Aplicação clínica do cimento Portland



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Transcrição:

caso clínico Oooo XX, Oooo XX Aplicação clínica do cimento Portland Fabiano de Sant Ana dos Santos 1 Resumo Introdução: dentes com lesões periapicais necessitam de terapêuticas especiais. Nesse sentido, a cirurgia parendodôntica seguida de obturação retrógrada com um material biocompatível e indutor de reparação tecidual é indicada. O cimento Portland (CP) apresenta todas as características do mineral trióxido agregado (MTA), indicado para tratamentos endodônticos complexos. O CP não tem radiopacidade, entretanto, apresenta baixo custo. Objetivo: apresentar um caso clínico em que se realizou uma cirurgia parendodôntica seguida de obturação retrógrada selada com o CP. Resultados: decorridos 40 meses, as imagens radiográficas sugeriram reparação da lesão periapical, bem como satisfatório aspecto clínico. Conclusão: a cirurgia parendodôntica com obturação retrógrada com cimento Portland sugeriu eficácia. O tratamento apresentou baixo custo para o paciente. O cimento Portland pode ser uma alternativa para compor o arsenal de materiais dentários do endodontista. Palavras-chave: Endodontia. Abscesso periapical. Apicectomia. Obturação retrógrada. Materiais dentários. Como citar este artigo: Santos FS. Clinical application of Portland cement..» O autor declara não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financeiros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo. Recebido: 18/01/2012. Aceito: 17/02/2012. 1 Especialista em Endodontia. Professor Doutor da Disciplina de Diagnóstico e Cirurgia I e II do Curso de Odontologia, UNIFEB. Coordenador do Curso de Odontologia, UNIFEB. Endereço para correspondência: Fabiano de Sant Ana dos Santos Av. 27, 931 (Ruas 22 X 24) Centro 14.780-340 Barretos/SP E-mail: fss@uol.com.br 2012 Dental Press Endodontics 59

[ caso clínico ] Aplicação clínica do cimento Portland Introdução Dentes submetidos a tratamentos endodônticos fracassados e/ou que apresentam lesões apicais necessitam de terapêuticas especiais para debelar os microrganismos causadores de processos infecciosos periapicais. A cirurgia parendodôntica associada à colocação de um anteparo físico local biológico, compatível com os tecidos periapicais, é um recurso que pode ser vantajoso aos dentes com prognósticos desfavoráveis 1,2. O mineral trióxido agregado (MTA) foi desenvolvido para ser empregado em obturações retrógradas e, posteriormente, para outras situações endodônticas. Estudos demonstraram a biocompatibilidade e a regeneração dos tecidos perirradiculares, como ligamento periodontal, cemento radicular e osso alveolar, quando o MTA foi utilizado 3,4. O MTA se apresenta na forma de pó branco ou cinza, sendo composto de partículas hidrofílicas que se solidificam na presença de água e, por isso, o contato do material com os fluidos periapicais atua como estímulo para o início das reações químicas de presa. Os principais componentes desse material são o silicato tricálcico, aluminato tricálcico, óxido tricálcico, silicato e bismuto, sendo esse último utilizado para conferir radiopacidade ao produto 5,6. Pode-se dizer que o cimento Portland (CP), que não é um material de uso odontológico direto, possui basicamente os mesmos componentes químicos do MTA. O CP difere do MTA pela ausência do óxido de bismuto e presença do íons de potássio em sua fórmula 7-10. Sob o ponto de vista biológico e antibacteriano, o MTA e o CP têm demonstrado comportamentos similares 8,11,12,13. O interesse científico pelo CP tem crescido pelo fato de ser economicamente acessível e por apresentar propriedades físicas, químicas e biológicas similares ao MTA. A adaptação marginal do MTA e do CP em obturações endodônticas é outro importante fator que apresentou resultados similares 14. A possível substituição do emprego do MTA em endodontia pelo CP tem sido considerada pelos autores, isso em função dos resultados promissores obtidos em pesquisas in vitro e in vivo com esse último material 12,15,16,17. O objetivo do presente estudo foi apresentar um caso clínico em que se realizou uma cirurgia parendodôntica seguida de obturação retrógrada selada com o CP. Relato do caso Paciente do sexo feminino, 52 anos de idade, leucoderma, compareceu ao consultório com queixa de dor moderada na região anterior da maxila esquerda. Realizado a anamnese e o exame físico, procedeu-se o exame clínico em que se constatou a presença de uma fístula localizada apicalmente ao elemento 21. No exame radiográfico foi constatada presença de lesão periapical nos dentes 21 e 12 (Fig. 1). A paciente foi comunicada, mas optou por realizar o tratamento endodôntico somente do elemento 21. Decorridos 39 meses, a paciente retornou ao consultório com queixa de dor aguda e pulsátil, edema e rubor localizado na região anterior da maxila direita. Seguiu-se as formalidades protocolares de rotina antes do atendimento odontológico clínico. Durante o exame intrabucal, notou-se um abaulamento na região apical do dente 12 e endurecido à palpação. Foi realizada uma tomada radiográfica da região (Fig. 2) e confirmou-se o aumento da lesão periapical, comparada com as imagens radiográficas realizadas na época do tratamento endodôntico do dente 21. Reforçou-se sobre a importância da realização da terapêutica endodôntica no elemento 12. A paciente concordou em realizar o tratamento. Estabeleceu-se o plano de tratamento que consistiu das seguintes etapas: manobra de biossegurança, abertura coronária, drenagem e neutralização do conteúdo séptico e tóxico. Após 72 horas e alívio dos sintomas, o sistema de canal radicular foi instrumentado e realizado curativo de demora com pasta de hidróxido de cálcio (Ca(OH) 2 ) associado ao paramonoclorofenol canforado (PMCC) (Fig. 3). O paciente retornou após 15 dias e, ao se remover o curativo de demora, notou-se a persistência do exsudato. Mediante tal situação, foi colocada novamente uma pasta de Ca(OH) 2 pura e aguardou-se mais duas semanas. No retorno, após a remoção da pasta de Ca(OH) 2 observou-se que o exsudato ainda estava presente. Frente a essa situação, obteve-se a anuência da paciente para obturação do canal radicular e, na mesma sessão, a realização da cirurgia parendodôntica seguida de obturação retrógrada com CP. A paciente foi preparada tomando-se todos os cuidados em termos de biossegurança. O dente 12 foi obturado com cimento de hidróxido de cálcio (Fig. 4). Após preparo da mesa cirúrgica e campo operatório, foi realizada analgesia do nervo alveolar anterossuperior direito por vestibular e palatino e nervo nasopalatino. Foi escolhida a incisão de Neumann para levantamento de retalho mucoperiosteal. 2012 Dental Press Endodontics 60

Santos FS 01/2006 04/2009 Figura 1. Área sugestiva de lesão periapical nos dentes 12 e 21. Figura 2. Área sugestiva de lesão periapical extensa no dente 12. 04/2009 05/2009 Figura 3. Extravasamento de hidróxido de cálcio na área periapical do dente 12. Figura 4. Dente 12. Obturação do canal radicular, cirurgia parendodôntica e obturação retrógrada com cimento Portland e iodofórmio. 2012 Dental Press Endodontics 61

[ caso clínico ] Aplicação clínica do cimento Portland Figura 5. Radiografia de controle após 7 meses do procedimento proposto. Figura 6. Radiografia de controle após 40 meses do procedimento proposto. A osteotomia da área apical para exposição do ápice radicular foi iniciada com cinzel goivo (Quinelato, Rio Claro, São Paulo) para visualização da porção apical da raiz. Em seguida, realizou-se o aplainamento e alisamento perirradicular para remoção do tecido de granulação. Com uma broca troncocônica n 700 (KG Sorensen, Barueri, São Paulo) montada na peça-reta do micromotor (Dabi-Atlante, Ribeirão Preto, São Paulo) e, sob abundante irrigação com soro fisiológico a 0,9%, realizou-se o corte no sentido perpendicular ao longo eixo do dente em ângulo de 45 de distal para mesial, seccionando totalmente a porção apical da raiz. A retrocavidade foi realizada, sob irrigação com soro fisiológico, com uma broca de baixa rotação esférica haste longa n 4 (KG Sorensen, Barueri, São Paulo). Em seguida foi realizada a manipulação do CP associado com o iodofórmio. A proporção entre os dois produtos foi de 4:1 em peso, respectivamente. A aplicação do CP (Votoram, Rio Branco do Sul, Paraná) associado com iodofórmio na retrocavidade foi realizada tomando-se os seguintes cuidados: remoção dos excessos, indução de sangramento para o CP entrar em contato com o sangue e tomar presa, reposicionamento do retalho e sutura. Após 7 meses, a imagem radiográfica sugeriu formação óssea (Fig. 5). Após 40 meses de acompanhamento do caso, a imagem radiográfica (Fig. 6) sugere aspecto de normalidade com formação óssea e integridade da lâmina dura. Discussão O progresso na compreensão dos processos infecciosos oriundos do sistema de canais radiculares e da região periapical, somado aos avanços das técnicas e dos materiais dentários biocompatíveis empregados na cirurgia parendodôntica, têm sido grandes aliados para os casos de tratamentos e/ou retratamentos 2012 Dental Press Endodontics 62

Santos FS endodônticos 1,2,18. Frente à escassez de trabalhos clínicos relacionados ao uso do CP na prática endodôntica, esse estudo visou apresentar um caso clínico em que esse material foi utilizado para obturação retrógrada, após uma cirurgia parendodôntica. O uso do Ca(OH) 2 é consagrado em condições clínicas onde há presença de microrganismos anaeróbios que causam dor no estágio agudo, grandes destruições na região periapical, bem como a presença de exudato 19,20,21. Dessa forma, no presente estudo, o autor fez uso da pasta de Ca(OH) 2 consorciada com o PMCC e, posteriormente, o citado material foi utilizado isoladamente com a finalidade de controlar a dor e restabelecer a integridade do periápice. Não obstante, o efeito do Ca(OH) 2 para cessar a produção de exsudato não foi conseguido. Talvez a persistência na utilização da medicação à base de Ca(OH) 2 pudesse determinar a interrupção do líquido resultante do processo inflamatório periapical. Entretanto, a paciente, por motivos particulares, solicitou celeridade no tratamento proposto, sendo acatado pelo autor, prontamente. A biocompatibilidade do CP é similar à do MTA, mesmo quando se acresce à fórmula do CP, o óxido de bismuto 18. A decisão pelo uso do CP nesse caso clínico levou em consideração a conhecida biocompatibilidade desse material quando em contato direto com os tecidos periapicais e, também, pelo seu baixo custo, conforme tem sido relatado em trabalhos científicos 12,15,16,17. O principal inconveniente do CP é a ausência do óxido de bismuto, que o torna radiolúcido 7-10. Visando corrigir esse problema inerente ao CP, foi adicionado o iodofórmio na porção preparada para realização da obturação retrógrada do dente 12, conforme proporção citada no relato de caso e preconizado por outros autores 10. Um estudo para avaliar a radiopacidade do CP branco com o iodofórmio foi realizado tendo sido verificado um efeito radiopaco do produto da mistura 22. Por outro lado, em nosso estudo está associação sugeriu não interferir na ação do CP. O uso do iodofórmio em endodontia é consagrado como agente antibacteriano e radiopacificador 23. O aplainamento e alisamento radicular, a cirurgia parendodôntica e a obturação retrógrada com CP descrita no presente relato, deles pode se dizer que foram muito favoráveis ao dente 12, pois o resultado alcançado sugeriu que o biofilme acumulado na região apical foi removido e, também, que o CP teve ação antibacteriana por ação alcalina, corroborando com os principais achados científicos envolvendo esse material de uso não convencional em Odontologia 1,8,11,12,13. Na literatura, há dois estudos in vitro que avaliaram a capacidade antimicrobiana de diferentes cimentos utilizados em endodontia. Nos referidos estudos, os autores concordaram sobre a não existência de atividade antimicrobiana do MTA e do CP, entretanto, salientaram que o ph dos cimentos pesquisados atingiu 12,5, semelhante ao observado nos cimentos endodônticos à base de hidróxido de cálcio de reconhecida ação antibacteriana e indutor eficaz de reparação tecidual 7,25. As imagens radiográficas apresentadas no presente estudo sugeriram a reparação da lesão dos tecidos periapicais ao longo dos 40 meses de acompanhamento do caso. Contudo, o consórcio das técnicas cirúrgicas endodônticas ora apresentadas aliadas a utilização do CP sugeriram eficácia clínica, uma vez que a reparação da lesão foi efetivada. Resultado semelhante ao discutido, no que se refere à capacidade de reparação tecidual do CP em complicações endodônticas também já foi descrito na literatura 26. Esses achados reforçam a importância de se investir no CP, visto que esse material apresenta baixo custo 7,12,15,16,17 e, em um país com distorções econômicas e sociais evidentes, democratizar o uso de materiais dentários que melhoram os índices de saúde bucal se torna uma necessidade preeminente. Conclusão O presente estudo demonstrou a eficácia da cirurgia parendodôntica associada à retro-obturação com CP em um caso clínico de lesão periapical de provável causa bacteriana. Uma característica importante do CP que deve ser levada em consideração é a viabilidade financeira desse material, principalmente para o paciente, quando comparado com outros materiais existentes atualmente no mercado. O CP pode ser um aliado na solução das complicações endodônticas periapicais, tornando prognósticos de dentes com diagnósticos reservados mais previsíveis. 2012 Dental Press Endodontics 63

[ caso clínico ] Aplicação clínica do cimento Portland Referências 1. Leal JM, Bampa JU, Poliseli-Neto A. Cirurgias parendodônticas. Indicações, contra-indicações, modalidades cirúrgicas. In: Leonardo MR. Endodontia: tratamento de canais radiculares princípios técnicos e biológicos. 4ª ed. São Paulo (SP): Artes Médicas; 2008. v. 2, p. 1243-323. 2. Otani K, Sugaya T, Tomita M, Hasegawa Y, Miyaji H, Tenkumo T, et al. Healing of experimental apical periodontitis after apicoectomy using different sealing materials on the resected root end. Dent Mater J. 2011 Jul 28;30(4):485-92. 3. Torabinejad M, Chivian N. Clinical applications of mineral trioxide aggregate. J Endod. 1999 Mar;25(3):197-205. 4. Torabinejad M, Parirokh M. Mineral trioxide aggregate: a comprehensive literature review part II: leakage and biocompatibility investigations. J Endod. 2010 Feb;36(2):190-202. 5. Camilleri J, Montesin FE, Brady K, Sweeney R, Curtis RV, Ford TR. The constitution of mineral trioxide aggregate. 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caso clínico Oooo XX, Oooo XX Tomografia computadorizada no diagnóstico de perfuração radicular Priscila Dias Peyneau 1 Claudia Scigliano Valerio 1 Andréia Cruz Pires Ribeiro de Sousa 1 Flávio Ricardo Manzi 2 Resumo Introdução: a perfuração é uma comunicação entre o canal radicular e a superfície externa do dente e, normalmente, ocorre durante o tratamento endodôntico, induzida por iatrogenia. Existem algumas condições que favorecem a ocorrência das perfurações. Pode-se citar a morfologia irregular dos canais radiculares, a dilaceração radicular, o erro durante o preparo da câmara pulpar, o desgaste excessivo das paredes dos canais radiculares e o preparo inadequado para colocação de pinos intrarradiculares. O diagnóstico definitivo desse tipo de iatrogenia é muito difícil devido à capacidade limitada da radiografia periapical, pois ela oferece imagem bidimensional e sobreposição de estruturas, principalmente se essa perfuração ocorrer no sentido vestibulolingual. Devido a isso, deve-se utilizar métodos de imagens que permitam avaliar todas as faces radiculares, como a tomografia computadorizada, a fim de diagnosticar e informar com maior precisão a localização das perfurações radiculares. Conclusão: por meio da apresentação de três casos clínicos, demonstrou-se a importância da tomografia computadorizada por feixe cônico no diagnóstico de perfurações radiculares. Palavras-chave: Tomografia computadorizada cone beam. Raiz dentária. Fraturas dos dentes. Tratamento do canal radicular. Como citar este artigo: Peyneau PD, Valerio CS, Sousa ACPR, Manzi FR. Computed tomography in the diagnosis of root perforation. Dental Press Endod. 2012 Jan-Mar;2(1):65-9.» Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financeiros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo. Recebido: 20/02/2012. Aceito: 24/02/2012. 1 Mestre em Clínicas Odontológicas, ênfase em Radiologia, PUC Minas. 2 Professor Adjunto de Radiologia e Coordenador do mestrado em Clínica Odontológica, ênfase em Radiologia, PUC Minas. Endereço para correspondência: Flávio Ricardo Manzi Av. Dom José Gaspar, Prédio 45 Clínica de Radiologia Coração Eucarístico 30.535-901 Belo Horizonte/MG E-mail: manzi@pucminas.br 2012 Dental Press Endodontics 65 Dental Press Endod. 2012 Jan-Mar;2(1):65-9

[ caso clínico ] Tomografia computadorizada no diagnóstico de perfuração radicular Introdução A trepanação é uma das complicações mais frustrantes do tratamento endodôntico. Sua incidência tem aumentado nos últimos anos devido à negligência, imprudência e inexperiência dos novos profissionais. Pode-se considerar como trepanação uma comunicação artificial na raiz causada por iatrogenias ou reabsorções patológicas, que resultam em uma íntima relação entre a cavidade pulpar e os tecidos periodontais. As trepanações iatrogênicas são causadas por diversas razões, incluindo- -se morfologia irregular dos canais radiculares, alta incidência de dilaceração radicular, erro durante o preparo da câmara pulpar, desgaste excessivo das paredes dos canais radiculares, calcificações e perfurações por preparos inadequados de pinos intrarradiculares. Dentre os aspectos clínicos da trepanação pode-se citar a dor, sensibilidade à palpação, presença de fístula e/ou bolsa periodontal. As características radiográficas incluem o aumento do espaço do ligamento periodontal e rarefação óssea adjacente à região da perfuração, além da visualização da trepanação, quando essa ocorre nas superfícies mesial e distal. A radiografia periapical é o primeiro exame solicitado em casos de trepanação, já que oferece informações sobre a condição e morfologia da raiz e do canal radicular. Entretanto, existe a limitação do plano vestibulolingual, uma vez que a imagem é bidimensional e os reparos anatômicos podem ser confundidos com lesões patológicas. Dessa maneira, deve-se utilizar métodos avançados de imagem como a tomografia computadorizada, que permite a visualização e avaliação da raiz e do osso alveolar, a localização e a extensão da câmara pulpar e a visão tridimensional da raiz. Sendo assim, as imagens tridimensionais são valiosas no diagnóstico e tratamento de problemas odontológicos. O prognóstico para os dentes com perfuração radicular depende, principalmente, da prevenção ou controle da infecção bacteriana no local da perfuração e do uso de material biocompatível na reparação para fornecer o melhor selamento possível contra a penetração de bactérias e limitar a inflamação periodontal, além da experiência e habilidade do profissional, da localização da perfuração, da qualidade do tratamento endodôntico, das condições periodontais e do tamanho da perfuração. Assim, a maior complicação decorrente da trepanação é o potencial para uma inflamação secundária no ligamento periodontal causando a perda de inserção óssea e, consequentemente, levando à perda do órgão dentário. O objetivo deste trabalho é demonstrar a importância da tomografia computadorizada na localização e no diagnóstico de trepanação radicular através do relato de três casos clínicos. Caso clínico 1 Paciente do sexo masculino, 43 anos de idade, foi encaminhado para avaliação do primeiro molar superior direito que apresentava sintomatologia dolorosa após o preparo do canal para a confecção de pino intrarradicular. Por meio do exame clínico foi identificada a presença de fístula na região do dente em questão, sondagem e palpação negativa e sensibilidade à percussão vertical e horizontal. O paciente foi submetido a um exame de tomografia computadorizada Multislice utilizando o aparelho SOMA- TOM Sensation 64 (Siemens, Erlangen, Alemanha) envolvendo a região de interesse. Na reconstrução panorâmica foi observada uma lesão de furca, e nas reconstruções oblíquas nota-se a presença de trepanação e rarefação óssea na raiz palatina do primeiro molar superior direito (Fig. 1). Nesse caso, devido ao comprometimento de furca e também à trepanação, o prognóstico não era favorável e o dente foi extraído. Figura 1. A) Observar dente 16 na reconstrução panorâmica. B) Reconstrução oblíqua: note a seta branca indicando a presença de trepanação radicular no dente 16 (corte 25). 2012 Dental Press Endodontics 66 Dental Press Endod. 2012 Jan-Mar;2(1):65-9

Peyneau PD, Valerio CS, Sousa ACPR, Manzi FR Caso clínico 2 Paciente do sexo feminino, 34 anos de idade, compareceu à clínica odontológica com leve sintomatologia dolorosa e inchaço na região apical do dente 21 após 7 meses da conclusão de tratamento endodôntico nesse dente. Foi realizado um exame de tomografia computadorizada cone beam por meio do aparelho GXCB-500 (Imaging Sciences, Hatfield, EUA). Na reconstrução panorâmica, observa-se somente uma rarefação óssea no periápice do dente 21. Nas reconstruções oblíquas, identifica-se a presença de trepanação (Fig. 2). Nessa situação, foi feito o selamento da perfuração com agregado de trióxido mineral (MTA), pois é um material biocompatível que previne infiltrações e promove regeneração tecidual. A B C Figura 2. A) Reconstrução panorâmica: observe a rarefação óssea no ápice do dente 21 (seta amarela). B) Reconstrução em 3D. C) Reconstrução oblíqua: note trepanação radicular no corte 28. Caso clínico 3 Paciente do sexo feminino, 27 anos de idade, foi encaminhada para avaliação do incisivo central direito que apresentava dor e fístula recorrente. Durante o exame clínico verificou-se inchaço e sensibilidade ao toque na região em questão. A paciente foi submetida a um exame de tomografia computadorizada cone beam da maxila por meio do aparelho GXCB- 500 (Imaging Sciences, Hatfield, EUA). Observou-se uma rarefação óssea no ápice do dente 11 e uma leve imagem hiperdensa na face mesial da raiz. No corte sagital do dente 11, identificou-se a presença de trepanação, além de extravasamento do material obturador no terço radicular médio (Fig. 3). Devido ao prognóstico desfavorável, o dente foi extraído e a paciente foi encaminhada para reabilitação bucal por meio de implante na região. 2012 Dental Press Endodontics 67 Dental Press Endod. 2012 Jan-Mar;2(1):65-9

[ caso clínico ] Tomografia computadorizada no diagnóstico de perfuração radicular B A C Figura 3. A) Notar rarefação óssea no ápice do dente 11 na reconstrução panorâmica. B) Reconstrução 3D: observe dente 11. C) Presença de trepanação no terço radicular médio do dente 11, com extravasamento de material obturador na reconstrução sagital. Discussão Casos de perfuração radicular são sempre prejudiciais à região adjacente ao dente e são de difícil tratamento. Para que haja a preservação do dente, é necessário que seja realizado um tratamento adequado a fim de corrigir o defeito e conseguir condições locais para a manutenção da saúde na região 4. As perfurações radiculares são diagnosticadas por sintomas clínicos tais como edema, mobilidade dentária, fístula e sensibilidade à percussão, e também por exames de imagem como a radiografia periapical e a tomografia computadorizada. A conjugação desses exames com a anamnese bem conduzida do paciente fornecerá um diagnóstico preciso do caso. Segundo alguns estudos 5,7,9,10, a radiografia periapical impõe algumas limitações à interpretação, devido à sobreposição de estruturas e à imagem ser bidimensional. Nos casos clínicos descritos nesse artigo, a tomografia computadorizada foi utilizada como exame relevante no diagnóstico, fornecendo informações precisas na localização da trepanação. As reconstruções panorâmicas foram realizadas e as perfurações não foram visualizadas, pois os defeitos encontrados na vestibular ficaram sobrepostos à raiz, mostrando que na maioria dos exames bidimensionais, dependendo da região atingida, não é possível a observação dessa condição. De acordo com os estudos de Metzger e Shperling 1, a forma e a direção do osso alveolar em relação à raiz do dente e o formato do canal radicular são características essenciais para um tratamento endodôntico de sucesso. Dessa maneira, pode-se citar a tomografia computadorizada como um importante método de diagnóstico por imagem, o qual fornece informações sobre as estruturas anatômicas auxiliando no planejamento e na execução do tratamento endodôntico. 2012 Dental Press Endodontics 68 Dental Press Endod. 2012 Jan-Mar;2(1):65-9

Peyneau PD, Valerio CS, Sousa ACPR, Manzi FR D Addazio et al. 7 realizaram um estudo para diagnosticar diversos defeitos endodônticos. Em relação às perfurações radiculares, as radiografias periapicais não identificaram sinais de perfuração em 80% das imagens avaliadas e forneceram diagnósticos imprecisos em 20% dos casos. Com a tomografia computadorizada cone beam todas as alterações foram identificadas, sendo que 20% foram precisas. O exame tomográfico ofereceu maior acurácia do que as radiografias periapicais. Bueno et al. 9 fizeram considerações em relação às falsas interpretações de imagens através da tomografia computadorizada cone beam devido a artefatos metálicos. Eles podem simular defeitos endodônticos, confundindo o diagnóstico de perfuração radicular. Os artefatos aparecem como faixas escuras, produzindo erros de interpretação, podendo trazer uma consequência desagradável na terapêutica endodôntica. Porém, o correto manuseio das imagens pode minimizar os erros no diagnóstico. Deve-se utilizar imagens coronais, axiais e sagitais com 0,2mm de espessura, como foram feitos nos casos clínicos relatados, pois fornecem informações preciosas da localização exata dos pontos de comunicação entre os canais radiculares e o espaço periodontal, muitas vezes associados a áreas hipodensas, sugerindo perfuração da raiz. Esse método supera as limitações da radiografia periapical, com a possibilidade de navegação da imagem, mostrando uma visualização dinâmica do que antes era estático. Nos casos relatados nesse trabalho, verificou-se que a tomografia computadorizada possibilitou o diagnóstico das trepanações radiculares, além de auxiliar na conduta do planejamento clínico. Conclusão Um diagnóstico definitivo de perfurações é um desafio, principalmente devido à ausência de sintomas clínicos patognomônicos e a capacidade limitada da radiografia periapical para a visualização dessas perfurações. Assim, a tomografia computadorizada é uma tecnologia útil para o endodontista no diagnóstico e tratamento de problemas endodônticos complexos, pois permite a visualização de estruturas tridimensionais em diferentes planos. Mas é importante lembrar que o diagnóstico final e a escolha da terapêutica clínica para as perfurações radiculares devem ser feitos sempre em conjunto com os achados clínicos. Referências 1. Metzger Z, Shperling I. Iatrogenic perforation of the roots of restoration-covered teeth. J Endod. 1981 May;7(5):232-3. 2. Biggs JT, Benenati FW, Sabala CL. Treatment of iatrogenic root perforations with associated osseous lesions. J Endod. 1988 Dec;14(12):620-4. 3. Behnia A, Strassler HE, Campbell R. Repairing iatrogenic root perforations. J Am Dent Assoc. 2000 Feb;131(2):196-201. 4. Alves DF, Gomes FB, Sayão SM, Mourato AP. Tratamento clínico cirúrgico de perfuração do canal radicular com MTA caso clínico. Int J Dent. 2005;4(1):37-40. 5. Eleftheriadis GI, Lambrianidis TP. Technical quality of root canal treatment and detection of iatrogenic errors in an undergraduate dental clinic. Int Endod J. 2005 Oct;38(10):725-34. 6. Young GR. Contemporary management of lateral root perforation diagnosed with the aid of dental computed tomography. Aust Endod J. 2007 Dec;33(3):112-8. 7. D Addazio PSS, Campos CN, Ozcan M, Teixeira HGC, Passoni RM, Carvalho ACP. A comparative study between cone-beam computed tomography and periapical radiographs in the diagnosis of simulated endodontic complications. Int Endod J. 2011 Mar;44(3):218-24. 8. Patel S, Dawood A, Ford TP, Whaites E. The potential applications of cone beam computed tomography in the management of endodontic problems. Int Endod J. 2007 Oct;40(10):818-30. 9. Bueno MR, Estrela C, Figueiredo JA, Azevedo BC. Map-reading strategy to diagnose root perforations near metallic intracanal posts by using cone beam computed tomography. J Endod. 2011 Jan;37(1):85-90. 10. Shemesh H, Cristescu RC, Wesselink PR, Wu MK. The use of conebeam computed tomography and digital periapical radiographs to diagnose root perforations. J Endod. 2011 Apr;37(4):513-6. 2012 Dental Press Endodontics 69 Dental Press Endod. 2012 Jan-Mar;2(1):65-9