DIFERENTES OLHARES SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR DENTRO DE UM GRUPO A PARTIR DO ESTÁGIO ACADÊMICO



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Transcrição:

DIFERENTES OLHARES SOBRE PSICOLOGIA HOSPITALAR DENTRO DE UM GRUPO A PARTIR DO ESTÁGIO ACADÊMICO Trabalho de Intervenção em Psicologia Hospitalar Bacharelado em Psicologia da Universidade São Francisco, Itatiba, Brasil 2007 Angela Cristina de Oliveira Rosana Mara Nunes Shirley Pereira Miguel Viviane Alessandra de Campos Graduados pela Universidade São Francisco, Brasil Maria Eugênia Radomille Mauro Salviatto Docentes na Universidade São Francisco, Brasil Contactos: shirleymiguel@gmail.com RESUMO O presente artigo refere-se à apresentação da experiência vivenciada por quatro estagiárias do último ano do curso de psicologia. Trata-se do trabalho de implantação do serviço de psicologia hospitalar em um hospital geral do interior de São Paulo, evidenciando a experiência em diferentes enfoques abordados pelas estagiarias na atuação junto ao paciente, familiar e equipe multiprofissional. A psicologia hospitalar tem como objetivo minimizar o sofrimento provocado pela hospitalização, considerando a assistência psicológica prestada aos pacientes e seus familiares, a produção de conhecimento psicológico na área através de sua experiência e a contribuição a partir das experiências relatadas no aperfeiçoamento de outros psicólogos e profissionais de saúde. Palavras-chave: psicologia hospitalar, paciente, hospitalização, humanização, grupo Angela C. de Oliveira, Maria E. Radomille, Mauro Salviatto, Rosana M. Nunes, Shirley P. Miguel, Viviane A. de Campos 1/10

INTRODUÇÃO Psicologia Hospitalar A psicologia hospitalar tem como objetivo a minimização do sofrimento provocado pela hospitalização, sendo que esta deverá levar em consideração diversos aspectos, um leque amplo de opções de atuação, tem características próprias, adequadas e específicas ao âmbito hospitalar e que interferem diretamente na inserção e no desempenho técnico do psicólogo. Além disso, os objetivos do psicólogo em sua atuação hospitalar abrangem a assistência psicológica que prestada aos pacientes e seus familiares, a produção de conhecimento psicológico na área através de sua experiência e, por essa mesma experiência, a contribuição de alguma forma para o aperfeiçoamento de outros psicólogos e de outros profissionais de saúde. O alcance destes objetivos implica em uma atuação coordenada e interativa entre os diferentes profissionais envolvidos com paciente, apresentando uma contribuição interdisciplinar, científica e metodológica de cada área do saber humano. (Angerami- Camon, 2001) Logo, o hospital estreitou seu compromisso com a comunidade, envolvendo-se não só nos problemas da doença e de hoje, mas também cuidando de aspectos do amanhã, prevenindo-os durante a hospitalização (Romano 1999). Os médicos e os profissionais da saúde deram-se conta de que há um lado obscuro, inconsciente, que gera conflitos, queixas, que complicam evoluções e reduzem a eficácia terapêutica prevista (Botega e Dalgalarrondo, 1993, citando em Romano, 1999). Segundo Martins e Frenk (1980, citando em Romano, 1999) a presença do psicólogo no hospital se faz imprescindível a partir do momento em que houve o aparecimento e registros de episódios psicóticos, relacionados tanto com o uso da tecnologia avançada, quanto com os procedimentos cirúrgicos, assim como com os estados confusionais e depressivos decorrentes do uso de medicação. Segundo Chiatone e Sebastiane (1991), o psicólogo hospitalar diferencia-se tecnicamente do psicólogo clinico em alguns pontos fundamentais, como: as possibilidades de atuação hospitalar são determinadas e limitadas por limites institucionais, caracterizados por regras, rotinas e dinâmicas de funcionamento e a inserção na equipe de saúde; outra característica peculiar é o espaço institucional resistente, já que o psicólogo no contexto hospitalar não era elemento previsto, devido à valorização dos aspectos orgânicos das doenças e dos doentes, em detrimento dos aspectos psíquicos; mais uma diferença significativa refere-se ao fato de que no hospital, o psicólogo deve transpor os limites de seu consultório e manter contato obrigatório com os demais Angela C. de Oliveira, Maria E. Radomille, Mauro Salviatto, Rosana M. Nunes, Shirley P. Miguel, Viviane A. de Campos 2/10

profissionais, para determinar a multiplicidade de enfoques ao mesmo problema e em conseqüência, a aplicação de diversas ações terapêuticas. A atuação do psicólogo hospitalar é permeada pela multiplicidade de solicitações, o que exige do profissional uma consistente e rápida capacidade de ação emergencial. O hospital desmobiliza a segurança e a tranqüilidade do consultório tradicional, levando o profissional a realizar seus atendimentos entre macas no pronto socorro, no centro cirúrgico ou ao lado dos leitos nas enfermarias e muitas vezes, conjuntamente aos procedimentos terapêuticos e rotinas hospitalares (Angerami Camon, 2001). O tempo interfere no atendimento psicológico, à medida que delimita a intervenção do psicólogo hospitalar. Esta delimitação decorre da rotatividade dos leitos, da gravidade das doenças e da ação de caráter emergencial. Por essa razão, é de extrema importância que cada atendimento seja consistente e que possua um fechamento coerente com as necessidades emergentes do momento vivido pelo paciente (Angerami Camon, 2001). Por isso, no hospital o profissional precisa utilizar, entre outras técnicas, a psicoterapia breve e/ou de emergência, que são as mais coerentes com situação crítica da doença e da hospitalização. Além do mais, na instituição hospitalar não é possível garantir que o paciente esteja lá no dia seguinte para retomar ou esgotar as questões levantadas no atendimento anterior (Angerami Camon, 2001). O psicólogo precisa ter muito claro que sua atuação no contexto hospitalar abrange não apenas a hospitalização em si, em termos específicos da patologia que eventualmente tenha originado a hospitalização, mas também as seqüelas e decorrências emocionais dessa hospitalização. Nesse sentido então, o psicólogo atua de modo preventivo, evitando o agravamento e a permanência de determinados problemas. (Angerami Camon, 2001). Há quatro tipos de relações que interessam ao psicólogo hospitalar, a saber: pessoa com pessoa sexo, idade, procedência, costumes, valores, etc.; paciente com grupos seu grupo familiar, a equipe multiprofissional, o grupo de outros pacientes; paciente com o processo do adoecer e com a situação da hospitalização; paciente consigo mesmo personalidade, necessidades, mitos e fantasias, etc. O psicólogo na instituição hospitalar pode fazer o papel de interconsultor psicológico, buscando atingir aspectos de compreensão relacional entre a equipe e o paciente, através de intermediação desta relação. Neste caso, assume o caráter de um porta voz das necessidades, desejos de ambos os lados e intervém de forma que os desencontros das informações sejam minimizados (Romano, 1999). Angela C. de Oliveira, Maria E. Radomille, Mauro Salviatto, Rosana M. Nunes, Shirley P. Miguel, Viviane A. de Campos 3/10

Sobre o campo de atuação O presente estudo foi realizado em um Hospital Geral, na cidade de Campinas, interior do estado de São Paulo. O Hospital atende a convênios, particulares e ao SUS (Sistema Único de Saúde) nas seguintes áreas: Pronto Socorro, UTI, Centro Cirúrgico, Maternidade, Unidades de Internação particular e convênios, Unidade de Internação SUS e Ambulatório SUS. As atividades realizadas durante o período de estágio, se concentraram nas Unidades de Internação destinada a convênios e particulares, UTI e Maternidade (atualmente atende apenas pacientes do sexo feminino, mas não realizam partos). As intervenções eram realizadas duas vezes por semana, as terças e quintas-feiras, por duas estagiarias em cada dia, no período de 03 (três) horas, durante esse período era realizada a apresentação do serviço, as visitas de rotina, atendimentos aos pacientes e também apoio junto à equipe de enfermagem. Objetivo e Justificativa O presente trabalho trata de uma proposta de discussão sobre a intervenção de um grupo de estagiários de Psicologia dentro de um hospital geral, com diferentes olhares frente a situações, equipes e demandas diferentes, sejam elas vindas do tipo de atendimento individual, familiar, apoio à equipe de saúde ou mesmo de diferentes patologias, que geraram sentimentos, sensações e diferentes reações dos membros do grupo, resguardando a subjetividade e abordagem psicológica de cada. Dentro da discussão surgem importantes observações quanto ao campo da intervenção, seus facilitadores e dificultadores e as situações mais marcantes que ocorreram ao longo dessa experiência, que se iniciou desde a implantação do serviço de psicologia hospitalar no hospital até a fase de incorporação do serviço como parte do hospital, dando continuidade a diversos projetos paralelos realizados por novos grupos aceitos dentro do hospital. O estágio em Psicologia Hospitalar foi realizado sob supervisão de docente da Universidade São Francisco, sendo parte de um programa de estágio no curso de Psicologia. MÉTODO O método do trabalho consistiu em dividir as duplas em dois dias, (terça e quinta-feira) e em sistema de atendimentos de rotina, realizando visitas em todos os quartos, e os atendimentos solicitados, quando a equipe de saúde indica aqueles pacientes e/ou familiares que mais demonstram precisar de atendimento psicológico. O atendimento à equipe de saúde do hospital Angela C. de Oliveira, Maria E. Radomille, Mauro Salviatto, Rosana M. Nunes, Shirley P. Miguel, Viviane A. de Campos 4/10

também poderia ser solicitado, se necessário. Durante os atendimentos realizados pode-se observar o emprego de várias técnicas comportamentais e psicanalíticas, uma vez que cada dupla de estagiárias contava com o conhecimento de ambas as teorias. Solicitou-se que cada dupla fizesse relatórios dos atendimentos realizados para posterior discussão entre si e com os supervisores da instituição de ensino, compondo uma das fontes deste artigo. Diante da proposta psicanalítica, observou-se que a escuta propriamente dita torna-se a técnica mais utilizada ao atendimento no hospital. Considerando o setting, o tempo de atendimento e o conteúdo trazido pelo paciente tornam-se importante o acolhimento deste sujeito, o suporte psíquico, ou simplesmente estar presente em um momento difícil de enfrentamento físico e psíquico. O atendimento a luz da Psicologia Cognitivo Comportamental envolveu algumas atividades para facilitar o vínculo e a reflexão de algumas situações, principalmente ao lidar com comportamentos de fuga-esquiva dos pacientes no processo do adoecer e internação. Procurou-se trabalhar os sentimentos e emoções causados por esses processos e dentre essas atividades, destacamos a leitura de histórias (motivadoras ou com contexto semelhante ao do paciente), o que permitia que se contassem suas próprias histórias ou expressassem seus sentimentos utilizando figuras/símbolos contidos nas histórias contados pelas estagiárias, sorteio e reflexão de frases (provérbios populares) trabalhando o cognitivo dos pacientes e uma abordagem mais diretiva, pontuando comportamentos e sentimentos que ainda não foram suficientemente trabalhados. RELATO DE EXPERIÊNCIA O início de tudo É importante relatar a chegada ao hospital pelas estagiárias, primeiramente duas que fizeram o levantamento de dados entre a equipe sobre as facilidades e dificuldades no atendimento de pacientes, avaliando as condições emocionais destes e também o conhecimento e interesse da equipe de saúde no trabalho da psicologia hospitalar. Foi um trabalho árduo, sobretudo por ser novo na instituição, apesar de muitos acolherem e apoiarem a implantação houve situações em que à resistência se fez bastante presente, subjetivamente avaliamos como um receio do novo, além de ser um trabalho que se propunha a lidar diretamente com os pacientes, foco principal de uma instituição hospitalar. Após a apresentação dos dados levantados pelas observações ao longo de um semestre, e a proposta da implantação de um Serviço de Psicologia Hospitalar, as portas foram abertas, a equipe inicial de duas estagiárias foi composta por mais duas estagiárias, uma psicóloga hospitalar foi contratada, tendo como uma das atribuições a supervisão in loco dos estagiários, e inclusive houve a formação de novas equipes de estagiários. Angela C. de Oliveira, Maria E. Radomille, Mauro Salviatto, Rosana M. Nunes, Shirley P. Miguel, Viviane A. de Campos 5/10

Algumas experiências Faz-se necessário relatar alguns trechos de atendimentos sobre os diferentes olhares e situações, tais atendimentos referem-se ao paciente, à família e à equipe de saúde da instituição. Tentamos discutir em cada momento o papel do psicólogo, que passa a oferecer o apoio psicológico e emocional que o paciente necessita para enfrentar e auxiliar a superar a doença, a internação, as fantasias geradas por todo o contexto hospitalar. Atendimento individual As técnicas foram utilizadas de acordo com a necessidade de cada paciente, como por exemplo, no atendimento realizado com uma paciente renal que teve sua fala debilitada devido a uma traqueotomia que impossibilitava que a paciente se expressasse verbalmente. Logo, a comunicação foi feita através de gesticulações, contato visual e físico, respeitando sempre o tempo da paciente. Cabe ressaltar que o contato físico aqui descrito, se deu no ato de segurar a mão do paciente. O primeiro contato com essa paciente gerou muita angústia nas estagiárias, pela dificuldade na comunicação e por desconhecermos como abordar o paciente e dar prosseguimento no atendimento. Um caso que chamou muito a atenção foi o atendimento realizado a uma paciente que realizaria uma cirurgia de grande complexidade para retirada de um tumor na região frontal do cérebro. Durante o atendimento pré-cirúrgico, observou-se que, embora a paciente procurasse demonstrar muita calma, bom humor e confiança, sua fala expressava muita insegurança quanto ao procedimento a ser realizado. Após a cirurgia, teve-se contato com a paciente na UTI, e demonstrou comportamento diferente do pré- cirúrgico. Estava muito agressiva e irritada, não desejando receber atendimento. Posteriormente a paciente foi transferida para um quarto, e num novo contato, a paciente estava mais receptiva, porém demonstrando ainda traços de agressividade e angustiada quanto às seqüelas que a cirurgia poderia lhe causar. Durante o acompanhamento realizado procurou-se acolher a paciente, reforçando-a positivamente, oferecendo escuta ativa e acima de tudo, respeitando o momento da paciente para se expressar. Outro exemplo de atendimento psicológico individual que foi solicitado pela equipe do Pronto Socorro. Segundo a equipe a paciente necessitava de acompanhamento devido a inúmeras procuras ao serviço (de forma recorrente), sem justificativa compatível. Um caso de hipocondria, no qual a paciente deseja sempre a internação e manipula a atenção de toda a equipe para suas condições de saúde, controlando até a medicação a si prescrita. No início do atendimento, não houve aderência, inclusive houve bastante referências de não gostar de psicólogo e bastante negação de sua condição de hipocondria, aliás com falas repetidas sobre seu estado não ser emocional. Contudo, no atendimento, feito em dupla, com revezamento de técnicas psicanalíticas e comportamentais, e também para o não-esvasiamento emocional das estagiárias-terapeutas. Ao longo do atendimento contextos de família disfuncional, abuso sexual e emocional, sentimentos de Angela C. de Oliveira, Maria E. Radomille, Mauro Salviatto, Rosana M. Nunes, Shirley P. Miguel, Viviane A. de Campos 6/10

solidão, além de grande repressão surgiram e foram trabalhados dentro do contingente hospitalar da paciente. A escuta foi o recurso utilizado, visto que a paciente mostrou-se resistente no primeiro momento, porém percebia-se que precisava ser escutada, respeitando seu tempo e necessidade. Atendimento familiar Em relação ao atendimento ao acompanhante ou familiar, pode-se destacar o acolhimento realizado a uma senhora de aproximadamente 50 anos. A mesma estava acompanhando sua mãe e mostrava-se muito debilitada emocionalmente. Ao entrar no quarto, foi solicitado o atendimento pela acompanhante e inclusive pelas demais pacientes do quarto. A acompanhante chorou muito e dizia não se conformar por sua mãe estar hospitalizada. Isso a fazia pensar em morrer, visto que seu maior medo era perder sua mãe. Procurou-se ouvi-la deixando com que expressasse suas angustias e medos. O desgaste emocional ao final do atendimento era evidente na estagiária, pois havia um sentimento de tristeza e angustia muito intensos naquela acompanhante que chorou todo o tempo de atendimento. A culpa pareceu estar presente em sua fala, talvez por uma adolescência conturbada e um relacionamento difícil com sua mãe. Na atual circunstancia, a filha da paciente encontra-se casada, com filhos, mas não os vê como pessoas mais ou tão importantes quanto sua mãe, a qual considera a pessoa mais importante de sua vida, colocando-a a frente de sua própria vida. Aparentemente a filha da paciente esperava que a criticasse ou que falasse para se conformar diante da idade em que sua mãe se encontrava, porém, a postura foi contrária, a escuta e não repreensão da acompanhante a surpreendeu e fez com que expressasse cada vez mais os sentimentos e emoções que a afligiam. Ao término do atendimento ela demonstrou e relatou estar se sentindo aliviada por ter expressado sua dor, agradecendo pelo tempo de escuta. Este atendimento despertou um sentimento de gratificação pela profissão e fez pensar que enquanto estagiários de psicologia, muitas vezes a ansiedade e dúvida sobre o que falar, como se expressar naquele momento, faz com que deixamos de lado a atenção flutuante e não ouvimos o que o paciente nos traz. A presença, acolhimento e escuta é muito importante para que só a partir do conteúdo trazido possamos conduzir o atendimento. Outra experiência de atendimento à paciente e família conjuntamente bastante marcante foi o atendimento de um paciente que desenvolveu um tumor maligno no encéfalo. O atendimento realizado pelas estagiárias foi solicitado pelo médico neurologista, como apoio à família na decisão em contar ao paciente que seu tumor era maligno e que apesar da cirurgia, não havia possibilidade de remissão integral, sendo um prognóstico reservado. O paciente foi atendido no pré e póscirúrgico, assim como sua família e em todo momento falava de Deus e de sua crença de cura integral. A família optou até o momento de sua saída do hospital em não contar o real estado do paciente. Essa situação gerou diversas dúvidas em relação ao direito do paciente em saber integralmente de sua condição de saúde e do quanto o impacto do saber deveria ser minimizado em sua vida. É valido relatar o sentimento das estagiárias diante da situação em que o médico as Angela C. de Oliveira, Maria E. Radomille, Mauro Salviatto, Rosana M. Nunes, Shirley P. Miguel, Viviane A. de Campos 7/10

chama e na presença da mãe do paciente, solicita suporte na apresentação do estado atual da doença aos familiares. Neste primeiro momento, procurou-se ouvir o que o médico apresentava, em seguida, buscou-se afastar a mãe do paciente daquele local e acolhê-la propondo-se uma escuta compreensiva, visto que a ansiedade e apreensão diante da situação tornaram-se evidentes. Procurou-se deixar claro que a informação deveria ser passada pelo médico, mediante aceitação da família e que somente eles poderiam optar, embora seja direito de todos saber a verdade sobre seu estado de saúde. O papel do psicólogo naquele momento foi de acolher e ouvir, mostrar-se presente. Percebe-se que tanto por parte do médico, quanto pela própria família, havia um sentimento de alívio diante do serviço de psicologia, como se coubesse ao psicólogo decidir se o paciente deveria ou não saber seu estado real de saúde e inclusive apresentá-lo ao mesmo. Atendimento à equipe Durante o período de estágio um dos membros da equipe de enfermagem, profissional de muitos anos dentro do hospital, sofreu a morte de sua mãe. Esse profissional sempre bastante aderente ao trabalho dos estagiários, sempre indicando pacientes para atendimento, foi facilmente aderida ao seu próprio atendimento. A sessão ocorreu com a técnica da escuta, através da qual se observou uma grande revolta por ter perdido a mãe sem poder como profissional da saúde interferir em nada, procurou negar a morte várias vezes e também se utilizou do processo da culpa ao lidar com a situação, culpou a si mesmo por não perceber antes a doença da mãe e ao hospital por não solucionar logo o problema, ocasionando diversas infecções levando a a morte, e por fim culpou a Deus, por ser injusto. Depois em um segundo momento, passou a demonstrar todo seu processo depressivo, seu desejo de morte também, sua falta de motivação ao trabalho e em continuar suas atividades rotineiras, contudo se auto julgando como não ter o direito de se sentir desse modo. Isso é para os outros (sic). A estagiária só interferiu em momentos que achou necessário questionar aquela crença, e quando foi solicitada pelo paciente. A estagiária procurou também esclarecer o processo de perda. Durante outros encontros com esse membro da equipe, percebeu-se uma progressiva melhora, principalmente na aceitação da morte e na motivação a voltar às suas atividades rotineiras normalmente. CONSIDERAÇÕES FINAIS A escolha pelo estágio em Psicologia Hospitalar foi pela experiência clínica envolvida, por pensar que estar num ambiente hospitalar com tantas pessoas fragilizadas, que nós como psicólogos pudéssemos fazer diferença, oferecendo conhecimento psicológico e apoio emocional adequado, embasados na técnica. Contudo, o que mais se percebeu e por muitas vezes gerou frustrações é que ajudar as pessoas hospitalizadas transcende a técnica, a teoria. Por muitas vezes o Angela C. de Oliveira, Maria E. Radomille, Mauro Salviatto, Rosana M. Nunes, Shirley P. Miguel, Viviane A. de Campos 8/10

papel do psicólogo hospitalar é o de um voluntário que está ali para distrair, servir de depósito do que o paciente e familiares quer falar e sem tempo para investigar e tratar conteúdos muito mais específicos e psicológicos que interferem diretamente na saúde física das pessoas. Muitos se limitam a falar da doença, do hospital, mas outros se abrem e falam do que na verdade gerou aquele estado de doença, suas frustrações, medos. Essa catarse ocorre de diversas formas, naturalmente, através de histórias contadas pelas estagiárias ou frases de motivação, técnicas eventualmente utilizadas para o atendimento hospitalar. Angela C. de Oliveira, Maria E. Radomille, Mauro Salviatto, Rosana M. Nunes, Shirley P. Miguel, Viviane A. de Campos 9/10

REFERÊNCIAS Angerami-Camon, V. A. et al. (2001). Psicologia Hospitalar: teoria e prática. São Paulo: Pioneira; Chiatone, H. B. C., Sebastiane, R. W. (1991). Introdução em Psicologia Hospitalar. Nêmeton: Centro de Estudos e Pesquisas em Psicologia e Saúde. Série: Cadernos de Psicologia Hospitalar; Romano, B. W. (1999). Princípios para a prática da Psicologia Clínica em hospitais. São Paulo: Casa do Psicólogo. Angela C. de Oliveira, Maria E. Radomille, Mauro Salviatto, Rosana M. Nunes, Shirley P. Miguel, Viviane A. de Campos 10/10