Discurso de Sua Excelência o Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação de Portugal João Gomes Cravinho na IV Conferência das Nações Unidas sobre os Países Menos Avançados Check against delivery Istambul, República da Turquia 11 Maio 2011
Senhor Presidente Distintos Delegados Excelências, Senhoras e Senhores 1. Quero em nome do meu Governo felicitar as Nações Unidas pela organização desta Conferência e sublinhar a honra que tenho em me dirigir hoje a esta audiência na bela cidade de Istambul. Gostaria ainda de me associar aos anteriores oradores no agradecimento sincero ao Governo turco e ao povo de Istambul pela sua calorosa hospitalidade e pelas excelentes instalações dispensadas para os trabalhos, que contribuirão certamente para o êxito desta Conferência. 2. Permitam-me que comece a minha intervenção afirmando que Portugal subscreve inteiramente a visão apresentada pela União Europeia na Sessão de Abertura, pelo Senhor Presidente da Comissão Europeia. 3. Há dez anos atrás, reunimo-nos numa atmosfera de confiança e de crescimento em torno da preocupação comum com o desenvolvimento e a dignidades dos Países Menos Avançados e dos seus povos, o que resultou na adopção do Programa de 2
Acção de Bruxelas, um reflexo do nosso compromisso partilhado para lidar com as vulnerabilidades e as necessidades destes países. 4. Ora, o Programa de Acção de Istambul que acabámos de aprovar é um resultado do trabalho conjunto que desenvolvemos para avaliar a implementação dos nossos compromissos e objectivos. Conseguimos identificar muitos dos obstáculos e constrangimentos que entretanto se nos colocaram, sendo que este processo, incorporado no Programa de Istambul, é uma enorme responsabilidade de toda a comunidade internacional, na medida em que todos nós temos de cumprir o nosso papel na resposta às necessidades específicas dos Países Menos Avançados durante os próximos anos. 5. Foi neste espírito de consciência das dificuldades, no enquadramento de uma parceria renovada e de confiança no processo dos PMA que o meu Governo organizou, no passado mês de Outubro, em Lisboa, uma Reunião Ministerial sobre o Reforço da Mobilização dos Recursos Financeiros para o Desenvolvimento dos Países Menos Avançados. Esse momento constituiu uma excelente oportunidade para discutir, num ambiente amistoso e construtivo, alguns dos principais desafios que se colocam ao desenvolvimento dos PMA, e para 3
retirar algumas conclusões e recomendações importantes para orientar o trabalho que nos conduziu até Istambul 6. Excelências, Senhoras e Senhores. Chegámos a um momento definitivo que exige uma mudança real, em que é obrigatório construir um novo paradigma da cooperação para o desenvolvimento. Devemos começar por enfatizar a importância dos PMA e do seu bem-estar na promoção da segurança, do progresso e do desenvolvimento sustentável a nível global. Vivemos hoje num mundo pautado por mudanças de tal modo vertiginosas, que a sorte e as vivências dos outros terão inevitavelmente impacto sobre as nossas próprias vidas. Como bem sabemos, são os PMA que frequentemente se confrontam com as maiores dificuldades no cumprimento e alcance dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. Ora, esta constatação ensina-nos que para conseguirmos de facto produzir uma mudança real na vida de milhões de pessoas em todo o mundo, somos obrigados a melhorar a qualidade da nossa arquitectura da ajuda e dos mecanismos ao seu dispor. Deixemo-nos de rodeios: já não é possível pensar que podemos continuar a marginalizar uma parte tão importante da humanidade e esperar que tudo continue como sempre (business as usual). É-nos exigido ter a coragem de olhar para trás, de examinar o que correu mal e de tentar antecipar e responder atempadamente aos principais desafios e 4
objectivos da próxima década e para além dela. O êxito em conseguir fazê-lo irá ditar a nossa capacidade de gerir colectivamente os muitos desafios globais que se apresentam perante nós. 7. Na actual arquitectura da ajuda assistimos, e bem, a avanços que permitem incorporar as contribuições e oportunidades que surgem do envolvimento das economias emergentes. É por esta razão que Portugal se juntou ao grupo de países que defendeu a incorporação de uma noção de parceria mais amplamente global no Programa de Acção de Istambul, uma parceria que congregue todos os actores relevantes para as dinâmicas de desenvolvimento com os PMA. Esta afirmação não pretende de forma alguma isentar-nos das nossas obrigações e compromissos, internacionalmente assumidos, mas procura antes reconhecer que o mundo sofreu mudanças significativas durante a última década, e que os nossos paradigmas do desenvolvimento são hoje muito diferentes. De facto, as economias emergentes desempenham hoje um papel muitíssimo importante, com tendência a incrementar, pelo que faz pouco sentido continuar a construir e moldar os nossos acordos multilaterais como se nada tivesse mudado no decurso deste jovem século. 5
8. A complexidade do nosso mundo impele-nos a estarmos abertos a novos conceitos e a conseguir tirar proveito da sua diversidade e heterogeneidade, pensando de modo criativo e explorando novas vias de actuação. Acredito sinceramente que esta nova arquitectura da ajuda, em constante evolução, nos coloca desafios imensos, mas acredito também que cria oportunidades e novas perspectivas que necessitam ser analisadas globalmente e que têm obrigatoriamente de incluir a voz dos países mais pobres do mundo nos diferentes contextos internacionais em que nos movemos. 9. Ora, se por um lado, os recursos que temos ao nosso dispor são claramente limitados, por outro, com a intensificação da globalização emergem constantemente novos desafios, e é verdade que a nossa arquitectura internacional da ajuda não se adapta tão rapidamente como acontecem as transformações globais. A verdade é que necessitamos de novos mecanismos multilaterais, orientados para nos ajudar a dar resposta aos problemas globais de uma forma global; precisamos de novas propostas globais e de novas políticas globais. A promoção do desenvolvimento e da boa governação em cada um dos países tem de ir de mão dada com políticas fortemente enraizadas que visem promover a boa governação da globalização como um todo, o que inclui naturalmente a regulação dos fluxos financeiros internacionais. Esta será a única forma de conseguirmos 6
criar ciclos virtuosos na nossa arquitectura de desenvolvimento global. Encontrar os caminhos certos para responder às actuais necessidades dos PMA exige novas formas de conceber a cooperação para o desenvolvimento como um todo, bem como a vontade política de fazer mais e de o fazer melhor. 10. Um modelo revitalizado de cooperação internacional deve indubitavelmente basear-se em vários princípios fundamentais. Estes incluem, entre outros, a apropriação e liderança nacionais, a consulta multilateral, uma avaliação séria das necessidades e o seu enquadramento em esforços mais amplos de desenvolvimento sustentável e de governação global. Esta argumentação corresponde inteiramente à nossa convicção de que a mobilização de recursos domésticos e as fontes inovadoras de financiamento são elementos centrais da nossa parceria global sobre o financiamento do desenvolvimento, reforçando o princípio da apropriação e reafirmando a nossa responsabilidade global na promoção do desenvolvimento. 11. Isto dito, há também que reconhecer que a apropriação não é possível excepto quando os países alcançam um certo nível de compromisso com o desenvolvimento e, a este respeito, não nos podemos esquecer de que não há 7
soluções padronizadas, já que cada país é diferente do outro, com diferentes níveis de desenvolvimento e de capacidades, o que implica constrangimentos e desafios distintos. Temos, além disto, de olhar com cautela para a questão da graduação e de garantir que a fase da transição é suficientemente atraente para os PMA, ao mesmo tempo que criamos mecanismos de transição adequados para apoiar os países que entram nessa fase, em vez de minar os seus esforços e ganhos de desenvolvimento através da imposição de condicionantes novas e mais duras. 12. Excelências, Senhoras e Senhores, as minhas palavras finais são palavras de esperança, mas são também palavras de certeza. Certeza, principalmente, de que seremos capazes de renovar a nossa parceria para o desenvolvimento dos PMA, cumprindo os nossos compromissos internacionais e procurando fazer melhor, de um modo mais eficiente, coerente e coordenado. Por fim, mas não menos importante, esperança de que a seu tempo possamos realmente assistir a um aumento significativo no número de países a graduar da categoria de PMA. 13. Deixem-me garantir-vos que Portugal se associa a todos aqueles que partilham um forte compromisso político para com este esforço central e para uma efectiva implementação do Plano de Acção de Istambul. Muito obrigada! 8