DELINEANDO UM PANORAMA SOBRE AS PESQUISAS EM ESTIMULAÇÃO PRECOCE NO BRASIL Ana Flávia HANSEL 1 - UNICENTRO Maria Augusta BOLSANELLO 2 - UFPR Introdução A estimulação precoce consiste em um conjunto de intervenções dirigidas à população infantil de zero a seis anos, à família e ao meio, e tem por objetivo responder às necessidades transitórias ou permanentes que apresentam crianças de risco ou com transtornos em seu desenvolvimento (GRUPO DE ATENCIÓN TEMPRANA, 2000). Nas últimas décadas ocorreram mudanças importantes nos modelos conceituais desse atendimento e a orientação teórica comum e consensual é a de que este serviço deve privilegiar o envolvimento familiar. Para que estas mudanças se efetivem com competência é indispensável à melhoria na qualidade da formação e da atuação profissional, sendo essencial o aumento de produção de conhecimento na área Portanto, este artigo tem como principal objetivo verificar os estudos e a investigação acadêmica nacional sobre estimulação precoce, dos últimos anos, e de acordo com os resultados configurar o panorama dessas discussões no Brasil. Método Para isso foram realizadas buscas em bases de dados nacionais que focalizassem estudos realizados em estimulação precoce, entre os anos de 2000 a 2008. As bases procuradas foram: banco de teses da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), ANPEd (Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Educação) e Revista Brasileira de Educação Especial, cuja publicação é da ABPEE (Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial). O rastreamento se deu de diferentes formas. No banco de teses da CAPES foram procuradas dissertações e teses de programas de pós graduação em educação entre os anos de 2000 a 2008, com base nas seguintes palavras chaves: estimulação precoce, atenção precoce e intervenção precoce. Na ANPEd a busca foi realizada pelos trabalhos apresentados nas reuniões anuais a partir da 23º reunião, realizada no ano de 2000 até a 31º que aconteceu em 2008. A área temática focalizada foi a Educação Especial. Consultou-se também a linha editorial da 1 Doutoranda em Educação pela UFPR; Docente do Departamento de Pedagogia da Universidade Estadual do Centro-Oeste do Paraná - Campus Universitário de Irati aflaviah@hotmail.com 2 Doutora em Psicologia pela USP; Docente do Programa de Pós Graduação em Educação e do Departamento de Teoria de Fundamentos da Educação da Universidade Federal do Paraná mabolsanello@yahoo.com.br 1144
ANPEd, composta pela Revista Brasileira de Educação que é editada em três números por ano. Iniciou-se a busca pelos números 13, 14 e 15 do ano de 2000. A partir de 2006, com os números 31, 32 e 33 a revista passou a ser publicada em volumes; começando neste mesmo ano pelo volume 11, em 2007, volume 12 e 2008, volume 13. Já na ABPEE, o rastreamento foi feito a partir da Revista Brasileira de Educação Especial, volume 06 do ano de 2000. Em 2001, 2002 e 2003 foram editados respectivamente os volumes 07, 08 e 09 cada uma com dois números por ano e a partir de 2004, com o volume 10, a revista passou a ter publicação quadrimestral, portanto mantendo três números ao ano. Resultado No banco de teses da Capes, com a definição dos critérios palavras chaves ( estimulação precoce, atenção precoce e intervenção precoce ), período de tempo (2000 a 2008) e programas de pós graduação em educação, foram encontrados um total de onze trabalhos entre dissertações e teses. No ano de 2000 um estudo (mestrado) investigou quais são os níveis da noção de objeto permanente e de causalidade física são encontrados nas crianças com síndrome de down em atendimento de estimulação precoce, da Universidade Federal do Paraná. Em 2003 foi encontrada uma pesquisa (mestrado) sobre os programas de intervenção com bebês pré termo e suas famílias, considerando a avaliação e os subsídios para a prevenção de deficiências, da Universidade Federal de São Carlos. Em 2004 apareceu uma investigação de mestrado evidenciando as concepções paternas sobre o bebê com deficiência inserido na estimulação precoce, da Universidade Federal do Paraná. Já em 2005 uma pesquisa de mestrado foi rastreada abordando o trabalho com crianças autistas e possíveis modelos de intervenção, da Universidade Federal de São Carlos. Em 2006, também da Universidade Federal de São Carlos uma investigação de mestrado sobre os efeitos de um programa de prevenção de problemas de comportamento em crianças até três anos pré escolares de famílias de baixa renda. No ano de 2007 apareceram quatro trabalhos, sendo três em nível de mestrado e um em nível de doutorado. Da Universidade Federal do Rio Grande do Sul veio um dos trabalhos (mestrado) sobre a importância da estimulação precoce na educação infantil e a detecção dos sinais de risco psíquico para o desenvolvimento infantil. Da Universidade Federal do Ceará outro trabalho de mestrado evidenciando a avaliação da psicomotricidade no processo ensino aprendizagem da criança com síndrome de down, freqüentando a educação infantil. Outra investigação em nível de mestrado oriunda da Universidade Federal do Paraná pesquisando a aquisição da noção de espaço pela criança com síndrome de down em atendimento de estimulação precoce. Ainda em 2007 mais uma contribuição para os estudos em estimulação precoce da Universidade Federal de São Carlos, este em nível de doutorado avaliando a grade curricular e os conhecimentos de residentes em pediatria sobre a vigilância do desenvolvimento. Finalizando a busca, em 2008 foram encontradas duas pesquisas, uma em nível de mestrado e outra em nível de doutorado, ambas da Universidade Federal do Paraná. A dissertação tratou das concepções das educadoras sobre o desenvolvimento infantil de crianças de zero a três anos a atenção e a tese tratou da atenção e estimulação precoce e o desenvolvimento da criança em creche. 1145
Nas reuniões anuais da ANPEd, foram rastreados textos completos e trabalhos apresentados na área temática da Educação Especial, desde a 23º reunião/2000 até a 31º/2008. Foi encontrado apenas um trabalho da 29º reunião realizada em 2006 em que a autora abordou os desafios dos sistemas educacionais públicos, na ampliação do acesso aos programas educacionais para os bebês. O trabalho foi composto dentro de uma linha teórica atualizada sobre os programas de estimulação precoce, suas características, filosofia, princípios, relacionando o referido atendimento às práticas inclusivas nas creches. Para isso a autora efetuou um estudo de caso a partir da descrição e análise de como um educador de crianças pequenas desenvolve seu trabalho quando alunos com necessidades educacionais especiais estão inseridos nos grupos. Constituindo a linha editoria da ANPEd, na Revista Brasileira de Educação não foram encontrados nenhum artigo sobre estimulação precoce. Porém no número 24/2003 - sem volume, vale ressaltar que um artigo publicado situa a educação infantil no contexto das políticas públicas, com base na análise de documentos e registros oficiais, porém sem nenhuma referência aos programas de estimulação precoce. Já no número 35/2007 volume 12, um artigo chamou a atenção, pois trouxe dados relevantes sobre o índice de desenvolvimento em crianças de zero a seis anos, entre os anos de 1999 a 2004 no Brasil. O artigo tece algumas considerações sobre a importância da assistência à saúde e a educação na primeira infância estabelecendo relações diretas com o desenvolvimento infantil. Na Revista Brasileira de Educação Especial, entre os anos de 2000 a 2008, foram encontrados apenas cinco artigos relacionados à estimulação precoce. Dois deles estão contidos no número 01/2002 volume 08. O primeiro abordou as representações maternas sobre o bebê portador de fissura labiopalatal e o outro apresentou informações sobre a organização e a assistência de serviços peri natais, objetivando a prevenção primária e secundária de deficiências, em Québec, no Canadá. No número 01/2004 volume 10, apareceu outro artigo que refletia sobre os níveis de prevenção de deficiências (primário, secundário e terciário), destacando os programas de estimulação precoce como facilitadores do desenvolvimento infantil. Já nos números 01 e 02, ambos de 2005 - volume 11, foram apresentados mais dois artigos sobre a temática. Na revista número 01 o texto abordou um estudo de caso realizado com uma mãe adolescente e seu bebê de risco, identificando os impactos da intervenção focada na família e também no desenvolvimento da criança. Já na revista número 02 a pesquisa abordou um estudo comparativo entre a avaliação de habilidades neuromotora, cognitiva, lingüística e psicossocial de bebês com e sem alterações no desenvolvimento. Discussão A busca realizada na execução deste trabalho limitou-se a três bases de dados consideradas referências em termos de produção de conhecimento em educação a nível nacional: CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), ANPEd (Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Educação) ABPEE (Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial). Quanto às investigações nos cursos de pós graduação em educação - nível de mestrado e doutorado da CAPES, foram encontrados onze trabalhos. Neste contexto duas universidades destacam-se em suas produções sobre estimulação precoce: Universidade 1146
Federal do Paraná UFPR e Universidade Federal de São Carlos UFSCAR. Observase que nos anos 2000, 2003, 2004, 2005, 2006 a produção de trabalhos sobre estimulação precoce era tímida, apenas um por ano e que a partir de 2007 houve um pequeno aumento do número de produções por ano. No rastreamento de artigos produzidos e trabalhos apresentados para uma das maiores organizações de pesquisas em educação do Brasil, a ANPEd, considerando as reuniões anuais e as revistas, foi localizado apenas um trabalho sobre estimulação precoce, na área temática da educação especial, em oito anos. Já na revista mais conhecida e qualizada que publica artigos cujo foco específico é a educação especial da ABPEE, foram encontradas cinco produções sobre estimulação precoce. O mapeamento da produção de trabalhos nacionais em estimulação precoce permite vislumbrar a escassez de pesquisas científicas nesta área de conhecimento, o que revela certa preocupação, se consideramos a importância do trabalho da estimulação precoce, tanto para o campo educacional, quanto para o campo da saúde e também se considerarmos a necessidade da oferta de serviços comprometidos efetivamente com o desenvolvimento infantil e familiar. Conclusões Através da análise dos dados obtidos, algumas questões merecem ser destacadas. A primeira refere-se ao compromisso das universidades brasileiras com a educação a fim de mobilizarem-se na luta pela qualidade do atendimento educacional das crianças pequenas, com ou sem deficiências, por meio das atividades de ensino, pesquisa e extensão. Igualmente marcante nos resultados é a demanda dos programas em estimulação precoce, observando aí os níveis primário, secundário e terciário de prevenção às deficiências. Por isso este atendimento é importante, necessário e indispensável, tanto para crianças de risco, quanto para crianças com transtornos em seu desenvolvimento. Os trabalhos encontrados colaboram também na visualização da situação da estimulação precoce a nível nacional: mudanças de modelos conceituais, envolvimento familiar nos programas, observação e atenção ao desenvolvimento das crianças na educação infantil, busca de melhores alternativas de atendimento educacional para esta população, considerando as práticas inclusivas na escola. Observando os movimentos de inclusão da família, como apoio e base para o desenvolvimento humano, reforça-se que o atendimento da estimulação precoce quando voltado à família e não visualizando somente a dificuldade da criança, deverá possibilitar ao bebê uma construção mais efetiva de suas aprendizagens e a promoção global de seu desenvolvimento, facilitando sua inclusão escolar e social. Este artigo representou uma tentativa de mapear a produção de conhecimento sobre estimulação precoce no Brasil, socializando isso para profissionais e pesquisadores e esperando ter contribuído para ampliação das discussões sobre como prover o melhor atendimento educacional para as crianças pequenas com ou sem necessidades educativas especiais. Referências 1147
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