A PESQUISA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: À LUZ DO CONCEITO DE RESPONSIVIDADE NA ESTÉTICA BAKHTINIANA



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Transcrição:

A PESQUISA NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: À Resumo LUZ DO CONCEITO DE RESPONSIVIDADE NA ESTÉTICA BAKHTINIANA SOUZA, Maiara Ferreira de 1 - UFJF LEITE, Ariane Rodrigues Gomes 2 - UFJF BERTOLDO, Quézia dos Santos 3 - UFJF Grupo de Trabalho - Didática: Teorias, Metodologias e Práticas Agência Financiadora: Propesq O presente trabalho apresenta o nosso olhar sobre um recorte da pesquisa Práticas de Leitura nos anos iniciais do Ensino Fundamental, realizada pelo Grupo de Pesquisa LEFoPI (Linguagem Educação Formação de Professores e Infância) na Faculdade de Educação, da Universidade Federal de Juiz de Fora. Essa pesquisa surgiu a partir de outra pesquisa intitulada "Práticas de leitura na educação infantil e na passagem ao ensino fundamental". Tal pesquisa teve seu início no ano de 2010, objetivando compreender as relações entre educação infantil e ensino fundamental frente à nova realidade advinda da lei nº. 11.272/2006, especialmente no que concerne às práticas de leitura propostas e/ou exercidas pelas crianças, tanto na educação infantil quanto no ensino fundamental (MICARELLO et al., 2011, p. 02). Tomando como base o referencial teórico da filosofia de linguagem de Mikhail Bakhtin, buscamos discutir como se configura, no âmbito da referida pesquisa, a relação do pesquisador com o outro a partir dos conceitos de alteridade e responsividade na estética bakhtiniana. Através do intercambiar de olhares e interpretações, objetivamos refletir sobre a concepção de criança e o papel do pesquisador na investigação com crianças pequenas, através da análise das notas expandidas produzidas pelos pesquisadores ao se inserirem no campo de pesquisa e se colocarem em interação com os sujeitos. Ao mergulharmos nesses estudos constatamos que a perspectiva dialógica de linguagem fundamentada em Bakhtin evidencia diversos elementos sobre a relação eu outro. Assim, o texto a seguir é fruto de uma aproximação com as proposições de Bakhtin e uma experiência de pensar o referencial 1 Graduanda do curso de pedagogia pela UFJF/FACED. Bolsista de iniciação cientifica da pesquisa Práticas de Leitura nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, orientada pela professora Hilda Micarello e financiada pela Propesq. E-mail: maiaraf.souza@gmail.com. 2. Graduanda do curso de pedagogia pela UFJF/FACED. Participante da pesquisa Práticas de Leitura nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental., orientada pela professora Hilda Micarello e financiada pela Propesq.E-mail: ariane-csc@hotrmail.com 3 Graduanda do curso de pedagogia pela UFJF/FACED. Participante da pesquisa Práticas de Leitura nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental., orientada pela professora Hilda Micarello e financiada pela Propesq.E-mail: quezia.jf@hotmail.com

17614 teórico no universo metodológico da pesquisa em educação, como ato responsável e responsivo. Palavras-chave: Ensino Fundamental. Linguagem. Bakhtin. Introdução A pesquisa Práticas de Leitura nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental adota um desenho longitudinal, no qual um mesmo grupo de crianças foi acompanhado na última etapa da educação infantil e, posteriormente, nos anos iniciais do ensino fundamental. Os recursos metodológicos utilizados nesta pesquisa foram a observação participante, numa perspectiva etnográfica, e entrevistas semi-estruturadas com os professores responsáveis pelas turmas. No segundo semestre do ano de 2010, pesquisadores se inseriram em duas escolas da rede pública municipal da cidade de Juiz de Fora, no estado de Minas Gerais, com o objetivo de observar as práticas de leitura realizadas pelas crianças, o acompanhamento ocorreu em duas turmas com crianças de 5 anos (última etapa da educação infantil). No ano de 2011, essas mesmas turmas foram acompanhadas no primeiro ano do ensino fundamental. Já no ano de 2012, por questões organizacionais das escolas, somente uma turma foi observada, agora já cursando o segundo ano do ensino fundamental. Essa escola funciona em regime de tempo integral apenas para os alunos e atende às crianças da educação infantil ao 9º ano do ensino fundamental. Com o intuito de esclarecer ao leitor sobre quem são os sujeitos da pesquisa e de que contexto eles partilham, já que segundo Bakhtin (2011) para compreendermos o sujeito é necessário compreender o contexto em que este está inserido, destacamos a seguir alguns aspectos da história da instituição, bem como o perfil da turma. As informações aqui registradas foram produzidas mediante um breve histórico realizado pela atual coordenadora da escola e pela professora regente da turma, em reunião do grupo de pesquisa Práticas de Leitura, no dia 18 de setembro de 2012. A escola de tempo integral foi fundada em 1969. Antes de tornar-se uma instituição da rede municipal da cidade de Juiz de Fora, era uma escola comunitária e funcionava com o apoio de moradores do bairro, tendo sido fundada para atender aos filhos dos caseiros que trabalhavam nos arredores de um bairro da zona norte da cidade. No ano de 1999 os índices de repetência e evasão eram muito altos e a superação desses índices tornou-se o primeiro desafio enfrentado pela escola. Lidar com tal problema

17615 não foi nada fácil, pois os trabalhadores do bairro muitas vezes tinham que procurar emprego em outros locais e acabavam tirando as crianças da instituição. Outros iam embora e depois de alguns meses voltavam, e durante este período de afastamento as crianças ficavam sem frequentar a escola. Outra dificuldade que a escola encontrou foi com relação ao preconceito racial. Para lidar com essa questão, em 2000 foi criado o 1º projeto escolar que visava tratar a diversidade étnico-racial, objetivando a construção de experiências poéticas e estéticas com e entre os alunos. Atualmente a escola atende a aproximadamente 300 alunos, sendo alguns da zona rural da cidade. A turma pesquisada é composta por 22 crianças, cada uma delas se encontra num estágio específico em termos da apropriação da leitura e da escrita. A professora trabalha na escola há nove anos e nos esclareceu que a instituição funciona como Bloco pedagógico 4, dando continuidade aos ciclos de ensino. Devido à metodologia assumida pela escola, a professora teve a oportunidade de acompanhar a turma durante três anos consecutivos, do primeiro ano ao terceiro ano do ensino fundamental. Ao falar sobre sua rotina de trabalho, a professora regente afirmou que suas práticas estão embasadas no interesse das crianças por brincar e sonhar com as palavras. Ao apresentar o tapete de contação de histórias, suporte utilizado por ela para a narrativa de contos de fadas, enfatizou como a linguagem oral e escrita perpassa o cotidiano escolar das crianças, de forma mágica e especial, através do uso de textos como poesias, lendas, parlendas, etc. Em suma, essa escola se localiza num bairro de periferia, onde crianças pequenas vivem a dimensão do lúdico e da fantasia e, ao mesmo tempo, vivem a experiência de apropriação da linguagem escrita na alfabetização. A criança enquanto sujeito, produtora de cultura e produto da cultura na qual se constitui enquanto ser humano, brinca e dá sentido ao mundo, produzindo história. Ela produz cultura na interação que estabelece com outras formas e manifestações de cultura, atribuindo significação às coisas, tanto as que o homem já encontra prontas na natureza, como as que ele produz agindo sobre ela. Segundo Baptista (s/ d, p.3): 4 A Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora denomina Bloco Pedagógico os três primeiros anos do ensino fundamental.

17616 Como sujeitos que aspiram a novos conhecimentos, as crianças enfrentam o desafio de compreender os signos, os símbolos e os complexos sistemas de representação que circulam socialmente, dar sentido a eles e deles se apropriar. Ao interagir com os diferentes signos e com os conhecimentos que circulam socialmente, a criança o faz sob a mediação dos seus saberes e das suas experiências infantis. Dessa articulação, nascem novos saberes, conhecimentos e experiências. Ao chegarmos na escola descrita acima, como pesquisadores iniciantes, buscamos principalmente compreender o contexto, e a medida em que entramos à campo fomos tecendo nossas concepções, as quais discorremos nesse trabalho, primeiramente, imbricadas a estrutura conceitual na qual o texto em tela está ancorado, com o objetivo de delinear seu enquadramento teórico metodológico; em seguida apresentaremos o nosso olhar sobre o contexto escolar; e por fim nossas considerações. O Conceito de Responsividade na Estética Bakhtiniana Ao mergulharmos no contexto escolar supracitado sentimos a necessidade de compreender a relação do pesquisador com o outro. Para tanto, trazemos o conceito de alteridade como conceito chave para entender essa relação. A Responsividade pode ser caracterizada pelo modo como o sujeito assume, em seus atos, um compromisso ético com o seu agir, ou seja, o ouvinte, ao perceber e compreender o significado (linguístico) do discurso, ocupa simultaneamente em relação a ele uma ativa posição (Bakhtin, 2011, p. 271). É nessa perspectiva que Sobral (2005) se apóia ao dizer que o sujeito se forma e manifesta seus pensamentos através da linguagem, em que essa forma de interação esta imersa no mundo e, portanto, necessita dele para se constituir e construí-lo. Assim: O agir do sujeito é um conhecer em vários planos que une processo (o agir no mundo), produto (a teorização) e valoração (o estético) nos termos de sua responsabilidade inalienável de sujeito humano, de sua falta de escapatória, de sua inevitável condição de ser lançado no mundo e ter ainda assim de dar contas de como nele agiu (SOBRAL, 2005, p.118). Ao entrarmos na instituição, campo da referida pesquisa, deparamo-nos com um ambiente constituído por diversas trocas de experiências e aprendizagens como, por exemplo, entre professor-criança, criança-criança. E, mais especificamente, ao nos inserirmos em uma determinada turma, encontramos sujeitos ativos, que têm voz, o que implica uma responsabilidade ao expor essas vozes no momento de transcrevê-las ou parafraseá-las nas notas de campo e notas expandidas.

17617 Dessa forma, compreendemos que a tarefa do pesquisador não é fácil e exige uma tomada de decisão, visto que a produção de linguagem da criança apresenta-se como continuidade de algo que se constituiu antes, refletindo nas produções posteriores, as quais têm uma dimensão coletiva. É por isso que no momento em que trazemos nossas considerações registradas em forma de notas expandidas não necessariamente estamos expondo o que o outro pensa de si próprio, visto que o olhar que temos sobre o outro não é o que ele vê de si mesmo, posto que justamente por apresentarmos características semelhantes e diferentes, ao compartilharmos essas características com o outro podemos alterá-lo, por isso através desses registros notas de campo vemos o mundo a partir de uma dada posição, o que não implica negar a existência do mundo dado, mas postular que sua apreensão é sempre situada (SOBRAL, 2005, p.107). Nesse contexto surge a idéia de opacidade do discurso (AMORIM, 2003), em que deixamos claro que as descrições de nossas observações são feitas a partir de nosso olhar e, por isso, ocorre uma ilusão de transparência que Amorim destaca da seguinte forma: Entre o discurso do sujeito a ser analisado e o conhecido e o discurso do próprio pesquisador que pretende analisar e conhecer, uma vasta gama de significados conflituais e mesmo paradoxais vai emergir. Assumir esse caráter conflitual e problemático da pesquisa em Ciências Humanas implica renunciar a toda ilusão de transparência (AMORIM, 2003, p.12). A partir dessas perspectivas, o pesquisador ocupa um lugar singular de onde só ele consegue ver, no outro, o que o outro não consegue ver e, ao compartilhar esses diferentes pontos de vista, o pesquisador complementa o outro. Por isso enquanto pesquisadoras (iniciantes), nossa tarefa é tentar captar algo do modo como ele [o outro] se vê, para depois assumir plenamente nosso lugar exterior e dali configurarmos o que estamos vendo do que ele vê (AMORIM, 2003). Do lugar que ocupamos, de ainda graduandas e pesquisadoras iniciantes, temos a consciência de que nossa entrada em campo modifica a rotina da sala de aula e consequentemente os sujeitos nela envolvidos, assim como também somos modificadas por eles. Concordamos com Pino (2005) quando ele diz que a criança é sujeito histórico que produz cultura e é ao mesmo tempo, modificada pela cultura. Assim, o desenvolvimento cultural da criança, mais do que inserção dela na cultura, é a inserção da cultura nela para torná-la um ser cultural (PINO, 2005, p. 158, grifos do autor).

17618 Logo, o pesquisador assume a responsabilidade por tudo aquilo que faz, inclusive ao compartilhar com o outro seu ponto de vista e de certa forma alterá-lo, já que cabe ao pesquisador tratar o acontecimento do campo de forma ética, a partir da observação singular do outro. Portanto, constata-se que a alteridade implica necessariamente a responsividade, uma vez que o pesquisador, ao se inserir no campo, altera todo aquele cenário modificando, consequentemente, a si mesmo e aos sujeitos com os quais se coloca em interação. Os nossos olhares sobre o contexto escolar Ao nos inserirmos no campo, estamos entrando em um território que está em constante movimento, em processo de mudanças e que, logo, os acontecimentos e as práticas humanas ocorridas durante o período da pesquisa não são estáticos, bem como não possuem uma única forma de serem percebidos. Sarmento (2003) destaca que a pesquisa no terreno em etnografia tem como principal instrumento de investigação o próprio investigador, na sua "disponibilidade para, precisamente, observar, escutar e sentir o que o rodeia, interrogar e recolher as opiniões dos que agem no terreno e examinar os documentos e os artefatos produzidos pela e na ação" (SARMENTO, 2003, p. 155). Ao introduzir-se no campo o pesquisador ressignifica e partilha suas significações com outros sujeitos. E através da observação, pode realizar aproximações contínuas aos sentidos que os sujeitos pesquisados produzem para as práticas desenvolvidas no cotidiano escolar, bem como as implicações dessas práticas no desenvolvimento desses sujeitos. Numa perspectiva etnográfica, a observação, nos possibilita através de um olhar sensível aos indícios deixados pelos sujeitos pesquisados no âmbito escolar, esquadrinhar aproximações sucessivas aos sentidos produzidos por esses sujeitos no decorrer de seu processo de escolarização. Segundo Tura (2003) a observação é a primeira forma de aproximação do indivíduo com o mundo em que vive. Pelo olhar entramos no mundo, começamos a nos comunicar com ele e iniciamos o conhecimento acerca dos seres que nele habitam. A autora destaca ainda que a observação, com as características especificas de sistematização de condutas e procedimentos, bem como de focalização em torno de um objeto determinado, constitui também um procedimento básico da investigação científica, da experimentação. Assim a observação é:

17619 (...) o mergulho profundo na vida de um grupo com o intuito de desvendar as redes de significados produzidos e comunicados nas relações interpessoais. Há segredos do grupo, fórmulas, padrões de cultura, silêncio e códigos que podem ser desvendados (TURA, 2003, p. 189). É na atividade de observação, através do intercambiar de olhares, que o pesquisador estabelece uma relação com seu objeto de conhecimento e através dessa relação torna-se possível apreender as experiências dos sujeitos pesquisados e a busca por aproximações sucessivas aos sentidos por eles atribuídos se torna viável. Cabe ressaltar que o pesquisador participa ativamente desse processo, criando e recriando inúmeras significações sobre as condutas observadas e mediante sem números de interpretações possíveis, traz diante de si suas experiências e fundamenta as práticas observadas, em processo dialético. Assim, em vez de o pesquisador iludir-se em procurar eliminar os efeitos de sua presença no campo de investigação, o importante é buscar entendêlas. É mergulhadas neste contexto de interação e modificação do outro que iremos, a partir de agora, nos colocar em ação perante as notas de campo, as quais possuem responsabilidades para com os sujeitos que estão se constituindo como leitores e se formando como seres sociais. Considerações Finais No momento em que apresentamos algumas considerações acerca das observações feitas na sala do 2º ano, não necessariamente estamos expondo o que o outro pensa de si próprio, mas o que podemos captar da experiência alheia justamente por apresentarmos semelhanças e diferenças em relação a esse outro, o que nos permite alterá-lo pelo excedente de visão que trazemos em relação à experiência observada (BAKHTIN, 2011). O contexto observado se constitui fonte inesgotável de conhecimento, tanto do outro como do mundo à sua volta e de nós mesmos, enquanto pesquisadores e professores em formação. Assim não existe um verbo único para definir as vozes e os olhares que o outro tem para com o mundo e para suas próprias práticas do cotidiano, mas sim expressões criativas que nos surgem em cada novo momento de análise do discurso alheio. É através da mediação que ocorre entre crianças e entre crianças e adultos que as primeiras vão construindo seus conceitos, apropriando-se da cultura e se integrando às

17620 práticas sociais. Vigotski ao entender que o desenvolvimento humano passa pelo outro, afirma que: É por meio dos outros que nos tornamos nós mesmos e esta regra se aplica não só ao indivíduo como um todo, mas também à história de cada função (psíquica) separadamente. Isso também constitui a essência do processo do desenvolvimento cultural traduzido numa forma puramente lógica. O indivíduo torna-se para si o que ele é em si pelo que ele manifesta aos outros (VIGOTSKI, 1997, p.105 apud PINO, 2005, p. 66). É só nessa troca com o outro que a criança pode ingressar no mundo da cultura e isso implica necessariamente, a sua progressiva inserção nas relações humanas e nas práticas sociais. E se por cultura for entendido o conjunto das produções humanas, as quais, por definição, são portadoras de significação, ou seja, daquilo que o homem sabe e pode dizer a respeito delas, então o nascimento cultural da criança é a porta de acesso dela ao universo das significações humanas, cuja apropriação é condição da sua constituição como um ser cultural. Nesse processo de mediação os sujeitos envolvidos na pesquisa (professora-nóscrianças) não são agentes passivos. À medida que percebemos e compreendemos o significado (linguístico) do discurso, de acordo com as reflexões de Bakhtin (2011), ocupamos simultaneamente uma ativa posição responsiva, ou seja, concordamos, discordamos, concordamos/discordamos parcialmente, completa-o, etc. REFERÊNCIAS AMORIM, M. A contribuição de Mikhail Bakhtin: a tripla articulação ética, estética e epistemológica. In: Freitas, Maria Tereza; Jobim e Souza, Solange; Kramer, Sonia (orgs.): Ciências humanas e pesquisa: leitura de Mikhail Bakhtin São Paulo: Cortez, 2003. p.11-25. BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 6ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011. BAPTISTA, M. C. A linguagem escrita e o direito à educação na primeira infância. Consulta Pública - MEC. [S.l : s.n : s.d]. BRASIL. Lei nº 11.272 de 02 de fevereiro 2006. Disponível em: <http://www.cosif.com.br/captura.asp?arquivo=lo11272> Acesso em: 01 de jul. de 2013. MICARELLO, H. A. L. S.; SOUZA, M. F.; LEITE, A. R. G; CAMPOS, V. R.; SANTOS, T. T. M. Leitura, literatura e prática pedagógica na educação infantil. In: IX jogo do livro e III

17621 fórum ibero-americano de letramentos e aprendizagens, 2011, Belo Horizonte-MG. Anais do IX jogo do livro e III fórum ibero-americano de letramentos e aprendizagens, 2011, Belo Horizonte-MG. PINO, A. As marcas do humano: às origens da constituição cultural da criança na perspectiva de Lev S. Vigotski. São Paulo: Cortez Editora, 2005. SARMENTO, M. J. O estudo de caso etnográfico em educação. IN Itinerários de pesquisa: perspectivas qualitativas em sociologia da educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. SOBRAL, A. Ético e estético: Na vida, na arte e na pesquisa em Ciências Humanas. In: BRAIT, Beth (org.): Bakhtin: conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2005. p.103-118. TURA, M. L. R.. A observação no cotidiano escolar. IN Itinerários de pesquisa: perspectivas qualitativas em sociologia da educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.