Ciberespaço e cibercultura: um novo tipo de sociedade na contemporaneidade 1. Karol Almeida da Silva ABREU 2 Universidade Federal de Goiás, Goiás, GO

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Transcrição:

Ciberespaço e cibercultura: um novo tipo de sociedade na contemporaneidade 1 Karol Almeida da Silva ABREU 2 Universidade Federal de Goiás, Goiás, GO RESUMO O impacto das tecnologias da informação e comunicação é visível na sociedade contemporânea, isto devido ao crescimento do uso dessas tecnologias em todos os setores, tanto de forma coletiva quanto individual. Essa nova relação com as tecnologias de rede está emergindo um novo tipo de sociedade, através do ciberespaço. A proposta do presente texto é apontar a visão de Lévy e Castells, grandes autores do ciberespaço e da cibercultura e apresentar abordagens complementares de outros autores que discutem sobre o tema, além de refletir como o ciberespaço e a cibercultura está construindo um novo tipo de sociedade. PALAVRAS-CHAVE: Tecnologias. Sociedade contemporânea. Ciberespaço. Cibercultura. 1 INTRODUÇÃO Diante do contexto da sociedade globalizada e do crescimento constante das tecnologias da informação e comunicação, novos desafios estão surgindo para a sociedade contemporânea. A globalização rompeu as barreiras territoriais nas questões comerciais, integrando os mercados nacional e internacional, além de ampliar a comunicação e a velocidade das informações. Na sociedade atual as relações sociais não se restringem ao universo local, passando a serem conexões globais. O grande fenômeno da globalização deu ênfase à noção de desterritorialização, visto que, não existe mais uma referência geográfica dos produtos fabricados pelas multinacionais. Essa mesma noção pode ser vista em relação ao trabalhador que passa a atuar na modalidade do teletrabalho, transformando o espaço de sua casa em um espaço público e vice-versa (LÉVY, 1996). Desde as últimas décadas do século XX, as tecnologias da informação e comunicação (TICs) estão muito presentes no mundo. O modo de relacionamento entre as pessoas, a economia, a política, a arte, tudo está envolvido nos processos comunicacionais em que está presentes o uso de tecnologias. É importante destacar 1 Trabalho apresentado no DT 5 Comunicação Multimídia do XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste, realizado de 12 a 14 de junho de 2017. 2 Mestranda do Curso de Comunicação da UFG-GO, email: karolalmeidasilva@gmail.com. 1

ainda que estamos em contato constante com as novas tecnologias, através do uso crescente dos smartphones, computadores, tablets e outros produtos que estão cada vez mais sofisticados e com múltiplas funções. Vivemos na era da informação, que se constitui de um novo momento histórico no qual a base das interações e relacionamentos ocorre através da informação e da sua capacidade de processamento. Este fenômeno é denominado por Castells (2008) como Sociedade em Rede, que se caracteriza por um novo espaço de apropriação da Internet trazendo mudanças nos movimentos culturais e ao sistema capitalista. Diante desse contexto é possível a discutir as transformações ocorridas por essas tecnologias à sociedade, tanto no sentido individual quanto coletivo. Para isso, o artigo apresenta as principais discussões propostas por Lévy e Castells, além de outros teóricos que abordam sobre o ciberespaço e cibercultura. E pretende ainda uma reflexão teórica que envolve um novo tipo de sociedade que está emergindo na contemporaneidade. Este artigo está dividido em três partes, sendo o primeiro tópico uma contextualização sobre Lévy e Castells, incluindo aspectos relacionados à tecnologia, informática e à Internet. O segundo tópico trata sobre o ciberespaço e a cibercultura através do diálogo com os autores Pierre Lévy e Castells e outros. No terceiro e último tópico apresenta-se as considerações finais. 2 CONTEXTUALIZAÇÃO O pensador francês Pierre Lévy, é um dos pioneiros estudiosos sobre a temática do ciberespaço. Os trabalhos de Lévy trazem uma perspectiva antropológica da dimensão social do ciberespaço. Manual Castells é um dos pensadores de grande influência, seus escritos possuem uma abordagem marxista da sociedade capitalista e é considerado o principal analista da era da informação e das sociedades conectadas em rede, seu foco de investigação é sobre os efeitos da informação sobre e economia, a cultura e a sociedade em geral. Desde o surgimento das primeiras sociedades até as complexas cidades pós-industriais, o homem inventou o fogo cultivou a terra, domesticou animais, construiu cidades, dominou a energia, implementou indústrias, conquistou o espaço cósmico, viajou aos confins da matéria e do espaço-tempo. Diante disso, a tecnologia ganhou significações e representações diversas, em um momento que vaivém com a vida social. Em alguns momentos, esta é dominada, 2

controlada, racionalizada pelas atividades científico-tecnológicas; em outras, é a tecnociência que deve negociar e aceitar os ditames da sociedade (LEMOS, 2002, p. 27). As tecnologias, diferentemente de como é conhecida no senso comum, não se restringe somente aos recursos tecnológicos, pois são tão antigas quanto à espécie humana. A invenção humana, em todos os tempos, deu origem às várias tecnologias. De acordo com suas origens na Grécia Antiga, a tecnologia é o conhecimento científico (teoria) transformado em técnica (habilidade), que irá possibilitar a produção de novos conhecimentos científicos. Diante desse contexto, as tecnologias não se resumem apenas a instrumentos físicos, mas também a forma como o homem se comunica e o modo como este se relaciona com o mundo. A abordagem deste artigo será do uso da tecnologia da informação e comunicação no sentido da informática e de redes, que possibilitam a transmissão de informação, dados e a comunicação. A criação do computador em 1945, nos Estados Unidos e na Inglaterra, trouxe inovações e reformulações no processamento de dados. É possível observar que a informática está presente em quase todas as atividades humanas. No decorrer dos anos, o homem foi criando novas técnicas que serviram de auxílio para sua atuação em sociedade. Os sistemas de processamento da informação efetuam a mediação prática de nossas interações com o universo. Tanto óculos como espetáculo, nova pele que rege nossas relações com o ambiente, a vasta rede de processamento e circulação que brota e se ramifica a cada dia esboça pouco a pouco a figura de um real sem precedente (LÉVY, 1998, p. 16). Portanto, a informática possibilita novas formas de interação social, no qual o processamento da informação modifica o modo de relacionar com o ambiente, o real adquire uma nova perspectiva, além do real físico, passa a existir também o real na esfera virtual. A Internet foi outra criação de origem americana, que surgiu durante a Guerra Fria, em meados de 1969, com o nome de Arpanet. Inicialmente tratava-se de um sistema utilizado pelo Departamento de Defesa Americano, que depois se estendeu a universidades e centros de pesquisa, e posteriormente para uso particular e irrestrito. A Internet no modelo que conhecemos hoje, com os sistemas HTTP, WWW e HTML, surgiu em 1991. 3

O modelo informatizado, cujo exemplo é o ciberespaço, é aquele onde a forma do rizoma (redes digitais) se constitui numa estrutura comunicativa de livre circulação de mensagens, agora não mais editada por um centro, mas disseminada de forma transversal e vertical, aleatória e associativa. A nova racionalidade dos sistemas informatizados age sobre um homem que não mais recebe informações homogêneas de um centro editor-coletor-distribuidor, mas de forma caótica, multidirecional, entrópica, coletiva e, ao mesmo tempo, personalizada (LEMOS, 2002, p. 85). A Sociedade em Rede, termo designado por Castells, se consolidou e ampliou a partir do uso da Internet, que pode ser entendida como uma rede que congrega diversos grupos de redes. As redes podem ser compreendidas não apenas como redes de computadores, mas constituída também por pessoas e informação, isto é, a Sociedade em Rede é um conjunto formado por computadores, grupos de pessoas e informações. 3 O CIBERESPAÇO E A CIBERCULTURA O ciberespaço está em constante expansão e atinge todas as camadas da sociedade e áreas do conhecimento, além de utilizarmos cada dia mais as facilidades proporcionadas por esse novo espaço de disponibilização de informações. Diante desse contexto é necessário conhecer sua definição e significado, para posterior entendimento do que é o ciberespaço e como suas características afetam o nosso cotidiano. O termo ciberespaço, em sua etimologia, significa cyber-espaço, isto é, um espaço diferente, cibernético, com novas possibilidades e implicações. O ciberespaço é definido como um mundo virtual, pois não possui um território fixo, ou seja, é um espaço desterritorializante. Lévy (1996) conceitua o espaço cibernético como um terreno onde está funcionando a humanidade, hoje. É um novo espaço de interação humana que tem uma importância enorme, sobretudo no plano econômico e científico, e essa importância vai ampliar-se a vários outros campos de conhecimento. O espaço cibernético é a instauração de uma rede de todas as memórias informatizadas e de todos os computadores. Castells (2013) caracteriza o ciberespaço como um espaço criado no mundo virtual, produzindo um novo tipo de sociedade: a Sociedade em Rede. Esse novo espaço 4

trouxe grandes mudanças nas práticas culturais, principalmente com relação aos movimentos culturais. Os movimentos sociais do século XXI, ações coletivas deliberadas que visam à transformação de valores e instituições da sociedade, manifestam-se na e pela Internet. O mesmo pode ser dito do movimento ambiental, o movimento das mulheres, vários movimentos pelos direitos humanos, movimentos de identidade étnica, movimentos religiosos, movimentos nacionalistas e dos defensores/proponentes de uma lista infindável de projetos culturais e causas políticas (CASTELLS, 2003, p. 114). O ciberespaço possibilita o surgimento de uma nova era da sociedade, sendo um novo meio, um local ainda pouco conhecido. O ciberespaço traz uma nova relação de tempo e espaço. O espaço não é mais concreto, localizado em um território específico, mas trata-se de um espaço virtual, abstrato. A concepção de tempo também muda, não sendo mais linear, cronológico, mas tempo real e atual. Lévy (1999) também analisa a Sociedade em Rede, com a denominação de cibercultura, sendo um novo espaço de interações propiciado pelo virtual. A cultura originária desse mundo virtual traz uma nova experiência na relação do espaço-tempo. Os movimentos no ciberespaço são simultaneamente locais e globais, iniciando em contextos específicos e expandindo através das redes de internet, tornando-se acessíveis globalmente. Os movimentos sociais são debatidos na internet, isto é, no ciberespaço e também ocorrem em locais físicos (CASTELLS, 2013). Lévy (1999) caracteriza o ciberespaço como o mais novo local de disponibilização de informações possibilitado pelas novas tecnologias. Uma nova mídia, um espaço aberto, virtual, fluidor, navegável e construído por sistemas, que possui muitos desafios e incertezas, além de recursos inimagináveis. A emergência do ciberespaço acompanha, traduz e favorece uma evolução geral da civilização. Uma técnica é produzida dentro de uma cultura, e uma sociedade encontra-se condicionado por suas técnicas (LÉVY, 1999, p. 25). Segundo Lévy (1999) o ciberespaço habita no espaço do saber, no qual inventa sua própria língua constrói seu próprio universo e cria formas diferentes de se comunicar, de trabalhar e viver. E esse novo espaço surgiu graças à informática e à internet, que possibilitou a interconexão mundial. Lévy (1999) apresenta em seu livro Cibercultura que o ciberespaço é um dispositivo de comunicação interativo e comunitário e apresenta-se justamente como um 5

dos instrumentos privilegiados da inteligência coletiva. Por exemplo, os organismos de formação profissional ou de ensino a distância desenvolvem sistemas de aprendizagem cooperativa em rede. Grandes empresas instalam dispositivos informatizados de auxílio à colaboração e à coordenação descentralizada. Os pesquisadores e estudantes do mundo inteiro trocam ideias, artigos, imagens, experiências ou observações com conferências eletrônicas organizadas de acordo com interesses específicos. O universo virtual inclui possibilidades de participação, interligada ao processamento de dados e da geração de novos conhecimentos, o que atinge especialmente as formas de interação entre os indivíduos, no qual a comunicação está presente. Essas mudanças advindas do virtual perpassam vários aspectos de ordem antropológica, social, filosófica e comunicacional. Com o surgimento desse novo espaço virtual, emergem novas formas de sociabilidade nos ambientes virtuais, permitindo uma interação dinâmica e mundial. As várias formas de organização social que antes estavam presentes somente no mundo físico, agora se fazem presentes também nos espaços virtuais, por exemplo: as Comunidades Virtuais de Aprendizagem (CVA). Lévy (1997) em seu livro O que é o virtual? Traz um exemplo do processo de virtualização no contexto de uma empresa. Na organização clássica cada empregado ocupa um posto de trabalho precisamente situado e seu livro de ponto especifica os horários de trabalho. Em uma empresa virtual, ocorre principalmente o teletrabalho, no qual traz a possibilidade de substituir a presença física dos empregados, pela participação numa rede de comunicação eletrônica e pelo uso de recursos e programas. A virtualização da empresa consiste sobretudo em fazer das coordenadas espaço-temporais do trabalho um problema sempre repensado e não uma solução estável. O centro de gravidade da organização não é mais um conjunto de departamentos, de postos de trabalho e de livros de ponto, mas um processo de coordenação que redistribui sempre diferentemente as coordenadas espaço-temporais da coletividade de trabalho e de cada um de seus membros em função de diversas exigências (LÉVY, 1997, p. 7). Além do contexto da empresa, o mundo virtual também está presente em comunidades, por exemplo: as comunidades virtuais, constituídas por membros que não estão reunidos em um espaço físico, mas por meio de sistemas de comunicação 6

telemáticos e os objetivos são os mesmos de uma comunidade estabelecida no mundo físico, isto é, pelos grupos e aspectos comuns de interesse, problemas, especialidades. A virtualização reinventa uma cultura nômade, não por uma volta ao paleolítico nem às antigas civilizações, mas fazendo surgir um meio de interações sociais onde as relações se reconfiguram com um mínimo de inércia. Essa nova reconfiguração, traz novos espaços e novas velocidades, em que muda a relação do espaço-tempo e abre novos meios de interação e cronologias inéditas (LÉVY, 1997). Castells (2008, p. 414) explica que esse novo sistema eletrônico de comunicação caracterizado pelo seu alcance global, integração de todos os meios de comunicação e interatividade potencial, está mudando e mudará para sempre nossa cultura. Lévy (1999) também possui um pensamento semelhante ao sociólogo Manuel Castells ao afirmar que devido o crescimento do ciberespaço, que surge da interconexão de computadores surge também a cibercultura. Desde os terminais bancários até o acesso à internet, o termo ciber está em todos os lugares: cyberpunk, cibersexo, ciberespaço, cypherpunks, ciber-moda, ciber-economia, ciber-raves, etc. Todos os termos mantêm suas particularidades, semelhanças e diferenças, formando, no seu conjunto, a cibercultura (LEMOS, 2002, p. 20). Segundo Lévy (1999, p. 15) a cibercultura expressa o surgimento de um novo universal, diferente das formas culturais que vieram antes dele no sentido de que ele se constrói sobre a indeterminação de um sentido global qualquer. Portanto, o avanço tecnológico proporcionado pelo advento da internet trata-se de um dilúvio, desconstruindo a cultura existente e emergindo um novo tipo de sociedade e de cultura, ou seja, a cultura do virtual. A cibercultura se refere a todo o processo de mutação de formas de trabalhar, se relacionar, de sociabilidade, realizada a partir da existência do ciberespaço e de suas características novas. Quanto mais o ciberespaço se amplia, mais ele se torna universal, e menos o mundo informacional se torna totalizável. O universal da cibercultura não possui nem centro nem linha diretriz. É vazio, sem conteúdo particular (LÉVY, 1999, p. 111). Lemos (2002) caracteriza a cibercultura pela formação de uma sociedade estruturada através de uma conectividade telemática generalizada, ampliando o 7

potencial comunicativo, proporcionando a troca de informações sob as mais diversas formas, possibilitando agregações sociais. Ainda na perspectiva de Lévy (2001) a cibercultura é cada vez mais toda a cultura, tendo em vista que tudo se direciona para ela. A cibercultura pode ser vista como a cultura do nosso tempo, uma vez que toda a subjetividade, toda a produção intelectual a ela se dirige. O aparecimento de novas formas documentais, como um hiperdocumento produzido e lido virtualmente por todos e a emergência de um metatexto que contém potencialmente todas as mensagens. Castells (2003, p. 34) traz a concepção da cultura da Internet que é a cultura dos criadores da Internet. Segundo ele a cultura corresponde um conjunto de valores e crenças que formam o comportamento; padrões repetitivos de comportamento geram costumes que são repetidos por instituições, bem como por organizações sociais informais. E diante do cenário da rede o autor aponta uma cultura própria da Internet, caracterizada pela junção de outras culturas: a cultura tecnomeritocrática, a cultura hacker, a cultura comunitária virtual e a cultura empresarial. A cultura tecnomeritocrática refere-se à elite científica responsável pelo desenvolvimento da informática. Para Castells (2003, p. 36) trata-se de uma cultura da crença no bem inerente ao desenvolvimento científico e tecnológico como um elemento decisivo para o progresso da humanidade. As principais características dessa cultura é a descoberta tecnológica, a relevância da descoberta para o campo como um todo e o princípio fundamental da comunicação aberta do software e aperfeiçoamentos resultantes da colaboração em rede. Antes de abordar sobre a cultura hacker é importante explicar o que são os hackers na visão de Castells. Os hackers não são o que a mídia diz que são. Não são uns irresponsáveis empenhados em quebrar códigos, penetrar em sistemas ilegalmente, ou criar o caos no tráfego dos computadores (CASTELLS, 2003, p. 38). Os crackers que possuem esse comportamento, e em geral são rejeitados pela cultura hacker. A cultura hacker especifica-se como um grupo que impulsionou o crescimento da Internet, formado por grupos de programadores que foram responsáveis pelas inovações tecnológicas. Para Castells (2003) a melhor maneira de compreender a cultura hacker é considerar o processo de desenvolvimento do movimento da fonte aberta. 8

Dentro do conjunto de valores defendidos pela cultura hacker o mais supremo é a liberdade. Liberdade para criar, liberdade para apropriar todo conhecimento disponível e liberdade para redistribuir esse conhecimento sob qualquer forma ou por qualquer canal escolhido pelo hacker (CASTELLS, 2003, p. 42). A cultura hacker, em todos os contextos sociais, se caracteriza pela maneira de reinventar as formas de se comunicar com computadores e por meio deles, construindo um sistema de pessoas e computadores em interação na Internet (CASTELLS, 2003). A cultura comunitária virtual é constituída por todas as pessoas que utilizam a rede. Os primeiros usuários de redes de computadores criaram as comunidades virtuais, e essas comunidades foram fontes de valores que moldaram o comportamento e a organização social. A cultura comunitária é um dos espaços onde as pessoas expressam suas percepções de mundo e o seu contexto social, além da interação com pessoas com compartilham opiniões semelhantes. A cultura empreendedora é formada pelos empresários que descobriram a Internet para fins comerciais e lucrativos. A partir da difusão da Internet tornaram-se possíveis novas formas de negociação, produção, proporcionando o desenvolvimento econômico. Os empresários que antes investiam em ações, passaram a investir na criação de tecnologia. Para Castells (2003, p. 50) a estratégia é mudar o mundo através da tecnologia, e depois ser recompensado com dinheiro e poder, por meio de operações do mercado financeiro. Portanto a cultura da Internet é formada por essas quatro culturas, que juntas produziram e moldaram a Internet. A cultura da Internet é uma cultura criada pela crença no progresso dos seres humanos através da tecnologia, realizada por comunidades de hackers, permeada por redes virtuais que pretendem reinventar a sociedade e, materializada por empresários motivados pelo dinheiro (CASTELLS, 2003). O ciberespaço e a cibercultura representam um marco na evolução da própria consciência humana, que estaria conectada completamente em um único espaço: o virtual. Velloso (2008) explica que o espaço virtual, advindo com outras temporalidades e outra noção de territorialidade, destaca-se pela celeridade das informações hipertextuais, dispostas em rede, as quais possibilitam leituras mais imediatistas pela associação da expressão verbal a imagens e sons entre outros; ensejam 9

ainda caminhos alternativos para o leitor que, valendo-se de nós na rede hipertextual não-linear, vê-se co-autor, em um exercício autônomo de produção de sentido da malha textual. A cibercultura assim como no espaço físico também não está livre de conflitos, convicções e hábitos presentes na sociedade. A sociedade é quem definirá os potenciais positivos e/ou negativos existentes no ciberespaço. No aspecto negativo podem surgir novas ameaças a coletividade, tais como: os crackers, maiores possibilidades de pedofilia, de crimes (os famosos crimes virtuais), mas também podem surgem os aspectos positivos, como a criação de espaços para a prática da democracia, das manifestações sociais, novas possibilidades de aprendizagem, enfim, ampliam-se as formas de interação, comunicação e conhecimento da sociedade. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS O ciberespaço é parte integrante da sociedade na contemporaneidade, trazendo mudanças paradigmáticas ocasionadas pelo advento da informática o com o avanço da internet. Esse espaço é visto por Lévy e Castells como uma dimensão da Sociedade em Rede, no qual emergem novas formas de se relacionar, interagir e comunicar. No ciberespaço encontram-se grandes quantidades de dados informações e conhecimentos em que os textos são integrados a imagens e sons, um ambiente não físico, mas onde acontece tudo instantaneamente, em tempo real, com duração incerta e no qual as relações sociais são conectadas em rede. Diante desse novo espaço surge a concepção da cibercultura por Lévy e cultura da internet por Castells, que se referem a culturas permeadas pelas tecnologias e pelo virtual. O ciberespaço e a cibercultura são elementos inter-relacionados e juntos transformam o espaço de interação da sociedade, mudando a relação espaço-tempo, o local de disponibilização de informações, as formas de sociabilidade e a organização social. A cultura advinda da difusão da Internet é a do compartilhamento/disseminação de informações e conhecimento, que ampliaram as possibilidades de comunicação e o acesso às informações, representando um marco na sociedade contemporânea, podendo ser caracterizada como um novo tipo de sociedade contemporânea. As relações sociais no ciberespaço, apesar de serem construídas virtualmente, elas tendem a se concretizar no mundo físico, real, como é o caso das 10

manifestações culturais, que se iniciam pela internet e depois vão para a rua. O ciberespaço marca um novo tipo de sociedade, que possui amplas possibilidades de comunicação e interação, rompe com alguns princípios, valores e crenças, mas não se trata de uma relação excludente, mas de uma dinâmica de complementaridade das relações sociais nesse novo tipo de sociedade: a Sociedade em Rede. REFERÊNCIAS LEMOS, André. Cibercultura, tecnologia e vida social na cultura contemporânea. Porto Alegre: Sulina, 2002. CASTELLS, Manuel. A galáxia da Internet: reflexões sobre a internet, os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 2008. CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e esperança: movimentos sociais na era da internet. Rio de Janeiro: Zahar, 2013. LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999. LÉVY, Pierre. O que é virtual. São Paulo: Editora 34, 1996. LÉVY, Pierre. A conexão planetária. São Paulo: Editora 34, 2001. VELLOSO, Ricardo Viana. O ciberespaço como ágora eletrônica na sociedade contemporânea. Ciência da Informação, Brasília, v. 37, n. 2, p. 103-109, maio/ago. 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ci/v37n2/a08v37n2.pdf>. Acesso em: 10 abr. 2017. 11