Ensacamento de frutos: uma antiga prática ecológica para controle da mosca-das-frutas



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Transcrição:

Ensacamento de frutos: uma antiga prática ecológica para controle da mosca-das-frutas João, Paulo Lipp * Secchi, Valdir Antônio ** 1 O problema Um dos problemas fitossanitários mais graves na fruticultura, com perdas econômicas significativas, tem sido o ataque das moscas-dasfrutas. As espécies Anastrepha fraterculus e Ceratitis capitata assumem grande importância econômica, considerando-se que nossas condições climáticas permitem, durante todo o ano, a existência de frutos cultivados e silvestres, favorecendo a sobrevivência e o deslocamento da praga de uma planta para outra (TRÉS, 1992). *Engenheiro Agrônomo, Ms. em Citricultura (Universidade Politécnica de Valencia-Espanha)e Assistente Técnico Estadual da EMATER/RS. **Engenheiro Agrônomo, Mestre em Agronomia e Assistente Técnico Estadual da EMATER/RS. prejuízos causados aos fruticultores são antigos. Desde que apareceram os primeiros pomares comerciais, o controle tem sido necessário para viabilizar a colheita e a comercialização. Em Taquari, no período de 1955 a 1957, foram realizadas pesquisas na Estação Experimental de Pomicultura (hoje Centro de Pesquisa de Fruticultura) e, também, na propriedade dos "Irmãos Höerlle", em Montenegro, visando o controle da mosca-das-frutas em pomares de laranjeiras, variedade Valência, muito suscetível aos ataques da mosca por ser de colheita tardia. Nas parcelas testemunhas e nos pomares vizinhos, sem tratamentos, tiveram 70 a 80% de frutos bichados (GONÇALVES, 1958). 2 O controle Antes do advento dos inseticidas químicos, o controle da mosca limitava-se às práticas de con- 53

54 trole biológico e mecânico, tais como limpeza dos pomares, recolhimento dos frutos caídos, capinas e lavras superficiais, com a finalidade de destruição das pupas e caça com vidros pegamoscas (GONÇALVES et al., 1958). Günther (1977), ao publicar matéria no Suplemento Rural do jornal Correio do Povo (30.12.77) acerca do problema das moscas-dasfrutas, assim se reportou: "Em 1943 havia considerável plantação de árvores frutíferas em minha Granja Concórdia, na Vila Nova (Porto Alegre), e recebia mensalmente as publicações "Deutsche Ilustrierte Monatshefte - Obst e Gartenbau", de Munique. Foi então que li um artigo sobre "A Necessidade de Combate Biológico da Mosca da Fruta". No caso específico dos frutos caídos, o recolhimento e enterrio freqüente durante a safra e enterrá-los, a fim de matar as larvas neles alojadas, é uma importante prática auxiliar, que se baseia no controle biológico natural. Consiste na coleta dos frutos caídos, colocando-os em pequenos buracos (70x70x30 cm), no meio do pomar. No fundo do buraco coloca-se uma camada de 10 cm de areia, coberta por uma tela fina, com malha de 2 mm, para impedir a saída das moscas e facilitar a passagem das vespinhas que fazem o controle biológico (TRÉS, 1992). 3 O ensacamento O ensacamento das frutas para protegêlas do ataque de moscas é uma das práticas fitossanitárias mais antigas e eficazes. Na década de 60, quando a Grande Porto Alegre era o principal pólo de produção de hortigranjeiros no Rio Grande do Sul, o ensacamento era prática usual, principalmente para o pêssego, pêra e ameixa. Usavam-se sacos de papel encerado e de papel manteiga e, também, folhas de jornal, para proteger os cachos de uva contra o ataque de vespas e outros insetos (ROSA, 2002). Nos municípios de produção citrícola, o ensacamento era praticado correntemente, desde o início do século passado, exigindo dispêndio elevado de material e, em especial, de mão-de-obra, tornando-se inviável, principalmente nos grandes pomares, onde difícil se tornava a obtenção de mão-de-obra barata e abundante (GONÇALVES et al., 1958). A partir do final da década de 60 e início dos anos 70, o ensacamento praticamente deixou de ser feito, substituído pela aplicação de iscas com inseticidas para controle da mosca-das-frutas. A escassez de mão-de-obra na zona rural, o maior custo, o tamanho dos pomares e o preço final da fruta são fatores que hoje limitam esta prática a determinadas espécies e variedades. A mosca-das-frutas ataca o pêssego no início ou durante o período de inchamento do fruto, quando estiver ligeiramente mole. Um modo prático para determinar o "ponto" é cravar levemente a unha no fruto. Se ocorrer um "estalo", estará no ponto de ataque, geralmente acontecendo em torno de 20-25 dias antes da maturação (EMBRAPA, 1990). A proteção de pêssegos com saquinhos de papel é bastante eficiente contra a mosca-dasfrutas. frutos não ficam bichados e apresentam melhor aparência pela sanidade e maturação uniforme. A época mais aconselhável para a realização do ensacamento é antes do início do inchamento, isto é, quando os frutos ultrapassarem o diâmetro de, mais ou menos, 6 a 7 cm (SACHS et al., 1984). Lorenzato (1988) recomenda proteger os frutos com saquinhos de papel encerado, com dimensões de 23x16 cm, 27x20 cm e outras, logo que estejam formados, antes que ocorra o ataque da mosca. Devem ser colocados lateralmente em relação ao ramo e amarrados com arame fino n.º 24 por trás do ramo que sustenta o fruto. (SACHS et al., 1984). Shizuto (1973) recomenda usar amarrilhos de junco

fino, barbante ou fita de plástico para amarrar os saquinhos. Piza Junior e Kavati (2002), reportando-se ao ensacamento da goiaba de mesa (Psidium guajava L.), consideram que os frutos remanescentes do desbaste são protegidos por sacos de papel-manteiga, com as dimensões usuais de 15x12 cm, que podem ser adquiridos prontos. Todavia, os produtores preferem fazer sacos a partir de resmas de papel adquiridas do fabricante, pela melhor qualidade do produto empregado, que apresenta maior durabilidade e resistência. sacos são presos no pedúnculo do fruto ou no ramo que o sustenta, por meio de um fitilho vegetal ou arame fino. O ensacamento das goiabas novas (tamanho da azeitona), visa obter frutos de melhor qualidade e sem resíduos de agrotóxicos. Tem a finalidade de proteger o fruto do ataque do gorgulho, das moscas-das-frutas e da incidência direta do sol (SILVA, 1998). Em nespereira, o cacho é revestido com saquinhos de papel para impedir o ataque de aves e insetos (JORDÃO; NAKANO, 2000). Na bananicultura, utilizam-se sacos de polietileno. É uma prática usada principalmente para cultivos destinados à exportação, apresentando como vantagens: aumentar a velocidade de desenvolvimento dos frutos; evitar o ataque de pragas (abelha irapuá, tripes, etc.) e melhorar a qualidade geral da fruta pela redução dos danos relacionados com raspões, queimaduras no fruto pela fricção de folhas dobradas, escoras e processo de corte do cacho e seu manuseio. A operação consiste em se eliminar a última penca, deixandose apenas um "dedo", que permitirá a circulação normal da seiva (ALVES, 2000). Para o ensacamento da graviola são utilizados sacos plásticos translúcidos perfurados no fundo, quando os frutos tiverem cerca de 3 a 5 cm (SACRAMENTO, 2000). Em tomateiros, visando o controle das pragas dos frutos Neoleucinodes elegantalis (broca-pequena) e Helicoverpa zea (broca-grande), Jordão & Nakano (2000) testaram o efeito do ensacamento de pencas de tomates, associadas ou não a repelentes. Houve redução do ataque dessas pragas com resultados semelhantes ao nível controle químico padrão. Para a proteção dos cachos de uva contra a ação de insetos, pássaros e de moléstias criptogâmicas na fase de maturação, Marengo (2002) recomenda o uso de plásticos transparentes. Além da finalidade fitossanitária, o ensacamento serve para manter a uniformidade de coloração (RIVADULLA, 1996, citado por JORDÃO; NAKANO, 2000). Na cultura da alcachofra, Isechi et al. (1998) recomendam o ensacamento dos botões ou inflorescências (partes comestíveis) com sacos de papel para preservar a sua cor roxa característica, que assegura melhor preço no mercado. Para a proteção do marmelo, Duarte (2000) recomenda o ensacamento quando os frutos apresentarem cerca de 4 cm de diâmetro, usando-se saquinhos de papel impermeável, de 20x25 cm. Na cultura do maracujazeiro, ensacam-se os frutos para protegê-los das moscas-das-frutas e do percevejo-do-maracujá, Diactor bilineatus (JORDÃO; NAKANO, 2000). 4 resgates históricos Bettio O senhor Valter José Souza Bettio, 57 anos, produtor de frutas e hortaliças da terceira geração de uma família de horticultores, filho de Vitório Quinto Simone Bettio, da Vila Nova, e agora próximo ao Bairro Restinga, em Porto Alegre (RS), recorda que até a década de 60 praticamente toda produção de pêssego era ensacada para impedir o ataque da moscadas-frutas. 55

56 Protegiam cerca de 100.000 frutos por safra, sendo este trabalho feito, na maior parte das vezes, por mulheres que chegavam a empapelar 1.500 frutos/dia. Esta prática, segundo ele, exigia muita habilidade, tanto para ensacar, como identificar o momento certo da colheita, com a observação da cor da casca da fruta através do saco de papel. As principais variedades cultivadas e ensacadas na metade do século passado eram: 15 de Outubro; 15 de Novembro; Delicioso; Maracotão. Para ele, atualmente, o custo alto da mão-de-obra, o tamanho dos pomares e o preço final da fruta impedem a aplicação desta prática. Moresco O senhor José Moresco, 48 anos, outro produtor de família tradicional na fruticultura, recorda que seu avô utilizava o ensacamento dos frutos em todo pomar. Chegaram a ensacar 5 ha de pêssegos, além de 1 ha de pêras. Observava que, além do controle das moscas, a cor e o sabor das frutas também melhoravam e as frutas eram comercializadas ensacadas. Girelli Na região da Serra do Rio Grande do Sul, a prática do ensacamento também é antiga, como nos conta o senhor Alcides Girelli, 50 anos, de Bento Gonçalves, hoje fruticultor em Muçum. De família com tradição na fruticultura, confirma que seu pai e avô utilizavam o ensacamento de frutas. Atualmente ensaca cerca de 80.000 goiabas/ano. Engel No outro lado do Rio Caí, na localidade de Sertão Capivara, hoje município de Portão, cerca de 20 Km do porto de São Sebastião do Caí, a família de Reinaldo Engel também fazia do ensacamento uma prática comum para proteger as laranjas, chegando a ensacar 130.000 frutas/ano. Um dos descendentes, o senhor Lauro Engel, 69 anos, citricultor, juntamente com seus filhos e genros, ainda hoje continua ensacando frutos da variedade Murcott. Em 2002, foram 80.000 unidades, vendidas em novembro, ao preço médio de R$ 25,00/cx de 25 kg. Höerlle No Vale do Caí, principal região produtora de citros, o ensacamento de frutos era utilizado em quase todos os pomares de laranjas Valência e Natal, ou Natal Umbigo, desde a primeira metade do século XX. Relatam os irmãos Pedro Arno Höerlle, 75 anos, e Jorge Renato Höerlle, 55 anos, que seu pai, senhor Ernesto Höerlle, também filho de citricultores e pioneiro no cultivo da laranja Valência na região, passou a utilizar a prática do ensacamento, incentivado por um missionário evangélico, o pastor Droerte, vindo da Alemanha, que mencionava ser comum, naquele país, a utilização de sacos em maçãs, pêras e em outras frutas de clima temperado. Durante bom tempo, seu pai foi "taxado de louco" por ensacar a safra dessas duas variedades de laranjas tardias. Em 1952, quando era comum esta prática na região, ele mandou vir da Alemanha uma "máquina" para cortar os arames utilizados no ensacamento. cartuchos eram preparados geralmente à noite pelas famílias, com folhas de jornal ou revistas e colados com goma feita de polvilho. Naquela época, 100% dos produtores ensacavam seus frutos tardios e conseguiam vender grande parte das laranjas na época de Natal e até mesmo em fevereiro e março. A senhora Miriam Höerlle, de origem dinamarquesa, esposa de Jorge Höerlle e moradora na localidade de Bananal, na época município de Montenegro, trabalhou muitos anos com uma "equipe" de ensacadoras, já que esta prática era feita, na maioria das vezes, por

mulheres. Chegava a ensacar até 2.500 laranjas em 10 horas de serviço diário e cerca de 100.000 frutos/safra. Naquela época, todo transporte de laranjas era feito com barcos através dos rios Caí e Guaíba, levando de 6 a 7 horas até o cais do Mercado das Frutas, em Porto Alegre, onde esperavam os carroceiros e comerciantes para adquirirem as frutas que eram vendidas por unidade (milheiros). Para os compradores e consumidores acreditarem que os frutos não estavam "bichados", deixavam muitos frutos ensacados até o varejo. 5 tipos de sacos de papel Empresa Plastipel, de Vacaria (RS), pode-se estimar em 5.000.000 o número de sacos de papel vendidos anualmente pelas indústrias para o ensacamento de frutos no Rio Grande do Sul. Incluindo-se a produção artesanal feita de papel jornal, ainda usada nos citros, podese estimar em 6 milhões de frutos ensacados por ano. Em ordem de expressão no ensacamento de frutos, a goiaba é a mais protegida, seguida pela pêra, pêssego, tangerina Murcott, caqui, maçã, laranja Valência, uva, entre outras em menor escala. Atualmente, existem no comércio vários tipos de sacos de papel, confeccionados por diversas firmas e destinados ao ensacamento de pêssego, ameixa, goiaba, laranja, bergamota, pêra, maçã, caqui, entre outras frutas, que precisam ser protegidas das pragas. principais tipos são de papel encerado, branco ou "glassine" 40g/m2 e o papel pardo. tamanhos são variáveis conforme a espécie e variedade da fruta. Por exemplo: 35x18 cm (pêssego, ameixa, goiaba); 35x22 cm (goiaba); 40x24 cm (pêra, caqui, bergamota). 6 A dimensão da prática Conforme informações obtidas junto à A ALVES, S. A. M. Cultura da banana Disponínvel em: <http://www.cursosagricolas.hgp.ij.com.br/ tratos.htm>. Acesso em 27 de novembro de 2002. Brsil ANVISA-Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Portaria n.º 177, de 4 de março de 1999. Diário Oficial da União, Brasilia DF, 08 março 1999. Secá 1 7 Referências DUARTE, A. C. Moléstias e pragas do marmeleiro. Revista Campo,Porto Alegre n.16, Ano 2, 1966, p. 48-49. EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa de Fruteiras de Clima Temperado. Cartilha do produtor de pêssego. Pelotas, RS, 1990. 30p. (EMBRAPA-CNPFT. Documentos, 36). 57

GONÇALVES, O.; KOBER, E.; VARGAS, E. O controle da mosca das frutas em citrus. A Granja, Porto Alegre, 1958. 14 (133): 50-52. GÜNTHER, E. F. Combate biológico à mosca da fruta (Anastrepha). Correio do Povo (Suplemento Rural), Porto Alegre. 30.12.77. ISECHI, K., PAIVA, L. C., MALUF, W. R. Como plantar alcachofra. 1 ed. UFLA. 1998. (Boletim Técnico de Hortaliças, 11). JORDÃO, L. A.; NAKANO, O. Controle de pragas dos frutos do tomateiro pelo ensacamento das pencas. Anais da Sociedade Entomológica do Brasil, Piracicaba, v.29, n.4, p. 773-782, dez. 2000. LORENZATO, D. Controle integrado de moscas-das-frutas em frutíferas rosáceas. Porto Alegre, 1988. IPAGRO, Porto Alegre 31: 57-70. MARENGO, E. A. Calendário de tratos culturais em videiras.disponível em: <http://www.earengoplantas.hpg.ig.com.br/ calendario.htm.> Acesso em 27.11.2002. PIZA JUNIOR, C. T. & KAVATI, R. Goiaba de mesa (Psidium guajava L.). Disponível em:<http://www.agrocasa.com.br>. Acesso em 27.11.200. RIVADULLA, P. S. Presente y futuro del sector de la uva de mesa del Vinapó. 1996. Frut. Prof. nº 83: p35-39, 1996. ROSA, J. I. da. Ensacamento de frutos. Porto Alegre. EMATER/RS,2002. (Informativo DAT, 70). SACHS, HERTER, F. G. Et al. A cultura do pessegueiro. Pelotas, CNPFT, 1984, 156p. (Circular Técnica, 10). SACRAMENTO, C. K. do. Graviola. CEPLAC, Jornal do CEPLAC Notícias, jul. 2000. Internet: <http://www.ceplac.org.br/ graviloa.htm>. Acesso em 27.11.2002. SALLES, L. A. Principais pragas da ameixeira, pessegueiro, pereira e seu controle. Apostila, 19f. s.d. SHIZUTO, M. Fruticultura. 2.ed. Campinas: Instituto Campineiro de Ensino Agrícola, 1973, v.3, 371p. SILVA, D. N. da. A cultura da goiabeira. Vitória:EMATER-ES. 1998. 15p. TRÉS, F. Mosca das frutas. Niterói: EMATER-RIO, 1992. 7p. (Agropecuária fluminense, 10). 1 Atualmente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), visando preservar a saúde do consumidor, regulamentaram o uso de embalagens e equipamentos celulósicos destinados a entrar em con- Notas tato com alimentos e matérias-primas para alimentos, determinando que nenhum componente da embalagem poderá conter resíduos prejudiciais ao produto acondicionado e/ou à saúde humana. (Portaria ANVISA n.º 177/99; Portaria MA n.º 127/91). 58