Prevalência do sinal de Hawkins em pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico para fratura do colo do tálus

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Transcrição:

60 ARTIGO ORIGINAL Prevalência do sinal de Hawkins em pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico para fratura do colo do tálus Talar neck fracture: prevalence of Hawkins sign in patients submitted to surgical treatment Otaviano de Oliveira Júnior 1, Philipe Melgaço Mendes 1, Mateus Martins Marcatti 1, Bruno Vieira Medeiros 2, João Carlos Pereira Salomão 2, Fabrício Melo Bertolini 1 RESUMO Objetivo: Avaliar a prevalência do sinal de Hawkins nos pacientes com fratura do colo do tálus e as características epidemiológicas dos indivíduos internados para o tratamento cirúrgico desta lesão. Métodos: Foram analisados prontuários de 18 pacientes com fratura do colo do tálus internados no Hospital Universitário Ciências Médicas, em Belo Horizonte (MG), no período entre 1 o de janeiro de 2010 e 10 de março de 2015. As variáveis analisadasforam: sexo, idade, mecanismo de trauma, tempo entre a data da fratura e da realização da cirurgia, classificação de Hawkins, sinal de Hawkins, presença de osteonecrose e pontuação na escala AOFAS. Resultados: A prevalência do sinal de Hawkinsfoi de 55,6% nos pacientes tratados cirurgicamente. Destes, todos evoluíram sem osteonecrose do corpo talar. Conclusão: A fratura do colo do tálusfoimais frequente em jovens do sexo masculino. Pacientes com sinal de Hawkins positivo não evoluíram com osteonecrose. Dos pacientes com sinal de Hawkins negativo, 50% evoluíram com esta complicação. Descritores: Tálus/lesões; Fraturas ósseas/complicações; Fraturas ósseas/clas si ficação ABSTRACT Objective: To evaluate the prevalence of Hawkins sign in patients with talar neck fracture and characteristics of individuals admitted for surgical treatment of this injury. Methods: We analyzed medical records of 18 patients with talar neck fracture admitted between October 1, 2010 and October 3, 2015 to the Hospital Universitário Ciências Médicas in Belo Horizonte/MG. Analyzed variables were sex, age, mechanism of trauma, time between date of fracture and date of the surgery, Hawkins classification, Hawkins sign, presence of osteonecrosis and AOFAS score. Results: We found a prevalence of 55.6% of Hawkins sign in surgically treated patients. Of these, all evolved without osteonecrosis of the talar body. Conclusion: Talar neck fractures are more common in young men. Patients who hadpositive Hawkins sign did not evolvewith osteonecrosis. However, those with negative Hawkinssign, 50% of them evolved with this complication. Keywords: Talus/injuries; Fractures, bone/complications; Fractures, bone/ classification 1 Serviço de Cirurgia do Pé e Tornozelo, Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil. 2 Hospital Universitário Ciências Médicas, Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil. Correspondência: Otaviano de Oliveira Júnior Rua Curitiba, 2.258/1.002 Lourdes CEP: 30170-122 Belo Horizonte, MG, Brasil E-mail: ooliveirajr@hotmail.com Conflito de interesse: não há. Fonte de financiamento: não há. Data de recebimento: 19/9/2016 Data de aceite: 7/11/2016

Prevalência do sinal de Hawkins na fratura do colo do tálus 61 INTRODUÇÃO A fratura do colo do tálus é uma lesão rara e desafiadora, geralmente encaminhada e tratada em centros ortopédicos de referência em cirurgia do pé e tornozelo. Devido àsua anatomia única, com múltiplas articulações, grande superfície condral e tênue suprimento sanguíneo, as fraturas do tálus frequentemente causam complicações pós-ope ratórias e têm sequelas permanentes. Esta fratura corresponde a 50% das fraturas do tálus, a 6% das fraturas do pé e a 1% de todas as fraturas do esqueleto. (1-3) É causada por trauma de alta energia, em um mecanismo de dorsiflexão do pé. Uma anamnese completa, incluindo questionamentos a respeito do mecanismo de trauma, deve ser realizada em todos os pacientes na investigação das fraturas do tálus. No exame físico, é essencial avaliar as condições de pele, as equimoses, o edema, a rigidez e as deformidades. Após a avaliação clínica inicial, devem ser solicitadas as radiografias padrão do pé e tornozelo: anteroposterior (AP), perfil e oblíqua do pé, e AP, perfil e AP com 15º de ro tação interna (mortalha) do tornozelo. A incidência de Canalee Kelly (4) também é útil para avaliar fraturas da cabeça e do colo do tálus. É obtida pela rotação interna do pé, colocando-o na posição plantígrada sobre o chassi de raios X e alinhamento dos feixes de raios com inclinação cefálica de 75º. É importante utilizar a tomografia computadorizada com reconstrução tridimensional como parte da rotina na avaliação da fratura do colo do tálus. A classificação de Hawkins baseia-se na fratura do colo do tálus e é feita de acordo com o desvio e a congruência com a articulação subtalar, tibiotalar e talonavicular. Esta classificação foi inicialmente descrita portrês tipos e, posteriormente, foi modificada para um quarto tipo: (4) tipo I se fratura vertical do tálus sem desvio; tipo II se fratura do colo com subluxação/luxação da articulação subtalar; tipo III se fratura do colo com luxação tibiotalare subtalar; tipo IV se fratura do colo com luxação talonavicular, tibiotalar e subtalar. A despeito do avanço dos implantes, do entendimento sobre a biologia daconsolidação óssea e dos novos conceitos de osteossíntese, as complicações após a reconstrução cirúrgica do colo talar permanecem comuns. A complicação mais esperada descrita é a osteonecrose do corpo talar, que ocorre quando há interrupção ou significativa redução no suprimento sanguíneo ósseo. A insuficiência vascular leva à morte da parte orgânica do tecido ósseo, o que reduz sua resistência mecânica e favorece a ocorrência de microfraturas, com consequente destruição articular. (5) Apresenta íntima correlação com a classificação de Hawkins, sendo que as do tipo I variam de zero a 13%; as dotipo II, de 20 a 50%; as dotipo III, de 75 a 100%; e as do tipo IV, aproximadamente 100%. (4) Sua evolução nem sempre é o colapso do tálus, existindo pacientes até mesmo assintomáticos. Existe uma relação entre a osteonecrosedo corpo talar e o sinal de Hawkins. Este sinal é visto na radiografia em incidência AP como uma linha radiolucentena região subcondral da tróclea do tálus (Figura 1). Tipicamente aparece entre 6 e 8 semanas após a ocorrência da fratura. (2,6) Representa uma atrofia subcondral,devido àrevascularização,e é uma indicação radiográfica sobre a viabilidade do corpo talar. (7) Um sinal de Hawkins positivo exclui o diagnóstico de osteonecrose do tálus. (2,5) Daniels e Smith pontuaram que o sinal de Hawkins tem uma alta sensibilidade, porém baixa especificidade.sua presença é um indicador confiável de boa evolução, e sua ausência não excluiu a possibilidade de aparecimento tardio (8) (Figura 2). Sua prevalência é de aproximadamente 48% nos estudos internacionais, (9) mas estes registros não existem na literatura brasileira. O objetivo deste estudo foiavaliar a prevalência do sinal de Hawkins nos pacientes com fratura do colo do tálus e as características epidemiológicas dos indivíduos internados para o tratamento cirúrgico desta lesão. Figura 1 Sinal de Hawkins positivo. Linha radiolucente na região subcondral do tálus.

62 Oliveira Júnior O, Mendes PM, Marcatti MM, Medeiros BV, Salomão JC, Bertolini FM A B C Figura 2 A) Fratura Hawkins; B) Radiografia de incidência anteroposterior pós-osteossíntese sem sinal de Hawkins; C) Radiografia de incidência em perfil pós-osteossíntese sem sinais de colapso do tálus. MÉTODOS Foram levantados todos os prontuários dos pacientes internados com fratura do colo do tálus no Hospital Universitário Ciências Médicas, em Belo Horizonte (MG), no período entre 1 o de janeiro de 2010 e 10 de março de 2015. Os critérios de inclusão foram as fraturas de tálus tratadas cirurgicamente. Foram excluídas fraturas de pé e tornozelo associadas ou prévias, e as fraturas de tálus não tratadas com cirurgia. Após revisão detalhada destes prontuários, foram selecionados 18 pacientes, que não foram separados de acordo com a técnica cirúrgica utilizada ou via de acesso. Para avaliação, foram utilizados radiografias pré e pós-operatórias (imediato, 1, 2 e 6 meses de evolução). Os parâmetros analisados foram: sexo, idade, mecanismo de trauma, tempo entre a data da fratura e a data da realização da cirurgia, classificação de Hawkins, presença do sinal de Hawkins, presença de osteonecrose e escala da American Orthopaedic Foot and Ankle Society (AOFAS) (10). O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Fundação Educacional Lucas Machado (FELUMA) do Hospital Universitário Ciências Médicas, sob o número 1.149.247. RESULTADOS Foram analisados os dados dos prontuários dos 18 pacientes (Tabela 1). Tabela 1 Registros gerais Paciente Sexo Idade Tempo fratura- cirurgia (dias) Sinal Hawkins Osteonecrose Classificaçãode Hawkins AOFAS BBO M 22 47 Não Não 2 NI RFS M 32 10 Sim Não 2 45 FRSM M 28 5 Sim Não 3 NI DHGP M 28 19 Não Sim 3 65 WRS M 23 18 Sim Não 2 NI IVCM F 36 19 Não Não 2 NI FPS M 37 10 Sim Não 1 66 JFS M 28 24 Não Não 1 NI OMB M 40 15 Não Sim 2 NI PEM F 14 5 Sim Não 2 NI STFL F 25 15 Sim Não 2 NI CEFC M 37 15 Não Não 3 94 JAN M 38 30 Sim Não 1 NI JFS M 23 5 Não Sim 3 34 BJO M 48 NI Não Sim 2 58 CGACL M 28 10 Sim Não 2 69 TSL M 38 16 Sim Não 3 49 MMM F 29 14 Sim Não 2 55 AOFAS: American Orthopaedic Foot and Ankle Society; M: masculino; NI: não informado; F: feminino.

Prevalência do sinal de Hawkins na fratura do colo do tálus 63 Do total, 14 pacientes eramdo sexo masculino (relação 3,5:1). Os pacientes analisados possuíam idade entre 14 e 48 anos, sendo que a idade média foide 30,8 anos. Para melhor interpretação, as idades dos pacientes foram divididas em três faixas etárias aleatórias: até 25 anos (27,8%), de 26 a 35 anos (33,3%) e de 36 a 48 anos (38,9%) (Tabela 2). Trauma de alta energia com o pé em dorsiflexãofoi o mecanismo mais frequente(acidente automobilístico commotocicleta e automóveis e queda de altura) com 17 casos. Outro mecanismo envolvido foi o trauma esportivo, com um caso (Tabela 3). A incidência de fraturas expostas foi de 16,6% (três casos), duas classificadas como Gustilo II e uma como Gustilo IIIA. Destes três casos, dois evoluíram com osteonecrose. O tempo entre a data da fratura e a data da realização da cirurgia variou entre 5e 47 dias. Para um paciente, a informação do tempo não estava disponível. Metade dos pacientes (50%) tinha entre 13 e 24 dias de fratura no momento da cirurgia (Tabela 4). De acordo com a classificação de Hawkins para fraturas do colo tálus, três pacientes apresentavam fratura do tipo I, dezapresentavam fratura do tipo II e cinco apresentavam fratura do tipo III. Nenhum paciente foi classificado com fratura do tipo IV de Hawkins (Tabela 5). Tabela 2 Faixa etária dos pacientes Faixa etária (anos) n (%) Até 25 5 (27,8) 26-35 6 (33,3) 36-48 7 (38,9) Tabela 3 Mecanismo do trauma Mecanismo n (%) Acidente automobilístico 9 (50,0) Queda de altura 8 (44,4) Trauma esportivo 1 (5,6) Tabela 4 Tempo entre a data da fratura e a data da cirurgia Intervalo de tempo fratura - cirurgia (dias) n (%) Até 12 6 (33,3) 13-24 9 (50) 25 ou mais 2 (11,1) Não informado 1 (5,6) Tabela 5 Classificação de Hawkins Classificação Hawkins Número de pacientes Hawkins positivo I 3 2 II 10 6 III 5 2 IV 0 0 A prevalência identificada do sinal de Hawkins foi de 55,6%. Do total de pacientes avaliados, 22,3% apresentaram osteonecrose, número que aumentouquando avaliamos somente os pacientes com sinal de Hawkins negativo. Destes oitopacientes, quatro(50%) evoluíram para osteonecrose. Já os pacientes com o sinal positivo, não evoluíram da mesma forma, pois nenhum apresentou osteonecrose (Tabela 6). Tabela 6 Sinal de Hawkins Sinal de Hawkins n (%) Presente 10 (55,6) Ausente 8 (44,4) Em relação à escala AOFAS para retropé e tornozelo, foi feitareavaliação de apenas nove pacientes. Apontuação média foi de 59,4 (Tabela 1). DISCUSSÃO No estudo,constatou-se a maior prevalência da fratura do colo do tálus no sexo masculino (77,8%) e em jovens (idade média de 30,8 anos), semelhante ao que reporta a literatura. (2,11) Isso evidencia a importância do correto tratamento de uma fratura que apresenta grandes taxas de complicações e sequelas muitas vezes permanentes em pa cientes economicamente ativos. A origem do trauma da fratura de colo do tálus nos pacientes estudados foi por acidente automobilístico, queda de altura e trauma no esporte, que acarretaram um mecanismo de força que deslocou o osso por dorsiflexão súbita em direção à borda anterior da tíbia. Se a força deformante continua após a produção da fratura, ocorrerá subluxação/ luxação subtalar. Com forças maiores, o corpo pode se deslocar posteriormente. Em nossa série, 94% dos pacientes tiveram trauma de alta energia como mecanismo de trauma de suas fraturas, número maior do que o encontrado no trabalho de Sakakiet al., (12) que foi de 78%. A incidência de fraturas expostas foi de 16,6%, índice próximo ao encontrado na literatura nacional; (12,13) 66,6% das fraturas expostas evoluíram com osteonecrose, o que implica pior prognóstico. O tempo entre a data da fratura e a data da realização da cirurgia definitiva variou entre 5e 47 dias, sendo que metade dos pacientes (50%) foi operada entre 13 a 24 dias após o trauma. Neste período não estão incluídos os pacientes com fixação externa provisória na urgência. Esse longo tempo até a realização da cirurgia definitiva pode ser atribuídoa outras fraturas e traumas sistêmicos asso

64 Oliveira Júnior O, Mendes PM, Marcatti MM, Medeiros BV, Salomão JC, Bertolini FM ciados, a lesões do pé que frequentemente não são diagnosticadas em pacientes politraumatizados e, por último, a lesões de partes moles, que atrasam o tratamento definitivo. Apesar da irrigação sanguínea do tálus ser crítica nas fraturas do colo com desvio, a espera para tratamento cirúrgico definitivo parece não aumentar o risco de osteonecrose. (14) Esta complicação está mais relacionada ao desvio e à classificação da fratura, à sua cominuição e à não redução de urgência. (14) A prevalência identificada do sinal de Hawkins foi de 55,6%. O resultado encontrado ficou próximo ao referenciado na literatura internacional, que é de 48%. (9) Não há dados, na literatura nacional, sobre a prevalência deste sinal em hospitais de referência no Brasil. Dentre os pacientes que apresentaram o sinal de Hawkins, todos evoluíram com ausênciade osteonecrose, por centagem que cai para 50% quando o sinal de Hawkins está ausente. Esses dados são condizentes com a literatura, que afirma que um sinal de Hawkins positivo exclui o diagnóstico de osteonecrose do tálus, porém um sinal negativo não necessariamente quer dizer evolução ruim (alta sensibilidade e baixa especificidade). (1,2,5) De acordo com a escala AOFAS, obtivemos somente nove pacientes analisados, sendo que cinco tinham sinal de Hawkins positivo. A pontuação média foi de 59,4 pontos, resultado pior do que o encontrado no estudo de Bastos et al., (15) que foi de 73 pontos. Este dado é limitado, dada a natureza retrospectiva da avaliação do estudo, com grande número de pacientes não reavaliados (50%), o que, embora seja comum nos trabalhos que avaliam o resultado de tratamento de lesões traumáticas, dificulta o estabelecimento de prognóstico preciso, principalmente ao avaliarmos complicações como osteonecrose. CONCLUSÃO As fraturas do colo dotálusocorreram em pacientes jovens com média de idade de 30,8 anos, com predomínio dosexo masculino (3,5:1). O sinal de Hawkins esteve presente na maioria dos pacientes. Os portadores do sinal de Hawkins positivo não evoluíram para osteonecrose. REFERÊNCIAS 1. Fleuriau Chateau PB, Brokaw DS, Jelen BA, Scheid DK, Weber TG. Plate fixation of talar neck fractures: preliminary review of a new technique in twenty-three patients. J Orthop Trauma. 2002;16(4):213-9. 2. Hawkins LG. Fractures of the neck of the talus. J Bone Joint Surg Am. 1970;52(5):991-1002. 3. Kenwright J, Taylor RG. Major injuries of the talus. J Bone Joint Surg Br 1970;52(1):36-48. 4. Canale ST,Kelly FB Jr. Fractures of the neck of the talus: Long-term evaluation of seventy-one cases. J Bone Joint Surg Am. 1978;60(2): 143-56. 5. Pearce DH, Mongiardi CN, Fornasier VL, Daniels TR. Avascular necrosis of the talus: a pictorial essay. Radiographics. 2005;25(2):399-410. 6. Adelaar RS. The treatment of complex fractures of the talus. Orthop Clin North Am 1989;20(4):691-707. 7. Newcomb WJ, Brav EA. Complete dislocation of the talus. J Bone Joint Surg Am.1948;30A(4):872-4. 8. Daniels TR, Smith JW. Talar neck fractures. Foot Ankle Int. 1993;14:225-34. 9. Tezval M, Dumont C, StürmerK. Prognostic reliability of the Hawkins sign in fractures of the talus. J Orthop Trauma. 2007;2(8):538-543. 10. Kitaoka HB, Alexander IJ, Adelaar RS, Nunley JA, Myerson MS, Sanders M. Clinical rating systems for the ankle-hindfoot, midfoot, hallux, and lesser toes.foot Ankle Int. 1994;15(7):349-53. 11. Bucholz RW, Court-Brown CM, Heckman JD, Tornetta P. Fraturas em adultos de Rockwood e Green. 7a ed. Barueri (SP): Manole; 2013. p. 782-828. 12. Sakaki MH, Saito GH, de Oliveira RG, Ortiz RT, Silva JS, Fernandes TD, et al. Estudo epidemiológico das fraturas do tálus. Rev Bras Ortop. 2014;49(4):334-9. 13. Fonseca Filho FF, Santin RA, Ferreira RC, Sanmartin M, Guerra A. Epidemiological aspecto fractures of the talus. Rev Bras Ortop. 1996; 3(6):481-4. 14. Elgafy H, Ebraheim NA, Tile M, Stephen D, Kase J. Fractures of the talus: experience of two level 1 trauma centers. Foot Ankle Int. 2000; 21(12):1023-9. 15. Bastos LR,FerreiraRC,Mercadante MT. Análise do resultado clínicofuncional e das complicações da fratura do colo do tálus. Rev Bras Ortop. 2010;45(4):362-74.