Profissional da Saúde Qual a sua responsabilidade frente a essa prática? Figura 1: abate de ovino na propriedade Se você ficou em dúvida sobre a resposta, então leia as informações a seguir sobre HIDATIDOSE. A hidatidose é uma doença causada pela fase larval do parasita Echinococcus granulosus. A enfermidade é também conhecida como bolha d água, cisto hidático e equinococose cística. Historicamente definida como uma doença rural e endêmica nas regiões da Campanha e da Encosta e da Serra do Sudeste do Rio Grande do Sul, atualmente está disseminada pelo Estado e pode acometer moradores de áreas urbanas. Orientações aos Profissionais da Saúde elaboração Sabrina Vizeu, 05/2013 Página 1 de 8
Informações a respeito do parasita Echinococcus granulosus é um parasita pertencente ao filo Plathelminthes (platy: plano e helmins/helminthes: vermes), classe Cestoda e família Taeniidae. O ciclo evolutivo compreende as fases de ovo, larva e adulto. Os adultos são hermafroditas, medem de 3 a 6 mm de comprimento e possuem as seguintes estruturas: escólex, colo e estróbilo, esse último constituído por 3 a 4 proglótides (sendo que a última é a grávida 500 a 800 ovos). Estão presentes no intestino delgado dos cães e os ovos produzidos saem expulsos com as fezes de seu hospedeiro definitivo. Os ovos medem cerca de 32 µm. Figura 2:Adulto No ambiente, os ovos podem ser encontrados nas pastagens, nas coleções de água, nas hortas não cercadas, aderidos aos pêlos dos cães e/ou à lã das ovelhas. Os herbívoros (ovelha, gado, suíno) comportam-se como hospedeiros intermediários e os humanos como hospedeiros acidentais quando ingerem os ovos desse parasita. Ao serem ingeridos e absorvidos pelo intestino, o primeiro local que chegam é ao fígado, e passam a desenvolver a fase de larva = cisto hidático. Caso não fiquem retidos ao fígado (50-70%), migram para pulmões (20-30%), o 2º local mais freqüente de localização. Ainda, podem atingir músculos (5%), ossos (3%), rins (2%), cérebro (1-2%), baço (1%), dentre outros (1%). Figura 3: larva (= cisto hidático) Como o desenvolvimento da larva é lento e muitas vezes não existe sintomatologia específica associada, as lesões nos animais normalmente são um achado de abate. Nos humanos, a época mais comum de se infectar é na infância, pelo estreito convívio com os cães e medidas de higiene deficitárias. O tamanho do Orientações aos Profissionais da Saúde elaboração Sabrina Vizeu, 05/2013 Página 2 de 8
cisto hidático é variável, podendo chegar a 20 cm. A parte externa do cisto, conhecida como membrana adventícia, é constituída por tecido fibroso (resultante de uma reação do hospedeiro à presença da larva e seus metabólitos). A parte interna, conhecida como membrana germinativa, origina as demais estruturas do cisto (algumas delas são as precursoras dos parasitas adultos nos cães). O ciclo do E. granulosus se completa quando o cão ingere as larvas presentes nas vísceras cruas (fígado, pulmão, etc) dos animais infectados, e essas larvas viram parasitas adultos. Frequentemente os cães infectados com E. granulosus são assintomáticos quando detectam-se os parasitas adultos, a enfermidade denomina-se equinococose. Em alguns casos, o cão pode encontrar algum animal morto no campo e vai se alimentar, ingerindo as vísceras contaminadas. Mas o maior responsável pela perpetuação das hidatidoses animal e humana no Rio Grande do Sul é o hábito de fornecer vísceras cruas (contaminadas) aos cães, ao abater animais para consumo na propriedade. Figura 4: Ciclo Evolutivo do Echinococcus granulosus Orientações aos Profissionais da Saúde elaboração Sabrina Vizeu, 05/2013 Página 3 de 8
A doença nos humanos Por ser uma doença crônica, com sintomas inespecíficos, é de extrema importância que o Profissional da Saúde esteja atento ao histórico do paciente para extrair o máximo de informações no momento da triagem e da anamnese. Embora seja uma doença onde as manifestações clínicas são mais freqüentes na população adulta, qualquer faixa etária pode estar acometida. A dispersão da área endêmica no Estado, a cronicidade da doença, um agente etiológico pouco lembrado e os resultados sugestivos de exames físicos e complementares exigem perspicácia para diagnosticar a hidatidose. A fase inicial da infecção é sempre assintomática e isso pode levar meses a anos. Os sintomas apresentados vão depender da quantidade, do tamanho, da localização dos cistos nos órgãos envolvidos, da pressão exercida pelo cisto às estruturas adjacentes e dos mecanismos de defesa individuais. O cisto hidático pode involuir, ocorrendo reabsorção do líquido e calcificação. Antes disso, se houver ruptura do cisto hidático, o indivíduo pode apresentar reação anafilática decorrente do extravasamento de seu conteúdo, manifestada através de urticária ou sintomatologia mais grave. Se o indivíduo sobrevive à ruptura, é possível que mais cistos hidáticos sejam formados em outros locais (hidatidose secundária). Clinicamente, e até mesmo com alguns exames complementares, o cisto hidático é confundível com massa tumoral de qualquer etiologia. Usualmente pesquisam-se anticorpos no soro dos pacientes suspeitos, através de imunodiagnóstico (método de Imunoblotting). Se o médico optar por realizar esse teste, no momento da requisição do exame é suficiente escrever: Solicito sorologia para hidatidose. Nesse caso, conforme as instruções de coleta e transporte de amostras laboratoriais disponibilizadas em 2012 pelo Laboratório Central de Saúde Pública do Rio Grande do Sul (LACEN/RS), o paciente deve ter feito jejum de 8 horas, o material enviado deve ser no mínimo 2 ml de soro, Orientações aos Profissionais da Saúde elaboração Sabrina Vizeu, 05/2013 Página 4 de 8
acondicionado em frasco ou tubo de ensaio com tampa, a uma temperatura entre 4ºC e 8ºC, com tempo de acondicionamento máximo de 24 a 72 horas o ideal é enviar a amostra no mesmo dia da coleta. A amostra deverá ser cadastrada no Sistema Gerenciador de Ambiente Laboratorial (GAL), do LACEN/RS, e estar acompanhada obrigatoriamente dos seguintes documentos: 1) requisição da sorologia para hidatidose, 2) Ficha de Requisição de Exames Hidatidose Imunodiagnóstico do LACEN/RS (Figura 5 ao final do texto) e 3) Ficha para Diagnóstico de Hidatidose da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) (Figura 6 ao final do texto). Ambas as Fichas devem conter informações completas, coerentes entre si e devem estar escritas de forma legível; na Ficha da FIOCRUZ é necessário carimbo do profissional de saúde (ao fim do documento) responsável pela investigação. As técnicas de imagem auxiliam na identificação de cistos: ultrassonografia, radiografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética e cintilografia. O procedimento cirúrgico também pode ser uma das formas de diagnóstico, além de ser uma indicação de tratamento. O material aspirado do interior do cisto pode ser analisado para identificar e confirmar algumas partes estruturais do E. granulosus, com uma técnica chamada morfometria, realizada na FIOCRUZ. A administração de benzimidazóis pode ser indicada pré e/ou pós cirurgia, ou usada naqueles casos nos quais o cisto é inoperável. Em casos de cisto pequenos, que não ocasionem sintomas, calcificados ou não, o tratamento indicado pode ser aguardar e observar. Os exames complementares podem não confirmar e, além disso, não descartar a ocorrência de cisto hidático. Por exemplo, um resultado não reagente de sorologia para hidatidose não descarta a ocorrência da doença, pois o estímulo do sistema imunológico muitas vezes não ocorre devido à espessa camada protetora que envolve o cisto hidático. Orientações aos Profissionais da Saúde elaboração Sabrina Vizeu, 05/2013 Página 5 de 8
Obrigatoriedade de notificação A Hidatidose não consta na Lista de Notificação Compulsória expedida através da Portaria 104 pelo Ministério da Saúde em 2011. Entretanto, no Estado do Rio Grande do Sul, os casos de hidatidose humana passaram a ser de notificação compulsória no Sistema Nacional de Agravos de Notificação (SINAN) desde 2010, com a publicação da Portaria 203, de 17 de março. O código e a denominação da enfermidade no Sistema estão como CID 10 - B67 Equinococose. (a ficha de notificação do SINAN e a Portaria 203 são as Figuras 7 e 8 ao final do texto, respectivamente). Medidas de prevenção A principal medida de prevenção é a adoção de hábitos básicos de higiene, como lavar bem as mãos após contato com cães, lavar bem as verduras e legumes antes de consumi-los e não manipular qualquer alimento sem lavar as mãos. A água consumida deve ser tratada e/ou fervida. É importante adotar essas medidas, mas é igualmente relevante reduzir a contaminação das pastagens pelos ovos de E. granulosus, através de algumas práticas de manejo em relação aos cães da propriedade, exercendo a guarda responsável. Orienta-se: 1) reduzir ao mínimo o número de cães na propriedade (evitando crias indesejadas, através da castração de fêmeas e/ou machos); 2) fornecer vermífugo regularmente aos cães (com orientações de um médico veterinário); 3) não fornecer vísceras cruas aos cães (se vísceras forem fornecidas, elas devem ser cozidas por no mínimo 30 minutos e estarem completamente imersas na água durante o cozimento). Não se pode evitar o abate para consumo nas propriedades, mas se pode e se deve evitar o acesso dos cães às vísceras cruas, evitando assim as sucessivas reinfecções o parasita Echinococcus granulosus vive 4 meses, em média, em seus hospedeiros definitivos: os cães. Orientações aos Profissionais da Saúde elaboração Sabrina Vizeu, 05/2013 Página 6 de 8
Documentos citados no texto (também estão disponibilizados separadamente na página da Secretaria Estadual da Saúde do Rio Grande do Sul). Figura 5: Ficha de Requisição de Exames - Hidatidose - Imunodiagnóstico (LACEN/RS) Figura 6: Ficha para Diagnóstico de Hidatidose (FIOCRUZ) Figura 7: Ficha de notificação - SINAN Figura 8: Portaria 203, de 17/03/2010 Orientações aos Profissionais da Saúde elaboração Sabrina Vizeu, 05/2013 Página 7 de 8
REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Coordenação-Geral de laboratórios de Saúde Pública. Hidatidose Humana no Brasil. Manual de Procedimentos para o Diagnóstico Parasitológico e Imunológico. 1. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2011. 63 p. ECKERT, J.; DEPLAZES,P. Biological, Epidemiological, and Clinical Aspects of Echinococcosis, a Zoonosis of Increasing Concern. Clin Microbiol Rev, v. 17, n. 1, p. 107-135, jan. 2004. FORTES, E. Parasitologia Veterinária. 3. ed. São Paulo:Ícone, 1997. 686 p. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Departamento Nacional de Endemias Rurais. Boletim Informativo da Campanha Contra a Hidatidose. Nº 2. Nov 1958. 21p. NEVES, D.P. et al. Parasitologia Humana. 11. ed. São Paulo:Atheneu, 2005.494 p. REY, L. Parasitologia Parasitos e Doenças Parasitárias do Homem nas Américas e na África. 3. ed. Rio de Janeiro:Guanabara Koogan, 2001. 856 p. TAVARES, W.; MARINHO, L.A.C. Rotinas de Diagnóstico e Tratamento das Doenças Infecciosas e Parasitárias. São Paulo:Atheneu, 2005. 1206 p. REFERÊNCIAS (DAS FIGURAS) Figura 1: imagem cedida pelo médico veterinário Ivo Kohek Jr, da Secretaria Estadual da Agricultura, Pecuária e Agronegócio do Rio Grande do Sul (SEAPA/RS), Figura 2: < http://www.k-state.edu/parasitology/546tutorials/platyquery26> acesso em 13 maio 2013, Figura 3: retirada de NEVES, D.P. et al (2005), Figura 4: < http://www.dpd.cdc.gov/dpdx/html/echinococcosis.htm> acesso em 13 maio 2013; modificada por Sabrina Vizeu. A educação em saúde é um processo contínuo e multidisciplinar! Em caso de dúvidas, entre em contato com Sabrina Vizeu, através do telefone: (51) 3901-1144 ou do e-mail: sabrina-vizeu@saude.rs.gov.br Orientações aos Profissionais da Saúde elaboração Sabrina Vizeu, 05/2013 Página 8 de 8