Comunicação Social. Orientador: Júlio Pinto Belo Horizonte 2014

FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais F383i Ferreira, Marcelo Victor de Carvalho Imitando um real inexistente: os efeitos visuais na construção da narrativa cinematográfica / Marcelo Victor de Carvalho Ferreira. Belo Horizonte, 2014. 153 f. : il. Orientador: Júlio Pinto Dissertação (Mestrado) Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. 1. Cinematografia - Efeitos especiais. 2. Mimese na arte. 3. Cinema. 4. Narrativa (Retórica). I. Pinto, Júlio. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. III. Título. CDU: 791.43.01

Marcelo Victor de Carvalho Ferreira IMITANDO UM REAL INEXISTENTE: os efeitos visuais na construção da narrativa cinematográfica Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Comunicação Social. Júlio Pinto (Orientador) PUC Minas Eduardo Antônio de Jesus PUC Minas Anna Karina Castanheira Bartolomeu UFMG Belo Horizonte, 02 de dezembro de 2014

Aos meus pais e irmã, portos de sabedoria e amor.

AGRADECIMENTOS Sinto-me como numa sala de cinema, após uma projeção de longa duração. O corpo está cansado, os olhos ainda se acostumam com as luzes que já acendem e a mente tenta entender toda aquela informação fragmentada. O filme termina, mas ainda sobem os créditos na tela escura. Ainda há música para embalar as últimas imagens que surgem ora ou outra entre os nomes da vasta equipe de produção. Nesse momento é costume para muitos apenas levantar, sair e viver a vida lá fora. Como um velho hábito meu, repito aqui o movimento de estender o fim. Me desligar aos poucos daquele mundo existente entre as quatro paredes e voltar para a realidade sem pressa. Assim como a imensidão de pessoas necessárias para concluírem aquela produção fílmica que terminara, esse trabalho só foi realizado com a existência de uma força criadora plural. Para os que pensam que a escrita se faz sozinho, sinto informá-los que ela só se fez quando estive muito bem acompanhado. E se não posso colocá-los todos na capa junto ao meu nome, me resta agradecer. Agradeço de corpo e alma a benevolência divina e a oportunidade do trabalho no bem. Aos meus pais, dedico minha mais profunda admiração e respeito, pois foram fonte de amor incondicional e de sabedoria que só a vida sabe ensinar. Agradeço a minha irmã pela austeridade de cerne doce, cuidando mesmo a distância, com seu olhar felino. Ao meu afilhado, lanço um desejo de tardes longas na companhia de videogames e heróis mascarados. Primos e primas que me desejaram o melhor em encontros esporádicos. Principalmente àquela que me refaz com abraços apertados, aplausos sem propósito e conversas animadas pela madrugada. Tios e tias que não se cansam em parabenizar por meus esforços, sejam lá quais esses forem. Em meu ambiente de trabalho, praticamente meu segundo lar durante todo esse tempo, também deixo meu carinho. Lá encontrei um antigo mestre, que se tornou colega de trabalho, que se tornou amigo. Uma baixinha de voz potente e um espirito protetor. Um companheiro de colóquio sagaz e divertido. E também um gigante com coração valente. Por todos os momentos que precisei e fui compreendido, meu muitíssimo obrigado. Ainda nesse lar, encontrei espaço para fazer novos amigos que carrego para a vida. Em especial, um espirito livre de risada fácil, tão pronto para ajudar quanto para celebrar. Os mestres de outrora, que dividem os corredores, papos descontraídos e mesas de almoço. Aos membros da banca, meus ouvidos atentos e a alegria por compartilharem desse momento. Lembro-me também daqueles

da casa laranja, movidos pela arte e bons pensamentos. Agradeço por me acolherem nessa caminhada de reverberação do pensamento no bem. Nos templos do saber, invisto minha admiração por cada um dos que passaram em meu caminho. Ao meu orientador, em especial, que havia me alertado desde o início que se propunha a me desorientar. Desorientação que só me fez crescer, pois como haveria de chegar em algum lugar diferente e desconhecido, se não me perdesse vez ou outra por aí? Seus comentários cirúrgicos e humor inteligente estão emaranhados nas linhas que seguem. Ao animado professor amante das imagens e das artes, obrigado por me permitir manter a leveza no olhar, ainda que com sobriedade. Ao sério de escrita elegante, agradeço por me fazer buscar o meu melhor. À de sorriso largo e papo agradável, por ter sempre acreditado em mim. Aos demais professores, um abraço recheado de gratidão. Às tímidas senseis que transbordam simpatia, reverencio com demasiado respeito, por me permitirem alcançar um sonho de tempos imemoriais. Entre tantos amigos, abraço aqueles que entraram nessa mesma viagem, enlouquecendo juntos. Aos irmãos de coração, meu agradecimento pela paciência, conselhos, companhias, puxões de orelha e declarações. Aos que pouco vi, saibam que não foram esquecidos. A existência de vocês mesmo que na lembrança foram base para a perseverança. Diliças, lindões e companheiros de jornada NERD, foi a inebriante companhia de vocês que me permitiram alçar voos na imaginação. Agradeço a cada um que depositou em mim confiança, não apenas de um trabalho bem feito, mas de retidão moral em cada passo firmado. Também ao leitor que chegou até essas palavras, pois foi inspiração mesmo em tempo diferido. Foram tantas pessoas que, se hoje não me lembro de todas as faces, guardo no coração todos os sorrisos. Foi uma caminhada de dores e amores. Aprendizados de todas as espécies que me preparam para filmes por vir.

Frodo: - Não consigo fazer isso, Sam. Sam: - Eu sei. Isso não é justo. Na verdade, nem devíamos estar aqui. Mas estamos. É como nas grandes histórias, Sr. Frodo. As que tinham mesmo importância. Eram repletas de escuridão e perigo. E, às vezes, você não queria saber o fim... porque como podiam ter um final feliz? Como podia o mundo voltar a ser o que era depois de tanto mal? Mas, no fim, é só uma coisa passageira... essa sombra. Até a escuridão tem de passar. Um novo dia virá. E, quando o sol brilhar, brilhará ainda mais forte. Eram essas histórias que ficavam na lembrança... que significavam algo. Mesmo que você fosse pequeno demais para entender por quê. Mas acho, Sr. Frodo, que eu entendo, sim. Agora eu sei. As pessoas dessas histórias tinham várias oportunidades de voltar atrás, mas não voltavam. Elas seguiam em frente... porque tinham no que se agarrar. Frodo: - E em que nós nos agarramos, Sam? Sam: - No bem que existe neste mundo, Sr. Frodo... pelo qual vale a pena lutar. (O SENHOR DOS ANÉIS: AS DUAS TORRES, 2002, 02:44:35)

RESUMO Essa pesquisa investiga a utilização dos efeitos visuais no cinema, como parte da construção da narrativa cinematográfica. A começar por uma conceituação básica das diferenças entre efeitos visuais e efeitos especiais, levantam-se questionamentos sobre a sensação de realidade provocada pela imagem síntese. Como operadores conceituais foram acionadas as noções de representação a partir da mímesis, desde Platão até autores do século XX, culminando na teoria de Rolland Barthes sobre o Efeito de Real. Em um segundo momento, há uma análise específica dos elementos constituintes da narrativa visual cinematográfica, como as diferentes possibilidades expressivas no uso da câmera e da montagem, principalmente relacionadas aos efeitos visuais. Através do estudo da imagem foram percorridas algumas possibilidades da expressão de signos da fisicalidade e também imateriais como o espaço e o tempo. Além das análises pontuais em diversos exemplares cinematográficos, o filme As Aventuras de Pi é estudado com maior proximidade. A partir de As Aventuras de Pi, um filme com forte presença da imagem síntese e questionamento de real interno e externo à narrativa, o caminho teórico percorrido é retomado através da análise imagética para descobrir se/como essas imagens podem ter reverberado na compreensão da narrativa final. Palavras-chave: Efeitos visuais. Efeitos especiais. Mímesis. Efeito de real. Cinema. Narrativa cinematográfica.

ABSTRACT This thesis investigates the use of visual effects in the cinema as part of the construction of cinematic narrative. Departing from a basic distinction between the concepts of visual and special effects, the work raises questions about the sensation of reality caused by synthetic images. As conceptual operators the research utilizes the notions of representation founded on the idea of mimesis, from Plato to 20 th century authors, up to Rolland Barthes and his Effet de Réel. A second movement of the work specifically analyzes the constitutive elements of visual cinematic narrative, such as the different expressive modalities of camera use and montage when related to visual effects. By means of the study of the image, the text examines some expressive possibilities of signs of physicality and immaterial ones, such as space and time. Besides sampled analyses from several cinematic pieces, the film The Life of Pi is studied more closely, as it is a film with a strong presence of synthetic images which challenge the Real, both within and without the narrative. Having The Life of Pi as ground, the theoretical framework is taken up once more by way of imagetic analysis, in order to verify whether and how those images may have had an impact upon the understanding of the final narrative. Key words: narrative. Visual effects. Special effects. Mimesis. Effet de réel. Cinema. Cinematic

LISTA DE FIGURAS Figura 1 A lua de Méliès... 18 Figura 2 A complexa cidade de Metropolis... 19 Figura 3 Diferentes usos dos efeitos visuais em O Senhor dos Anéis... 24 Figura 4 Os efeitos visuais na sequência final de MIB... 26 Figura 5 Reprodução cinematográfica do Titanic... 35 Figura 6 Expedição ao Titanic pela equipe do filme... 35 Figura 7 Referências reais do Titanic... 36 Figura 8 A construção fragmentada do monstro em Allien... 40 Figura 9 Círculo de Fogo e o imaginário dos monstros e robôs gigantes... 40 Figura 10 Semelhanças entre a Graphic Novel e o filme 300... 45 Figura 11 A atmosfera vampiresca em Nosferatu... 54 Figura 12 A atmosfera do velho oeste em Era uma vez no oeste... 55 Figura 13 A atmosfera infantil da animação Lilo & Stitch... 55 Figura 14 Estudo de atmosferas de Lou Romano... 56 Figura 15 Imagem estilizada em O Homem duplo... 59 Figura 16 Beowulf, motion captures em estúdio e a diferença do personagem final... 59 Figura 17 O uso de cores em Sin City... 60 Figura 18 A reconstrução digital de Nova York em Os Vingadores... 65 Figura 19 Câmera virtual em nível microscópico em Prometheus... 66 Figura 20 Câmera virtual pelo espaço em Árvore da Vida... 67 Figura 21 Powers of ten e a câmera virtual em potências de dez... 68 Figura 22 A montagem interna ao plano em O grande Gatsby... 72 Figura 23 As diferentes concepções de Hogwarts em Harry Potter... 77 Figura 24 A concepção dos planetas Tatooine e Hoth em Guerra nas Estrelas... 78 Figura 25 A mímesis do espaço em Gravidade... 80 Figura 26 A subjetividade do espaço em A Origem... 81 Figura 27 O tempo congelado em Melancolia... 84 Figura 28 Um lugar chamado Notting Hill, plano sequência para passagem de tempo... 86 Figura 29 Mudanças de idade usando o mesmo ator em Benjamin Button... 87 Figura 30 A sensação subjetiva de tempo em Peixe Grande... 89 Figura 31 Teste e gravações com Suraj... 94 Figura 32 Produção do tanque... 96

Figura 33 Cenas reais de Richard Parker... 98 Figura 34 Tigre real vs Tigre virtual... 100 Figura 35 Zoológico 1... 106 Figura 36 Zoológico 2... 107 Figura 37 A pureza de Piscine Molitor e a infinitude de Pi... 111 Figura 38 Pondicherry... 113 Figura 39 Conhecendo Deus... 116 Figura 40 Os olhos de Richard Parker... 118 Figura 41 Dúvida e Inquietação... 120 Figura 42 TsimTsum... 123 Figura 43 A arca de Pi... 125 Figura 44 Laranja, a cor de Deus... 126 Figura 45 Guia de Sobrevivência... 128 Figura 46 Alimentando o companheiro de viagem... 130 Figura 47 Universo marítimo... 131 Figura 48 Cardume voador e o rugido de Pi... 133 Figura 49 Não perca a esperança... 134 Figura 50 As profundezas da alma 1... 136 Figura 51 As profundezas da alma 2... 137 Figura 52 Tempestade de Deus... 138 Figura 53 A ilha... 140 Figura 54 A praia... 142 Figura 55 Uma outra versão dos fatos... 144

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO... 12 2 OS EFEITOS VISUAIS E A PERCEPÇÃO DE REAL... 14 2.1 Os Efeitos Visuais... 16 2.2 A Mímesis... 27 2.3 Efeito de Real... 41 3 UMA ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS... 46 3.1 Potências da Imagem Cinematográfica... 52 3.2 Potências Diegéticas... 73 4 O MAR, O TIGRE E O MENINO... 91 4.1 As Aventuras de Pi... 101 4.1.1 Zoológico... 103 4.1.2 A pureza de Piscine Molitor. A infinitude de Pi... 108 4.1.3 Pondicherry... 111 4.1.4 Conhecendo Deus... 114 4.1.5 Os olhos de Richard Parker... 116 4.1.6 Dúvida e inquietação... 118 4.1.7 TsimTsum... 120 4.1.8 A arca de Pi e a ascensão de Richard Parker... 123 4.1.9 Laranja, a cor de Deus... 125 4.1.10 Guia de sobrevivência... 126 4.1.11 Alimentando o companheiro de viagem... 128 4.1.12 Universo marítimo... 130 4.1.13 Cardume voador e o rugido de Pi... 132 4.1.14 Não perca a esperança... 134 4.1.15 As profundezas da Alma... 135 4.1.16 Tempestade de Deus... 137 4.1.17 A ilha... 139 4.1.18 A praia... 141 4.1.19 Uma outra versão dos fatos... 143 4.1.20 Considerações finais... 144 5 ENFIM...... 147 REFERÊNCIAS... 148 FILMOGRAFIA... 151

12 1 INTRODUÇÃO Com certa ansiedade, algumas pessoas se aproximam da sala escura para conhecer a novidade. Dada a hora marcada, o aparelho dá partida ao carrossel das películas, dando vida à tela anteriormente inerte. Há êxtase com as imagens lançadas naquele espaço reservado, fazendo ouvir aqui e ali a mudança de respiração que indicam a montanha russa de emoções compartilhadas. Risinhos, sustos, suspiros. Encantamento provocado por uma série de experiências visuais e sonoras. O cinema, como fora denominado este tipo experiência, surgia no fim do século XIX através de pequenas exibições de imagens em movimento, com historietas ou puro exibicionismo visual. Nesse primeiro cinema, como chama Costa (1995), havia espaço para o espetáculo, tal qual os mágicos e artistas mambembes. Ora ou outra o personagem podia quebrar a barreira entre o mundo fílmico e a realidade, convidando o espectador a participar ativamente da história narrada. Aos poucos, uma gramática visual foi instaurada, configurando enquadramentos, tipos de montagens e estilos narrativos, tornando-se não a única forma de expressão cinematográfica, mas a mais comum. Somos diariamente expostos às imagens dessa narrativa clássica do cinema, que nos provoca, na maioria das vezes, sem quebrar a parede invisível da ficção. Muito pelo contrário, somos convidados a nos agarrar e embrenhar cada vez mais em um mundo que não existe em outro lugar senão na tela de imagens projetadas. Uma narrativa que nos conduz através de escolhas bem elaboradas de luz, câmera, movimento, formas, cores e sons. Cineastas de todo o mundo experimentaram novas formas de expressão através das imagens em movimento. Novas técnicas foram assimiladas, processos de animação, colorização, mecanização, automação de processos, criação de efeitos da ordem do visual e do sonoro que pudessem continuar o encantamento por gerações. Com o desenvolvimento de equipamentos capazes de sintetizar imagens em computadores, não tardou para que essas também fossem alvo de projetos cinematográficos. Os efeitos visuais, como são chamados no cinema esses elementos da imagem produzidos digitalmente, abriam caminho para uma nova logística de produção fílmica. No cinema contemporâneo é difícil encontrar uma única produção que não tenha contado com algum artifício digital. Dentre as produções com maior bilheteria de todos os tempos, todas possuem rica produção de imagens sintetizadas por computador. O grande entrelaçamento dos processos de efeitos visuais com as narrativas contemporâneas instigou o questionamento: seriam esses efeitos apenas facilitadores

13 operacionais? Seriam apenas artifícios da imagem espetáculo? Seriam ornamentais ou poderiam criar efeitos de ordem narrativa? Na tentativa de investigar os questionamentos acima, busquei entender o funcionamento das técnicas de efeitos visuais no cinema e como essas reverberam em elementos da narrativa cinematográfica. Inicio o trajeto através do questionamento de real provocado pela imagem de síntese, cada vez mais convincente aos olhos. Para tal, aciono a ideia de representação através da noção de mímesis. Adentro a caverna de Platão e volto à luz do efeito de real de Roland Barthes. Segundamente, busco as potencialidades da imagem no cinema enquanto criadora de sentidos narrativos. Como funcionam a câmera, o espaço o tempo, a montagem e demais elementos imagéticos na lógica da produção de efeitos visuais. Finalmente, analiso como objeto empírico o filme As Aventuras de Pi (Life of Pi, Ang Lee, 2012). As Aventuras de Pi conta a história de Pi Patel, sobrevivente no naufrágio do cargueiro TsimTsum no meio do Oceano Pacífico. Após muitos anos do acidente, Pi narra sua experiência de ter vivido duzentos e vinte e sete dias em alto mar, na companhia de um tigre de bengalas, para um escritor ávido por uma boa história. O filme, adaptado de uma produção literária de mesmo nome, possui grande parte dos elementos produzidos digitalmente, incluindo o tigre personagem Richard Parker. Através desta produção, faço apontamentos sobre a sensação de real provocada pela imagem síntese para o espectador, analiso as estratégias narrativas e seus resultados internos e externos ao espaço fílmico. Antes de chegar até essa viagem ao Pacífico, entretanto, convido o leitor a um passeio por diversas outras produções. É hora de adentrar a sala escura. As primeiras imagens já se configuram na tela. Imerso nesse espaço que constitui quase um universo paralelo, há vida pulsando. Dentre feixes de luz e partículas suspensas, as imagens improváveis causam a pergunta inevitável: Isto é real?. Me atrevo a perguntar de volta: O que é real?. Sentemonos confortavelmente, o caminho para as respostas podem estar ao alcance das mãos.

2 OS EFEITOS VISUAIS E A PERCEPÇÃO DE REAL 14

15 2 OS EFEITOS VISUAIS E A PERCEPÇÃO DE REAL Morpheus: - Esta é sua última chance. Depois não há como voltar. Se tomar a pílula azul, a história acaba, e você acordará na sua cama acreditando no que quiser. Se tomar a pílula vermelha ficará no país das maravilhas, e eu te mostrarei até onde vai a toca do coelho. (MATRIX, 1999, 00:28:57) Neo: - Isto não é real? Morpheus: - O que é real? Como você define o real? Se está falando do que consegue sentir, do que pode cheirar, provar, ver... então real são simplesmente sinais elétricos interpretados pelo cérebro. (MATRIX, 1999, 00:40:10) O que é real? Os diálogos acima, extraídos do filme Matrix (The Matrix, Andy e Lana Wachowski, 1999), são parte do caminho e dos questionamentos que o personagem Neo enfrentou até descobrir a verdade. Para Neo, a pergunta vem acompanhada com outra fundamental: o que é a Matrix?. Neo descobre que a Matrix é uma representação do mundo que conhecemos do final do século XX, criada por máquinas com inteligência artificial e independentes. Após anos de guerra entre humanos e máquinas, essas últimas obtiveram vantagem em força e número, construindo por fim uma plantação de humanos, fonte poderosa de energia. Programado pelas máquinas, a Matrix é um mundo semelhante ao que existia antes da guerra, ligado diretamente ao sistema nervoso dos humanos cultivados. Morpheus faz parte da resistência, formada por aqueles que conseguiram se desvincular da Matrix e pelos poucos que nasceram por vias normais, e acredita que Neo é a peça chave para ganharem a guerra. O estranhamento do que era real acontece para Neo ao mesmo tempo em que acontece para o espectador. Se comparado com o mundo em que vivemos, o filme Matrix apresenta uma inversão do que consideramos realidade. No mundo fílmico, as cidades, as pessoas, a tecnologia, tal qual como conhecemos é apenas uma representação da Matrix. A verdade, em contrapartida, é composta por naves futurísticas, tubulações no centro da terra e máquinas sentinelas que se assemelham a grandes lulas metálicas. O cenário real no espaço fílmico nos parece pura ficção. Utilizando dessa breve observação, aponto para uma possível existência de diferentes instâncias do real. Pensar em real demanda o estabelecimento prévio de um ponto de partida: real em relação a que? Real para quem? Guardemos essas considerações para mais adiante. O questionamento de real trabalhado no filme foi tão contundente, que deu visibilidade para discussões a respeito em fóruns de internet, ensaios acadêmicos e até mesmo publicações filosóficas. Tecnicamente Matrix também despertou a atenção do público e dos críticos. A direção dos irmãos Andy e Lana Wachowski explorou diversas possibilidades dos

16 efeitos gerados por computador para a produção do longa-metragem. O filme se tornou referência no assunto e foi vencedor de várias premiações, incluindo o Oscar de melhor efeitos visuais. Diante da narrativa, vamos aos poucos entendendo como funciona a Matrix através de Morpheus, que ironicamente ostenta o nome do Deus dos sonhos, da mitologia grega, e lidera o despertar para a realidade dos resgatados. O personagem explica pacientemente ao descrente Neo as novas leis que regem sua percepção do que é possível. Entre essas possibilidades Neo aprende que as leis da física, apesar de operantes, podem ser burladas até certo ponto. Neste aspecto do mundo fílmico, age grande quantidade dos efeitos visuais do longa-metragem. Saltos a distâncias impossíveis a humanos, andar sobre paredes ou desviar de balas projetadas por armas de fogo. Esta última acabou popularizando o chamado bullet time. Ao desviar dos tiros, Neo cria a sensação de tempo praticamente congelado, permitindo vermos a trajetória da bala. A técnica do bullet time foi bastante repetida nos filmes subsequentes ao lançamento de Matrix, com homenagens e paródias. A partir de Matrix, até mesmo desenhos animados e jogos passaram a utilizar cenas que simulam o bullet time, como o jogo de ação Max Payne (2001). Todavia, na codificação do jogo ou na animação de um desenho, o efeito não é reproduzido com o mesmo aparato técnico, sugerindo portanto, uma busca pela reprodução do efeito estético e narrativo. Os efeitos visuais em Matrix parecem ser empregados para gerar uma experiência estética diferenciada, mas também para agregar significados à narrativa e corroborar com as leis do que é real, segundo o mundo fílmico. A partir da técnica cinematográfica, foi possível moldar um real imaginário, tornando-o visualmente identificável para o espectador. A realidade do filme não é apenas contada, mas mostrada de forma crível. Matrix é um marco do cinema, sobretudo quando relacionado aos efeitos visuais. A utilização desses efeitos só tende a crescer, assim como a melhoria das técnicas vigentes. Efeitos visuais de toda a sorte, reproduzindo visuais diferentes, relacionando à suas respectivas narrativas também de maneiras diferentes. Muitos reais sendo imaginados e reproduzidos. Volto a questionar: real em relação a que? Real para quem?. Para respondêlas, fazem-se necessárias algumas conceituações básicas. Tomemos a pílula vermelha. 2.1 Os Efeitos Visuais Manipular as imagens, construir cenários fantásticos, animar o inanimado, fazer ver o impossível. Todas essas características poderiam estar relacionadas aos efeitos visuais, mas

17 não somente. Muito antes do advento dos computadores, alguns cineastas, já no fim do século XIX, observavam as potencialidades do cinema e seu poder de encantar através das imagens. Além das representações cotidianas, o cinema crescia com produções que investiam no visual estético e também na narrativa. Dentre essas primeiras experiências cinematográficas, destaco as produções de Georges Méliès. Atuando como produtor teatral e mágico antes de aventurar-se com as películas, Méliès trouxe também aos filmes um toque de magia. Grande quantidade dos artifícios utilizados por Méliès são trucagens, constituídos principalmente por sobreposições de imagens, pequenas animações e ilusões de ótica. Dentre mais de quinhentos curtas-metragens produzidos, Viagem à Lua (Le Voyage dans la Lune, 1902) é um dos mais lembrados pelos críticos e estudantes da sétima arte, com a marcante imagem da Lua com face humana atingida no olho por um foguete. Por seus truques, o cineasta francês foi considerado o precursor dos efeitos especiais no cinema. Também no fim do século XIX, já aconteciam os primeiros experimentos de animações voltadas para o cinema. Desenhos, bonecos e pequenos objetos ganhavam vida nas mãos do norte-americano J. Stuart Blackton e o inglês Arthur Melbourne-Cooper. Donald Crafton (1999) afirma não ser possível classificar qual dos dois animadores citados anteriormente, foi o primeiro a explorar a técnica no cinema. Entretanto, observa que a manipulação dos objetos, organizados de maneira justaposta por apenas um frame ou alguns poucos, como faziam, era o suficiente para criar uma ordem mimética de ilusão de movimento no cinema. Os métodos utilizados por Méliès, Blackton e Melbourne-Cooper, se sofisticaram com o passar dos anos tanto por novas descobertas de processos, quanto por novos aparatos tecnológicos. Com o desenvolvimento também das demais técnicas cinematográficas, já na década de 1910 era possível a produção de longas-metragens, épicos e filmes da ordem do fantástico. O filme Metrópolis de Fritz Lang (Metropolis, 1927), já apresentava grande potência na representação, com cenários futurísticos de visual impressionante. Em 1933 King Kong (Merian C. Cooper e Ernest B. Shoedsack) apresentava Kong, o gorila gigante, animado completamente pela técnica de stop-motion 1, demonstrando grande avanço dos recursos de animações no cinema. As animações feitas com ilustrações quadro-a-quadro também se desenvolviam consideravelmente. Produções animadas adotaram a banda sonora desde 1 Stop-Motion é uma técnica de animação que consiste na captura de um fotograma a cada pequena modificação de posição do objeto animado. Colocado em sequência, as imagens anteriormente estáticas dão a impressão de movimento.

18 Steamboat Willie (Ub Iwerks,1928) e o uso das cores com Flores e Árvores (Flowers and Trees, Burt Gillett, 1932), ambas da gigante da animação Walt Disney. As obras de animação cresciam em quantidade e em duração, com o aumento do investimento dos estúdios também em longas metragens. Branca de Neve e os sete anões (Snow White and the Seven Dwarfs, William Cottrell, 1937) foi o primeiro longa da Walt Disney e abriu espaço para uma série de animações que se tornaram clássicos do cinema e do público infantil, como Fantasia (Norman Ferguson, 1940), Cinderela (Cinderella, Clyde Geronimi, 1950) e A Bela Adormecida (Sleeping Beauty, Clyde Geronimi, 1959). A intervenção de elementos animados feitos com ilustrações em produções liveaction 2 não eram comuns, sendo o stop-motion a principal técnica de animação cinematográfica para produção de efeitos até o final da década de 1970, substituída, gradativamente, pela animação feita diretamente no computador. Nesse período da década de 1970 o cinema norte-americano movimentava algumas mudanças. Figura 1 A lua de Méliès Fonte: Viagem à Lua (1902) 2 Termo utilizado para classificar atuações com atores reais, não animados.

19 Figura 2 A complexa cidade de Metropolis Fonte: Metropolis (1927)

20 A chegada de novos diretores como Steven Spielberg e George Lucas foi de grande relevância para a construção de uma nova lógica de produção em Hollywood. Com Tubarão (Jaws,1975) e Guerra nas Estrelas (Star Wars, 1977), Spielberg e Lucas alavancavam o mercado de blockbusters 3 ao criarem franquias de filmes de grande apelo visual e comercial, que geraram uma rede de produtos relacionados, denominado por Fernando Mascarello (2006), como escalada histórica do fenômeno da sinergia. (p. 348) Nessa mesma época o cinema procurava seu espaço em um momento de avanços tecnológicos que se popularizavam, com destaque para as televisões, as transmissões a cabo e os aparelhos VHS, considerados concorrentes das salas cinematográficas. O desenvolvimento tecnológico era motivo de preocupação por parte das grandes produtoras e distribuidoras pela abertura da nova concorrência, mas também esteve a favor do cinema nesse período embrionário para os efeitos visuais. John Belton (1999) destaca a utilização de determinados efeitos especiais em filmes anteriores a essa época, por meio de duas, ou mais, trilhas de filme sobrepostas. O autor ressalta a fragilidade da técnica, que mesmo que conseguisse produzir um efeito próximo ao esperado, ainda deixava traços identificáveis de sua produção, afastando a sensação de realidade desejada. Belton completa ao dizer que a tecnologia de computadores melhorou dramaticamente a ilusão de realidade provocada pelos efeitos especiais nos filmes. Por terem, os efeitos especiais e visuais, uma história muito próxima aos avanços dos aparatos tecnológicos, abro aqui uma reflexão. Ao delinear as mudanças do cinema com as melhorias tecnológicas, é imperante tomar certos cuidados. A tecnologia evoluía em todos os setores, não apenas no cinema. É comum que equipamentos mecânicos, elétricos e/ou digitais sejam substituídos por novos modelos, geralmente mais eficientes. Não é isso, porém, que define a melhoria do setor em si. O cinema avançava como um todo pelo mundo, com diretores e seus diferentes olhares, com novas perspectivas, movimentos críticos, publicitários, comerciais e políticos. O cinema foi e ainda é o que fazem dele, e não com que ferramenta o fazem. Tratar das potencialidades dos efeitos visuais no cinema é tratar também de suas respectivas ferramentas. Todavia, aqui interessa muito mais o que pode ser feito a partir desse aparato. Quando o cinema adotou o áudio síncrono no fim da década de 1920, e o filme em cores nos últimos anos da década de 1930, falava-se muito a respeito dos equipamentos. Hoje, áudio e cores são objetos de estudos que vão além. Não se trata, contudo, 3 Blockbuster é o nome dado às grandes produções do cinema com alto investimento financeiro, forte campanha de marketing, e grande público potencial. Por causa dos elevados recursos despendidos nesses filmes, os estúdios esperam resultados positivos com as arrecadações nas bilheterias e na assimilação de produtos relacionados.