PROF. EDUARDO HOFFMANN



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Transcrição:

FACULDADE ASSIS GURGACZ CURSO DE DIREITO DIREITO DAS COISAS II PROF. EDUARDO HOFFMANN Assessor Jurídico da Câmara Municipal de Toledo (PR). Advogado militante no escritório Canan e Poletto Advogados em Toledo (PR) Professor das Disciplinas de Direito Civil e Processual Civil no Curso de Direito da Faculdade Assis Gurgacz, de Cascavel (PR) Professor das Disciplinas de Direito Empresarial e Tributário nos Cursos Tecnológicos e de Administração da Faculdade Sul Brasil, de Toledo (PR) Especialista em Função Prática do Direito, ênfase em Direito Público pela Unisul (SC) Especialista em Direito Tributário pela Unisul (SC) Mestre em Direito Processual Civil e Cidadania pela UNIPAR (Umuarama - PR) Endereço Eletrônico: adv.hoffmann@hotmail.com http://professorhoffmann.wordpress.com 1

SUMÁRIO 1. DIREITOS REAIS SOBRE COISAS ALHEIAS... 5 2. DIREITOS REAIS LIMITADOS DE GOZO E FRUIÇÃO... 6 2.1 ENFITEUSE... 6 2.1.1 Histórico... 6 2.1.2 Natureza jurídica... 7 2.1.3 Conceito... 8 2.1.4 Objeto... 9 2.1.5 Constituição... 9 2.1.6 Extinção... 9 2.1.7 Situação atual da enfiteuse... 9 2.1.8 Estudo de caso: Desapropriação e registro da enfiteuse... 10 2.2 DIREITO DE SUPERFÍCIE... 12 2.2.1 Configuração... 12 2.2.2 Características e distinções... 14 2.2.3 O direito de superfície no Código Civil e no Estatuto da Cidade... 15 2.2.4 Quadro comparativo entre superfície e outros institutos... 20 2.3 DAS SERVIDÕES... 22 2.3.1 Conceito... 22 2.3.2 Finalidade... 23 2.3.3 Princípios fundamentais que regem às servidões... 23 2.3.4 Natureza jurídica da servidão... 24 2.3.5 Classificação das servidões... 25 2.3.6 Modos de constituição... 25 2.3.6.1 Servidão constituída por ato humano... 26 2.3.6.2 Servidão constituída por fato humano... 27 2.3.7 Regulamentação das servidões... 28 2.3.7.1 Obras necessárias à sua conservação e uso... 28 2.3.7.2 Exercício das servidões... 29 2.3.7.3 Remoção da servidão... 30 2.3.8 Ações que protegem as servidões... 31 2.3.8.1 Ação confessória... 31 2.3.8.2 Ação negatória... 32 2.3.8.3 Ações Possessórias... 33 2.3.8.4 Ação de nunciação de obra nova... 33 2.3.8.5 Usucapião... 33 2.3.9 Extinção da servidão... 33 2.4 USUFRUTO... 34 2.4.1 Caracterização... 34 2.4.2 Objeto... 35 2.4.3 Espécies... 35 2.4.4 Direitos do usufrutuário... 38 2.4.5 Obrigações do usufrutuário... 39 2.4.6 Direitos e obrigações do nu-proprietário... 41 2.4.7 Extinção do usufruto... 41 2.5 USO... 42 2.5.1 Conceito... 42 2.5.5 Concessão de direito real de uso... 45 2.6 HABITAÇÃO... 47 2.6.1 Caracterização... 47 2.6.2 Constituição... 48 2.6.3 Direitos e deveres... 50 2.6.4 Extinção... 51 2.7 CONCESSÃO DE USO ESPECIAL PARA FINS DE MORADIA... 51 2.8 DO DIREITO DO PROMITENTE COMPRADOR... 56 2.8.1 Efeitos da promessa de compra e venda... 56 http://professorhoffmann.wordpress.com 2

2.8.2 Cláusula de arrependimento... 57 2.8.3 Forma do contrato... 58 2.8.4 Registro no Cartório de Imóveis... 58 2.8.5 Direito real... 59 2.8.6 Direitos do titular de direito real... 59 3. DIREITOS REAIS DE GARANTIA... 62 3.1 Aspectos gerais e finalidades... 62 3.2 Elementos históricos... 63 3.3 Características... 64 3.4 Princípios... 65 3.5 Direitos reais de garantia e privilégios... 66 3.6 Pressupostos objetivos do contrato de garantia real... 67 3.7 Capacidade para a constituição dos direitos reais de garantia... 68 3.8 Objeto... 72 3.9 Pagamento parcial do débito e indivisibilidade das garantias... 73 3.10 Direito de seqüela... 74 3.11 Direito de excussão... 76 3.12 Remição das garantias reais... 77 3.14 Garantia assumida por terceiro... 80 3.15 Possibilidade de o credor ficar com coisa cláusula comissória... 80 3.16 PENHOR... 81 3.16.1 Conceito... 81 3.16.2 Espécies de penhor... 82 3.16.3 Objeto do penhor... 83 3.16.4 Características do penhor... 83 3.16.5 Constituição do penhor... 84 3.16.6 Excussão do bem e direitos decorrentes da garantia... 85 3.16.7 Obrigações do credor pignoratício... 86 3.16.8 Vencimento da obrigação... 86 3.16.9 Extinção do penhor... 87 3.16.10 Penhor rural... 87 3.16.10.1 Caracterização e classificação... 87 3.16.10.2 Requisitos... 89 3.16.10.3 Registro no ofício imobiliário... 89 3.16.10.4 Cédula rural pignoratícia... 90 3.16.10.5 Procedimento judicial para a cobrança da dívida... 91 3.16.11 Penhor industrial e mercantil... 92 3.16.12 Penhor de direitos e de títulos de crédito... 93 3.16.13 Penhor de veículos... 95 3.16.14 Penhor legal... 96 3.17 HIPOTECA... 98 3.17.1 Caracterização... 98 3.17.2 Natureza e obrigações. Objeto da hipoteca... 99 3.17.3 Bens. Objeto da hipoteca... 100 3.17.4 Constituição da hipoteca... 100 3.17.5 Pluralidade de hipotecas e insolvência do devedor... 102 3.17.6 Remição dos bens... 102 3.17.7 Efeitos da hipoteca... 104 3.17.8 Hipoteca de dívida futura ou condicionada... 104 3.17.9 Loteamento do imóvel dado em hipoteca ou sua constituição em condomínio edilício... 105 3.17.10 Hipoteca legal... 105 3.17.11 Hipoteca judiciária... 106 3.17.12 Hipoteca constituída no período suspeito da falência... 107 3.17.13 Execução da dívida... 107 3.17.14 Exoneração da hipoteca pelo abandono do imóvel... 107 3.17.15 Registro da hipoteca... 108 3.17.16 Extinção da hipoteca... 110 3.17.17 Hipoteca das vias férreas... 111 3.18 ANTICRESE... 111 http://professorhoffmann.wordpress.com 3

3.18.1 Conceito e caracterização... 111 3.18.2 Constituição e objeto... 112 3.18.3 Direitos e deveres... 112 3.18.4 Extinção... 114 http://professorhoffmann.wordpress.com 4

1. DIREITOS REAIS SOBRE COISAS ALHEIAS O direito real sobre coisa alheia significa que o proprietário sofre restrição ou perde alguns dos atributos relativos ao domínio. O direito real sobre coisa alheira causa uma redução das faculdades ou poderes normalmente conferidos ao proprietário. O domínio é o direito real mais completo; seu titular detém o jus utendi, o jus fruendi e o jus abutendi ou disponendi, podendo reivindicar o bem de quem quer que injustamente o possua. Disto decorre exatamente a possibilidade que ele faça com que alguns dos seus poderes passem a pertencer ao patrimônio de outrem, que terá, então, direito real sobre coisa alheia. Dentro dessa ideia o usufruto é direito real sobre coisa alheira, porque o usufrutuário usa o bem pessoalmente e recebe seus frutos. Assim, passa o titular do direito a sofrer uma restrição temporária em seus poderes, pois terceiro irá gozar e usar da coisa que lhe pertence, sem, contudo, a priori dela poder dispor. Os direitos reais sobre coisa alheia ou jus in re aliena são limitados por lei e só podem existir em função de norma jurídica em razão de ser um rol numerus clausus isto é, descrito pela lei. Estes são divididos em três espécies: 1ª. Direitos reais limitados de gozo ou fruição 2ª. Direitos reais de garantia (CC, 1.419 a 1.510), nos casos em que a coisa é dada em garantia pelo pagamento do débito 3ª. Direito real de aquisição a) enfiteuse (CC/16, 678 a 694 c/c CC/02, 2.038, 1º, I e II e 2º). b) superfície (CC, 1.225, II, 1.369 e 1.377). c) servidões prediais (CC, 1.225, II, 1.378 a 1.389). d) usufruto (CC, 1.225, IV, 1.390 a 1.411). e) uso (CC, 1.225, V, 1.412 e 1.413). f) habitação (CC, 1.225, VI, 1.414 a 1.416). a) penhor (CC, 1.225, VIII, 1.431 a 1.472) b) hipoteca (CC, 1.225, IX. 1.473 a 1.505) c) anticrese (CC, 1.225, X, 1.506 a 1.510) d) alienação fiduciária em garantia (Lei n. 4.278/65, art. 66; Dec.-lei nº. 911/69 e art. 4º da Lei n. 6.071/74; CC, 1.361 a 1.368) Compromisso ou promessa irretratável de compra e venda (CC, 1.417 e 1.418) http://professorhoffmann.wordpress.com 5

2. DIREITOS REAIS LIMITADOS DE GOZO E FRUIÇÃO 2.1 ENFITEUSE 2.1.1 Histórico Criação do direito romano, o primeiro esboço dela se descobre nos arrendamentos que de suas propriedades faziam aos particulares as cidades, os colégios de sacerdotes e as vestais 1. Temporários em princípio, ditos arrendamentos foram pouco a pouco se revestindo de um certo caráter de estabilidade. Nesse teor, veio afinal, a prevalecer o princípio de que os arrendatários não poderiam ser despejados do imóvel enquanto pagassem pontualmente a renda estipulada. A adoção daquele princípio converteu de fato os arrendamentos de temporários em perpétuos. Para proteger a posição jurídica que destarte se criou para os arrendatários, foi lhes dado uma ação real, conhecida como actio vectigalis. Mais tarde, os imperadores no intuito de atraírem cultivadores para as suas vastas propriedades, situadas na maior parte em regiões longínquas, tomaram o conselho de arrendá-las a longos prazos e ainda em perpétuo, por preços inferiores à taxa comum. Os particulares e as igrejas, que também possuíam grandes domínios nas mesmas condições, imitaram o exemplo. O direito, que por virtude destes arrendamentos se concedia aos arrendatários, adquiriu por fim o caráter de direito real. 1 Na Roma Antiga, eram designadas como virgens vestais («deusas do fogo») as assistentes da deusa romana Vesta. Estas mulheres gozavam de uma situação social respeitável na sociedade e deviam manter-se castas sob risco de sofrerem punições (inclusive mortais). Não podiam pisar no chão que não fosse o do seu templo, do Domus ou villa da sua família e de outras também patrícias, e das demais edificações governamentais e divinas, por isso eram transportadas em liteiras pela cidade, por escravos liteireiros. Todas as vestais obrigatoriamente teriam que ser patrícias, membras, portanto, da nobreza. Uma de suas obrigações era manter sempre acesa a chama sagrada do fogo do estado no Templo redondo no Fórum romano, sob a supervisão do Pontifex maximus. O fogo neste altar representava a origem da vida e se acreditava ter vindo de Tróia, não podendo apagar. Castigos mortais seriam aplicados se a obrigação não fosse devidamente cumprida, pois seriam enterradas vivas ou precipitadas do alto da Rocha Tarpéia, no monte Capitolino, em caso de transgressão. A partir de certa idade, tendo servido trinta anos, a mulher podia escolher entre continuar como virgem vestal ou libertar-se das obrigações. Essas mulheres eram muito consultadas, sobretudo em assuntos políticos, por terem instrução e situação econômica favorável. No Monte Palatino subsistem as ruínas da Casa das Virgens Vestais, ou Atrium Vestae, onde apenas mulheres podiam circular. No Império Romano, qualquer homem que fosse encontrado próximo da morada das virgens vestais era enforcado, e hoje o local é guardado apenas por guardas mulheres. http://professorhoffmann.wordpress.com 6

Os imóveis, da intenção com que eram feitos os arrendamentos, se ficaram chamando enfitêuticos (praedia emphyteutica), e o direito resultante, direito enfitêutico (jus emphyteuticum). Deste modo, Justiniano fundiu a actio vectigalis e o praedia emphyteutica num único instituto, surgindo à enfiteuse. No estado do direito romano, a enfiteuse consistia essencialmente no direito real de cultivar o campo alheio mediante uma pensão anual, e de aproveitá-lo tão amplamente como o faz o proprietário, sem, todavia, destruir-lhe a substância. Ao senhor do imóvel ficava como que a nua propriedade; ao enfiteuta, com a posse, passava o direito a todas as vantagens materiais do domínio. A enfiteuse, tal como o direito romano a organizara, era pura invenção econômica para melhor aproveitamento das grandes propriedades, era uma instituição simples, formada de elementos singelos e subordinada a regras claras. No Brasil por força de circunstâncias peculiares, nunca foi à enfiteuse uma instituição odiosa. A vastidão das propriedades e a escassez de população produziram aqui os mesmos resultados que em Roma no tempo dos imperadores. Para ter quem as cultivassem e aproveitasse cumpria fazer os emprazamentos com condições vantajosas para o enfiteuta, daí os prazos perpétuos e a modicidade das pensões. Atualmente, a enfiteuse conserva os mesmos caracteres da era romana, embora esteja em franca decadência, pois vários juristas a condenam e o novo Código Civil, no art. 2.038 2, proíbe-a, bem como a subenfiteuse, sob o argumento de ser inútil e de prejudicar a livre circulação de riquezas e, ainda, pela inconveniência de manter o enfiteuta e seus sucessores ligados, perpetuamente, ao senhorio direto. 2.1.2 Natureza jurídica É o mais amplo dos poderes do jus in re aliena 3, transferindo ao enfiteuta o jus abutendi (usar), fruendi (fruir) e até o disponendi (dispor), pois este pode alienar seus direitos sem que haja anuência do senhorio, podendo ainda reivindicar a coisa de quem quer que seja. 2 Art. 2.038. Fica proibida a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, subordinando-se as existentes, até sua extinção, às disposições do Código Civil anterior, Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916, e leis posteriores. 1 o Nos aforamentos a que se refere este artigo é defeso: I - cobrar laudêmio ou prestação análoga nas transmissões de bem aforado, sobre o valor das construções ou plantações; II - constituir subenfiteuse. 2 o A enfiteuse dos terrenos de marinha e acrescidos regula-se por lei especial. 3 Significa: Direito real sobre coisa alheia http://professorhoffmann.wordpress.com 7

2.1.3 Conceito Dá-se a enfiteuse, aforamento ou emprazamento, quando por ato entre vivos, ou de última vontade, o proprietário atribui a outrem o domínio útil do imóvel, pagando a pessoa, que o adquire, e assim se constitui enfiteuta, ao senhorio direto uma pensão, ou foro, anual, certo e invariável (Código Civil de 1916, art. 678). Acrescenta o art. 679 do Código Civil de 1916 4 que o contrato de enfiteuse é perpétuo. A enfiteuse por tempo limitado considera-se arrendamento, e como tal se rege. O proprietário é chamado de senhorio direto. O titular do direito real sobre coisa alheia é denominado enfiteuta e tem um poder muito amplo sobre a coisa, podendo usá-la e desfrutá-la do modo mais completo, bem como, aliená-la e transmiti-la por herança 5. São seus caracteres: a) presença de duas pessoas: a que tem o domínio do imóvel aforado (senhorio direto) e a que possui o bem de modo direto, tendo sobre ele uso, gozo e disposição (enfiteuta), desde que não afete sua substância. b) constitui um direito real imobiliário, isto só pode recair sobre bens imóveis alheios. c) não pode ser temporária, sendo essencialmente perpétua. d) contém obrigação do enfiteuta de pagar renda anual e invariável chamada foro, canon ou pensão. e) o senhorio tem direito de preferência 6 quando o enfiteuta pretender transferir a outrem o domínio útil 7. Se não exercer o direito de preferência, terá direito 4 O contrato de enfiteuse é perpétuo. A enfiteuse por tempo limitado considera-se arrendamento, e como tal se rege. 5 Art. 681. Os bens enfitêuticos transmitem-se por herança na mesma ordem estabelecida a respeito dos alodiais neste Código, arts. 1.603 a 1.619; mas, não podem ser divididos em glebas sem consentimento do senhorio. 6 Art. 683. O enfiteuta, ou foreiro, não pode vender nem dar em pagamento o domínio útil, sem prévio aviso ao senhorio direto, para que este exerça o direito de opção; e o senhorio direto tem 30 (trinta) dias para declarar, por escrito, datado e assinado, que quer a preferência na alienação, pelo mesmo preço e nas mesmas condições. Se, dentro no prazo indicado, não responder ou não oferecer o preço da alienação, poderá o foreiro efetuá-la com quem entender. 7 Art. 684. Compete igualmente ao foreiro o direito de preferência, no caso de querer o senhorio vender o domínio direto ou dá-lo em pagamento. Para este efeito, ficará o dito senhorio sujeito à mesma obrigação imposta, em semelhantes circunstâncias, ao foreiro. http://professorhoffmann.wordpress.com 8

ao laudêmio 8, que será de 2,5% do valor da venda do direito, se outro valor não foi estabelecido. Igual direito é assegurado ao enfiteuta. 2.1.4 Objeto Pelo art. 680 do Código Civil de 1916 9, a enfiteuse só pode ter por objeto coisa imóvel, limitando-se a terras não cultivadas e aos terrenos que se destinem à edificação. Inadmissível é a instituição sobre bens móveis, acessórios do solo, casas, prédios, glebas colonizadas ou cultivadas. 2.1.5 Constituição Conforme art. 678 do Código Civil de 1916, pode este ser constituído por ato inter vivos ou causa mortis. Quando realizado por ato inter vivos, imprescindível que se dê por meio de escritura pública (Código Civil, 108 e Lei nº. 7.104/83) e que seja devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis. Por causa mortis, pode ocorrer quando o testador transmite o domínio direto a um herdeiro e o domínio útil a outro, hipótese em que não é necessária a inscrição, já que a sucessão é um dos meios aquisitivos de direitos reais. 2.1.6 Extinção Pelo disposto no art. 692 do Código Civil de 1916, extingue-se a enfiteuse: I - pela natural deterioração do prédio aforado, quando chegue a não valer o capital correspondente ao foro e mais um quinto deste; II - pelo comisso, deixando o foreiro de pagar as pensões devidas, por 3 (três) anos consecutivos, caso em que o senhorio o indenizará das benfeitorias necessárias; III - falecendo o enfiteuta, sem herdeiros, salvo o direito dos credores. 2.1.7 Situação atual da enfiteuse A matéria é regulada pelo art. 2.038 do Código Civil que dispõe, atualmente ser proibida a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, subordinando-se as 8 Art. 686. Sempre que se realizar a transferência do domínio útil, por venda ou dação em pagamento, o senhorio direto, que não usar da opção, terá direito de receber do alienante o laudêmio, que será de 2,5% (dois e meio por cento) sobre o preço da alienação, se outro não se tiver fixado no título de aforamento. 9 Só podem ser objeto de enfiteuse terras não cultivadas ou terrenos que se destinem a edificação. http://professorhoffmann.wordpress.com 9

existentes, até sua extinção, às disposições do Código Civil anterior, Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916, e leis posteriores. Para tanto, esclarece no 1 o que nos aforamentos a que se refere este art. é defeso: I - cobrar laudêmio ou prestação análoga nas transmissões de bem aforado, sobre o valor das construções ou plantações; II - constituir subenfiteuse. Por sua vez, consigna no 2º que a enfiteuse dos terrenos de marinha e acrescidos regulase por lei especial. A seu respeito, comenta Pontes de Miranda: O Código Civil conserva a enfiteuse, que é um dos cânceres da economia nacional, fruto, em grande parte, de falsos títulos que, amparados pelos governos dóceis a exigências de poderosos, conseguiram incrustar-se nos registros de imóveis 10. 2.1.8 Estudo de caso: Desapropriação e registro da enfiteuse Para melhor compreensão do instituto, abaixo segue decisão proferida no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná onde se discutiu direito à indenização, decorrente de suposta enfiteuse, à vista de desapropriação indireta praticada pelo Município. Confira-se: APELAÇÃO CÍVEL. ALEGADA DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PLEITO INDENIZATÓRIO DEDUZIDO COM BASE NA ENFITEUSE. DOMÍNIO ÚTIL QUE NÃO RESTOU COMPROVADO. PROCESSO EXTINTO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, DIANTE DA ILEGITIMIDADE ATIVA "AD CAUSAM". SENTENÇA CORRETA. RECURSO DESPROVIDO. Para que o direito real da enfiteuse possa ser adquirido por ato inter vivos é imprescindível a formalização do seu título constitutivo mediante escritura pública, uma vez que sempre tem por objeto um bem imóvel, e que seja devidamente registrado no álbum imobiliário. (TJPR- 4ª C.Cível - AC 0377843-0 - Rio Negro - Rel.: Des. Adalberto Jorge Xisto Pereira - Unânime - J. 15.07.2008) 11 Consta das razões do voto do Relator Xisto Pereira: (...) Ocorre que, quanto ao seu modo de aquisição, segundo a lição de Orlando Gomes, "A enfiteuse só se adquire por um desses modos: a transcrição, a usucapião e a sucessão hereditária. Mas o título constitutivo pode ser: o contrato, o testamento ou a sentença judicial (...). O contrato não origina, por si só, o direito real de enfiteuse. Para se constituir por ato inter vivos, é indispensável, em nosso sistema jurídico, que esse título seja devidamente transcrito no 10 Tratado de direito privado. 3ª edição v. 18. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971, pág. 179. 11 http://www.tj.pr.gov.br/portal/judwin/consultas/jurisprudencia/visualizaacordao.asp?processo=377 843000&Fase=&Cod=794720&Linha=26&Texto=Acórdão http://professorhoffmann.wordpress.com 10

Registro Imobiliário" (obra citada, pág. 308, grifos nossos). A enfiteuse, no caso dos autos, foi instituída por ato inter vivos em favor dos antecessores dos apelantes pelo Município de Rio Negro, do qual era Distrito o atual Município de Piên, ora apelado (fl. 21). Mas conforme informaram os próprios apelantes, a "carta de foro" não foi levada a registro perante o Registrador Imobiliário, de modo que o contrato colacionado aos autos e ao qual se apegam para reivindicar a indenização a título de proprietários das áreas ditas esbulhadas é, no dizer de Orlando Gomes, um negócio jurídico que "de per si não é idôneo para operar a aquisição do domínio", pois "para que o direito real da enfiteuse possa ser adquirido por ato inter vivos, é imprescindível que esse título constitutivo seja feito por escritura pública, uma vez que sempre tem por objeto imóvel (Código Civil, art. 108, Lei n. 7.104/83) e que, conforme o art. 1.227 do Código Civil, seja devidamente registrado no Cartório de Imóveis competente (Lei n. 6.015/73, art. 167, I, n. 10)" (obra citada, pág. 327). Destarte, correta a sentença recorrida porque não restou demonstrada a aquisição, pelos apelantes, do domínio útil das áreas indicadas na inicial. (...) Elucidativo é o presente acórdão ao demonstrar da imprescindibilidade de se levar a registro a enfiteuse para fins de validade contra terceiros. No caso, a ausência do registro repercutiu na seara da indenização por desapropriação. http://professorhoffmann.wordpress.com 11