Acórdão nº 189/2010 Recurso VOL/CRF-309/2009 RECORRENTE: MARNORTE LTDA. RECORRIDA: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS INTERESSADO: SEBASTIÃO FERREIRA DA SILVA NETO PREPARADORA: COLETORIA ESTADUAL DE CABEDELO AUTUANTE: CLAUZENILDE CARDOSO DE OLIVEIRA RELATOR: CONS. JOSÉ DE ASSIS LIMA RECURSO VOLUNTÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO. SUPRIMENTO IRREGULAR DA CONTA CAIXA COMPROVAÇÃO - PROVAS MATERIAIS. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE COM RETIFICAÇÃO DOS VALORES EXIGIDOS A TÍTULO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO. REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA. Empréstimos de terceiros, desprovidos de quaisquer formalidades e de origem não comprovada, escriturados como se de sócio fossem, bem como a emissão de cheques próprios em nome de terceiros, escriturados a débito na Conta Caixa sem o correspondente lançamento na Conta Bancos, com o fito de validar pagamentos efetuados, comprovam a prática da infração apontada na peça acusatória. Entretanto, equívocos cometidos em relação às datas dos fatos geradores, bases de cálculo e ICMS devidos conduziram à retificação do valor do crédito tributário a ser exigido. Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc... A C O R D A M os membros deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade de acordo com o voto do relator pelo recebimento do Recurso de Voluntário, por regular e tempestivo, e no mérito pelo seu PARCIAL PROVIMENTO, para reformar a sentença prolatada na instância singular e julgar PARCIALMENTE PROCEDENTE o Auto de Infração de Estabelecimento nº. 93300008.09.00000386/2006-90, lavrado em 29 de junho de 2006 contra a empresa MARNORTE LTDA., empresa inscrita no Cadastro de Contribuintes do ICMS-PB sob nº 16.131.924-6, devidamente qualificada nos autos, e tornar exigível o crédito tributário de R$ 28.248,33, sendo que R$ 9.416,11 de ICMS por infringência aos arts. 158, I; 160, I, e 646 do Regulamento do ICMS-PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/1997, e R$ 18.832,22 de multa por infração, com fulcro no art. 82, V, f, da Lei nº 6.379/1996. Em tempo, CANCELO do crédito tributário exigido na exordial, por indevido, o valor de R$ 18.660,39, sendo R$ 6.220,13 de ICMS e R$ 12.440,26 de multa por infração.
Continuação do Acórdão n.º 189/2010 2 Desobrigado do Recurso Hierárquico, na expressão do artigo 730, 1, inciso II, do RICMS, aprovado pelo Decreto nº 18.930/97. P.R.I. Sala das Sessões do Conselho de Recursos Fiscais 13 de agosto de 2010. JOSÉ DE ASSIS LIMA CONS. RELATOR R E L A T Ó R I O Sob análise, o Recurso Voluntário impetrado pela Marnorte Ltda., empresa inscrita no Cadastro de Contribuintes do ICMS-PB sob nº 16.131.924-6, nos termos do art. 125 da Lei nº 6.379/1996, contra a decisão prolatada pela Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais, que considerou procedente o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00000386/2006-90, lavrado em 29 de junho de 2006. A peça acusatória afirma que a empresa acima citada efetuou suprimento irregular de Caixa, com repercussão em diversos meses dos exercícios de 2001 a 2004, ferindo com a conduta irregular as disposições contidas nos arts. 158, I; 160, I e 646 do Regulamento do ICMS- PB, tendo sido proposta pela autuante a penalidade inscrita no art. 82, V, f, da Lei nº 6.379/1996 (fls. 7 e 8). Por conseguinte, está sendo exigido da acusada o crédito tributário de R$ 46.908,72, sendo R$ 15.636,24 de ICMS e R$ 31.272,48 de multa por infração. A autuada tomou ciência da acusação na própria peça (fl. 08), dela tendo reclamado tempestivamente, onde alega, em síntese: 1) que a multa proposta tem natureza confiscatória; 2) que não houve suprimento irregular da Conta Caixa, uma vez que a autuante desconsiderou as entradas provenientes de cheques de sua conta junto ao Banco do Brasil S/A e de empréstimos efetuados por um de seus sócios; 3) que os lançamentos de entradas de receitas no Livro Caixa encontram-se revestidos das formalidades legais;
Continuação do Acórdão n.º 189/2010 3 4) que diversos cheques foram nominalmente emitidos em favor de uma das sócias, por exigência do Banco Central do Brasil; 5) que sua atividade principal é pesca de peixes e só esporadicamente desenvolve atividades de preparação de pescado e fabricação de conservas de peixes, crustáceos e moluscos; 6) que suas operações internas com pescados, in natura ou resfriado, são isentas, nos termos do art. 6º, I, do Regulamento do ICMS-PB, quer as mesmas se dêem com ou sem emissão de nota fiscal; 7) que qualquer irregularidade na Conta caixa só poderia advir da venda de pescado no mercado interno sem emissão de documentos fiscais, o que redundaria em descumprimento de obrigação acessória, já que operações similares àquela são isentas; 8) que os empréstimos tomados junto a um dos sócios estão devidamente formalizados em contratos de mútuo com firma reconhecida, cujos recursos advieram de rendimentos de outra empresa que o aludido sócio faz parte, os quais foram declarados à Receita Federal da Noruega. Pede, ao término, a improcedência do feito (fls. 504 a 538). Replica a fazendária os argumentos apresentados pelo representante da autuada, afirmando: a) que se constatou a ocorrência de lançamento a débito na Conta Caixa de cheques emitidos para terceiros e a compensação efetuada na Conta Bancos sem o respectivo lançamento a crédito na mesma conta para registro das despesas efetuadas; b) que todos os contribuintes são obrigados a emitir notas fiscais, inclusive os que operam com mercadorias isentas, ainda mais a autuada, cuja atividade principal é de preparação e conservação de pescado e fabricação de conservas de peixes, crustáceos e moluscos; c) que os empréstimos foram contratados junto a Brynjulv Haga, pessoa estranha ao quadro societário da autuada, não tendo sido apresentados os contratos nem os respectivos depósitos bancários que possam vir a comprovar a existência dos mesmos; d) que a multa de 200% está prevista na no art. 82, V, f, da Lei nº 6.379/1996; e) que a autuada foi notificada para apresentar cópias dos cheques, contratos de mútuos e depósitos bancários sem, no entanto, haver encaminhado à fiscalização tal documentação (fl. 558). Encerra pedindo a manutenção do feito fiscal (fls. 559 a 562). Consta dos autos a informação de que a empresa autuada não é reincidente na prática de que está sendo acusada (fl. 539). Conclusos (fl. 564), foram os autos remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais GEJUP, onde foram distribuídos ao nobre julgador João Lincoln Diniz Borges que, após análise, concluiu pela procedência do feito (fls. 85 a 88), resumindo-a na seguinte ementa: OMISSÃO DE VENDAS Suprimento irregular de caixa Receita de origem não comprovada Contrato de mútuo inexistente. Comprova-se, nos autos, a ocorrência de suprimento de recursos lançados na escrituração de caixa da autuada, advinda de
Continuação do Acórdão n.º 189/2010 4 receitas extracaixa originária de cheques compensados a favor de terceiros, além da constatação de empréstimo sem lastro contratual, materializando, portanto, a existência de receitas marginais derivadas de vendas de mercadorias sem emissão de documentos fiscais, na forma prevista pelo artigo 646 do RICMS-PB. AUTO DE INFRAÇÃO PROCEDENTE. Procurou a repartição preparadora cientificar a autuada da decisão preliminar através de Aviso de Recebimento (fls. 577, 614 e 614-A), sem, no entanto, obter êxito. Entretanto, impetrou o representante legal da autuada com Recurso Voluntário tempestivo, no qual argumenta: a) que a autuante fundamentou sua acusação a partir de folhas dispersas de um rascunho do Livro Caixa; b) que falta credibilidade às provas apensadas aos autos pela fazendária, já que as cópias foram extraídas de um Livro Caixa não revestido de formalidades legais extrínsecas; c) que nunca manteve escrita contábil regular e jamais escriturou qualquer livro contábil na Junta Comercial do Estado da Paraíba; d) que diversos lançamentos contidos no Livro Caixa não atendem às formalidades intrínsecas. Pede, ao término, a nulidade ou a improcedência da acusação (fls. 578 a 613). Chamado a se pronunciar sob a forma de contra-arrazoado, a autuante concorda com a decisão prolatada em primeira instância, ao tempo em que rechaça os argumentos da recorrente, afirmando: a) que, por ocasião de sua defesa, a autuada não só ratificou que os Livros Razão e Caixa atendiam às formalidades legais como fez juntada de cópias dos mesmos, vindo agora aos autos querendo desconstituí-los; b) que a acusação deriva da ocorrência de lançamentos a débito na Conta Caixa provenientes de cheques emitidos para terceiros pela autuada, com compensação bancária e registros na Conta Bancos sem, no entanto, o respectivo lançamento de crédito na Conta Caixa das despesas realizadas, legitimando os pagamentos efetuados pela emissão dos aludidos cheques compensados; c) que o fato da empresa ser optante do regime de apuração por lucro presumido não a desobriga de escriturar o Livro Caixa, nos termos do art. 643, II, 3º, do Regulamento do ICMS- PB; d) que os livros apresentados continham todas as formalidades, intrínsecas e extrínsecas, estando assinados pelo contador e procurador legal da autuada. 616 a 620). Requer, ao término, a manutenção da decisão prolatada em primeira instância (fls. Eis o relatório. V O T O
Continuação do Acórdão n.º 189/2010 5 O presente contencioso traz a acusação de suprimento irregular de Caixa como fato jurídico a ser analisado. Informa a autuante que a Marnorte Ltda., contrariando dispositivos legais, supriu irregularmente o Caixa com recursos advindos de omissões de saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto devido. A acusação foi formulada tomando como elementos de prova os lançamentos contidos no Livro Razão e os extratos bancários da autuada. Observou a autuante, ainda, os lançamentos efetuados pela recorrente nos Livros de Apuração do ICMS e Registro de Inventário, além dos dados informados pela mesma à Secretaria de Estado da Receita, contidos em fichas econômico-financeiras. Constatou a fazendária que a autuada fez uso de artifícios contábeis como prover o Caixa com empréstimos de mútuo, desprovidos de quaisquer contratos ou formalidades e sem comprovação da origem dos recursos, concedido por pessoa estranha à sociedade, mas apontada como se sócio da mesma fosse, bem como lançar a débito, na citada Conta Caixa, valores provenientes de cheques emitidos pela própria empresa em favor de terceiros e compensados de sua Conta Bancos, sem os necessários lançamentos de contra-partidas, procurando, desse modo, encobrir a falta de recursos e legitimar despesas realizadas. Identificadas as situações fáticas infringentes, elaborou a fazendária Levantamentos da Conta Caixa, expostos às fls. 10 a 13, bem como Demonstrativos de Cheques Compensados e outros Documentos Lançados a Débito de Caixa, estes últimos apensos às fls. 14 a 17, onde se evidenciam a prática de suprimento irregular de Caixa. Restou evidenciado, à vista das provas colecionadas aos autos: a) que os recursos supostamente obtidos pela autuada, a titulo de empréstimos de sócio, não advieram de pessoa ligada à sociedade, bem como que os mesmos estavam fragilmente lastreados em meros recibos expedidos pela própria empresa (fls. 346 a 349), desprovidos de outros elementos essenciais que os legitimassem como contratos de mútuos registrados em cartório de título e documentos, declarações de rendimentos junto à Receita Federal, cópias de cheques e extratos bancários comprovando depósitos em contas correntes. b) que os extratos bancários (fls. 350 a 420) e os lançamentos efetuados no Livro Razão (fls 23 a 345-A) evidenciam que a empresa emitiu diversos cheques de sua Conta Corrente em favor de terceiros, cujos valores foram, em seguida, lançados a débito na Conta Caixa, com o intuito de dotá-la de valores capazes de tornar válidos os pagamentos então efetuados, sem, no entanto, lançar os referidos cheques a crédito naquela Conta Bancos, camuflando, assim, saídas pretéritas de mercadorias tributáveis sem o pagamento do imposto. Infrações dessa ordem são relativamente comuns e ocorrem, predominantemente, quando a empresa encontra-se sem suporte de numerário no Caixa, o que a leva a fazer uso de artifícios fiscal-contábeis, como suprir irregularmente o Caixa, qual seja, fazer aporte de recursos sem a necessária comprovação de origem. É importante salientar que tal acusação trata-se de uma presunção legal, que encontra substrato permissivo no 8º do art. 3º da Lei nº 6.379/1996, espelhado no art. 646 do Regulamento do ICMS-PB, a saber:
Continuação do Acórdão n.º 189/2010 6 Art. 3º.... 8º O fato de a escrituração indicar insuficiência de caixa, suprimentos a caixa não comprovados ou a manutenção no passivo, de obrigações já pagas ou inexistentes, bem como a ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas ou de declarações de vendas pelo contribuinte em valores inferiores às informações fornecidas por instituições financeiras e administradoras de cartões de crédito, autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção. Juntou a autuante, pois, elementos de prova suficientemente fortes de que a recorrente cometeu o ilícito tributário. Ademais, não trouxe a autuada argumentos nem fez juntada de provas documentais convincentes, que fossem capazes de apontar equívocos cometidos pela fiscalização e, assim, refutar a acusação fiscal. Quando lhe foi oferecida oportunidade de contradizer a decisão preliminar, procurou a autuada demonstrar que era contabilmente desorganizada e desqualificados eram os dados lançados no seu Livro Razão. Entretanto, tal argumento se mostrou incongruente, uma vez que, por ocasião da defesa, autuada havia feito uso do mesmo Livro e dos dados ali contidos para desmerecer a acusação. É importante destacar que, mesmo diante da desnecessidade jurídica, por se tratar de um livro auxiliar e facultativo para as empresas optantes do regime de lucro presumido, a análise das cópias do Livro Razão, juntadas aos autos pela fazendária, demonstram que não somente foram atendidas as formalidades extrínsecas como também as intrínsecas, o que valida os lançamentos que tomem por fundamento os dados contidos no mesmo. Por outro lado, ao confrontarmos os lançamentos do Livro Razão, os recibos dos supostos empréstimos a título de mútuo, os extratos bancários, bem como o Demonstrativo dos Cheques Compensados e Outros Documentos Lançados a Débito de Caixa, este elaborado pela fazendária, constatamos que a mesma equivocou-se ao lançar as datas dos fatos geradores e os valores tomados como bases de cálculo, o que nos levou a retificarmos esses aspectos da acusação, de modo a retratar com fidelidade as situações fáticas tidas por infringentes e oferecer o caráter de certeza e liquidez ao crédito tributário exigido. Assim sendo, o crédito tributário a ser exigido da acusada será como demonstrado no quadro abaixo: CÁLCULO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO PENALIDADE FATO GERADOR TRIBUTO PROPOSTA BASE DE BASE DE VALOR INFRAÇÃO INÍCIO FIM CÁLCULO ALIQ VALOR CÁLCULO % VALOR TOTAL SUPRIMENTO 01/07/2001 31/07/2001 22.932,20 17% 3.898,47 3.898,47 200% 7.796,94 11.695,41 IRREGULAR 01/08/2001 31/08/2001 10.277,64 17% 1.747,20 1.747,20 200% 3.494,40 5.241,60
Continuação do Acórdão n.º 189/2010 7 DE CAIXA 01/09/2001 30/09/2001 10.399,00 17% 1.767,83 1.767,83 200% 3.535,66 5.303,49 01/10/2001 31/10/2001 4.850,00 17% 824,50 824,50 200% 1.649,00 2.473,50 01/11/2001 30/11/2001 717,94 17% 122,05 122,05 200% 244,10 366,15 01/12/2001 31/12/2001 5.879,34 17% 999,48 999,48 200% 1.998,96 2.998,44 01/08/2002 31/08/2002 332,85 17% 56,58 56,58 200% 113,16 169,74 TOTAL 9.416,11 9.416,11 18.832,22 28.248,33 É importante ressaltar que todos os elementos de prova citados acima foram apresentados pela recorrente e colecionados pela representante fazendária, estando apensados à peça vestibular desde o nascedouro da acusação. Com estas considerações, V O T O pelo recebimento do Recurso de Voluntário, por regular e tempestivo, e no mérito pelo seu PARCIAL PROVIMENTO, para reformar a sentença prolatada na instância singular e julgar PARCIALMENTE PROCEDENTE o Auto de Infração de Estabelecimento nº. 93300008.09.00000386/2006-90, lavrado em 29 de junho de 2006 contra a empresa MARNORTE LTDA., empresa inscrita no Cadastro de Contribuintes do ICMS-PB sob nº 16.131.924-6, devidamente qualificada nos autos, e tornar exigível o crédito tributário de R$ 28.248,33, sendo que R$ 9.416,11 de ICMS por infringência aos arts. 158, I; 160, I, e 646 do Regulamento do ICMS- PB, aprovado pelo Decreto nº 18.930/1997, e R$ 18.832,22 de multa por infração, com fulcro no art. 82, V, f, da Lei nº 6.379/1996. Em tempo, CANCELO do crédito tributário exigido na exordial, por indevido, o valor de R$ 18.660,39, sendo R$ 6.220,13 de ICMS e R$ 12.440,26 de multa por infração. Sala das Sessões do Conselho de Recursos Fiscais, em 13 de agosto de 2010. JOSÉ DE ASSIS LIMA CONSELHEIRO RELATOR