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Transcrição:

CIDADE, POVO E NAÇÃO: Gênese do Urbanismo Moderno * Mônica McAllister ** Trata-se de uma seleção de textos apresentados no seminário Origens das Políticas Urbanas Modernas: Europa e América Latina, Empréstimos e Traduções 1, promovido pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional, UFRJ, em conjunto com o Centre de Sociologie de Paris. Os textos foram elaborados por pesquisadores brasileiros, argentinos, franceses, uruguaios e venezuelanos que vêm trabalhando com a história da cidade e do urbanismo e a quem se solicitou uma reflexão sobre determinados temas: Reforma urbana, reforma social, modernidade, construção nacional ; O meio social, político, cultural e profissional dos reformadores e Transferências e traduções. Os urbanistas europeus na América Latina (p. 17). Este livro encontra-se assim estruturado: Parte I - INTRODUÇÃO: Transferências, empréstimos e traduções na formação do urbanismo no Brasil, Da questão social aos problemas urbanos: os reformadores e a população das metrópoles em princípios do século XX e Da cidade à nação: gênese e evolução do urbanismo no Brasil. * PECHMAN, Robert; RIBEIRO, Luis Cezar de Queiroz (Org). Cidade, Povo e Nação: gênese do urbanismo moderno. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996. ** Arquiteta, Mestre em Arquitetura e Urbanismo, Doutoranda em Administração e Pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre Poder e Organizações Locais, NEPOL, isto junto ao Núcleo de Pós-Graduação em Administração, Escola de Administração, UFBA. 1 Itamonte, Minas Gerais, 29 de agosto a 2 de setembro de 1994.

420 RESENHA Parte II - A REFORMA URBANA: REFORMA SOCIAL, MODERNIDADE E CONSTRUÇÃO NACIONAL: As transformações urbanas na imprensa operária: São Paulo, na virada do século XX, O urbanismo de Lúcio Costa: contribuição brasileira ao concerto da nações, A concepção e o projeto de Belo Horizonte: a utopia de Aarão Reis, Christiano Stockler Neves: o opositor do Futurismo em São Paulo e Arquitetura fascista e o Estado Novo: Marcello Piacentri e a tradição monumental no Rio de Janeiro ; Parte III - O URBANISMO: MEIO PROFISSIONAL, TRAJETÓRIAS INDIVIDUAIS E INSTITUIÇÕES POLÍTICAS: Donald Alfred Agache: urbanismo, uma sociologia aplicada, Campo, contracampo, extracampo: fundamentos, desafios e conflitos sobre o lugar da arquitetura no campo urbano, O urbanismo no Instituto de Engenharia: São Paulo, 1920-1940, A formação do urbanismo como disciplina e profissão: São Paulo na primeira metade do século XX e O Museo Social Argentino e a formação e difusão das idéias do urbanismo ; Parte IV - TRANSFERÊNCIAS E TRADUÇÕES: Camillo Sitter, Camille Martin e Saturnino de Brito: traduções e transferências de idéias urbanísticas, A cidade controlada: santos 1870-1913, O urbanismo fora do lugar? Transferências e traduções das idéias urbanísticas nos anos 20, Pensando a metrópole moderna: os planos de Agache e Le Corbusier para o Rio de Janeiro, Entre práticas e representações: a cidade do possível e a cidade do desejo, A trajetória de Alfred Donat Agache no Brasil e História e cidade na Amazônia Brasileira: a utopia urbana de Henry Ford, 1930. No primeiro texto da Introdução, Ribeiro explicita que a coletânea apresenta vários aspectos e dimensões dos processos de constituição do urbanismo como ciência e experiência em várias cidades do Brasil e da América Latina, assim como suas relações com a expansão para o Novo Mundo do projeto de reforma social surgido após 1919 em vários países, especialmente na França e nos Estados Unidos (p. 17). Mais exatamente, a coletânea de textos cobre o período de 1900 a 1940, quando várias cidades do Brasil e de outros países da América Latina foram

Mônica McAllister 421 objeto de intervenções, de planos e projetos de renovação urbana, notandose aí a existência de fortes influências do modelo francês de modernização, sobretudo após o surgimento da ciência da cidade, quando se supera a fase do urbanismo e de embelezamento e melhoramentos urbanos (p. 15-16). Na Parte II, situa-se o estudo do processo de formação do urbanismo e das políticas urbanas no quadro mais vasto dos projetos reformadores, procurando[-se] identificar as categorias utilizadas na enunciação dos problemas urbanos, os diagnósticos e as prescrições; os dispositivos de observação do povo e da cidade; as experimentações, regras e modelos de intervenção (p. 17). Na Parte III, identificam-se os grupos profissionais, suas trajetórias individuais e as instituições políticas mobilizadas, isto é, estudam-se os atores da reforma urbana, a emergência do urbanismo como disciplina e como profissão, as relações dos profissionais com as municipalidades e com as burocracias centrais (p. 17). Na Parte IV, relacionam-se os estudos concretos sobre os países exportadores e importadores de saberes e técnicas. Esta parte de certa forma conclui as anteriores, tendo em vista que: na Parte II, examinam-se os processos pelos quais se efetuaram as transferências de um país para o outro e, na Parte III, determinam-se os canais pelos quais estas transferências se realizaram (p. 17-18). Ainda segundo Ribeiro, no exame das traduções, foram também observadas as escolhas exercidas pelos atores locais, concluindo-se que: Não ocorreu apenas a metabolização das idéias, como, também, a escolha daquelas que melhor podiam ser utilizadas nas estratégias teórico-políticoculturais dos atores na luta pela construção de um novo campo de saber e poder: o urbanismo. Estas estratégias foram influenciadas pelo espírito da época, isto é, pelo estado do debate sobre a sociedade brasileira organizado pelo campo intelectual, com suas concepções e diagnósticos. Não houve, portanto, um simples consumo dos produtos teórico-culturais. As teorias e modelos importados tiveram funções cogniscíveis da realidade e, ao mesmo tempo, legitimadora dos atores e das suas escolhas históricas (p. 17-18).

422 RESENHA As teorias e modelos importados se traduzem no modelo francês de modernização, amplamente difundido no Brasil e nos outros países da América do Sul, isto no período privilegiado pela coletânea. Este modelo é, pois, esboçado no segundo texto da Introdução. Ao esboçar o modelo, Topalov 2 indica que os problemas urbanos passam a existir, enquanto idéia, com os reformadores de moradias e os primeiros urbanistas, os filantropos e os assistentes sociais, que tinham de enfrentar a realidade das grandes metrópoles do mundo industrial (p. 23, 45). As intervenções urbanas perduram até meados de 1900 em termos de operações isoladas, mas, a partir de 1910, com o movimento de planificação urbana, considera-se que é a cidade inteira que tem que ser reformada. Trata-se de mudar a cidade para mudar a sociedade e, particularmente, o povo, partindo-se do pressuposto de que a nova ordem social será engendrada por esta nova ordem urbana pensada, ao mesmo tempo, como organismo no qual cada elemento contribui para a vida de todo o conjunto e como a fábrica racionalizada na qual cada função se realiza no lugar adequado e da melhor maneira possível (p. 23, 45). No terceiro texto da Introdução, Cardoso e Ribeiro, reafirmam que, no que se refere ao Brasil, um dos aspectos recorrentes das idéias e práticas presentes no universo do urbanismo/planejamento é a importação de modelos formulados nos países centrais, sendo que, todavia, a presença das idéias estrangeiras não se faz sem determinadas adaptações (p. 54). O que se ressalta é que, enquanto na Europa e nos Estados Unidos a questão social aparece como eixo e objetivo do conhecimento e da intervenção, no Brasil, [a]s idéias de modernização, desenvolvimento, e construção da nacionalidade, serão os principais temas que submeterão a questão social, e darão um caráter distinto à discussão sobre o urbano no Brasil, numa adaptação do discurso urbanístico importado em função das reais necessidades do país (p. 54). 2 Diretor de Pesquisa no Centre National de la Recherche Scientifique, Paris, França.

Mônica McAllister 423 No período Vargas, o padrão de planejamento que se configura reproduz o discurso higienista e urbanístico produzido nos países centrais desde o final do século XIX, apoiando-se nas categorias do organicismo ou do funcionalismo taylorista (p. 64). Esse padrão sofre, no Brasil, uma transformação... na finalidade de sua utilização, em se considerando que desde o início do século as idéias-força da nacionalidade e da modernização impõem-se à reflexão sobre o social. Isto significa que o discurso da higiene e da funcionalidade guarda assim muito mais um caráter modernizador e afirmador da nacionalidade emergente que propriamente de controle social (p. 64). Nas palavras de Pechman: Sim, tínhamos urbanismo, mas continuávamos a ter problemas urbanos. A vaga higienista entre nós aparentemente se esgotara nos anos 10 e os debates sobre a cidade saíram de cena. Aqui a experiência urbanística se esgotara na regeneração do corpo urbano e na hierarquização do corpo social, sem necessitar negociar melhoras nas condições de vida dos grupos, que, da cidade, sobreviviam de seus restos e, por isso mesmo, violavam, nas suas práticas cotidianas, as normas sanitárias.... No Brasil, apesar dos problemas sociais e urbanos não tínhamos ainda uma questão urbana. Conhecíamos o urbanismo, mas sua tradução entre nós limitou-se a produzir uma civilidade higienizada sem precisar aventurar-se pelas questões dos direitos sociais que a vida urbana suscitava, questionava (p. 334-335). Cardoso e Ribeiro abordam ainda dois períodos do urbanismo no Brasil, ao que correspondem padrões de planejamento, também resultantes de transferências e traduções : na Era do Desenvolvimentismo, a partir dos anos 1950, impõe-se o urbano como questão de desenvolvimento, nas suas diversas versões - o tecno-burocratismo desenvolvimentista, o humanismo lebretiano, a reforma urbana modernizadora e a reforma urbana redistributiva -, e nos dias de hoje, estaria surgindo um novo padrão, fundado no neoliberalismo e na questão ambiental (p. 65-78). Para que não se duvide da afirmação de Pechman, de que Yes, nós temos urbanismo (p. 331), registra-se a expectativa por uma continuidade do trabalho resenhado, isto é, espera-se que se produzam e sejam publicados estu-

424 RESENHA dos sobre o padrão desenvolvimentista e, se assim for, o padrão neoliberal e ambiental. Ora, como sugerem Ribeiro e Cardoso, se todas essas idéias vêm sendo progressivamente desenvolvidas aqui, a partir da influência dos debates em âmbito mundial, principalmente por intermédio das agências de ajuda financeira e de fomento à pesquisa, isto é, se mais uma vez, importamos idéias, cabe refletir sobre seu lugar (p. 73).