INTERFERÊNCIAS ANTRÓPICAS NOS PROCESSOS MORFODINÂMICOS NA ÁREA DO ASSENTAMENTO RURAL NOVA SUISSA - SANTO AMARO/BAHIA



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Transcrição:

INTERFERÊNCIAS ANTRÓPICAS NOS PROCESSOS MORFODINÂMICOS NA ÁREA DO ASSENTAMENTO RURAL NOVA SUISSA - SANTO AMARO/BAHIA ALVES, N.M.S. UFS, Cidade Universitária Prof. José Aloísio de Campos, Bloco da Didática II, 1º andar, sala 115, São Cristóvão - Sergipe, (xx79) 3212 6782, e-mail: neisemare@yahoo.com SILVA, D.B. UFS, Cidade Universitária Prof. José Aloísio de Campos, Bloco da Didática II, 1º andar, sala 115, São Cristóvão - Sergipe, (xx79) 3212 6782, e-mail: deborabarbs@ig.com.br MOTTI, P. J. M. UFBA, Rua Barão de Geremoabo, s/n, Campus Ondina, Salvador - Bahia, (xx71), 3203 8523, e-mail: zapha67@hotmail.com RÊGO, M. J. M. UFBA, Rua Barão de Geremoabo, s/n, Campus Ondina, Salvador - Bahia, (xx71), 3203 8523, e-mail: maze@ufba.br RESUMO O Assentamento Rural Nova Suissa foi implantado numa antiga fazenda da zona canavieira, no município de Santo Amaro, Recôncavo Baiano. A comunidade assentada reúne pessoas de origens variadas, tendo como principais atividades a agricultura de subsistência e a pecuária, desenvolvidas com práticas e técnicas tradicionais. Nesta situação, as interferências da ocupação atual numa área que foi historicamente explorada, e em conseqüência já apresentava um certo grau de fragilidade, têm propiciado alterações na dinâmica ambiental. O objetivo deste artigo é avaliar as conseqüências das interações dos atuais modelos de ocupação e do uso dos recursos naturais com a morfogênese e a conservação da qualidade ambiental na área, a partir do diagnóstico geoambiental. O estudo, realizado sob o enfoque sistêmico, teve como referências teórico-metodológicas as propostas de Geossistema de Bertrand (1972, p.14) para a definição de unidades geossistêmicas e da Ecodinâmica de TRICART (1977) para a avaliação e a discussão da atualidade e intensidade dos processos geomorfológicos atuantes nestas unidades. A conjugação dessas propostas objetivou aprofundar o entendimento das relações entre os fatores naturais da dinâmica da transformação dos modelados em associação com as repercussões das intervenções antrópicas. No diagnóstico geoambiental, o clima, a geologia, os modelados herdados do passado geomorfológico, os solos e a vegetação são os principais componentes naturais analisados. O passado histórico da ocupação da área, os padrões atuais de exploração e a intensidade das atividades caracterizam as intervenções antrópicas. Foi constatado que, entre as sete unidades geossistêmicas identificadas, quatro apresentam elevados graus de instabilidade e problemas de degradação, levando a uma discussão das modalidades de seu aproveitamento pela comunidade assentada. Em três não se observam graves alterações na morfogênese, porém a manutenção desta situação exige precauções. Constatou-se que o homem constitui um importante agente de modificação da dinâmica natural de evolução do espaço, seja interferindo diretamente no meio natural, seja interagindo com os fatores naturais, potencializando sua ação. Palavras-chave: processos geomorfológicos, dinâmica ambiental, morfogênese. INTRODUÇÃO No Brasil, os assentamentos rurais tem sido uma das estratégias governamentais utilizadas para reduzir as tensões no campo decorrentes da demanda pela propriedade da terra. Entretanto, esta política, como é orientada, às vezes contempla pessoas sem tradição ou 1

conhecimentos da atividade rural. Esta situação, aliada ao fato que as áreas escolhidas podem se encontrar já esgotadas devido ao longo período de exploração, gera situações preocupantes para a manutenção da qualidade ambiental e para o sucesso do assentamento. O Assentamento Rural Nova Suissa instalado no Recôncavo Baiano, numa região historicamente ocupada com o plantio da cana-de-açúcar, é objeto desta análise. A economia açucareira levou a uma grande devastação da vegetação original em toda a região. Com a sua decadência introduziu-se a pecuária. Surgiram então outros padrões de ocupação e uso do solo e, novos impactos sobre os recursos dos sistemas ambientais. A comunidade em estudo foi assentada na Fazenda Nova Suissa quando esta se encontrava praticamente abandonada. Sua presença elevou a pressão demográfica sobre os recursos naturais, por conta de uma nova espacialização. Esta comunidade tem como principais atividades a pecuária e a agricultura - cultivos de subsistência e comerciais. Apesar de ocupar a área há aproximadamente dez anos nem todos os colonos começaram a cultivar seus lotes. Algumas áreas foram reservadas para uma exploração coletiva com a criação de gado, sendo freqüente também o aluguel dos pastos. Apesar do curto espaço de tempo, já são visíveis as repercussões da nova forma de organização e ocupação do espaço sobre a dinâmica natural da área, implicando em um novo arranjo nas relações entre os elementos naturais. O objetivo deste trabalho é discutir, a partir do diagnóstico geoambiental, o impacto da presença desta comunidade sobre os principais processos geomorfológicos atuantes na área, caracterizando os estados da morfodinâmica nas unidades geossistêmicas. ÁREA DE ESTUDO Cerca de 100 famílias foram assentadas nos 1821 hectares da Fazenda Nova Suissa - 12º 35 00 a 12º 40 45 de latitude Sul e, 38º 45 00 a 38º 48 45 de longitude Oeste - nas proximidades da Baia do Iguape, em terras dos municípios de Santo Amaro e Cachoeira, no Recôncavo Baiano. A paisagem associa três setores, refletindo a influência dos condicionantes litoestruturais: um setor de tabuleiro com bordas íngremes, um setor de baixas colinas cortado por rios e riachos e um setor serrano de topografia acidentada e íngreme. 2

Este condicionamento litoestrutural está associado à Bacia Sedimentar do Recôncavo Baiano. A Baia do Iguape se caracteriza como um graben delimitado pelas escarpas de linha de falha da Serra do Iguape e de Maragogipe. A Fazenda Nova Suissa ocupa um setor à leste desta baía, incluindo um pequeno trecho da escarpa da falha do Iguape. As rochas sedimentares dominam na área, principalmente os arenitos da Formação Sergi, presentes no setor escarpado da Serra do Iguape. No topo do Tabuleiro são encontrados os sedimentos da Formação Barreiras, e, as colinas da Depressão foram modeladas sobre os folhelhos e siltitos da Formação Candeias. Uma carapaça ferruginosa de idade quaternária é responsável pela permanência da topografia sub-horizontal do topo do Tabuleiro. A área do assentamento está inserida numa região de estabilidade meteorológica na maior parte do ano. As temperaturas médias estão acima de 21 C, registrando-se as mais elevadas no verão, acima de 25 C. A precipitação média anual, para o período analisado (1977-2001), foi de aproximadamente 1600mm, com chuvas concentradas no período do outono-inverno. As condições climáticas de temperatura e pluviosidade identificam, para a área, um sistema morfoclimático bigenético, caracterizado pela predominância de um sub-sistema úmido, atuante na maior parte do ano, que é substituído durante o verão por um sub-sistema subúmido ou eventualmente seco (ALVES, 2004). Tais condições interferem diretamente na atuação e na intensidade dos processos morfogenéticos dominantes: escoamento fluvial; escoamento superficial - difuso, concentrado com sulcos e ravinas e, concentrado associado a voçorocas -; escoamento sub-superficial com rastejamento e solifluxão. A combinação das características da topografia, dos solos e de seu uso define os traços gerais das sete unidades geossistêmicas (Geofácies) integrantes das macro-unidades geomorfológicas - Serra Residual, Depressão Colinosa e Tabuleiro - que constituem o quadro de observação dos processos morfodinâmicos. Na Serra Residual, área dissecada em morros e cristas com elevados gradientes de declividade, encontram-se manchas de vegetação com remanescentes da Mata Atlântica exploradas por atividades extrativas. Os setores mais planos são usados para a pecuária. Nesta unidade, os NEOSSOLOS LITÓLICOS formam a classe dominante de solos. Na Depressão Colinosa, os modelados apresentam baixo gradiente de declividade. Predominam os solos da classe dos VERTISSOLOS, ocupados principalmente por lavouras de 3

subsistência temporárias e/ou permanentes, alguns cultivos comerciais e pastagens para a criação de bovinos. No Topo do Tabuleiro, sobre os LATOSSOLOS, se encontram a agrovila, pequenos plantios de mandioca e feijão, áreas de pastagem e a casa de farinha. Nos espigões formados pela dissecação das vertentes definidas por patamares escalonados, os solos da classe dos ARGISSOLOS, de textura arenosa e de baixa fertilidade, estão ocupados por pastagens. O trabalho familiar constitui a base do sistema produção no assentamento. De modo geral, a comunidade assentada não dispõe de orientação e de apoio técnico qualificado, mantendo, portanto, o uso de técnicas e instrumentos agrícolas tradicionais. A prática de retirada da mata e as queimadas ainda são freqüentes na área. METODOLOGIA As análises foram feitas seguindo uma abordagem sistêmica, que se revelou a forma mais apropriada para entender a dinâmica das interações entre os condicionantes e os agentes morfogenéticos. As unidades espaciais foram definidas com base nos princípios teóricometodológicos dos Geossistemas (BERTRAND, 1972) e sua dinâmica a partir dos princípios da Ecodinâmica (TRICART, 1977). A utilização simultânea das taxonomias geossistêmica e ecodinâmica objetivou o entendimento das condições da dinâmica atual na área e das tendências de sua evolução, reconhecendo-se que são derivadas tanto de processos conduzidos por fatores naturais, como da interação ou associação destes com a ação antrópica. Como subsídio ao diagnóstico geoambiental foram analisados e interpretados diversos documentos cartográficos - cartas planialtimétricas da CONDER (1977); mapas temáticos do RADAMBRASIL (1981); mapa geológico do estado da Bahia, (1996); carta topográfica Baía de Todos os Santos, escala 1:100.000, IBGE/SUDENE - e, realizada fotointerpretação de aerofotos. Como a região onde se insere a área do assentamento não possui estação meteorológica, os dados analíticos para a análise do clima e a identificação do sistema morfoclimático foram obtidos junto ao posto pluviométrico da Usina Nova Paranaguá localizada no município de Santo Amaro e, junto à estação meteorológica EMBRAPA/CNPMF localizada no município de Cruz das Almas. 4

A análise combinada destes materiais possibilitou a contextualização geoambiental nos âmbitos regional e local e a elaboração de um mapa orientativo para a realização dos levantamentos de campo, a coleta de amostras para estudos morfológicos das formações superficiais, o detalhamento das feições morfológicas e a avaliação da dinâmica dos processos geomorfológicos atuantes. Concluído o diagnóstico geoambiental, as informações obtidas foram sintetizadas em três mapas para a área do assentamento: um geomorfológico, um morfodinâmico e outro geossistêmico. O primeiro mapa subsidiou a elaboração dos dois outros. A identificação dos processos morfogenéticos e a determinação do seu grau de intensidade foram feitas, mais especificamente, sobre aerofotos e a partir de observações no campo. Essas informações foram obtidas junto aos trabalhos de pesquisa desenvolvidos por Alves (2004) quando da realização do diagnóstico morfodinâmico no Assentamento Nova Suissa e Silva (2004), que realizou uma estratificação ambiental na área com base nos solos. RESULTADOS E DISCUSSÕES Em condições naturais, o principal agente da morfogênese é a água, seja diretamente através do escoamento superficial fluvial ou de vertente, seja indiretamente através dos processos desencadeados pelos escoamentos sub-superficial e hipodérmico, em particular rastejamento e movimentos de massa. Estes processos muitas vezes são potencializados pelas intervenções antrópicas devido ao tipo de uso dos recursos ambientais. Em se tratando de uma área que voltou a ser (re)explorada de forma mais intensiva, como é comum nos assentamentos rurais, os recursos naturais mais atingidos a curto e médio prazo são a vegetação e os solos, em virtude da necessidade imediata de subsistência da comunidade. Na área, ainda são freqüentes as práticas de retirada da mata - para uso doméstico e coletivo e/ou comercialização - além da queimada, para limpeza do terreno antes do plantio. Vale lembrar que a agricultura e a pecuária, principais atividades econômicas da comunidade, levam à substituição da vegetação, com exposição dos solos aos processos geomórficos. No caso da pecuária, o pisoteio do gado favorece a compactação do solo. O escoamento pluvial sobre solos submetidos a estas condições pode contribuir para o desenvolvimento de formas erosivas como sulcos, ravinas e voçorocas. 5

Os estudos procedidos na área do assentamento permitiram identificar o homem como um importante agente morfogenético. Entretanto, os resultados de sua ação se repercutem diferentemente entre as unidades geossistêmicas, em conseqüência das características próprias destas e da forma como elas limitaram ou condicionaram as atividades antrópicas. Na vertente do Tabuleiro (Espigões) e na Depressão Colinosa a implantação de pastagem e/ou de cultivos de subsistência levou à retirada da vegetação, muitas vezes já reduzida à capoeira em conseqüência da intensa exploração anterior da fazenda. Os solos são expostos às chuvas, e embora sua textura ofereça uma certa estabilidade e resistência aos impactos das gotas de chuva (efeito splash) observa-se a acentuação da rede de escoamento difuso nas vertentes mais íngremes, levando a uma erosão superficial seguida de acumulação nos setores inferiores. Localmente, esta intensificação gera canais mais profundos, etapa inicial de ravinas. Esta evolução é acentuada nas trilhas definidas pelo pisoteio do gado, principalmente na área dos Espigões. As vertentes são cortadas em escada por linhas transversais de terracetes generalizadas. A compactação do solo concorre para a concentração do escoamento superficial favorecendo o surgimento de sulcos e ravinas, que evoluem para voçorocas. Nos setores cortados por estradas vicinais e caminhos a concentração do escoamento desenvolve voçorocas com mais de 1,00m de profundidade, expondo o arenito alterado e caracterizando uma instabilidade morfodinâmica de média a forte, associada ao fator antrópico. Nas colinas do Geossistema da Depressão notam-se pontualmente, nas áreas de vertentes com solo descoberto, sulcos e ravinas. Constata-se ainda, nas áreas cobertas por pastagem a generalização de movimentos de massa lentos gerando deformações e ondulações. Entretanto, apesar das atividades antrópicas, esta unidade apresenta uma situação de estabilidade morfodinâmica favorecida pelas condições da topografia e boa cobertura dos solos por pastagem. Foram observadas apenas algumas situações pontuais de intensificação da morfogênese resultantes da aceleração dos movimentos de massa. A unidade Serra Residual apresenta forte sensibilidade e riscos de instabilidade morfodinâmica por fatores naturais - litoestruturas e altos graus de declividade. Tais condicionantes são potencializados pelo fator antrópico, com a prática da queimada nas áreas usadas para o plantio próximas aos sopés dos morros, sendo visível, o desenvolvimento de voçorocas. 6

Nos bordos do Tabuleiro e em setores escarpados da Serra Residual, ocorrem os deslizamentos e desmoronamentos. Estes processos, observados em condições naturais, condicionados, principalmente, pela pluviosidade e pela litoestrutura, são agravados pelo fator antrópico. Em condições de estabilidade natural a vegetação arbórea segura os solos rasos. Entretanto, a prática do extrativismo com a retirada de madeira, abre clareiras onde as águas pluviais se concentram, favorecendo sobremaneira os deslizamentos e os desmoronamentos. Ainda não foram observadas alterações substanciais nos vales fluviais. Entretanto, a construção de represas, enquanto que aumenta a retirada de material nas vertentes pela intensificação dos processos erosivos leva a pensar que esta situação é susceptível de evoluir negativamente nos próximos anos. CONCLUSÕES Ao término da análise constatou-se que nas unidades geossistêmicas identificadas na área ocupada pelo Assentamento Rural Nova Suissa, os problemas ambientais surgiram como uma resposta da natureza a um projeto econômico inadequado para as condições atuais e são indicativos de que os limiares do sistema ambiental estão sendo atingidos. Os processos geomórficos tendem a se tornar mais intensos e generalizados, enquanto que pela lógica, em se tratando de um projeto coordenado, se esperava que este risco tivesse sido prevenido por medidas educacionais e técnicas. Processos agressivos como as ravinas se tornam mais presentes na paisagem, enquanto a generalização dos terracetes reflete uma sobrecarga do rebanho bovino nas vertentes. Neste último caso, a comunidade do assentamento encontrou uma situação herdada da última fase exploratória na fazenda. Entretanto, estes indícios de fragilidade do meio não interferiram na escolha das atuais atividades dos assentados. As unidades geossistêmicas mais sensíveis aos desequilíbrios e identificadas como detentoras de maior grau de instabilidade foram as vertentes do Tabuleiro (Espigões); os morros e cristas e, as rampas da Serra Residual. O Topo do Tabuleiro e a Depressão Colinosa foram consideradas como unidades, atualmente, menos atingidas pelo impacto antrópico e, portanto, mais estáveis, em diferentes graus, favorecidas principalmente pelas condições da topografia. 7

Ao termo deste estudo, recomenda-se a adoção de um manejo mais adequado às atuais condições do sistema ambiental como forma de conservar recursos imprescindíveis à sobrevivência e manutenção da comunidade assentada. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, N.M.S. Análise ambiental e diagnóstico morfodinâmico no Assentamento Rural Nova Suissa, Santo Amaro - Bahia. 2004. 183 p. Dissertação. Instituto de Geociências, Universidade Federal da Bahia, Salvador. BERTRAND, G. Paisagem e geografia física global: esboço metodológico. São Paulo, Caderno de Ciências da Terra, São Paulo, n. 13, 27 p. 1972. CHRISTOFOLETTI, A. Aplicação da abordagem em sistemas na geografia física. Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, v. 52, n. 2, p. 1-108, abr./jun. 1990. GUERRA, A. J. T. Considerações a respeito da importância da geomorfologia no manejo ambiental. Boletim Geográfico, Rio de Janeiro, v. 36, n. 258/259, p. 60-67, jul./dez. 1978. SILVA, D. B. Estratificação e diagnóstico de ambientes do Assentamento Rural Nova Suissa, Santo Amaro/Bahia - com ênfase na análise dos solos. 2004. Dissertação. Instituto de Geociências, Universidade Federal da Bahia, Salvador. TRICART, J. Ecodinâmica. Rio de Janeiro: IBGE, 1977. 91 p. (Recursos naturais e meio ambiente, 1). 8