Imagem da Semana: Ressonância Nuclear Magnética Imagem 01. Ressonância nuclear magnética do encéfalo em corte transversal ao nível dos ventrículos laterais
Paciente, masculino, 73 anos, 4 anos de escolaridade, comparece à consulta acompanhado de esposa que relata apatia, agressividade, comprometimento da memória, retardo psicomotor, alterações da marcha e urge-incontinência urinária com 6 meses de evolução. Ao exame físico: marcha de base alargada, instabilidade postural e parkinsonismo. Miniexame do estado mental (MEEM): 12/30. Foi solicitada propedêutica laboratorial para síndrome demencial (exames inalterados) e ressonância magnética (RM) do encéfalo. Com base nos dados clínicos e na imagem, qual o diagnóstico mais provável? a) Hidrocefalia de pressão normal b) Doença de Alzheimer c) Demência vascular d) Demência na doença de Parkinson
Análise das imagens Imagem1: Ressonância nuclear magnética do encéfalo em corte transversal ao nível dos ventrículos laterais. Imagem ponderada em T1, sem contraste, revelando dilatação desproporcional dos ventrículos laterais, com relativo apagamento dos sulcos corticais, não se evidencia obstrução ao fluxo do líquido cefalorraquidiano. Setas vermelhas destacam ventriculomegalia. Diagnóstico Hidrocefalia de pressão normal (HPN) é condição na qual os ventrículos encontram-se aumentados sem que haja bloqueio estrutural à circulação do LCR, e à punção lombar a pressão é normal. Está associada à clássica tríade de alterações da marcha, incontinência urinária e declínio cognitivo, de desenvolvimento gradual (semanas ou meses).
A doença de Alzheimer (DA) é a doença neurodegenerativa mais comum em idosos e tem como principal manifestação perda de memória que evolui com progressivo declínio cognitivo e funcional, caracterizando a demência. De evolução insidiosa, inicialmente não prejudica a marcha nem a continência urinária. Os achados à neuroimagem, embora inespecíficos, são atrofia cortical generalizada e hipocampal. Demência vascular (DV) é uma síndrome heterogênea, cuja causa subjacente é a doença cerebrovascular. A piora cognitiva pode ocorrer logo após um infarto estratégico (ex: tálamo), ou evoluir de forma insidiosa, com curso flutuante, em degraus, podendo haver sinais neurológicos focais, história de hipertensão arterial, diabetes mellitus e AVE prévio. À neuroimagem, podem-se evidenciar infartos corticais e subcorticais prévios ou leucoaraiose. Na demência associada à doença de Parkinson (DDP), a demência ocorre pelo menos um ano após o parkinsonismo, com predomínio de disfunção executiva, déficit de atenção e alucinações visuais. À neuroimagem podem-se encontrar alterações inespecíficas, como hipotrofia generalizada e hipocampal. Discussão HPN é uma síndrome caracterizada por apraxia da marcha, demência e incontinência urinária. Estes sintomas são provavelmente decorrentes de disfunção da substância branca periventricular, particularmente daquela subjacente ao lobo frontal, por consequência do volume aumentado de LCR. Condição patológica, rara incide predominantemente na população acima de 60 anos e pode ser secundária ou idiopática. Em idosos, a HPN é geralmente idiopática e, como é potencialmente reversível pela colocação de derivação ventrículo-peritoneal (DVP), é de grande importância reconhecê-la e diagnosticá-la prontamente. Na investigação diagnóstica, deve-se mensurar o comprometimento cognitivo a partir de testes como o MEEM e solicitar propedêutica laboratorial para síndrome demencial, incluindo dosagens de vitamina B12, TSH e T4 livre, VDRL e anti-hiv. A RM pode sugerir HPN ao evidenciar ventriculomegalia desproporcional ao alargamento dos sulcos e sem obstrução evidente ao fluxo do LCR, além de afastar diagnósticos diferenciais como tumores, hematoma subdural. Na ventriculografia radioisotópica (VR), exame no qual se injeta isótopo radioativo 99mTc-DTPA por punção lombar e visualiza-se sua distribuição por até 24 h, a HPN é sugerida pela ausência de isótopos nas concavidades cerebrais. A VR tem 100% de sensibilidade e de valor preditivo negativo para o diagnóstico, apresentando boa relação custo-benefício por ser disponibilizada pelo SUS e ter menor custo que a RM (Prof. Viviane Parisotto Marino). O teste de punção lombar (TPL, tap test ), que consiste na retirada de 50 ml de líquor com documentação da marcha e função cognitiva antes e 60 minutos após o procedimento, é indicado para avaliar possível resposta à DVP, uma vez que simula um shunt provisório. A boa resposta ao teste indica bom prognóstico ao procedimento. Até 2/3 dos pacientes podem apresentar alguma melhora clínica após a DVP. Em metade destes, no entanto, o benefício não será mantido. Um problema potencial no diagnóstico diferencial é que a HPN pode coexistir com outras demências, particularmente DA e DV. Aspectos Relevantes: - Tríade clinica clássica: transtorno de marcha, incontinência urinária e declínio cognitivo - Pressão normal à punção lombar sem bloqueio estrutural à circulação do LCR. - Teste de punção lombar identifica pacientes que possam responder à DVP
- RM demonstra ventriculomegalia sem evidências de obstrução do fluxo do LCR. - VR é um exame diagnóstico sensível com boa relação custo-benefício Referências - Neill R Graff-Radford, MBBCh, FRCP. Normal pressure hydrocephalus. Steven T DeKosky, MD, FAAN, FACP, editor. UpToDate: 2014 http://www.uptodate.com/contents/normal-pressure-hydrocephalus - Vale TC, Barbosa MT, Caramelli P, Cardoso F. Vascular Parkinsonism and cognitive impairment. Dement Neuropsychol 2012; 6(3): 137-144. - Park KW, Kim HS, Cheon SM, Cha JK, Kim SH, Kim JW. Dementia with Lewy Bodies versus Alzheimer's disease and Parkinson's Disease Dementia: A Comparison of Cognitive Profiles. J Clin Neurol. 2011; 7(1):19-24. - McKhann GM, Knopman DS, Chertkow H, Hyman BT, Jack CR Jr, Kawas CH, Klunk WE, Koroshetz WJ, Manly JJ, Mayeux R, Mohs RC, Morris JC, Rossor MN, Scheltens P, Carrillo MC, Thies B, Weintraub S, Phelps CH. The diagnosis of dementia due to Alzheimer's disease: recommendations from the National Institute on Aging - Alzheimer's Association workgroups on diagnostic guidelines for Alzheimer's disease. Alzheimers Dement. 2011; 7(3): 263-269. Autora Thaís Salles Araujo, acadêmica do 11º período de Medicina da FM-UFMG E-mail: thaissalles9[arroba]gmail.com Orientadores Professora Maira Tonidandel Barbosa, médica geriatra e professora adjunta do Departamento de Clínica Médica da FM-UFMG. E-mail: mairatonidandel[arroba]terra.com.br Revisores Carla Faraco, Amanda Marcos de Oliveira, Ana Júlia Furbino, Hércules Riani, Professora Viviane Parisotto