ASPECTOS COMPARATIVOS ENTRE CARNES SEGUNDO A COMPOSIÇÃO DE ÁCIDOS GRAXOS E TEOR DE COLESTEROL



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ASPECTOS COMPARATIVOS ENTRE CARNES SEGUNDO A COMPOSIÇÃO DE ÁCIDOS GRAXOS E TEOR DE COLESTEROL Neura Bragagnolo Dra em Ciência de Alimentos. Departamento de Ciência de Alimentos Faculdade de Engenharia de Alimentos, Universidade Estadual de Campinas C. P. 6121. 13083-970, Campinas, SP, Brasil, neura@fea.unicamp.br, fax: 0 55 19 7887890. 1 Introdução A relação entre dieta e saúde está cada vez mais evidente nos trabalhos realizados sobre o assunto. Com isso, hoje em dia os consumidores têm se mostrado mais preocupados e interessados em saber o que realmente estão consumindo. Criadores de animais, conscientes deste interesse, têm tentado através modificações de dietas fornecidas aos animais e melhoramento genético, oferecer à população carnes que proporcionam dietas mais saudáveis. Carnes são constituídas, em geral, por 60 a 80% de água e 15 a 25% de proteína, sendo o restante formado principalmente por gorduras, sais, pigmentos e vitaminas. Carnes são alimentos preferidos pela maioria dos consumidores, no entanto, são apontados como alimentos com alto teor de colesterol, gordura e ácidos graxos saturados e baixos níveis de ácidos graxos insaturados. A doença cardiovascular é a principal causa de morte no Brasil e em muitos países. A incidência desta doença tem sido relacionada com os altos níveis de colesterol sanguíneo (Keys, 1970, Mattson et al., 1972, Kato et al., 1979, Stamler et al., 1986). Para mantê-lo em baixos níveis a American Heart Association (2001) recomenda uma dieta equilibrada, com baixo teor de lipídios, colesterol e ácidos graxos saturados e maior taxa de ácidos graxos monoinsaturados e poliinsaturados. O colesterol é uma substância pertencente ao grupo dos lipídios, presente predominantemente no reino animal. Desempenha funções importantes no organismo humano, sendo constituinte normal de todas as células do corpo, chave intermediária na produção de ácidos biliares, precursor de hormônios e participa da síntese da vitamina D 3. A maior parte do colesterol do organismo humano, aproximadamente 70%, é proveniente da síntese biológica (colesterol endógeno), sendo que apenas 30% é fornecido pela dieta (colesterol exógeno). Os ácidos graxos saturados são considerados hipercolesterolêmicos e os mais preocupantes, neste sentido, são mirístico (C14:0), láurico (C12:0) e palmitico (C16:0). O ácido esteárico (C18:0) tem função neutra, uma vez que no organismo se transforma imediatamente em ácido oléico (C18:1) (Sinclair, 1993). Os ácidos graxos saturados aumentam o nível de colesterol sanguíneo por reduzirem a atividade do receptor LDL-colesterol e reduzirem o espaço livre de LDL na corrente sanguínea (Grundy e Denke, 1990). Dos ácidos graxos insaturados, merecem atenção os ácidos graxos trans oriundos do processamento e da hidrogenação dos óleos e gorduras. São 393

considerados mais aterogênicos que os saturados, pois além de aumentarem o nível de LDL, diminuem o nível de HDL (Lambertson, 1992). Já os ácidos graxos poliinsaturados naturalmente cis são benéficos uma vez reduzem agregações das plaquetas e os triacilgliceróis e, consequentemente, o risco de doenças cardíacas (Kinsella et al., 1990). Desta forma, estudos que investigam os fatores influentes nestes constituintes nos animais são importantes para oferecer a população carnes de baixo teor de gordura saturada e colesterol. 2 Métodos analíticos para determinação de colesterol A análise de alimentos é dispendiosa e complicada, e os métodos variam largamente em custo, exatidão, precisão e complexidade. A validação e revalidação de métodos analíticos são necessários para se obter dados confiáveis. Numerosos métodos têm sido desenvolvidos ao longo de muitos anos para a determinação de colesterol em alimentos no sentido de se buscar dados precisos e exatos. Os principais métodos analíticos para análise de colesterol podem ser divididos em três grupos: colorimétricos, enzimáticos e cromatográficos. Dos três métodos, o procedimento colorimétrico é o mais barato e tem sido o mais utilizado na determinação de colesterol em carnes (Kritchevsky e Tepper, 1961, Tu at al., 1967, Swize at al., 1992, Prusa e Hughes, 1986, Reitmeier e Prusa, 1987, Morgan at al., 1988, Bragagnolo e Rodriguez-Amaya, 1992, 1995). O método enzimático também é menos oneroso, no entanto é pouco utilizado em amostras de carnes (Hutchison at al., 1987). No entanto, métodos colorimétricos e enzimáticos tendem a superestimar o teor de colesterol, pela presença de substâncias interferentes. Os métodos cromatográficos, embora mais caros, são os mais específicos, pois têm a capacidade de separar os interferentes. Muitos trabalhos empregam cromatografia gasosa na análise de colesterol em carnes (Slover at al., 1987; Bohac at al., 1988; Heymann at al., 1990) e atualmente a cromatografia líquida de alta eficiência está sendo utilizada (Arneth e Al-Ahmad, 1991, Bragagnolo e Rodriguez-Amaya, 2001a,b,c,d). Muito se discute sobre a falta de especificidade do método colorimétrico, no entanto, Bohac et al. (1988) realizaram um estudo comparativo em carne suína e bovina entre um método colorimétrico e cromatografia gasosa e não encontraram diferença significativa nos teores de colesterol. Bragagnolo e Rodriguez-Amaya (2001a) também não encontraram diferença significativa nos teores de colesterol de carne suína e bovina obtidos pelo mesmo método colorimétrico e um método por cromatografia líquida de alta eficiência. No entanto, o método colorimétrico requer um controle rigoroso das condições analíticas para assegurar resultados precisos e exatos (Bragagnolo e Rodriguez-Amaya, 1992). Independente do método utilizado, a determinação de colesterol envolve as seguintes etapas: (1) extração dos lipídios totais por um solvente orgânico ou mistura de solventes, (2) remoção do solvente, (3) saponificação alcalina dos lipídios, (4) extração da matéria insaponificável, (5) remoção do solvente e (6) quantificação. Os lipídios são extraídos de preferência com a mistura de clorofórmio, metanol e água, segundo Folch et al. (1957) ou Bligh e Dyer (1959), que são procedimentos semelhantes. Atualmente, a tendência é a fazer saponificação direta da amostra 394

eliminando a primeira etapa. A saponificação direta da amostra é mais rápida, menos trabalhosa e principalmente utiliza um volume menor de solvente, o qual diminuí o custo da análise e o problema do descarte e evita o uso de solventes tóxicos como o clorofórmio e o metanol. Em todas as etapas cuidados especiais devem ser tomados para a obtenção de resultados confiáveis. 3 Teores de colesterol em carnes Valores encontrados na literatura para colesterol em carnes variam largamente. Valores de 30 mg/100g na carne suína crua (Csallany, 1989) a 114 mg/100g na carne bovina crua (Kritchesky e Tepper, 1961) foram relatados. Estas discrepâncias podem ser atribuídas a variação natural das amostras devido a uma série de fatores tais como idade, raça, sistema de alimentação, sexo, localização anatômica, nível de gordura externa e interna, local de criação, sistema de criação, estação do ano e método de cozimento. Entretanto, um exame da literatura sobre determinação de colesterol revela que estas diferenças podem ser geradas, em grande extensão, pelos diferentes procedimentos analíticos utilizados. Amostras de carne de frango (separada em carne branca, escura e pele), carne suína (bisteca, lombo, pernil e toucinho) e carne bovina (contrafilé, coxão duro, coxão mole, músculo e peito) adquiridas no comércio de Campinas, São Paulo, foram analisadas quanto ao teor de colesterol por Bragagnolo e Rodriguez-Amaya (1992, 1995). Estes cortes representam diferentes localizações anatômicas com diferentes graus de gorduras. O método utilizado foi o colorimétrico de Bohac et al. (1989) otimizado e validado no próprio laboratório. Os resultados obtidos para carne crua (Tabela 1) variaram de 49 mg/100 para a bisteca e lombo a 104 mg/100g para a pele de frango. Os valores de colesterol obtidos para carne suína e toucinho não apresentaram diferença significativa (p> 0,05) embora o toucinho tenha apresentado um valor ligeiramente maior que os cortes de carne. Dos cortes de carne bovina, o coxão duro também apresentou um maior teor de colesterol, mas não foi significativamente diferente dos demais cortes. No entanto, a carne escura e a pele de frango apresentaram valores significativamente maiores, que a carne branca de frango, carnes bovinas e suínas. Comparando-se estes dados com os teores de colesterol relatados na Tabela de Composição de Alimentos da USDA (1999) (Tabela 2) observa-se que para a carne de frango, os valores são semelhantes, enquanto para carne suína são ligeiramente maiores e para a carne bovina maiores no filé e menores na alcatra. Quando as amostras foram analisadas cozidas, foi observado que houve um aumento no teor de colesterol decorrente da perda de água com a consequente concentração dos constituintes. Para avaliar a possibilidade de perda durante o cozimento, foram calculados os teores de colesterol de amostras pareadas, em base seca, para eliminar a influência da água (Tabela 1). Verificou-se uma perda significativa, devido ao tratamento térmico, o qual variou de 8% na carne branca de frango a 19% no lombo suíno. Os valores de colesterol para carne branca de frango assada encontrados na Tabela de Composição de Alimentos da USDA (1999) (Tabela 2) são maiores que os obtidos por Bragagnolo e Rodriguez-Amaya (1992) enquanto para carne escura 395

Tabela 1 Concentração de colesterol (mg/100g) em carnes Carne Colesterol (mg/100g) Perda pelo crua cozida cozimento (%) Bovina Contrafilé 51 ± 6 66 ± 6 14 Coxão duro 56 ± 6 NR NR Coxão mole 50 ± 4 NR NR Músculo 52 ± 4 67 ± 4 16 Peito 51 ± 6 NR NR Suína Bisteca 49 ± 5 97 ± 6 NH Lombo 49 ± 7 69 ± 12 19 Pernil 50 ± 6 82 ± 8 12 Toucinho 54 ± 6 56 ± 6 NH Carne de frango Carne branca 58 ± 10 75 ± 17 8 Carne escura 80 ± 9 124 ± 20 14 Pele 104 ± 5 139 ± 37 NH NR não realizado; não houve perdas. Referência: Bragagnolo e Rodriguez-Amaya (1992, 1995). 396

ocorreu o contrário. Em relação as carnes suínas assadas (Bragagnolo e Rodriguez- Amaya, 1995), o valor de colesterol no pernil foi semelhante, enquanto para lombo os valores descritos na Tabela de Composição de Alimentos da USDA (1999) são maiores. Nas carnes bovinas, os teores de colesterol em carne cozida, independente do tipo de cozimento são maiores na Tabela de Composição de Alimentos da USDA (1999). Estas variações são devidas, provavelmente, as diferenças na temperatura interna de cozimento, tempo de cozimento, tamanho e formato da amostra e também ao modo de cozimento. No entanto, de acordo com Morgan et al. (1988) e Prusa e Hughes (1986) não foram observadas diferenças no conteúdo de colesterol em carnes bovinas cozidas por vários métodos (assado, microondas, frito em frigideira e refogado). Trabalho realizado pelo INMETRO (2001) com carne de frango, suína e bovina também verificou que não houve diferença significativa no teor de colesterol por diferentes tratamentos térmicos. Tabela 2 Valores de colesterol (mg/100g) em carnes de acordo com a Tabela Composição de Alimentos da USDA (1999) Carne Crua Grelhada Assado Assada Frita Ensopada na panela no forno Carne de frango Carne branca 58 - - 93 96 88 Carne escura 80 - - 85 90 77 Carne suína Lombo 63 80 80 - - - Pernil 68 - - 94 - - Carne bovina Alcatra 38 80 - - - - Filé 71 86-86 - - Considerando que um dos fatores que pode influir o teor de colesterol é a raça, foi realizado um trabalho em Longissimus dorsi cru e grelhado das raças bovinas Nelore (Bos indicus), Canchin (cruzamento de 3/8 Nelore x 5/8 Charcelais) e Beefalo (cruzamento de 3/8 hibrido Beefalo x 5/8 Nelore) (Bragagnolo e Rodriguez-Amaya, 2001c). Não houve diferença significativa (p>0,05) no teor de colesterol entre as raças estudadas. Outro fator que pode influenciar os níveis de colesterol em animais é a idade. Suínos com 15, 21 e 110 dias resultantes do cruzamento (Hampshire com Landrace x Large White) e Camborough 15 (Duroc Pic com Landrace Pic x Large White Pic) foram analisados. Observou-se que o teor de colesterol da carne diminuiu com o aumento da idade dos animais (Bragagnolo e Rodriguez-Amaya, 2001b). Foi verificado também que a inclusão da gordura externa em lombo (amostras pareadas de lombo com e sem gordura externa) não alterou o conteúdo de colesterol (Bragagnolo e Rodriguez-Amaya, 2001d). Em termos de colesterol, portanto, a carne bovina, suína e a carne branca de frango apresentaram valores semelhantes. No entanto, a carne escura e pele de 397

frango apresentaram valores significativamente maiores. Dos fatores influentes aqui analisados, apenas a idade dos animais influenciou o teor de colesterol. Por outro lado, os níveis de colesterol no sangue não dependem somente do conteúdo de colesterol dos alimentos, mas também do teor de gordura e do balanço de ácidos graxos saturados e insaturados. 4 Teores de lipídios totais e ácidos graxos saturados e insaturados Os teores de lipídios totais variaram de 1,7 g/100g na carne bovina (coxão mole) a 7 g/100g na carne escura de frango (Tabela 3). Observa-se que a carne bovina apresentou valores de lipídios totais menores, semelhante a carne branca de frango e ao lombo. Os cortes de pernil, paleta (suínos) e carne escura de frango apresentaram valores mais elevados. Valores ainda maiores foram encontrados em pele de frango e toucinho. Como esperado, o lombo com gordura externa apresentou valores maiores (13 g/100g) do que retirando-se toda gordura externa (3 g/100g). Em relação à saúde humana, no sentido de reduzir o risco a doenças cardiovasculares, as recomendações nutricionais são de consumir alimentos com baixo teor de gordura. Segundo Food Advisory Commitee da Inglaterra (1990) alimentos contendo até 5% de gordura podem ser considerados alimentos com baixo teor de gordura. Os valores para as carnes no presente trabalho, foram obtidos retirando-se toda camada externa de gordura. Em comparação com os valores encontrados na Tabela de Composição de Alimentos da USDA (1999), os teores de lipídios totais da carne branca e escura de frango, cruas, foram maiores, enquanto para pernil suíno foi semelhante e para lombo suíno e carne bovina foram menores. A composição de ácidos graxos na carne suína, média dos quatro cortes analisados (paleta, pernil, lombo e toucinho) foi, 40 ± 2, 44 ± 2 e 14 ± 2% para ácidos graxos saturados, monoinsaturados e poliinsaturados, respectivamente. Na carne bovina, média dos três cortes analisados, foi de 45 ± 4, 40 ± 4 e 7 ± 4% para ácidos graxos saturados, monoinsaturados e poliinsaturados, respectivamente (Tabela 4). Na carne de frango os valores médios considerando carne branca, carne escura e pele foram de 33 ± 1, 46 ± 2 e 21 ± 1% para saturados, monoinsaturados e poliinsaturados, respectivamente. Comparando-se as três carnes, observamos que a carne bovina apresentou maior teor de ácidos graxos saturados e menor teor de ácidos graxos poliinsaturados enquanto o frango mostrou ter mais ácidos graxos poliinsaturados e menos ácidos graxos saturados que as demais. Em termos de ácidos graxos monoinsaturados as três carnes foram semelhantes. O ácido esteárico, um ácido graxo saturado com 18 carbonos quando presente na dieta, não aumenta o teor de colesterol sanguíneo (Grundy, 1994). Se a quantidade deste ácido for subtraída do total de ácidos graxos saturados da carne de frango, suína e bovina, teremos, 28, 28 e 31%, respectivamente. Isto sugere que a ingestão de carne suína, de frango e bovina pode ter efeito similar no colesterol sanguineo. Atualmente é importante considerar a relação ϖ6/ϖ3 dos ácidos graxos. Na carne bovina a razão foi 1,9 (Tabela 5) estando dentro do máximo recomendado pelo British Department of Health, (1994) da Inglaterra. A razão ϖ6/ϖ3 para carne suína e de 398

Tabela 3 Concentração de lipídios totais em carnes cruas Carne Lipídios totais (g/100g) Bovina Contrafilé 2,4 ± 0,7 Coxão mole 1,7 ± 0,4 Coxão duro 1,9 ± 0,9 Suína Lombo 3,0 ± 1 Pernil 5,0 ± 3 Paleta 5,0 ± 1 Toucinho 83 ± 1 Carne de Frango Carne branca 2,7 ± 0,6 Carne Escura 7 ± 1 Pele 56 ± 1 Dados não publicados. Tabela 4 Percentagem de ácidos graxos saturados, monoinsaturados e poliinsaturados em carnes Ácidos graxos (%) Carne bovina Carne suína Carne de frango Saturados 45 ± 4 40 ± 2 33 ± 1 Monoinsaturados 40 ± 4 44 ± 2 46 ± 2 Poliinsaturados 7 ± 4 14 ± 2 21 ± 1 Dados não publicados. 399

frango variou de 10 a 21, estando bem acima do máximo recomendado de 4 para a dieta total, implicando a necessidade de compensar esta deficiência com outros componentes da dieta. A quantidade de ácidos graxos saturados, monoinsaturados e poliinsaturados expressas em mg/100g usando fator de conversão (Holland et al., 1986) pode ser observada na Tabela 5. Como os ácidos graxos foram calculados em mg/100g de carne, é compreensível que os cortes que têm mais gordura apresentem valores maiores de ácidos graxos. Comparando estes resultados (Tabela 5) com os da Tabela de Composição de Alimentos da USDA (1999) nota-se que a carne branca de frango apresentou proporcionalmente menor teor de ácidos graxos saturados e maior de ácidos graxos poliinsaturados. Por outro lado, para carne escura de frango, carne bovina e suína os resultados foram semelhantes. Em geral, dentre os tratamento de cozimento, a forma grelhada ou cozida na água resulta em menor teor de gordura e conseqüentemente em menor teor de ácidos graxos (INMETRO, 2001). Tabela 5 Percentagem de ácidos graxos saturados, poliinsaturados em carnes monoinsaturados e Analito Carne bovina Carne suína Carne de frango Contrafilé Lombo Pernil Branca Escura Lipídios totais (g/100g) 2,4 3,0 5,0 2,7 7,0 Saturados (g/100g) 0,98 1,09 1,82 0,84 2,18 Monoinsaturados (g/100g) 0,88 1,20 2,00 1,17 3,04 Poliinsaturados (g/100g) 0,15 0,38 0,64 0,54 1,39 ϖ6/ϖ3 1,9 21 12 14 10 Dados não publicados. Considerando o fator raça bovina, a raça Beefalo apresentou um valor ligeiramente menor, mas não significativo, de lipídios totais, tanto para carne grelhada como para carne crua. O total de ácidos graxos saturados, monoinsaturados e poliinsaturados foram semelhantes entre as raças e entre os tratamentos, cru e grelhado. Em todas as raças e em amostras cruas e grelhadas, os ácidos graxos saturados foram sempre menores que 50% e os poliinsaturados variaram de 8 a 11%. O teor de lipídios das carnes cruas e grelhadas das três raças variou de 2,1 a 4,0 g/100g. Em relação à idade de suínos, o teor de lipídios diminuiu ligeiramente com a idade na carne, mas aumentaram substancialmente no toucinho. A porcentagem de ácidos graxos saturados foi mantida com a idade, mas o total de ácidos graxos monoinsaturados foi ligeiramente maior e o de poliinsaturados menores na carne de animais com 110 dias. No toucinho o total de ácidos graxos saturados aumentou enquanto o total de ácidos poliinsaturados decresceu ligeiramente com a idade (Bragagnolo e Rodriguez-Amaya, 2001b). O efeito da retirada da gordura externa no lombo foi significativo apenas na porcentagem de ácidos graxos poliinsaturados, observando-se menor valor no lombo com gordura externa (Bragagnolo e Rodriguez-Amaya, 2001d). De acordo com American Heart Association (2001) a quantidade de ácidos graxos saturados recomendado para uma dieta de 2500 calorias deve ficar entre 19 a 28 g/dia. 400

Verifica-se pela Tabela 5 que qualquer uma das carnes apresentam valores menores. O consumo com moderação é permitido, sem ultrapassar o valor máximo de 28 g de gordura/dia na dieta total. Cabe ainda lembrar que ao consumir, toda gordura externa deve ser retirada, diminuindo assim a ingestão de gordura. 5 Referências Bibliográficas AMERICAN HEART ASSOCIATION. Dietary Guidelines for Health American Adults. (http://www.americanheart.erg/heart_and_stroke_a_z_guide/dietg.html), 2001. ARNETH, W., AL-AHMAD, H. Cholesterol und seine ester in fleisch - Analytik und Gehalte Mitteilungsblatt, 112: 201, 1991. BLIGH, E. G., DYER, W. J. A rapid method of total lipid extraction and purification. Canadian Journal Biochemistry, 37: 911, 1959. BOHAC, C. E., RHEE, K. S. Influence of animal diet and muscle location on cholesterol content of beef and pork muscles. Meat Science, 23: 71, 1988. BRAGAGNOLO, N., RODRIGUEZ-AMAYA, D. B. Teores de colesterol em carne de frango. Revista de Farmácia e Bioquímica da Universidade de. São Paulo, 28: 122, 1992. BRAGAGNOLO, N., RODRIGUEZ-AMAYA, D. B. Teores de colesterol em carne suína e bovina e efeito do cozimento. Ciência e Tecnologia de Alimentos, 15: 11, 1995. BRAGAGNOLO, N., RODRIGUEZ-AMAYA, D. B. Determinação de colesterol em carnes: comparação de um método colorimétrico e um método por cromatografia líquida de alta eficiência. Revista do Instituto Adolfo Lutz, 60: 53, 2001a. BRAGAGNOLO, N., RODRIGUEZ-AMAYA, D. B. Simultaneous determination of total lipid, cholesterol and fatty acids in meat and backfat of suckling and adult pigs. Food Chemistry (enviado em julho de 2001b). BRAGAGNOLO, N., RODRIGUEZ-AMAYA, D. B. Influence of beef cattle breed and grilling on the total lipid, cholesterol and fatty acid composition. Archivos Latinoamericanos de Nutricion (enviado em julho de 2001c). BRAGAGNOLO, N., RODRIGUEZ-AMAYA, D. B. Colesterol, lipídios totais e ácidos graxos em cortes de carne suína. Ciência e Tecnologia de Alimentos (aceito para publicação 2001d) BROWN, M. S., KOVANEN, P. T., GOLDSTEIN, L. Regulation of plasma cholesterol by lipoprotein receptores. Science, 212: 628, 1981. CSALLANY, A. S., KINDOM. S. E., ADDIS, P. B., LEE, J. HPLC method for quantitation of cholesterol and four of its major oxidation products in muscle and liver tissues. Lipids, 24: 645, 1989. DEPARTMENT OF HEALTH. Nutritional Aspects of Cardiovascular Disease. Report on Health and Social Subjects no 46. HMSO, London, 1994. FOLCH, J., LEES, M., STANLEY, G. H. S. A simple method for the isolation and purification of total lipids from animal tissues. The Journal of Biological Chemistry, 226: 497, 1957. FOOD ADVISORY COMMITTEE. Report on review of food labelling and advertising. London, 1990. GRUNDY, S. M. Influence of stearic acid on cholesterol metabolism relative to other long chain fatty acids, American Journal Nutrition, 60: 986S, 1994. GRUNDY, S. M., DENKE, M. A. Dietary influences on serum lipids and lipoproteins. Journal Lipid Reserch, 31: 1149, 1990. 401

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