EDUCAÇÃO DO CAMPO NO SEMIÁRIDO MINEIRO: A ARTICULAÇÃO ENTRE MOVIMENTOS SOCIAIS, UNIVERSIDADEE ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL RESUMO 142 Magda Martins Macêdo Aneuzimira Caldeira Souza 143 Este texto tem como proposta refletir sobre algumas experiências e práticas educacionais desenvolvidas no território do Semiárido Mineiro. Ações que tem refletido o compromisso e a coragem dos povos deste territóri o em denunciar situações de mazelas sociais e ausência depolíticas públicas comprometidas com o desenvolvimento regional pautado no diálogo e respeito as manifestações culturais dos povos tradicionais. Mas, ao mesmo, discutem, articulam e se movimentam na busca de soluções e alternativas para os problemas enfrentad os. Palavras-chaves: Educação do Campo; Universidade; Movimentos Sociais ; ONG s; Articulação Regional. Introdução 144 O Semiárido Mineiro compreende as regiões do Norte de Minas e Vale do Jequitinhonha, onde vivem mais de 3,5 milhões de pe ssoas. Os principais rios são o Rio São Francisco, o Rio Jequitinhonha e o Rio Pard o. A região é caracterizada, principalmente, pela distribuição irregular de chuv as durante o ano. Com enorme biodiversidade, o Semiárido Mineiro abriga os biomas Caatinga, Cerrado e parte da Mata Atlântica, o que garante uma rica flora e faun a nativa, que é também retratada com alegria na cultura de seu povo. Historicamente, essa grande riqueza é agredida por políticas de desenvolvimento degradantes, baseadas na concentração de terra, água e renda. Isso tem provocado degradação ambiental e exclusão social de milhares de famílias agricultoras da região. 142 Mestre em Desenvolvimento Social/PPGDS-Unimontes. Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES). magdamartinsm@yahoo.com.br. 143 Mestre em Educação/FAE-UFV. Rede Estadual de Ensino /MG e professora das Séries iniciais da Secretaria Municipal de Educação de Bocaiúva/MG. an euzimira@hotmail.com 144 http://asaminas.blogspot.com.br/p/semiarido-mineiro.html. Acesso em 15/03/2014
No que diz respeito à Educação, essa não tem se com prometido junto aos professores do campo, educandos, povos e comunidades com a reflexão crítica dos problemas do Semiárido Mineiro, onde tem permanecido uma lógica de políticas emergenciais e compensatórias, sendo ainda essa reg ião identificada como lugar de pessoas pobres, rudes e sem cultura. Esse modelo de educação escolar não tem construído uma relação dialógica entre seu trabalho pedagógico e o rico contexto social, étnico, produtivo e cultural regional. Por outro lado, as comunidades regionais do campo têm demandado o cumprimento de seus direitos como o direito a terra e ao crédito fundiário, direito à expressão cultural das suas tradições e acesso aos bens culturais, direito aos conhecimentos da medicina tradicional e à saúde moderna, direito aos conhecimentos tradicionais e a uma educação escolar para todos, contextualizada e de q ualidade. Uma educação que reflita a diversidade e a liberdad e responsável do compromisso com o bem estar de seus povos e comunidades tradicionais. Dessa forma, nas duas últimas décadas, a partir de 1980, e mais efetivamente a partir da última década de 1990 e 2000, tem se intensificado a luta dos movimentos sociais e comunidades do campo do Semiárido Mineiro por um projeto de educação renovador, chamado de educação contextualizada,educação étnica, Educação do Campo. O projeto de Educação do Campo consubstancia um pro jeto de sociedade das classes sociais populares, em que a tônica da refor ma agrária permeia as relações sociais dos camponeses. Vale ressaltar Ribeiro (2010, p. 198), que, ao associar a reforma agrária à educação e ao desafio da transformação so cial pelo sujeito histórico, comenta o seguinte: Esse desafio coloca tarefas essenciais como a conquista da terra sob novas relações de produção de vida, do conhecimento, da c formação humana radicada nessas relações. Nesse vi iência e da arte, associada a uma és, entendemos que a classe dos trabalhadores do campo, organizada, se propõe a ocu par não só as terras que lhe são de 145 direito, mas também o latifúndio do saber, contrariando situações adversas.caldart (2004, p.14) salienta que: omovimento inicial da Educação do Campo foi o de um a articulação política de organizações e entidades pa ra denúncia e luta por políticas públicas de educação no e do cam po, e para 145 Ver Aranha, Antônia Vitória Soares. In: Rocha, Mar ia Isabel Antunes (2009), p.12. Comentando o grito empostado pelos alunos da turma de 2006 do Curso Pedagogia da Terra, da Faculdade de Educação da UFMG.
mobilização popular em torno de um outro projeto de desenvolvimento. Ao mesmo tempo tem sido um movimento de reflexão pedagógica das experiências de resistênciacamponesa. Dentre as estratégias regionais para propiciar o debate sobre Educação do Campoe o fortalecimento do movimento social regional estãoa realização de seminários, visitas de intercâmbio, cursos de nível médio e superior para educadores agricultores familiares - sejam assentados, sem-terra, quilombolas, indígenas, geraizeiros, pescadores, garimpeiros, vazanteiros, catingueiros. No ano de 2012, com o intuito de dar continuidade à s reflexões e ações de fortalecimento da luta regional, foi realizado o I Seminário Educação e Ruralidades, em Montes Claros, no espaço da Universidade Estadual d e Montes Claros (UNIMONTES). Esse evento foi realizado pela Articulação Por uma Educação do Campo no Semiárido Mineiro, composta pelas organizações não governamen tais Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (CAA/NM), Centro de Agricultura Alternativa Vicente Nica (CAV-Turmalina), Projeto MOVA Brasil - Minas Gerais/Instituto Paulo Freire, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)/ Regional Norte de Minas, Mandato Popular e Participativo do Deputado Federal Padre João, PRONERA/Unimontes, além de contar com o apoio de professores da Unimontes, e com os parceiros dos componentes da Articulação. Esta Articulação seconstitui num espaço movimentos sociais do campo, instituições de ensino secretarias de educação e outras instituições e org lutam pela Educação Contextualizada e do Campo que partilhado e compartilhado pelos superior, escolas do campo, anizações do campo, que em parceria esteja comprometida e que desenvolvam práticas pedagógicas que proponham a convivência pacífica com o Semiárido Mineiro, que aprofunde e amplie a discussão sobre a Educação do Campo e a relação dialógica que ela propõe com a Diversidade Cultural do Semiárido Mineiro. Nessa perspectiva, a Articulação entende o campo co mo espaço de vida digna, com necessidades de políticas públicas e projeto educativo peculiar ao modo de vida campesino, sendo esta concepção de educação respald ada na forma da lei na conferência da e nas Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo, no Parecer Nº36/2001, na Resolução 1/2002 d o Conselho Nacional de Educação, estes documentos constituíram importantes conquistas no âmbito das políticas públicas.
Como proposta metodológica, todo o evento primou pe la intenção de dar voz aos povos e comunidades presentes. As mesas foram ocupadas pelos sujeitos dos processos que relataram suas vivências, seus processos de luta e de agonia, mas também de esperança, e numa relação dialógica com os pesquisa dores e professores presentes foram trocados saberes e possibilidades coletivizadas. A apresentação das experiências educacionais regionais as EFA s, a Escola Xakriabá, a Escola do MST, a Escola Rural Geraizeira,a Cisterna na Escola (ASA Minas), contou com tempo e espaço privilegiados de debate e troca de informações e conhecimento, in tencionalizadas como espaço de fortalecimento da Articulação e das lutas locais. Financeiramente e estruturalmente, o evento só foi possível de realização devido a força dos sindicatos, dos movimentos sociais e do movimento de parceria entre as organizações não governamentais e a universidade. Todo o evento foi registrado em gravação para futura edição de material áudio visua l para que seja utilizado em momentos e locais estratégicos para a luta da Educação do Campo no Semiárido Mineiro. Considerações Finais Denunciar as práticas e políticas adotadas pelos governos liberais tem sido uma tarefa nada fácil para os movimentos sociais do campo. Paulo Freire (2000, p.28) salienta que a mudança do mundo implica a dialetiz ação entre a denúncia da situação desumanizante e o anúncio da sua superação.pode-se dizer, então, que a intenção do evento em muito dialoga com o pensamento freiriano. Ou seja, pautados na indignação e na esperança,foi um convite à prática da denúncia, da manifestação das indignações dos povos e comunidades do Semiárido Mineiro, mas,ao mesmo tempo, prenhes de esperança e movidos pelaconvicção de que se é possí vel tecer as mudanças das práticas educacionais e de que um novo projeto de Educação do Campo no Semiárido Mineiro seja construído. Por fim, acredita-se que essas iniciativas têm conseguindo aprofundar o debate e apontar com mais clareza quais são os desafios a se rem vencidos por uma educação genuinamente do campo. Referências
CALDART, R. Elementos para Construção do Projeto Po lítico Pedagógicoda Educação do Campo. In: MOLINA, M.C.; JEUS, S.M. S.A. (org.) Contribuições para a Construção de um Projeto de Educação do Campo. Brasília, DF: Articulação Nacional Por Uma Educação do Campo, 2004. FREIRE, P. Pedagogia da Indignação cartas pedagógicas e outr os escritos. São Paulo: UNESP, 2000. MACÊDO, Magda Martins. Escola Rural Geraizeira: os Geraizeiros da Tapera e sua Luta por uma Educação do Campo no Norte de Minas. Montes Claros. Unimontes, 2009. (Dissertação de Mestrado). RIBEIRO, M. Movimento Camponês, Trabalho e Educação: Liberdade, autonomia, emancipação. São Paulo: Expressão Popular, 2010. ROCHA, Maria Isabel Antunes; MARTINS, Aracy Alves. Educação do Campo: desafios para a formação de professores. Belo Horizonte: Autentica, 2009.