A BIOMASSA COMO SOLUÇÃO ENERGÉTICA PARA O ESTADO DO AMAZONAS



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A BIOMASSA COMO SOLUÇÃO ENERGÉTICA PARA O ESTADO DO AMAZONAS Rubem Souza 1, Alessandro Trindade 2 1 Centro de Desenvolvimento Energético Amazônico CDEAM da Universidade Federal do Amazonas. Av. Gal. Rodrigo Otávio, 3000, Campus Universitário, Manaus-AM 2 Instituto Energia e Desenvolvimento Sustentável INEDES. Rua Belo Horizonte, 1320, sala 202, Manaus-AM (rubem.cesar@pq.cnpq.br) Resumo O número de unidades consumidoras supridas eletricamente no interior do Estado do Amazonas cresceu significativamente em face do Programa Luz para Todos. Entretanto, ainda persiste um grande contingente populacional sem acesso à energia elétrica, além dos resultados de geração de emprego e renda terem sido pífios diante do número de consumidores atendidos. Nesse trabalho são apresentadas possibilidades do uso da biomassa para fins energéticos no Estado do Amazonas, como caminho factível para contribuir significativamente para a universalização do serviço de energia elétrica, para a redução das emissões de gases de efeito estufa e para a geração de emprego e renda. O cenário do setor elétrico estadual é descrito com ênfase em indicadores importantes, tais como o consumo de eletricidade, as emissões de gases de efeito estufa e as perdas elétricas. Os fatores que inibem a difusão das tecnologias de energias renováveis no Amazonas são apontados e discutidos de sorte a estabelecer o cenário contemporâneo. Com a perspectiva de apontar soluções para transformação do cenário energético local, com base no uso energético de biomassa, são apresentadas algumas ações recentes desenvolvidas pelo Centro de Desenvolvimento Energético Amazônico CDEAM da Universidade Federal do Amazonas e pelo Instituto Energia e Desenvolvimento Sustentável INEDES. Palavras-chave: biomassa, Amazonas, universalização. Abstract The number of consumer units that are served electrically at the Amazonas state grew significantly in the face of the LPT (Luz para Todos Lighting for All) program which was established by the Brazil Federal Government in 2008. However, there remains large number of people without access to electricity, and the results of employment and income remains so

small. This work presents possibilities of using biomass for energy purposes in the State of Amazonas, as a feasible way to contribute significantly to the universal electric service for reducing emissions of greenhouse gases and the generation of employment and income. The scenario of the Amazon state electricity sector is described with emphasis on key indicators such as electricity consumption, emissions of greenhouse gases and the electrical losses. Factors that inhibit the diffusion of renewable energy technologies in the Amazon are pointed out and discussed in order to establish the contemporary scene. With the aim of indicate solutions for changing the local energy scenario, based on the use of biomass, this paper presents some recent actions taken by the Amazon Energy Development Centre - CDEAM at Federal University of Amazonas and the Institute for Energy and Sustainable Development - INEDES. Keywords: biomass, Amazonas, universalization. 1. INTRODUÇÃO O estado do Amazonas possui área de 1.559.159,148 km 2, com 62 municípios abrigando uma população estimada para 2015, pelo IBGE (2015), de 3.938.336 habitantes. Aproximadamente 50% da população está concentrada na cidade de Manaus, capital do estado do Amazonas. A baixa densidade demográfica, a dificuldade de logística e o regime hidrológico da região, se apresentam como barreiras de difícil superação quando se trata de universalizar o serviço de energia elétrica no estado. Por outro lado, o Amazonas é detentor de toda a produção de petróleo e gás natural da região Norte do Brasil, detêm recursos hídricos capazes de contribuir para a oferta de energia para outras regiões, possui uma riqueza diversificada de recursos de biomassa, além de contar com níveis de insolação que, embora sejam bastante inferiores aos verificados em regiões litorâneas do Brasil, são superiores aos disponíveis na Alemanha. Explorar tais recursos assegurando o acesso a cidadania e ao desenvolvimento econômico com a segurança ambiental, são os motivadores para este trabalho.

2. CENÁRIO DO SETOR ELÉTRICO NO ESTADO DO AMAZONAS O suprimento elétrico do Estado do Amazonas é levado a efeito via dois sistemas. O Sistema Capital e o Sistema Interior, com características bem díspares. A empresa Amazonas Distribuidora de Energia S/A AmE, pertencente ao grupo Eletrobras, é responsável por toda a distribuição de energia elétrica no estado e pela geração no interior. De forma a atender a legislação vigente, tendo em vista a interligação do Sistema Capital ao SIN - Sistema Interligado Nacional, foi criada em julho de 2013 a empresa Amazonas Geração e Transmissão de Energia S.A - AMAZONAS GT, a qual é responsável pela hidrelétrica de Balbina e pelas usinas termelétricas que pertenciam a AmE. A seguir apresenta-se algumas características dos dois sistemas. 2.1 Sistema Capital O Sistema Capital é responsável pelo suprimento elétrico da cidade de Manaus e dos municípios de Iranduba, Presidente Figueiredo e Rio Preto da Eva. A oferta de energia elétrica desse sistema é assegurada pela hidroelétrica de Balbina, termelétricas da empresa Amazonas GT e termelétricas pertencentes a Produtores Independentes de Energia PIE s. Soma-se a estas a energia recebida do SIN Sistema Interligado Nacional via a LT - linha de transmissão Tucuruí-Macapá-Manaus. Embora as obras para construção da LT Tucuruí-Macapá-Manaus tenham sido concluídas no ano de 2013, somente em 5 de maio de 2015, via o Despacho no. 1.365, a ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica atestou a conclusão das obras pertinentes a distribuição de energia, de responsabilidade da AmE, configurando a plena interligação do Sistema Capital ao SIN. No ano de 2014, esse sistema foi responsável pela geração de 8.845,8 GWh para atendimento de 506.169 unidades consumidoras. No ano de 2014, as três classes de maior consumo no Sistema Capital foram a industrial (33,68%), residencial (28,2%) e comercial (22,17%), A classe rural foi responsável por apenas 0,24% da energia total consumida. As perdas de energia na distribuição foram da ordem de 37,5% no ano de 2014, contribuindo significativamente para estas o desvio de energia e a inadimplência. As termelétricas são movidas a óleo combustível e a gás natural.

GEE (GgCO2e) AGRENER GD 2015 O Sistema Capital foi responsável, no ano de 2013, pela emissão de 3.582 GgCO2e, representando um crescimento de somente 7% com relação ao ano de 2004. Na Figura 1, tem-se o comportamento das emissões de GEE no período de 2004 a 2013. Esse comportamento deve-se a substituição de termelétricas a óleo diesel e óleo combustível, por termelétricas a gás natural a partir do ano de 2010, e a entrada no sistema da energia do SIN a partir do ano de 2013. 4.955 3.356 3.259 3.096 3.423 3.250 3.621 4.002 3.623 3.295 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 Figura 1. Evolução das emissões de GEE no Sistema Manaus 2004 a 2013. 2.2 Sistema Interior O Sistema Interior é constituído por 107 sistemas elétricos isolados dotados de usinas termelétricas a óleo diesel. Descola desse cenário uma única termelétrica a lenha localizada no município de Itacoatiara-AM com potência instalada de 9 MW. A diferença entre a potência instalada e a potência efetiva é da ordem de 24%, o que se explica pelo fato das máquinas apresentarem um quadro precário de conservação, estando várias delas com a vida útil ultrapassada. No ano de 2014, o sistema produziu 1.731,57 GWh para atendimento de 354.578 unidades consumidoras. Para tal foi consumido 393.634 m 3 de óleo diesel. As três classes de maior consumo, no ano de 2014, no Sistema Interior, foram a residencial (48,17%), a comercial (15,47%) e a industrial (6,7%). A classe rural foi responsável por somente 5,64% da energia total consumida. Verifica-se que há uma distribuição muito irregular entre as principais classes consumidoras com forte concentração do consumo na classe residencial, sinalizando o baixo nível de desenvolvimento econômico no interior do estado.

Emissões de GEE (GgCO2e) AGRENER GD 2015 As perdas de energia na distribuição foram da ordem de 30,1% no ano de 2014, decorrentes em grande parte do desvio de energia e da inadimplência, a exemplo do que ocorre no Sistema Capital. O Programa Luz para Todos, iniciado no ano de 2004, certamente que contribuiu para o crescimento do consumo de energia elétrica. Na classe rural, o consumo de eletricidade cresceu 771%, no período de 2004 a 2013, enquanto o consumo de óleo diesel, em todo o Sistema Interior, se elevou de 103,24%, no mesmo período. Por sua vez as emissões de GEE no Sistema Interior, no período de 2004 a 2014, cresceram 234%, como pode ser observado na Figura 2. 968 980 481 526 558 608 642 714 777 835 863 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 Figura 2. Evolução das emissões de GEE no Sistema Interior 2004 a 2014. O crescimento das emissões se explica pelo fato dos atendimentos terem sido levados a efeito via geração a diesel exclusivamente. É mister registrar que, projetos pilotos foram desenvolvidos com geração fotovoltaica, porém, tal solução não evoluiu como estratégia de expansão do sistema elétrico estadual. Em que pese o avanço no consumo de energia elétrica, o estado do Amazonas ainda possui um número expressivo de comunidades totalmente desassistidas eletricamente e onde o suprimento é levado a efeito, o serviço apresenta baixa qualidade. 3. FATORES QUE INIBEM A DIFUSÃO DE TECNOLOGIAS DE ENERGIA RENOVÁVEIS NO ESTADO DO AMAZONAS Em que pese a grande diversidade de recursos energéticos renováveis existentes na região, a participação destes na oferta de eletricidade para a área rural é praticamente nula.

O subsídio para a geração de eletricidade com derivados de petróleo, via a CCC Conta de Consumo de Combustível, associado ao subsídio para o transporte de derivados de petróleo para o mesmo fim, foram fatores que historicamente comprometeram a competitividade de soluções tecnológicas pautadas nos recursos renováveis locais. Muito embora exista o subsídio, via sub-rogação da CCC, para empreendimentos com TER s - Tecnologias de Energias Renováveis, a falta de inventário sobre as potencialidades energéticas locais de base renovável, a inexistência da perfeita definição do mercado a ser atendido, associado a baixa atratividade dos mesmos; se apresentam como fatores que elevam o risco e inibem a entrada do capital privado na exploração dos recursos renováveis. O capital privado tem se apresentado, no interior do estado, associado exclusivamente na locação de unidades geradoras a diesel para a concessionária, registrando-se um único caso de usina que faz uso de recurso energético renovável. Os empreendimentos realizados no estado do Amazonas para a exploração de recursos hídricos, via Pequenas Centrais Hidrelétricas, quase que exclusivamente foram levados a efeito pelo exército brasileiro, objetivando o atendimento de suas instalações. Deve-se registrar que também há um empreendimento com capital privado, porém, para uso próprio em atividade de mineração. É mister registrar que tais PCH s, a menos da utilizada na atividade de mineração, estão inoperantes e o exército vem despendendo, há alguns anos, grande esforço para transferir as usinas para a concessionária local sem sucesso. A falta de massa crítica qualificada no quadro funcional da concessionária, para identificação de potencialidades energéticas renováveis, bem como, para a elaboração de projetos com fontes renováveis de energia; também ajudam a explicar o cenário atual do parque gerador estadual. O poder público local, após o processo de federalização da concessionária estadual, responsável pela geração e distribuição de energia elétrica no interior do estado, adotou a postura de expectador das ações concebidas e implementadas pelo poder central. Tal postura faz com que as demandas locais não sejam contempladas no planejamento da expansão do parque gerador, e ainda que, as soluções energéticas locais não sejam contempladas com políticas adequadas. Embora o agente regulador nacional do setor elétrico tenha procurado estimular a difusão das TER s, tais ações tem servido para demonstrar que somente a regulamentação é insuficiente para assegurar a penetração das mesmas no estado do Amazonas.

A ANEEL regulamentou os denominados Microssistema Isolado de Geração e Distribuição de Energia Elétrica MIGDI e o Sistema Individual de Geração de Energia Elétrica com Fonte Intermitente SIGFI, via a Resolução Normativa no. 493, de 5 de junho de 2012, para viabilizar a difusão das TER s. No entanto, até a presente data, somente um projeto foi desenvolvido no estado do Amazonas. Registre-se que esse projeto foi levado a efeito por uma organização não governamental, como forma de divulgar o conceito de sustentabilidade ambiental associado a esse tipo de empreendimento. Credita-se esse resultado a falta de viabilidade econômica para tais projetos, requerendo a ação de outros agentes para viabilizá-los. É oportuno registrar que a ANEEL, via a nova regulamentação dos programas de eficiência energética, possibilitou a implementação de projetos com TER s. Em que pese essa prerrogativa, na primeira Chamada Pública realizada pelas empresas do grupo Eletrobras, esse tipo de projeto não foi contemplado. Caso as concessionárias não demandem projetos dessa natureza, inócua terá sido a ação da ANEEL. 4. OPORTUNIDADES PARA USO DE BIOMASSA PARA FINS ENERGÉTICOS Inúmeros foram os projetos desenvolvidos por diferentes entidades educacionais e científicas relacionados com a temática das fontes renováveis de energia no contexto amazônico brasileiro, em geral, e no estado do Amazonas em particular. Dentre esta miríade de experiências, são apresentadas neste trabalho, algumas ações recentes levadas a efeito pelo Centro de Desenvolvimento Energético Amazônico CDEAM da Universidade Federal do Amazonas UFAM e pelo Instituto Energia e Desenvolvimento Sustentável INEDES, que acredita-se sejam portadoras de potencial transformador do cenário energético estadual. 4.1 Gaseificação de biomassa agroindustrial Existem dezenas de agroindústrias instaladas no interior do estado do Amazonas, gerando resíduos tais como: casca de cupuaçu; casca e ouriço de Castanha-do-Brasil; caroço de açaí e outros.

Tais empreendimentos se localizam na sede dos municípios e padecem dos problemas provocados pela precariedade no suprimento elétrico local. De modo a minimizar os danos provocados pela má qualidade de energia elétrica, as instalações são dotadas de grupos geradores a diesel, onerando sobremaneira o produto final. Além disso, há que se ressaltar que a grande quantidade de material residual produzido é deixada ao tempo para sua degradação natural. Ocorre, entretanto, que vetores de doenças são atraídos para essas áreas colocando em risco a saúde da população. A partir da experiência em diversos projetos, tanto o Instituto Energia e Desenvolvimento Sustentável INEDES, quanto o Centro de Desenvolvimento Energético Amazônico CDEAM da Universidade Federal do Amazonas, adquiriram capacidade técnica para projetar sistemas de gaseificação de biomassa in natura, capazes de assegurar o uso energético para os resíduos mencionados. A implantação de tais sistemas contribuiria tanto na solução da problemática energética, com possível injeção de energia elétrica excedente na rede da concessionária, quanto na eliminação do problema ambiental associado a saúde pública e ainda, reduziria os custos de produção aumentando a competitividade do produto final, e assim, assegurando a manutenção de emprego e renda. 4.2 Geração de eletricidade com etanol de mandioca O INEDES juntamente com o CDEAM, desenvolveram o projeto de P&D intitulado Geração de Energia Elétrica com etanol de mandioca no Amazonas, sob os auspícios da Eletrobras Amazonas Distribuidora de Energia Elétrica S/A, regulado pela ANEEL. De acordo com Souza et al. (2013) dentre os vários resultados desse projeto é pertinente destacar os que seguem: A matéria-prima utilizada foi a mandioca que é nativa da região amazônica; Houve a identificação de cultivar de mandioca com produtividade de um ciclo da ordem de 25 ton/ha, enquanto a média na Amazônia é de 10 ton/ha; A produtividade de etanol a frio obtida no projeto foi da ordem de 135 litros/ton, havendo margem para melhoria significativa na mesma; Verificou-se a inexistência de barreiras legais, seja do ponto de vista energético seja ambiental, para produção de etanol e geração de eletricidade com esse insumo na

Amazônia. Essa situação difere da cana-de-açúcar cuja ampliação da área plantada na Amazônia está proibida por determinação federal; Constatou-se a oferta de grupos geradores a etanol de dezenas a centenas de kw no mercado nacional e internacional; O consumo específico de moto geradores a etanol de 250 kw testados no projeto foi de 0,5 l/kwh; Nos vários cenários de simulação o maior custo da geração obtido foi de R$ 2.182,00/MWh; considerando que não haveria sub-rogação da CCC, o consumo específico seria de 0,6 l/kwh e, ainda que não seria auferida a redução de custos pelo aumento de escala de produção. Conforme a ANEEL (2014), o custo de geração, para fins de reembolso da CCC, para tecnologia solar fotovoltaica é de R$ 2.900,00/MWh, portanto, 33% maior que o valor obtido para a geração a etanol no pior cenário de custos; A produção de etanol descentralizada em unidades instaladas estrategicamente no interior do estado, reduziria os custos de transporte de combustíveis, evitaria o desabastecimento no período de vazante dos rios e ainda, asseguraria a geração de emprego e renda no campo; Verificou-se ainda que o plantio de mandioca pode ser feito em áreas antropizadas ou não, em áreas de várzea e terra firme, e ainda, de forma consorciada com outras culturas. Em 2014 ocorreu a inauguração da primeira indústria de calcário dolomítico (agrícola) no estado do Amazonas, contando com incentivos fiscais por parte do governo estadual para redução do custo para o agricultor. Considerando ser este insumo fortemente impactante no custo de produção agrícola, esse fato depõe a favor da mandioca como solução energética. 4.3 Elaboração de projeto de lei de política energética estadual Sob os auspícios da WWF - Wild Animal Health Fund e da SDS - Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Amazonas, o INEDES e o CDEAM, desenvolveram no presente ano os seguintes documentos: Balanço Energético do Estado do Amazonas para o ano de 2013. Essa publicação é pioneira;

Matriz Energética do Estado do Amazonas para o período 2015 2020. Documento este produzido pela primeira vez no estado; Proposta de lei de política energética estadual. Essa proposta procura contemplar os anseios dos diversos setores da sociedade amazonense, representados no Conselho Estadual de Energia. O projeto contempla, dentre outras ações, a constituição de programas para estimular as fontes renováveis de energia; a ampliação do uso do gás natural e a disseminação de ações de eficiência energética. Esses documentos serão apresentados e discutidos com várias entidades locais, quando então pretende-se que sejam definidos os próximos passos para levar a efeito a proposta de projeto de lei nas instâncias competentes. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os elementos apresentados neste trabalho não deixam dúvidas quanto a possibilidade real de transformação do cenário energético estadual. As ações desenvolvidas e em curso, possibilitam a condução do estado para uma realidade na qual a biomassa em particular, e as outras fontes de energia renováveis em geral, sejam uma realidade. Cenário no qual a energia cumpra seu papel de insumo para o desenvolvimento local, impulsionando a geração de emprego e renda e contribuindo para a inclusão social. Entende-se que não há barreiras tecnológicas, o que se faz necessário são políticas públicas, em nível local e nacional, comprometidas com o desenvolvimento regional em bases sustentáveis. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANEEL AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. Nota Técnica n o 55/2014 SRG/ANEEL,de 03 setembro de 2014, Brasília-DF. IBGE Cidades. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/estadosat/perfil.php?sigla=am> Acesso em 28 de setembro de 2015. SOUZA, R.C.S; SOUZA, F.C.R., BACELLAR, A.A., SARDINHA, M.D. Relatório Final do Projeto Geração de energia elétrica com etanol de mandioca no Amazonas, 2013. Manaus- AM.