ADMINISTRAÇÀO DE PROJETOS SOCIAIS:PERSPECTIVAS COMPETITIVAS PARA PEQUENOS NEGÓCIOS



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Transcrição:

ADMINISTRAÇÀO DE PROJETOS SOCIAIS:PERSPECTIVAS COMPETITIVAS PARA PEQUENOS NEGÓCIOS Resumo O artigo analisa a experiência de administradores de pequenas empresas, integrantes de uma incubadora tecnológica localizada na região metropolitana de Belo Horizonte, na construção e implementação de projetos sociais. Discute-se a relevância social e também a competitividade empresarial através do desenvolvimento de ações sociais para negócios em fase de incubação. A análise dos dados discute as concepções, metodologias e estratégias adotadas pelos empresários para articular ações junto às comunidades-alvo dos projetos. AUTORES Armindo dos Santos de Sousa Teodósio Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Betim Maria de Fátima Rosa Ocani Incubadora Tecnológica de Betim (ITEBE) Anadélia Íoná de Sousa Oliveira Incubadora Tecnológica de Betim (ITEBE) Juliana Nunes Moreira Incubadora Tecnológica de Betim (ITEBE) Palavras-chave Pequenas Empresas; Projetos Sociais de Empresas; Terceiro Setor; Competitividade. I- Introdução O artigo discute a experiência de micro-empresários, integrantes de uma incubadora tecnológica localizada na região metropolitana de Belo Horizonte, na construção de planos estratégicos de intervenção em problemas sociais. O objeto de pesquisa gira em torno da percepção estratégica dos empresários quanto à esfera social de seus empreendimentos, analisando-se concepções, metodologias e ações desenvolvidas para construir projetos de intervenção na realidade social. Procura-se fazer uma delimitação terminológica e histórica de expressões e idéias empresariais ligadas à esfera social, que têm ocupado lugar de destaque nos debates recentes sobre estratégias organizacionais, tais como: Responsabilidade Social, Cidadania Empresarial, Filantropia Empresarial e Terceiro Setor. A partir daí, discute-se a relevância estratégica de contrapartidas sociais na dinâmica das relações entre organização e sociedade, empresário e trabalhador, empresa e cliente, dentre outras, para o aprimoramento da performance organizacional. II Projetos sociais de empresas: novas terminologias e estratégias Projetos sociais de empresas têm assumido um lugar de destaque no Brasil tanto na mídia de negócios quanto nos debates acadêmicos, principalmente nos cursos ligados à esfera de formação gerencial. Esse fenômeno observado no cenário de negócios brasileiros parece acompanhar tendência que se manifesta nos países capitalistas centrais, sobretudo os EUA, nos quais existe uma forte tradição de intervenção empresarial nos problemas sociais (MEGGINSON et al, 1998). Se a centralidade relegada aos projetos sociais de empresas na atualidade permite um avanço das reflexões no cenário empresarial brasileiro, por outro deve-se atentar para o fato de que muitas estratégias e técnicas de gestão, na maioria das vezes importadas e aplicadas como verdadeiras panacéias para a

competitividade, chegam a ser descartadas antes mesmo de atingirem sua maturação (MICKLETHWAIT & WOOLDRIDGE, 1998). Sendo assim, no futuro corre-se o risco dos avanços em termos de estratégias sociais de empresas ficarem relegados ao esquecimento ou reduzidos em sua magnitude, devido ao surgimento de uma nova tecnologia de gestão, novamente vista como caminho fácil para a solução dos desafios competitivos das organizações (WOOD JR, 1999). Ao mesmo tempo em que o debate sobre a relevância de projetos sociais desenvolvidos por empresas se aprofunda, novos termos e expressões são criados, tentando trazer novas concepções às antigas estratégias de intervenção nos problemas da comunidade. Dentre essas novas terminologias destacam-se Cidadania Empresarial, Responsabilidade Social de Empresas, Filantropia Empresarial e, sobretudo, Terceiro Setor. Como destacam STONER & FREEMAN (1985), ações sociais desenvolvidas por empresários remontam aos primórdios do capitalismo, sobretudo no momento da Revolução Industrial, quando homens de negócios como Robert Owen passaram a dar benesses à comunidade. No entanto, essas primeiras intervenções de homens de negócios nos problemas sociais eram marcadas por um profundo assistencialismo, pietismo e por uma visão moralizante das massas trabalhadores, consideradas indolentes, desorganizadas e fadadas à miséria, caso não fossem auxiliadas pelos empresários da época. A concepção assistencialista de intervenção nos projetos sociais marcou grande parte dos projetos empresariais desenvolvidos até a primeira metade do século XX, encontrando seu florescimento principalmente após a crise da década de 30 nos EUA. No entanto, nos últimos anos novas concepções sobre o desenvolvimento de projetos sociais por parte de empresários passaram a dominar as estratégias organizacionais. Se antes as idéias de caridade e assistência social guiavam os projetos, agora tenta-se inserir abordagens nas quais os indivíduos auxiliados sejam concebidos como sujeitos ativos do processo, caminhando-se para a noção de parceria entre empresa e comunidade (IOCHPE, 1997). No quadro abaixo apresentam-se algumas transformações nos conceitos que guiavam a intervenção social desenvolvida por empresários no passado e as idéias consideradas atualmente como as mais avançadas na construção de relações entre empresa e comunidade. Quadro 1 Evolução das abordagens nos projetos sociais de empresas Itens do Projeto Estratégia Anterior Estratégia Atual Relação Assistencialismo / Parternalismo Parceria Empresa-Comunidade Noção de indivíduo Dependente, incapaz e submisso Ativo, capaz e sujeito do processo Transferência de soluções gerenciais e tecnológicas Via de mão-única da empresa para Via de mão-dupla entre empresa e comunidade Empresas capazes de intervenção social Sustentabilidade do projeto a comunidade Apenas grandes corporações privadas e estatais Dependência permanente Da empresa Retornos para a empresa Restritos à imagem institucional e relações com a clientela Fonte: Baseado em MELO NETO & FROES, 1999. Grandes, médias e pequenas Projetos auto-sustentáveis no médio e longo-prazos Ganhos externos e internos (produtividade e competitividade)

As abordagens mais recentes sobre a concepção e implantação de projetos sociais por parte de empresas partem do pressuposto de que não só a comunidade pode ter grandes ganhos com o suporte empresarial, mas também que as organizações podem se tornar mais produtivas e competitivas à medida em que desenvolvem ações sociais. Dentro dessa concepção, critérios como noção de indivíduo, aprendizagem gerencial-tecnológica entre comunidade e empresa, sustentabilidade do projeto e capacidade de equacionamento dos problemas sociais se modificam profundamente (MELO NETO & FROES, 1999). O primeiro aspecto significativo é que o paternalismo que caracterizava a relação entre empresa e população assistida pelos projetos sociais dá lugar à idéia de parceria. Assim, os projetos passam a ser concebidos e desenvolvidos em conjunto com membros representativos das comunidades assistidas, procurando partilhar ações, custos e soluções a serem implementadas. Nesse sentido, modifica-se a concepção quanto à relação de aprendizagem entre empresa e comunidade. Anteriormente, a idéia dominante era a de que os indivíduos pertencentes à determinada comunidade carente eram incapazes de extrapolar sua condição de miséria e exclusão social. Isso os colocava na posição de assimiladores passivos das soluções tecnológicas e gerenciais fornecidas pelas empresas. No entanto, percebe-se atualmente que a relação com a comunidade pode ser extremamente frutífera para a empresa, visto que formas criativas, de baixo custo e mais adequadas à realidades sociais específicas podem surgir do contato entre gerentes e funcionários com indivíduos empreendedores, pertencentes à comunidade atendida pelos projetos sociais. Assim, a aprendizagem tecnológica e gerencial se dá em via de mão-dupla na relação entre organização e sociedade. Outra idéia dominante é a de que os projetos não podem caracterizar-se pela extrema dependência de uma única fonte de financiamento externa, devendo caminhar para a auto-sustentação no médio e longoprazos. Esse é um ponto fundamental para o rompimento da noção assistencialista, pois parte-se da idéia não de investimentos caritativos a fundo perdido, mas de alocação de recursos humanos, financeiros e materiais que devem ser multiplicados através do seu gerenciamento adequado. A idéia de rompimento da dependência com a empresa às vezes causa resistência em alguns empresários, principalmente aqueles comprometidos com a idealização do projeto social. No entanto, cabe lembrar que a dependência total de uma única empresa, além de exigir volume de recursos mais significativo por parte de uma única fonte de recursos, resulta também em imobilismo na área social. Um problema social relevante em determinado momento pode não o ser no futuro. No entanto, se o projeto social é extremamente dependente da empresa, ela não pode modificar sua pasta de investimentos sociais sob pena de comprometer os projetos que já estão em execução. Um mito que começa a ser rompido na área social é o de que apenas as grandes corporações privadas ou as estatais podem fazer a diferença, cabendo às médias e, principalmente, às pequenas empresas um papel secundário ou mesmo irrelevante no equacionamento dos problemas sociais (DRUCKER, 1995). No entanto, uma análise mais apurada da realidade de outros países, como por exemplo dos EUA, demonstra que parcela mais significativa de recursos investidos na área social não é proveniente de grandes corporações, mas sim de pequenos contribuintes isolados. Apesar da intensa presença na mídia, empresas como a Microsoft investem comparativamente menos na área social do que pequenos empresários e pessoas físicas americanas. Além disso, os investimentos desenvolvidos por pequenos empresários tendem a ser marcados pelas novas abordagens na elaboração e implementação de projetos sociais, na medida em que existe maior possibilidade de abertura na relação com a comunidade e no intercâmbio gerencial e tecnológico, além de ser mais intensa a necessidade de programar a auto-sustentabilidade do investimento social. Entre as novas terminologias desenvolvidas para expressar essas transformações na relação entre empresa e comunidade, algumas são mais difundidas, ao passo que outras geram grande resistência tanto na mídia quanto nos meios acadêmicos. Enquanto o termo Filantropia Empresarial remeteria ainda à uma concepção assistencialista e paternalista, o termo Cidadania Empresarial seria um reducionismo da idéia de cidadania (CKAGNAZAROFF, 1999). A concepção de cidadania não careceria de adjetivação, dado à sua magnitude conceitual.

Por sua vez, o termo Responsabilidade Social das Empresas tem sido bastante difundido, no entanto não chega a atingir a expressividade que a idéia de Terceiro Setor tem atingido nos debates contemporâneos. Sendo assim, as discussões a seguir se concentrarão no alcance conceitual da expressão Terceiro Setor. Cabe destacar, no entanto, que muitas vezes os conceitos se interpenetram. Por outro lado, é fundamental discutir a natureza do que vem a ser Terceiro Setor, visto que é a partir dessa concepção que as estratégias empresariais para projetos sociais podem se modernizar. III - Terceiro Setor: heterogeneidade e abrangência conceitual As discussões recentes, tanto na esfera acadêmica quanto no âmbito das políticas sociais concretas, têm relegado lugar de destaque ao chamado Terceiro Setor. Multiplicam-se as publicações, seminários e debates cujo foco é discutir a relevância, as especificidades e a natureza das organizações que atuam nesse campo. No campo da gestão esse debate assume centralidade, ao introduzir reflexões sobre as características gerenciais dessas organizações, sobretudo no que diz respeito à ausência de objetivos de lucro privado e incorporação de mão-de-obra voluntária em suas ações. No entanto, vários autores constatam que o grau de informação e conhecimento sistematizado sobre o Terceiro Setor, sobretudo no caso brasileiro, ainda é insipiente. Nesse cenário, a pesquisa sobre as práticas e o pensamento gerencial desenvolvidos em organizações que atuam no Terceiro Setor assume grande relevância. (IOSCHPE,1997). A diferenciação entre três setores baseia-se na idéia de delimitação de espaços sócio-políticos e econômicos diferenciados entre o Primeiro Setor (Estado), o Segundo Setor (Iniciativa Privada) e o Terceiro Setor (Movimentos Sociais). No entanto, pode-se perceber que há uma interpenetração entre os três campos. Isso indica que, em alguns casos, as diferenças entre as partes convergem para campos comuns. Daí resultam os limites dessa conceituação, que apresenta-se muito mais como um esforço metodológico e terminológico do que uma diferenciação visivelmente encontrada na realidade. Além disso, percebe-se que uma das características do Terceiro Setor é sua extrema heterogeneidade, o que se repercute na ausência de consenso quanto à abrangência de seu conceito e às terminologias adotadas para se referir às organizações que o compõem (COSTA JÚNIOR, 1998). Para autores como PAULA (1997), Terceiro Setor e Organizações Não-Governamentais (ONG s) são neologismos surgidos na esteira do processo de expansão da lógica neoliberal de condução dos Governos das economias capitalistas centrais. Por detrás da discussão, cada vez mais intensa, sobre a importância das ONG s, estaria implícita a idéia de que os problemas sociais e econômicos devem ser resolvidos a partir da lógica do mercado, ou melhor, do encontro e da ação dos diversos atores no espaço das trocas econômicas, cabendo ao Estado um papel restrito à regulação dessa esfera. Cabe notar que, dentro da idéia de Terceiro Setor, encontram-se tanto organizações formalizadas juridicamente quanto informais, com uma gestão estruturada e profissionalizada quanto não-estruturada e pouco-profissionalizada, de grande porte quanto de tamanhos médio e pequeno, de caráter supra-nacional ou multinacional quanto local (CARVALHO, 1997; FERNANDES, 1994), com fontes de financiamento atreladas ao Estado e/ou grandes empresas quanto sem fontes regulares de financiamento de suas atividades, entre outras diferenciações (COSTA JÚNIOR, 1998). O ponto de convergência entre as várias organizações que comporiam o Terceiro Setor parece ser a ausência do lucro como finalidade central em sua orientação gerencial e a objetivação de benefícios para toda a comunidade ou grupos sociais específicos, seja por localização geográfica e/ou convergência de interesses tanto de natureza ideológica, quanto religiosa, racial, de opção sexual, dentre outros. Sendo assim, para fins deste trabalho assume-se como Terceiro Setor os projetos sociais e as organizações ligadas a eles que se caracterizam pela não-lucratividade como finalidade e constróem

estratégias centradas na busca de melhorias para a comunidade como um todo ou para grupos específicos da população. Isso quer dizer que considera-se integrantes do Terceiro Setor, em orientação semelhante à adotada por COSTA JÚNIOR (1998), organizações que vão desde fundações, com estruturas formais rígidas, e uma relação de proximidade com o Estado e grandes empresas a movimentos sociais pouco estruturados, englobando grupos religiosos e associações de moradores. IV - Trabalho Social: uma estratégia de reinserção no Mundo do Trabalho? As últimas décadas têm sido pródigas em transformações sociais e econômicas, que têm gerado intenso debate sobre os modelos de desenvolvimento das economias capitalistas, principalmente dos países centrais. Profundas mudanças no chamado Mundo do Trabalho vêm colocando em xeque a capacidade dessas economias de promoverem a inclusão social de grande parcela da população economicamente ativa. No cerne da discussão sobre eliminação de postos de trabalho, qualificação para o trabalho e geração de renda tanto pelo setor privado quanto pelo Estado, algumas reflexões têm se voltado para o espaço público não-estatal. A capacidade de articulação da sociedade civil é vista como instância capaz de se contrapor ao movimento de contração produtiva operado nos outros dois setores, minimizando seus impactos sobre a esfera do trabalho, não só pela capacidade de intervenção no jogo político, mas sobretudo pela organização e implementação de ações concretas no âmbito público não-estatal. (CARCANHOLO et al, 1997). Tais ações, ao mesmo tempo em que procurariam minimizar os impactos dos processos de exclusão social, estariam permitindo o desenvolvimento de novas formas de sociabilidade, contrapondo-se à uma dinâmica social estritamente guiada pela racionalidade econômica capitalista (DOWBOR, 1998). Por outro lado, discussões recentes têm destacado a capacidade de ações públicas nãogovernamentais criarem oportunidades de reinserção em atividades profissionais mesmo que não remuneradas - de muitos trabalhadores excluídos da dinâmica produtiva no setor privado e público estatal (MARCOVITHC, 1997). Para WYSOCHI (1991), entre os excluídos passíveis de ser incorporados nas atividades públicas não-estatais encontram-se não só aqueles que não foram capazes de desenvolver novas qualificações profissionais, mas também grupos que têm sido alvo de discriminações raciais, de gênero e mesmo quanto a doenças, como por exemplo, os portadores do vírus HIV. Novos trabalhadores estariam sendo cada vez mais requisitados pelo chamado Terceiro Setor, dado ao rápido crescimento dessa área e sua carência de mão-de-obra profissionalizada, especialmente no que diz respeito aos processos de gestão (McCARTHY, 1997; DRUCKER, 1995; BRADNER, 1993). Além disso, o Terceiro Setor estaria se constituindo em um espaço de requalificação profissional relevante, na medida em que as atividades comunitárias permitiriam e exigiriam do trabalhador o desenvolvimento de habilidades relevantes para o trabalho nos setores privado e público estatal, tais como capacidade de trabalhar em grupo, lidar com a diversidade, flexibilizar instrumentos de trabalho, cumprir metas com baixo aporte de recursos, entre outras (DRUKER, 1992; SILVER, 1998). No entanto, vários questionamentos se colocam, principalmente quando constata-se a relativa insipiência dos estudos sobre o Terceiro Setor (IOCHPE, 1997) e a heterogeneidade dessa área de atividade, quer seja de acordo com a trajetória histórica de cada nação (GASKIN & SMITH, 1995), quer seja pela natureza do próprio setor, manifestada em vários aspectos tais como forma e finalidade das intervenções sociais, tamanho e abrangência das organizações, grau de sistematização dos processos gerenciais, acesso a recursos e condições de trabalho, entre outros. Além disso, a visão do Terceiro Setor como alternativa para a incorporação e/ou reincorporação de profissionais em economias periféricas, como a brasileira, exige uma reflexão mais profunda das práticas concretas de gestão desenvolvidas pelas organizações desse setor e seus impactos efetivos na realidade sócioprodutiva nacional.

V Gestão do Terceiro Setor: interação e aprendizagem entre público e privado Além das habilidades profissionais que o trabalhador da esfera social pode vir a desenvolver, observase em algumas organizações do Terceiro Setor uma série de peculiaridades gerenciais. Entre elas destacam-se: proximidade do beneficiário, ações em rede, estruturas desburocratizadas e enxutas, gestão participativa, imagem institucional consolidada e motivação da mão-de-obra (voluntária). Cabe ressaltar que várias dessas peculiaridades gerenciais são enfatizas como virtudes administrativas pelos processos de reestrurução organizacinal no setor privado. Sendo assim, percebe-se que, em muitos casos, as organizações do Terceiro Setor alcançam metas gerenciais que são centrais para a iniciativa privada, visto que conseguem operar com estruturas reduzidas - devido à carência de recursos financeiros e humanos -, construir parcerias com outras organizações que atuam no mesmo setor (ação em redes ) - como forma de superar suas limitações operacionais - e gozar de uma sólida imagem institucional. Além disso, muitas instituições sem fins lucrativos apresentam um modelo de gestão participativo da mão-de-obra, que em sua maioria é voluntária e mostra-se altamente motivada e engajada em torno dos objetivos organizacionais. Por fim, muitas delas se fazem muito próximas dos beneficiários de seus projetos sociais, atendendo com maior eficiência e propriedade as demandas de seus clientes, até mesmo porque em muitos casos, essas organizações nasceram da própria associação dessas pessoas, visando sanar problemas sociais, econômicos e afetivos que as afligem. O campo da Gestão é considerado um dos espaços centrais para o avanço das organizações do Terceiro Setor (HUDSON, 1999; DRUCKER, 1995). Vários autores apontam para a necessidade de profissionalização dos indivíduos que atuam nessa área, sobretudo aqueles que desempenham papéis gerenciais. Através de gestores com sólida formação e domínio de técnicas administrativas, as práticas e políticas organizacionais no Terceiro Setor se tornariam mais sistematizadas, articuladas e voltadas ao cumprimento dos objetivos propostos pelas instituições sociais. Nesse movimento, as organizações estatais e privadas seriam espaços geradores de tecnologias gerenciais a serem incorporadas pelos gestores do Terceiro Setor. Isso se daria não só pela alocação de exexecutivos privados nessa área, mas também pela ação de consultores e pela incorporação de modelos gerenciais de órgãos e empresas financiadoras e/ou controladoras das organizações do Terceiro Setor. No entanto, a transposição de técnicas gerenciais oriundas da esfera privada não se processa de maneira linear e absoluta, esbarrando nas especificidades da gestão social, característica das organizações do Terceiro Setor. Ferramentas administrativas privadas carregam em si conceitos e pressupostos que, em alguns casos, podem trazer distorções quanto à natureza da gestão demandada na esfera social. (MINTZBERG, 1996). Para TENÓRIO (1997), os termos cliente e usuário, bastante difundidos e enfatizados por metodologiais gerenciais como a qualidade total, não se adequam às organizações não-governamentais, visto que não incorporam o conceito de cidadania à formulação, implementação e avaliação de políticas sociais. Para o autor, o conceito mais apropriado remete-se à idéia de cidadão-beneficiário. MINTZBERG (1996), por sua vez, indica que os parâmetros prevalescentes na gestão social giram em torno da noção de bem público e cidadania, fazendo com que os critérios de rentabilidade operacional do setor privado (geralmente baseados em alta utilização do serviço e número elevado de atendimentos) dêem lugar a critérios que levem em consideração fundamentalmente a metodologia aplicada para a intervenção nos problemas sociais. Essa metodologia, segundo KLIKSBERG (1997), deve se balizar no cenário imposto à gestão social na América Latina, cujos maiores desafios concentram-se na consolidação da democracia, na transparência e no controle social da gestão. Sendo assim, cabe ao gestor do Terceiro Setor não apenas desenvolver uma profunda visão dos mecanismos de mercado, mas sobretudo conciliar perspectivas política, social e constitucional em suas concepções gerenciais.

Tendo que trabalhar para a construção da cidadania em uma sociedade que mostra-se cada vez mais multi-facetada, o gestor social teria como atributos centrais a capacidade de articulação e de negociação (KLIKSBERG, 1997), diferentemente do gestor privado, que se caracterizaria pela agressividade e competitividade no alcance de metas do empreendimento. NOGUEIRA (1998), por sua vez, destaca que a fragmentação da sociedade civil só pode ser superada através de uma gestão social marcada pela combatividade, perseverança e pela indignação. Esses seriam os ingredientes básicos para o desenvolvimento de empreendedores no Terceiro Setor. Para o autor, faz-se necessário destacar os limites do gerencialismo privado e burocrático-estatal, sobretudo quanto à sua dominação pelas lógicas contábil e quantitativa. Um dos maiores desafios da construção da gestão no Terceiro Setor, segundo SERVA (1997) parece ser a relação entre racionalidade instrumental e substantiva. Atreladas a organismos financiadores de suas atividades, as organizações do Terceiro Setor, conforme atesta TENÓRIO (1997), muitas vezes se deparam com lógicas de eficácia econômico-financeira para avaliação de suas atividades, ao passo que seus modelos gerenciais são guiados no cotidiano por critérios mais substantivos, ligados à promoção social de suas ações. Nesse sentido, a gestão de organizações do Terceiro Setor assume grande complexidade. O completo desatrelamento em relação aos parâmetros de avaliação pode comprometer a sustentabilidade das intervenções junto aos problemas sociais, enquanto que a desconsideração da esfera substantiva da organização pode levar a uma dissonância entre corpo voluntário e corpo gerencial. O difícil equilíbrio entre esses pólos requer do gestor social habilidades especiais. Para HUDSON (1999), o gerente ou executivo principal no Terceiro Setor deve conciliar conhecimentos financeiros e de marketing com habilidades interpessoais e de articulação política, sendo enérgico quando decisões importantes precisam ser tomadas e delicado quando se requer compaixão e sensibilidade (p. 208-209). Seu trabalho seria caracterizado pela construção de relacionamentos com diferentes atores sociais, que iriam desde voluntários até órgãos financiadores, passando pela mídia, Governo e beneficiários. Pesquisa de TEODÓSIO & RESENDE (1999) em organizações sem fins lucrativos voltadas à problemas da infância indica que o gerente no Terceiro Setor parece possuir um papel diferente daquele tradicionalmente observado em organizações públicas e privadas. A capacidade de captação de mão-de-obra voluntária é associada à habilidade de se construir uma gestão harmoniosa, ou seja, que minimize o conflito no âmbito das organizações. Nesse setor, a insatisfação com a postura e as ações da organização pode levar o voluntário a se dedicar a outra causa/instituição. Já nas empresas públicas e privadas fatores como necessidade de remuneração, status e posição social, dentre outros, tornam-se barreiras para o desligamento da organização por parte do empregado, levando-o a adotar estratégias menos radicais, tais como mudança de área, procura por novas funções, simulação de engajamento, Ainda segundo HUDSON (1999), o cargo de gestor seria uma função de alta exposição pública, exigindo de seu ocupante uma sólida reputação entre os demais atores sociais e organizacionais, a fim de não abalar as bases de confiabilidade que sustentam as ações no Terceiro Setor. Além disso, esses gestores devem ser capazes de trabalhar com o pensamento estratégico e implementar ações imediatistas, dadas as carências administrativas e de recursos humanos dessas organizações. TEODÓSIO & RESENDE (1999) observam que gestores de organizações do Terceiro Setor, que pesquisaram, dividiam suas preocupações entre problemas cotidianos e assuntos estratégicos. Apesar de ocuparem o mais alto escalão na organização, o trabalho desses gestores assemelhava-se ao de gerentes de nível intermediário em grandes empresas, que têm que conciliar preocupações tanto de nível operacional quanto estratégico. A superação dos desafios gerenciais do Terceiro Setor, segundo TENÓRIO (1997), constitui-se em um aprendizado contínuo, no qual seus gestores desenvolvem percepções sobre novos modelos gerenciais, incorporando-os às peculiaridades de suas organizações. Entre os resultados esperados desse aprendizado

destacam-se: ação por meio de redes; identificação de áreas de atuação e cidadãos-beneficiários, criação de mecanismos de controle consistentes com a natureza das atividades desenvolvidas; e alcance de visibilidade perante a sociedade. TEODÓSIO & RESENDE (1999) constataram em sua pesquisa que, além dos problemas de natureza eminentemente gerencial que as organizações do Terceiro Setor atravessam, outros também se apresentam, sobretudo aqueles ligados à imagem e credibilidade junto à sociedade. As organizações do Terceiro Setor precisam se posicionar dentro de uma área de atuação ainda em construção e que tem passado por drásticas mudanças num curto espaço de tempo. Além disso, a dificuldade de construir parâmetros para avaliação de projetos sociais e a persistência de organizações que despertam questionamentos quanto à credibilidade e utilidade de suas ações constituem-se também em obstáculos para o desenvolvimento das organizações sérias e realmente relevantes para a sociedade. VI - Estratégias Metodológicas O estudo insere-se no âmbito da pesquisa-ação, visto que a coleta de dados se baseou em consultoria e suporte gerencial do autores para construção de planos de intervenção social pelos empresários, utilizandose variados instrumentos de coleta de dados. Dentre as estratégias empregadas para captação de informações destacam-se: participação em reuniões de trabalho, aplicação de questionário junto aos empresários com perguntas abertas e fechadas, pesquisa documental e entrevistas desestruturadas com os empresários e a equipe de apoio técnico da incubadora tecnológica. A análise dos dados privilegia a abordagem qualitativa do fenômeno social estudado, privilegiando a percepção e o discurso empresarial desenvolvidos na elaboração de planos de intervenção em problemas sociais. VII Construção de Planos Sociais: a experiência de empresas incubadas O processo de incubação de empresas envolve suporte tecnológico, gerencial e disponibilização de infra-estrutura material, financeira e humana às empresas recém-criadas, mediante a alocação das sedes dos novos empreendimentos em um espaço comum: a própria incubadora. Apesar de existirem incubadoras de negócios populares, a maioria dos processos de incubação existentes no Brasil estão voltados às empresas intensivas em tecnologia, que devem desenvolver projetos inovadores e mercadologicamente viáveis. A seleção de projetos para incubação se dá mediante concorrência pública, o que dá o direito de permanência por tempo limitado na incubadora (geralmente três anos). No que diz respeito à tecnologia, as incubadoras podem ser multi-setoriais, englobando variados segmentos tecnológicos, ou setorizadas, geralmente concentrando-se em uma das três áreas principais: biotecnologia, microeletrônica e industrial. A incubadora de empresas em análise, criada na década de 90, caracteriza-se pela multisetorialidade, situando-se em dos municípios de maior dinamismo econômico e social na região metropolitana de Belo Horizonte. Desde a sua formação, duas vertentes de igual valor e dimensão estratégica foram definidas em sua missão: a inovação tecnológica associada a benefícios sociais para a comunidade, expressos quer seja através da geração de empregos, quer seja no apoio ao desenvolvimento de tecnologias que beneficiem a comunidade, através da melhoria da qualidade de vida, saúde, habitação, transporte e meio ambiente (Planejamento Estratégico da Incubadora). Nesse sentido, a idéia de incorporar a elaboração de projetos sociais por parte das empresas incubadas como um dos critérios de análise da performance e da evolução dos empreendimentos apresentouse como um desdobramento natural dos valores expressos na missão institucional da incubadora. Por outro lado, uma preocupação fundamental na construção desses projetos foi evitar a duplicidade de esforços e recursos aplicados pelas empresas em áreas totalmente distintas de seus campos de atuação. Isso

poderia gerar um acúmulo de tarefas, esforços e demanda de recursos humanos e materiais num momento delicado de vida dessas empresas: a incubação. Sendo assim, foram definidos alguns critérios para o desenvolvimento dos projetos por parte dos empresários. O primeiro deles era o de que as intervenções sociais pretendidas pelos empresários focalizassem problemas sociais próximos à área de atuação da empresa, com vistas a fazer com que os esforços para desenvolvimento comunitário pudessem ser beneficiados pelos esforços para desenvolvimento tecnológico da empresa e vice-versa. Outro parâmetro extremamente importante definido como critério básico para a elaboração dos projetos seria o envolvimento do empresário na construção e, principalmente, na implementação da intervenção social. Nesse ponto, partiu-se da concepção de que não somente a comunidade se beneficiaria com a convivência com empreendedores natos em seu seio, mas também de que a empresa desenvolveria importantes fatores competitivos à medida em que o ímpeto dos self-made man (uma das características mais marcantes do perfil empreendedor) fosse mais humanizado, através da convivência com pessoas de cultura, realidade e perspectiva diferentes daquelas do empresário. Nesse sentido, habilidades comunicativas, trabalho em equipe, flexibilidade, capacidade de liderança, dentre outros fatores, seriam dinamizados pelo empresário ao entrar em contato com a comunidade. Por fim, mas não menos importante, apareceria o critério de relevância social, ou seja, os projetos deveriam contemplar problemas sociais relevantes vivenciados pelas comunidades no entorno da incubadora de empresas. A definição desses problemas não poderia ser feita de maneira unilateral pelas empresas, sob pena de se impor soluções às comunidades, que poderiam demandar ou idealizar outras saídas para seus problemas. Nesse ponto, a experiência prévia da equipe de suporte gerencial da incubadora em contactar a comunidade e desenvolver ações pontuais de intervenção social foi um fator fundamental para a integração entre empresários e comunidade. A vocação social da incubadora em análise pode ser explicada também pelos compromissos sociais que marcaram sua criação. Fundada a partir da articulação de ações entre uma grande empresa estatal, duas universidades, entidades empresariais, governo do Estado e prefeitura municipal, a incubadora sempre teve como referência básica a reversão dos investimentos feitos pelo município em ganhos econômicos e sociais para a comunidade na qual está inserida. Sempre houve uma preocupação em aumentar a aproximação com a comunidade do município, principalmente nas suas regiões mais carentes. Dessa forma, no momento de criação e implementação dos projetos já havia um know-how de abordagem social acumulado pela equipe de suporte gerencial da incubadora, que foi decisivo para o aprimoramento dos projetos criados pelos empresários. Um fator que serviu para ampliar o alcance social dos projetos, considerados como um todo, foi o fato da incubadora abrigar empreendimentos em variadas áreas tecnológicas. Por outro lado, isso tornou mais complexo o trabalho de suporte gerencial tanto da equipe interna da incubadora quanto do consultor contratato. A extrema heterogeneidade das empresas que compõem a incubadora resultou em enormes ganhos para a comunidade, pois o município que abriga essas empresas caracteriza-se por uma multiplicidade de problemas sociais. Tendo observado uma grande expansão industrial nas últimas décadas, o município em questão incorporou grandes problemas urbanos, na medida em que o fluxo migratório para a região aumentou consideravelmente. Assim, desde problemas ligados às cidades industriais, como o desemprego e a perda de dinamismo produtivo, até problemas ligados à posse de terras se manifestaram na cidade, que tem atualmente duas áreas de invasão e assentamento de sem-terras. No quadro abaixo apresentam-se os projetos sociais desenvolvidos pelas empresas incubadas. Quadro 2 Empresas incubadas e projetos sociais Empresa Área de atuação Área de intervenção social 1 Equipamentos médicos e esterilização de ambientes médico-hospitalares Suporte à purificação de água e esterilização de moradias em assentameto agrário

2 Produtos de limpeza industrial, doméstica e automotiva Coleta seletiva de lixo e utilização racional de produtos de consumo doméstico 3 Revestimento de superfícies metálicas Treinamento e emprego de mão-de-obra com necessidades especiais sensorias (auditivas) 4 Aprimoramento biológico de mudas e suporte agrário Suporte em projetos de infra-estrutura para assentamento agrário 5 Treinamento e emprego de mão-de-obra Análise química para indústria 6 Produção e comercialização de extratos para medicamentos Fonte: Dados coletados pela pesquisa. com necessidades especiais Transferência de tecnologia para plantio de mudas medicinais Como pode-se observar no quadro anterior, a maioria dos projetos concentra-se em sua área de atuação empresarial. Outros projetos, no entanto, extraíram a sinergia entre ação social e negócio através da alocação de mão-de-obra com necessidades especiais. No entanto, o que pode-se perceber é que procurou-se estabelecer uma relação de ganhos mútuos para a comunidade e para a empresa, na medida em que os empresários atuam sobre problemas ligados à sua formação e/ou área de atuação profissional, ao mesmo tempo em que atacam problemas sociais graves. No caso das empresas 4 e 5 os projetos sociais procuraram privilegiar a alocação de um tipo de mãode-obra que encontra sérios problemas de inserção no mundo do trabalho: os portadores de deficiências físicas. No caso da empresa 4, a utilização de indivíduos com baixa ou nenhuma capacidade auditiva não apenas possibilita a inserção desses profissionais no trabalho, como também equaciona um problema recorrente no processo de produção a ser implementado pela empresa: exposição à altos níveis de ruído no local de trabalho. Já na experiência da empresa 2, o suporte à implantação da coleta seletiva de lixo na cidade, associado ao desenvolvimento de programas de conscientização da utilização racional de produtos de consumo doméstico, sobretudo os ligados à limpeza, permite que a empresa tenha contato direto com seus consumidores, ao mesmo tempo em que ajuda a consolidar um programa de tratamento de lixo que já vem sendo discutido pela comunidade. Os programas das empresas 1, 4 e 6 concentram-se nos assentamentos agrários no município. Nesses programas, a complementaridade entre o foco de negócios das empresas e seus projetos sociais é extremamente elevada. Além disso, a ação articulada de três projetos numa mesma comunidade permite que os empresários tenham ganhos de escala significativos, partilhando conhecimento e habilidades complementares nos momentos de abordagem da população atendida, construção de soluções técnicas e gerenciais, alocação de recursos, dentre outros. Enquanto a empresa 1 auxiliará a comunidade na purificação e esterilização de seu ambiente, evitando a difusão de doenças e propagando princípios médios de higiene entre a população, a empresa 4 proverá estudos para a implantação de infra-estrutura básica para a área assentada se tornar produtiva. Já a empresa 6 proverá treinamento para a mão-de-obra local especializar-se no planto de mudas medicinais, cuja a produção tem grande valor agregado, principalmente nos mercados da região sudeste. Por outro lado, os ganhos competitivos para essas empresas relacionam-se tanto com o aprimoramento das habilidades gerenciais dos empresários, quanto pelo foco em suas áreas de ação, servindo como laboratório para futuros desafios competitivos que vivenciarão, quer seja na abordagem dos clientes, na negociação com fornecedores, na busca de soluções criativas para os obstáculos gerenciais,... VIII Considerações Finais Os ganhos competitivos com projetos sociais desenvolvidos por empresas não restringem-se à esfera do ambiente organizacional externo, mas remetem-se principalmente à produtividade no trabalho. Apesar de vantagens como consolidação da imagem institucional, melhor relacionamento cliente-empresa, redução de

ameaças externas, dentre outras, serem sempre citadas quando analisa-se estratégias empresariais de intervenção em problemas sociais, outros ganhos de magnitude muito mais significativa podem ser obtidos com a participação de empregados, tanto do nível gerencial quanto administrativo e operacional, em projetos sociais. O chamado Terceiro Setor, no qual se incluem projetos de cidadania empresarial, bem como organizações não-governamentais e/ou sem fins lucrativos, estaria se constituindo em um espaço de requalificação profissional relevante, na medida em que as atividades comunitárias permitiriam e exigiriam do trabalhador o desenvolvimento de habilidades relevantes para o trabalho, tais como: capacidade de trabalhar em grupo, lidar com a diversidade, flexibilizar instrumentos de trabalho, cumprir metas com baixo aporte de recursos, entre outras. O trabalho social e/ou voluntário estaria sendo cada vez mais requisitado no Terceiro Setor, dado ao rápido crescimento dessa área, e sua carência de mão-de-obra profissionalizada, especialmente no que diz respeito aos processos de organização e de gestão. Sendo assim, abre-se um espaço relevante para o aprimoramento da produtividade por vias alternativas ao esquema clássico de se repensar os processos e a forma de organização interna do trabalho na empresa. Essa saída parece estar sendo explorada em profundidade por empresas dos países centrais, principalmente as norte-americanas, na medida em que valorizam e estimulam a participação de seus empregados em atividades comunitárias e sociais voluntárias. Os empresários das pequenas empresas incubadas e os trabalhadores de suas organizações, na medida em que participam ativamente da execução dos projetos sociais podem adquirir importantes habilidades profissionais para atuar em áreas intensivas em tecnologia, como é o caso dos empreendimentos pesquisados. Atividades comunitárias exigem e permitem o desenvolvimento de habilidades como: adaptação de inovações tecnológicas à realidade social nas quais será empregada; desenvolvimento de soluções utilizando o conhecimento e as técnicas disponíveis junto à população atendida pelos projetos sociais; trabalhar em equipe com pessoas com diferentes graus e áreas de formação; lidar com a diversidade cultural e tecnológica; flexibilizar instrumentos e técnicas de trabalho; alcançar objetivos com baixo aporte de recursos, dentre outras. A análise dos dados indicou uma dificuldade dos empresários em conceber os planos de intervenção social como fatores alavancadores de produtividade e competitividade para seus negócios. As principais dificuldades encontradas pelos empresários no desenvolvimento dos projetos sociais giram em torno da abordagem da comunidade, adequação das soluções tecnológicas à realidade social das comunidades e articulação de variáveis de natureza tecnológica com fatores ligados às relações políticas, sociais e culturais. Por outro lado, o estudo evidencia que os projetos sociais mais consistentes conjugam vocações internas dos empresários, virtudes e habilidades tecnológicas de suas organizações com a intervenção em problemas sociais de natureza semelhante a essas vocações, virtudes e habilidades. Ao desenvolverem seus projetos sociais as organizações pesquisadas têm a oportunidade de testar novos usos de seus produtos e serviços, bem como novos mercados e hábitos de consumo da população. Além disso, há uma salutar aproximação entre o empresário inovador e a comunidade, permitindo maior agilidade no lançamento de que produtos e serviços mais eficientes para a sociedade e mais facilmente comercializáveis para as empresas pesquisadas. Assim, conclui-se que o desenvolvimento de planos sociais por parte de empresas intensivas em tecnologia pode resultar não apenas em grandes ganhos para a sociedade, mas também para a competitividade e produtividade das organizações. IX Referências Bibliográficas

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