A INFLUÊNCIA DO MEDO NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL Joelma Rodrigues Patrícia de Andrade Schana Castilho Cercato RESUMO O medo faz parte do desenvolvimento humano e serve como recurso de defesa e proteção. Mas em excesso e sem o tratamento adequado ele pode tornar-se patológico, transformando-se em fobias. É na infância que muitos desses sentimentos são despertados e é a qualidade das experiências vividas que vai determinar o comportamento nas fases mais avançadas na vida da pessoa. Buscando contribuir com educadores, pais e interessados em uma melhor compreensão dos medos infantis realizamos uma pesquisa na Escola Municipal de Educação Infantil Pedacinho do Céu (localizada no município de São Sebastião do Caí- RS),com as turmas de Maternal e Pré I, crianças de três a cinco anos, através do método proposto pelo NEPSO (Nossa Escola Pesquisa Sua Opinião), a fim de reconhecer e validar esses temores colaborando assim com a superação e aceitação dos mesmos. Consolidando o presente artigo, buscamos aporte teórico em grandes pesquisadores do desenvolvimento infantil, como Jean Piaget, Vigotsky, Freud, entre outros. Analisando as pesquisas realizadas nos é permitido concluir que várias das hipóteses iniciais foram confirmadas e que o diálogo é ferramenta essencial para o desenvolvimento emocional infantil já que a capacidade de exteriorizar sentimentos possibilita a aproximação e a procura conjunta de soluções para os problemas. Palavras-chave: medo- criança- desenvolvimento infantil- pesquisa. Contextualizando o problema... O medo é uma das principais forças motivadoras da conduta humana. Todas as pessoas já enfrentaram situações onde experimentaram este sentimento, com maior ou menor intensidade. À medida que crescemos aumenta a complexidade das emoções, os sentimentos passam a se distinguir baseados nas relações e situações que forem vivenciadas. Muitos dos medos que levamos para a vida adulta têm origem em temores que surgiram na infância. Durante seu desenvolvimento as crianças enfrentam várias situações onde vêem confrontadas com mudanças e conflitos. É comum que tenham receio, dúvidas
e angústias. Daí torna-se indispensável à mediação dos adultos de seu convívio, fornecendo-lhe o suporte e o conforto necessários para superarem os desafios que surgirem. Em ambiente escolar torna-se fundamental a preocupação e verificação dos medos infantis, pois o educador deve sentir-se preparado para que possa intervir de forma positiva e sutil, auxiliando a criança a lidar mais naturalmente com seus temores. Segundo MLYNARDZ (2008), dependendo das experiências vividas de suas relações familiares e outras variáveis a criança poderá apresentar uma evolução patológica do medo, caracterizada por perturbações do comportamento, que podem se manifesta em timidez e vergonha, até crises de ansiedade ou fobias. Considerando a necessidade e relevância de explorar este tema, foi definida a seguinte questão: Do que você tem medo?. Foram a partir daí oportunizadas reflexões e investigações promovendo o uso da pesquisa de opinião como motivadora do aprendizado, através da metodologia do NEPSO (Nossa Escola Pesquisa Sua Opinião). A função primordial da escola seria, então, a de auxiliar a criança a compreender melhor o mundo por meio da pesquisa, do debate e da solução de problemas, devendo ocorrer uma constante inter-relação entre as atividades escolares e as necessidades e os interesses das crianças e das comunidades. (Maria Carmem Silveira Barbosa e Maria da Graça Souza Horn, Projetos Pedagógicos na Educação Infantil, 2008, p.17) As análises das entrevistas realizadas e a exploração do tema Medo no Desenvolvimento Infantil tiveram como principais objetivos reconhecer os medos infantis e pensar sobre sua função facilitando o desenvolvimento integral da criança, discutir e refletir sobre noções de cuidado e zelo com o próprio corpo, identificando situações onde o medo é um fator de proteção e auto-preservação, além de perceber o medo como emoção natural, já que todos o enfrentam não importando a idade. Realizando conversações foram levantadas diversas hipóteses sobre os medos infantis mais comuns, entre eles os mais citados foram os medos de animais, de seres sobrenaturais e ferimentos. Entre os medos de pessoas adultas nomeadas medos de animais, da solidão, da violência.
Através das entrevistas e das intervenções proporcionadas ao longo do projeto buscamos aprofundar a compreensão sobre os próprios temores e inquietações visando encontrar melhores formas de lidar com os mesmos. 1 Primeiros Passos: observando e descobrindo um tema O assunto escolhido surgiu a partir de observações na própria rotina das crianças das turmas de Maternal e Pré I, entre 3 e 5 anos, quando as brincadeiras muitas vezes acontecem através do jogo simbólico, e são nessas situações que percebem-se diversas emoções, incluindo medo e ansiedade. Assim, estabelecendo critérios para distinguir uma brincadeira de outras formas de atividade, concluímos que ao brincar a criança cria uma situação imaginária. Esta não é uma idéia nova, no sentido de que as situações imaginárias no brincar sempre foram reconhecidas; mas eram vistas, anteriormente, apenas como um exemplo de atividades do brincar. A situação imaginária não era considerada a característica definidora do brincar em geral, mas era tratada como um atributo de subcategorias específicas do brincar. (VIGOTSKY,1978,p.93-94) 2 Iniciando o processo de pesquisa Os medos na infância nem sempre são previsíveis se levarmos em conta as diferenças individuais. O mesmo estímulo pode ser ameaçador para uma criança e ser indiferente para outra. Por isso foram realizadas diversas atividades para explorar o tema, oportunizando rodas de conversa, contação de histórias, apresentação do baú do Medo onde foram colocados objetos que representam algumas das figuras dos medos anteriormente verificados. Brincando de Repórter Durante as conversações em sala de aula surgiram várias curiosidades relacionadas ao tema Medo. Então selecionamos as principais para elaborar um questionário, onde cada um responderia do que tem medo, o que faz quando sente medo e quem a ajuda quando está com medo.
Analisando as respostas percebemos que as hipóteses foram confirmadas e acabaram se enquadrando em estudos realizados anteriormente sobre o medo infantil conforme a faixa etária. Também os adultos têm medo e muitos mantêm apreensões que tem origem nos seus temores da infância. Assim as crianças foram convidadas a refletir sobre o medo das pessoas adultas. Será que o pai e a mãe também têm medo? Do quê será que eles têm medo? Do que será que tinham medo quando eram do tamanho de vocês? Elaboramos questionários para serem respondidos por um adulto da família de cada criança da escola. Utilizamos pra isso as dúvidas das próprias crianças além de proporcionar uma reflexão sobre se é correto assustar os filhos. Crianças abaixo de seis ou sete anos não deveriam ser amedrontadas por conselhos para não confiar em estranhos, ou serem advertidas de perigo e abuso. Entretanto a orientação costrutiva positiva- Sempre segure a mão da mamãe no shopping. -pode ser útil tão logo as crianças sejam suficientemente verbais para entender as razões da preocupação. Essa orientação deveria ser gradualmente combinada com a capacidade da criança de discutir essas questões. Na idade adequada, essas ameaças precisam ser ensinadas gradualmente e com reafirmação tranqüila. (Brazelton e Greenspan, As Necessidades Essenciais das Crianças, 2002, p.86) Depois de familiarizados com o assunto e com as perguntas dos questionários foi proposto aos próprios alunos que entrevistassem crianças da comunidade. O questionário era similar ao respondido pelos alunos, porém com mais opções de resposta. As perguntas foram feitas oralmente pelo repórter e o entrevistado assinalava a resposta escolhida. 4 Comparando Respostas e Fazendo Descobertas Utilizando os dados coletados nas entrevistas realizadas com os alunos, partimos para a análise e comparação das respostas obtidas. Os Parâmetros Curriculares Nacionais ressaltam o valor formativo que a matemática deve ter no âmbito escolar, sobrepondo-se à mera memorização de fórmulas e vinculando-se ao domínio do saber fazer matemática e saber pensar matemática. (LIMA, Ana Lúcia D Império; ARAÚJO, Marilse. A pesquisa que ensina. São Paulo: IBOPE,2006).
Tivemos oportunidade de rever as entrevistas, compartilhar respostas, promover comparações e interpretar os resultados. A partir daí construímos gráficos com a participação de todos, que quando concluídos foram analisados coletivamente. 1. 2. 3.
Após analisarmos as respostas concluímos que, no gráfico 1, que apontava respostas a questão Do que você tem medo?, nove alunos responderam que tinham medo de animais (cobras e aranhas), oito responderam que tinham medo de seres sobrenaturais (bruxas e fantasmas) e três responderam que tinham medo de ferimentos (injeção e cortes). Já no gráfico 2, apresentamos a questão O que você faz quando sente medo?, um aluno respondeu que corre, seis que gritam e treze que choram. No gráfico 3, mostra as resposta da pergunta Quem te ajuda quando você sente medo?, onze alunos responderam a mãe, sete o pai e dois responderam a prô. As hipóteses inicialmente apontadas, tanto para os medos infantis quanto para os medos dos adultos foram em sua maioria confirmadas, e a partir de uma análise mais profunda e individualizada percebemos que de adéquam a resultados de estudos sobre a evolução do medo durante o desenvolvimento humano. Do nascimento aos 18 meses os bebês têm medo de objetos reais, ruídos inesperados, situações ou pessoas estranhas, quedas ou perigos de quedas, luzes fortes. Dos três aos cinco anos as crianças podem se tornar vítimas de sua própria imaginação. Elas já aprenderam que algumas coisas poderão realmente machucá-las, mas ainda não têm certeza sobre quais são. Conseqüentemente, assustam-se com perigos sobrenaturais e imaginários, monstros e fantasmas. Nessa idade aumenta muito o medo da escuridão. (Mlynarz, 2008). Com base nos resultados das pesquisas realizadas com os alunos, puderam ser desenvolvidos diversos trabalhos direcionados a exploração do assunto medo. Uma colaboração especial Através de várias atividades desenvolvidas ao decorrer do período em que focamos o tema Medo, buscamos explorar o assunto de forma lúdica, promovendo o diálogo, instigando a curiosidade e lançando questionamentos, procurando sempre colaborar no desenvolvimento emocional saudável, na construção da autonomia e identidade pessoal. A partir dos resultados obtidos com as pesquisas realizadas com as crianças e adultos, foi possível identificar certas inquietações decorrentes especialmente da
realidade social em que vivemos nos dias atuais, onde nos vemos expostos a situações que podem trazer ameaças a integridade física e segurança das pessoas. Surgiu então uma necessidade que nos trouxe a reflexão: Como poderíamos colaborar com os pais para que eles conseguissem ajudar seus filhos a administrar os medos infantis? Contamos na etapa final de nosso trabalho com a colaboração muito significativa da psicóloga Sandra Maria Schirmer Ferrão que realizou uma palestra para as famílias na escola, esclarecendo dúvidas, oportunizando debate e ainda reforçando a necessidade de uma postura segura e tranqüila por parte dos cuidadores da criança que é assegurada por uma boa conduta e uma boa conversa. Dessa forma os adultos aprendem a lidar com as defesas da criança e proporcionála maior estabilidade em relações pessoais. A identidade, o autoconceito e as atitudes de uma pessoa são questões individuais, fazem parte do eu interno da criança. Outro aspecto central do eu interno é a emoção. Os termos sentimento, emoção e afeto são todos usados para descrever um domínio da experiência humana que é subjetivamente claro e vívido para a maioria dos adultos. No entanto, os psicólogos não acham a emoção fácil de entender. As conversas diárias das crianças nos deixam claro que a alegria, a tristeza, o medo e muito as outras emoções são centrais para as experiências e suas relações com os outros. (Mussen, Conger, Huston, Desenvolvimento e Personalidade da Criança, 2001, p.367). Apesar de poucas famílias terem comparecido a palestra, percebemos um efeito positivo, já que além de conversar sobre os medos das crianças, as mães também puderam expor seus próprios medos. Considerações Finais Analisando a realidade encontrada por meio da pesquisa de opinião pudemos constatar a importância de dar atenção devida ao desenvolvimento emocional de nossas crianças, já que é na infância que se constroem as bases que formarão o indivíduo e sua personalidade. Tanto educadores, como pais e cuidadores devem estar preparados para lidar com as diversas situações conflitantes que as crianças enfrentarão ao decorrer de seu crescimento e que muitas vezes podem ocasionar-lhe angústias e preocupações.
Os medos que não são tratados de forma adequada podem se transformar em fobias e distúrbios, e é necessário ter um olhar sensível frente às atitudes, brincadeiras, desenhos e conversas das crianças procurando reconhecer seus reais temores pois talvez seja esse o melhor caminho para enfrentá-los e tentar resolvêlos. É importante reafirmar também que o medo funciona como um sinalizador de perigo e temos o papel de ajudar as crianças a reconhecer situações de risco e determinar quando realmente devem ter medo. É preciso ensinar a criança a avaliar a realidade fornecendo-lhe informações necessárias com segurança e autoridade. Durante momentos estressantes é essencial fornecer apoio e conforto. Atitudes como essas desenvolvem gradativamente a confiança e fazem com que as crianças sintam-se mais seguras ao deparar-se com situações ameaçadoras. Conclui-se também aqui que é desafiante, mas motivador desenvolver uma proposta de construção coletiva do conhecimento, articulando vivências, experiências e interesses das crianças e da comunidade em que estão inseridas. O método de pesquisa de opinião do NEPSO proporciona essa interação e aproximação da realidade vivenciada. Como foi a primeira vez que participamos da proposta NEPSO, tivemos inseguranças e encontramos algumas dificuldades iniciais, especialmente por tratarse de um trabalho com crianças pequenas que tem várias curiosidades e interesses, além disso, precisam ter supridas algumas necessidades para que seu desenvolvimento seja completo. Nosso trabalho foi direcionado a área da Educação Infantil, tornando-se necessário elaborar formas diversificadas de entrevistas e gráficos (ilustrados), já que as crianças ainda não são alfabetizadas. Foi desafiador mais percebemos que nossas expectativas foram superadas, pois a grande maioria compreendeu e demonstrou interesse na realização das atividades propostas. Nas oportunidades que tivemos, expomos o andamento do projeto desenvolvido e obtivemos retorno das famílias que participaram das entrevistas e atividades relacionadas. REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO
BARBOSA, Maria Carmem Silveira; HORN, Maria da Graça Souza. Projetos Pedagógicos na Educação Infantil. Editora, 2008 BRAZELTON; GREENSPAN. As necessidades essenciais das crianças. 2002. HOLANDA, Aurélio Buarque de. Minidicionário da Língua Portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. LIMA, Ana Lúcia D Império; ARAÙJO, Marilse. A pesquisa que ensina. São Paulo: IBOPE, 2006. MLYNARZ, Mônica. Medos infantis. Disponível em http://www.alobebe.com.br/site/revista/reportagem.asp?texto=115. Acesso em 25/04/12. MONTENEGRO, Fábio; RIBEIRO, Vera Masagão. Nossa escola pesquisa sua opinião: manual do professor. São Paulo: Global, 2002. MUSSEN; CONGER; HUSTON. Desenvolvimento e Personalidade da Criança. 2001. PAPALIA, Diane E. & OLDS, Sally Wendkos. Desenvolvimento Humano. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2000. STECANELA, Nilda. Roteiro para elaboração de artigo. In: Anais do X Seminário Escola e pesquisa: um encontro possível. Caxias do Sul, 2010. VIGOTSKY,