COMUNICA<;AO COORDENADA Rosangela FRANCISCHINI (Doutoranda - Linglifstica - IEUUNICAMP) ABSTRACT: This paper has as its theoretical background certain considerations of Bakhtin (1992). The study well analyze a commercial advertisement for Bubbaloo chewing gum. The figurative language and linguistic resources make explicit the "target" audience and make transparent the image which the author has of that audience: persons who consider competition and success to be bases values. Thus, the reaction-response expected is the consumption of chewing gum as a object which leads to the realization of those values. KEY WORDS: inter-discourse - discourse formation - commercial advertisements Este trabalho teve por objeto de analise uma propaganda do chicle de bolas Bubbaloo (sem trad~iio, de acordo com 0 dicionano Michaelis) veiculada em cartazes, com as seguintes caracterfsticas: urn retangulo de 34cm de largura X 59cm de altura; na parte superior, ocupando aproximadamente 1/3 desse retilngulo, M 3 criancas - urn rapaz e duas meninas - com idade aparente de 8 anos, sendo que a crianca posicionada ao meio esta com uma bola de chicletes na boca. Abaixo, em fundo amarelo, M 0 seguinte texto, em cor preta: "REVOLTA As AULAS", ocupando, igualmente, 1/3 do cartaz. Abaixo desse texto e em letras men ores segue 0 texto: "JA QUE NAo TEM JEITO, VOLTE COM A BOLA TODA. VOLTE As AULAS COM BUBBALOO". Abaixo e posicionado de forma centralizada esta escrito Bubbaloo, ern rosa, com sombreado preto. Essa propaganda passou a ser veiculada atraves de cartazes, em estabelecirnentos comerciais (padarias, lanchonetes, superrnercados, etc...) no final do mes de julho/95. Este perfodo caracteriza, no sistema educacional brasileiro, 0 final das ferias escolares que acontecem entre os dois semestres de um mesmo ano letivo. Trata-se de urn cartaz de aproxirnadamente 34cm de largura X 59 de altura. A referida publicidade explicit a, no nfvel lingtifstico, a questao acima citada - 0 termino das ferias escolares - e, no nivel figurativo - a fotografia - a quem ela se dirige:
as crian~as, especificamente aquelas pertencentes a uma camada da popula~ilo que tern acesso a escola. Mais ainda: a sintonia perfeita observavel entre texto e desenho. em que este e aquele silo marc ados socialrnente, deixa transparecer a percep~ao e irnagern que 0 autor da propaganda tern de seu publico destinatario. Este aspecto sera retornado posteriormente. quando da anaiise especifica dos enunciados. REVOLTA As AULAS REVOLT A - REVOLTA Dois rnodos de interpreta~ao nos sao colocados diante da expressao destaque da propaganda. 0 primeiro refere-se a leitura do item lexical revolta tendo por significado repulsa e averslio. Assim, a ideia de que aulas e algo que causa repulsa e aversao esta, portanto, marcada explicitamente atraves desse item lexical. Resta-nos, portanto, indagar porque as aulas podem nao ser agradaveis aos alunos e precisar as multiplas formas que estes manifestam seu desagrado. No que diz respeito ao primeiro aspecto. observa-se que a propaganda 0 ignora. 0 mesmo nao ocorre com a questao das forrnas de manifesta~ao da revolta. Nessa propaganda, as crian~as as explicitam de varias maneiras: 1.) vestindo-se de forma bastante diferenciada, diriamos, ate, contraria as expectativas estabelecidas socialmente - crian~as vao para a escola uniformizadas; 2.) comportando-se de forma rebelde - mascando chicletes - (a propaganda propoe essa atitude), conduta essa que confronta-se com uma norma socialmente estabelecida. E certo, porem, que outras crian~as revoltam-se e express am sua insatisf~ao de formas diferenciadas daquela proposta pelo autor da propaganda. Os altos fndices de evasao e de repetencia presentes em qualquer estatistica que procure tra~ar urn perfil do aproveitamento dos alunos das escolas da rede publica de ensino atestam essa afirma~ao. A segunda leitura possivel do lexico revolta e a que nos remete a volta de novo, permitida porque, ap6s 0 mes de julho, M um 2 'retorno as aulas, sendo, 0 1 ', no inicio do ano letivo, ap6s as ferias de [mal de ano. Consideramos essa leitura menos importante que a 1", porem nao menos necessaria. Se assim 0 fosse, estariamos desconsiderando palavra revolta, 0 poder do jogo com as Palavras e, nesse caso, com a ambigiiidade da tlio caro a linguagem da propaganda. JA QUE NAO TEM JEITO, VOLTE COM A BOLA TODA. VOLTE As AULAS COM BUBBALOO. JA QUE NAO TEM JEITO '" Aqui, a condi~ao explicitada por Bakhtin de que "todo enunciado C..) responde de uma forma ou de outra, a enunciados do outro anteriores." (Bakhtin, 1992:319) e possivel ser observada atraves das marcas lingiiisticas explfcitas e do que nos e permitido pressupor a partir delas. o efeito de sentido produzido pelo enunciado como urn todo, com enfase no emprego da conjun~ao ja que e de que M uma condi~ao definitiva, em que nao M alternativas: as crian~as tern Que voltar as aulas ap6s 0 periodo estabelecido como
ferias. B-nos possivel, no entanto, pressupor a existencia de outras situacoes cujas vozes contrapoem-se a essa, ou seja, ha situacoes diferenciadas em que outros jeitos alternativos se colocam. Nesses casos, a escolha lexical, com certeza, teria que ser igualmente diferenciada. Em sintese, dizer que em uma determinada situacao "nao tern jeito", pressupoe a existencia de situacoes em que essa condicao nao e verificada. Dois aspectos, parece-nos, merecem atencao: 1.) 0 que deterrnina a obrigatoriedade da educacao formal, e, 2.) a alterniincia periodo de aulas - perfodo de fecias escolares, definida como 0 e em nossa sociedade. No que se refere ao primeiro aspecto, a Constituiciio Brasileira atribui ao Estado 0 ~ de oferecer educacao ba.~icapublica e gratuita a todos. A famnia impoe-se 0 dever de encarninhar as criancas a escola. Ocorre, porem, que 0 dever de alguem (no caso, 0 do Estado) pressupoe 0 direito de urn outro, que, na propaganda em anatise, se traduz no direito de todos a escolarizacao formal. Em que formacao ideologica surge, no entanto, essa necessidade que se imp6s ao Estado de propiciar 0 acesso a educacao, indiscrirninadamente? Segundo Cunha (1985) "houve urn momento hist6rico em que princfpios como igualdade de direitos e de oportunidades, destruiciio de privilegios hereditarios, respeito as capacidades e iniciativas individuais e educacao universal para todos constitutram-se nas diretrizes fundamentais de uma doutrina: 0 liberalismo." (p. 27). B no interior dessa doutrina que, no Brasil, a educaciio passou a ser atribufdo 0 papel de ser instrumento propiciador de igualdade entre os homens. A ordem econ6mica capitalista que (re) produz asdesigualdades sociais e a qual 0 proprio sistema educacional esta vinculado, nao e posta em questao; a burguesia nao interessa faze-lo. Em relacao ao 2 0 aspecto apontado anteriormente observamos, apenas, que e a propria instituicao escolar que, por determinacao dos orgiios competentes a que ela esta diretamente vinculada, estabelece 0 calendario escolar tal como ele se nos apresenta.... VOLTE COM A BOLA TODA Essa expressao e comumente empregada, na giria, para referir-se a situacoes em que 0 sujeito (pessoa(s), equipe(de esportes, poi ex.), partidos polfticos, OIganizacoes, etc...) encontram-se em algurna situaciio privilegiada. Besse 0 efeito de sentido produzido pela expressao em anatise, quando considerada tiio-somente como continuidade do enunciado que imediatamente a antecede. Ocorre, no entanto, que 0 enunciado subsequente VOLTE As AULAS COM BUBBALOO redefine esse efeito de sentido. A partir dele, 0 grupo nominal a bola passa a fazer referencia a bola feita com 0 chiclete Bubbaloo. Ha, ainda, uma terceira possibilidade que, de alguma forma, condensa as duas leituras propostas anteriormente, qual seja, quem faz bolas com Bubbaloo esta com a bola toda.
Ainda em relacao ao enunciado "volte com a bola toda", e necessario acrescentar as observacoes anteriores que ele reflete uma formacao ideol6gica bastante presente em nossa sociedade: e precise estar sempre em vantagem em relacao aos pares. Nessa perspectiva, 0 efeito de sentido seria: ja que seus pares e voce tern que voltar as aulas, diferencie-se deles, volte em posicao de destaque, volte fazendo bolas com Bubbaloo. Nesse aspecto e que retomamos a questlio colocada no inicio desse trabalho, qual seja, a de que 0 autor da propaganda tem, de seu publico destinatario, uma percepcao e imagem peculiares. Segundo Bakhtin, "0 enunciado, desde 0 inicio, elabora-se em funcao da eventual reacao-resposta (do destinatiirio), a qual e 0 objetivo precise de sua elaboracao." (Bakhtin, 1992: 320). No caso da propaganda em analise, a percepcao que o autor tern de seu publico e a de pessoas que, dada uma formacao ideol6gica especifica, colocam a competicao e a necessidade de ser 0 melbor como valores a serem cultivados. Sendo assim, a reacao-resposta diante dela e exatamente 0 consumo (ele pr6prio tamoom pertencente a formacao ideol6gica da sociedade capitalista) de seu objeto - 0 chiclete Bubbaloo, como objeto que propicia 0 alcance daqueles valores. Os apontamentos anteriores permitem-nos observar que essa propaganda aponta para varios aspectos que. caracteristicamente, encontram-se presentes em textos cujo objetivo Ultimo e vender urn produto (em sentido bastante amplo), persuadindo, assim, o destinatario de que esse produto e algo necessario para ele. qualquer que seja a razao dessa necessidade, uma vez que ha varia\;oes determinadas pelas caracterlsticas do produto. A escolba. por parte do locutor, dos fatores lingilisticos e figurativos que a compoem possibilitaram-nos identificar seu publico destinatario, a imagem que dele tem 0 locutor e a resposta que esse locutor espera do destinatario., As forma\;oes discursivas que tornam daros esses aspectos refletem uma formacao ideol6gica que perpassa as sociedades cuja ordem economica e capitalista: 0 consumo e a competicao como seus ingredientes e a necessidade de estar en! destaque ~omo valor a ser preservado para que 0 produto final esteja de acordo com 0 estabelecido por aquela ordem, qual seja, a sua manutencao. RESUMO: Este trabalho tem por referencial teorico bdsico as considera~{jes apontadas por Bakhtin(l992). Trata-se da analise de uma propaganda do chiclete~, Bubbaloo. Os recursos lingii(sticos e figurativos explicitam 0 publico alvo e deixam transparecer a imagem que seu autor tem desse publico: pessoas que colocam a competi~iio e a necessidade de estar em vantagem como valores bdsicos. Assim, a rea~iio-resposta esperada e 0 consumo do chicletes, como objeto que propicia 0 alcance daqueles valores. PALA VRAS-CHA VE: interdiscurso - forma\;ao discursiva - propaganda.
BARROS, Diana Luz Pessoa de e FIORIN, Jose Luiz (orgs.) (1994) - DiDlogismo. Polifcmia InlertextualidDde. Sio Paulo, EDUSP CUNHA, Luiz Antonio. (1985) - EduCaf'20 e Desenvolvimenlo Social no Brasil. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 8a. Ed. GADET, Fran~oise e HAl{, Tony. (1993) -Por uma Analise Automdlica da UNICAMP, 2a. Ed. cwdiscurso. Campinu-SP, Editora MAlNGUENEAU, Dominique (1989) -Novas Tendlncias em Analise cw Discurso. Campinu: Editora da UNICAMPlPontcs.