Análise da Implementação da Proteção Social Especial de Média Complexidade da Política de Assistência Social no Município do Rio de Janeiro Aluno: Jéssica Ramos Baptista Orientador: Ariane Paiva Introdução A Assistência Social ganhou status e visibilidade como política pública no Brasil ao ser incluído como uma das políticas que compõem o sistema de Seguridade Social brasileiro na Constituição Federal de 1988, junto com a Saúde e a Previdência Social. A Assistência Social tem passado por transformações importantes nas suas formas de gestão, financiamento e oferta de serviços e benefícios após a aprovação da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), em 2004. Este documento é o marco que iniciou o processo de institucionalização do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e sistematizou suas bases para a implementação da política em todo o território brasileiro. A descentralização político-administrativa e a territorialização foram um dos eixos considerados como categorias fundamentais para a organização do novo modelo de gestão do SUAS, levando em consideração a alta densidade populacional do país e a desigualdade socioterritorial das regiões e dos municípios (PNAS, 2004). Justificado pela grande desigualdade demográfica e socioterritorial que o Brasil apresenta, a PNAS incluiu a gestão territorial dos serviços, acompanhada das ações que incluam a intersetorialidade. A dimensão territorial tem sido utilizada para a gestão de políticas sociais, principalmente para delimitar o espaço geográfico de atuação das ações programáticas de uma determinada política setorial e para delimitar o acesso do público-alvo beneficiado. Já a intersetorialidade, possui conceitos polissêmicos e diversas possibilidades de ser aplicada (PEREIRA, P., 2014, p.23). A intersetorialidadetem sido considerada como uma das estratégias de gestão que excede um único setor da política social e/ou um método político de articulação entre distintos setores sociais especializados (PEREIRA,P., 2014, p.23). Na Política Nacional de Assistência Social (2004) a intersetorialidade se configura como uma estratégia em resposta às demandas multifacetadas o que exige respostas que ultrapassem a ação setorial. Segundo a PNAS as ações no campo dessa política devem seguir em sintonia e articulação com outras políticas públicas sociais. Há um grande estreitamento
entre o sistema de garantia de direitos e os serviços de proteção social o que requer uma gestão mais compartilhada. Assim, compreende-se que a gestão territorial vinculada à noção de intersetorialidade, tem dado a tônica da gestão das unidades descentralizadas da Assistência Social nos municípios, porém essa perspectiva tem limitações que esbarram na ausência de serviços em determinadas áreas que dificultam a articulação intersetorial, na precarização dos recursos das políticas públicas, na fragmentação das ações e na burocratização das pretensas modernizações dos sistemas de informação e gestão, com suas metas de eficácia e eficiência que limitam a autonomia de gestores e profissionais. Conforme Pereira pontua: [...] é preciso qualificar o que são esses investimentos hoje disponibilizados no território. E se, de fato, contribuem para o fortalecimento de seus usuários como cidadãos ativos ou para sua inserção funcional, seja pelo consumo, seja pela capacidade de amenização dos conflitos no território, através da concessão de melhorias urbanas (PEREIRA, T., 2010, p.196). A pesquisa bibliográfica e a análise documental buscam problematizar a discussão entre gestão territorial e intersetorialidadeno SUAS. Trata-se de um esforço teórico para a compreensão da inter-relação entre estes elementos que delimitam a gestão pública da Assistência Social e suas estratégias no contexto neoliberal e que consequentemente, condicionam as ações profissionais. Ainda existem poucos estudos nesta seara e este trabalho retoma algumas produções, porém, totalmente aberto a novos subsídios para o debate. Resultados e Discussões A questão social se expressa de formas multivariadas na cotidianidade o que tem contribuído para o agravamento das situações de vulnerabilidade e de risco social. Segundo Koga, Ramos e Nakano (2008, p.01) essas expressões ocorrem nos territórios de vivência, nos mais variados municípios brasileiros, que apresentarão diferenças no seu contingente populacional, na sua geografia e nas suas configurações e relações econômicas, políticas, culturais e sociais. A territorialização é um eixo importante da Política de Assistência Social. Na política de assistência social a intersetorialidade é compreendida como sinônimo de descentralização. A territorialidade revela as diversas relações e o modo como o território é usado que definem as configurações do mesmo. Podemos dizer que territorialidade é uma propriedade
do território (FERNANDES, 2015, p.998), ou seja, a configuração desse território está intrinsecamente ligada à forma de uso que se relaciona a organização, as relações sociais e comunitárias, os interesses econômicos, políticos e sociais expressos no mesmo. Não é possível pensar políticas sociais e de desenvolvimento sem levar em consideração a territorialidade dos territórios (FERNANDES, 2015, p.998), pois para a implementação de políticas publicas compreender o território, a territorialização e a territorialidade é fundamental. É preciso considerar os conflitos advindos das produções das territorialidades dos mais variados territórios. Para Fernandes a territorialidade é definida pela forma de organização de indivíduos que produzem o território. Segundo Lefebvre (apud NASSER, 2013, p.125) esse espaço não pode ser considerado passivo, todavia, deve ser considerado como produto e produtor das relações sociais. Para Draibe (2015, p.488) a propensão institucional e eficiência das intervenções públicas irão dependeram de múltiplas qualidades das políticas públicas. Nessa pesquisa a intersetorialidade será considerada uma dessas qualidades. De acordo com Draibe (2015, p.488) segundo o senso comum a intersetorialidade é entendido como um conjunto de políticas e ações setoriais dissemelhantes que a articulação é concebida como vantajosa para gerir as diversas dimensões de uma realidade. Essa definição pode apresentar duas origens: primeiro, devido à natureza variada dos fenômenos sociais necessitar de uma atuação multissetorial, contando com a contribuições das ações que são diferenciadas setorialmente e, segundo, devido a forma especializadas como se organizam as políticas públicas e a exigência de superação de tal formato frente a ação coordenada e complementar de várias políticas ou programas A intersetorialidade é antes uma articulação de saberes e experiência no planejamento, realização e avaliação de ações destinadas a alcançar efeito sinérgico em situações complexas, visando o desenvolvimento social. Assim concebida corresponde a uma estratégia, deliberadas de intervenções que, para além dos efeitos setoriais de cada política participante, pretende também apropriar-se dos benefícios gerados pelas oportunidades e a sinergia das ações conjugadas e, especialmente coordenadas e complementares (JUNQUEIRA,1998 apud DRAIBE, 2015, p.489). Segundo Draibe (2015, p.489) a coordenação e a complementaridade são as bases de sustentação da intersetorialidade o que irá permitir a ultrapassagem de mera aplicação de
políticas ou programa. É preciso compreender que não existe um único que garanta de forma automática a intersetorialidade e a sinergia desejada (DRAIBE, 2015, p.492). A intersetorialidade tem sido considerada como uma da estratégia de gestão que excede um único setor da política social e/ou um método político de articulação entre distintos setores sociais especializados (PEREIRA, P., 2014, p.23). O prefixo inter traz a ideia não só de superação da setorialidade entre as políticas públicas, mas também da desagregação dos diferentes setores que compõe um campo de conhecimento e de ação (PEREIRA, P., 2014, p.25). As partes que constitui o setor ligam-se em uma relação de dependência e condicionando uma as outras de maneira recíproca. Intersetorialidade também pode ser vista como integração entre os setores o que causa uma contraditoriedade no termo de superação que de acordo com Pereira P. (2014, p.26) permite, de maneira implícita, a permanência dos setores. Na Política Nacional de Assistência Social (2004) a intersetorialidade se configura como uma estratégia em resposta àsdemandas multifacetadas o que exige respostas que ultrapasse a ação setorial. Segundo a PNAS as ações no campo dessa política devem seguir-se em sintonia e articulação com outras políticas públicas sociais. Há um grande estreitamento entre o sistema de garantia de direitos e os serviços de proteção social o que requer uma gestão mais compartilhada (PNAS, 2004, p.31) (MONNERAT e DE SOUZA, 2014, p.45). A intersetorialidade se incorpora a política social devido à complexidade que se manifesta nas expressões da questão social que pode ser observada por meio do agravamento das desigualdades sociais. Além disso, a sua articulação a rede torna-se fundamental em meio à debilidade do sistema de proteção social em atender as demandas por direitos sociais (MONNERAT e DE SOUZA, 2014, p.41) A intersetorialidade pode ser considerada como um processo político, logo, conflituoso. Isso se dar por essa envolver jogo de interesses. Muita das vezesocorre à manutenção de individualidade institucional ao manterem status intelectuais, corporações, linguagem incompreensível, entre outros. Intersetorializar as políticas sociais não é tarefa simples, contudo, tornasse possível quando as instituições estão dispostas a se articularem em prol do interesse público compreendendo a necessidade desse processo (PEREIRA, P., 2014, p.37). A intersetorialidade na PNAS é apresentada como um requisito para assegurar os direitos de cidadania (FAUSTINO, 2013, p.07) e operacionalização do Sistema Único de Assistência Social (MONNERAT e DE SOUZA, 2004, p.45).
Na política de Assistência Social apesar de seus executores compreenderem a importância de se estabelecer estratégia de atuação entre os diferentes setores, sua capacidade institucional, financeira e política são consideradas muito reduzidas. Isso aparece na dificuldade de muitos municípios de implementar o Sistema Único de Assistência Social. Diante disso, as ações do governo precisam ser mais multifuncional e equilibradas de maneira que venha fazer o efeito desejado sobre as necessidades dos usuários atendidos por essa política (MONNERAT e DE SOUZA, 2014, p.46). Contudo, é preciso compreender que o combate a pobreza ultrapassa a esfera de atuação das políticas sociais. Todavia, isso não anula a relevância das políticas públicas na viabilização do acesso a proteção social, mas aponta que o combate a todas as formas de exclusão social e de desigualdade irar necessitar de soluções de ordem macroeconômicas (BRONZO, 2010 apud MONNERAT e DE SOUZA, 2014, p.46). Como resultado dessa pesquisa compreendemos que devido as multifaces das expressões da questão sociala intersetorialidade é compreendida como uma estratégia de gestão que ultrapassa um único setore que é importante para superação dessas expressões com um trabalho integrado em rede buscando garantir os direitos sociais. Para atingir a efetividade desejada por meio das relações intersetoriais e por meio de políticas públicas é fundamentar considerar as particularidades do território, como são estabelecidas as relações sociais naquele espaço de vivência, como aquela comunidade se organiza, superar questões individuais relacionadas aos interesses políticos das instituições, entre outros. Metodologia Esta pesquisa tem caráter qualitativo, ou seja: Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (MINAYO, 1994, p. 22). A pesquisa qualitativa intitulada Análise da Implementação da Proteção Social Especial de Média Complexidade da Política de Assistência Social no Município do Rio de Janeiro foi iniciada em setembro de 2016 desenvolvido pela professora do Departamento de Serviço Social da PUC-Rio e pesquisadora responsável/ orientadora Ariane Rego de Paiva e pela aluna de graduação/ pesquisadora Jéssica Ramos Baptista, integrantes do Grupo de Pesquisa Estado, Sociedade, Políticas e Direitos (GESPD). Foi realizado levantamento dos
documentos federais da Política Nacional de Assistência Social e levantamento bibliográfico sobre os temas pertinentes à pesquisa. Foi feito um recorte para aprofundamento do debate teórico para o projeto da aluna de iniciação científica. O recorte se deu com a pesquisa denominada Gestão Territorial e Intersetorialidade na Assistência Social: Alguns Apontamentos. A pesquisa contou com a leitura de referências teóricas sobre o tema da gestão territorial das políticas sociais e especificamente na perspectiva da assistência social e com análise de conteúdo qualitativa da PNAS, com atenção às seguintes dimensões: territorialização, descentralização e intersetorialidade. Para que a pesquisa obtivesse êxito, ou seja, atingisse o gral de satisfação desejado foram realizadas sistematizações por meio de fichamentos com base no aporte teórico, encontros individuais para o debate teórico na sala do da PUC-Rio, reuniões em grupo com a finalidade de diálogo pertinente à pesquisa, entre outros. O texto produzido por essa pesquisa foi aceito no dia 07 de abril de 2017 no Congresso XXXI ALAS Uruguay 2017 em Montevidéu. Concomitantemente, sendo realizada com a pesquisa Análise da Implementação da Proteção Social Especial de Média Complexidade da Política de Assistência Social no Município do Rio de Janeiro, nesta realizamos a confecção de documentos como, por exemplo, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, preparação de questionários, visita institucional ao Centro de Referência Especializado de Assistência Social João Manoel Monteiro 10ª Coordenadoria de Desenvolvimento Social e realização de entrevistas. Conclusão As primeiras incursões na temática estudada apontam para um processo de disputa entre dois projetos distintos: o primeiro, que busca territorializar os serviços de assistência social como um importante mecanismo para facilitar o acesso da população às formas de participação e de ampliação dos direitos, e o segundo, que atende à demanda neoliberal de concentração de políticas sociais com foco na pobreza extrema e na conciliação de conflitos em territórios ditos de vulnerabilidade e risco social. A leitura da PNAS nos indica que a territorialização está associada à ideia de descentralização deações programáticas de políticas sociais. Este processo, com recursos precarizados, não proporciona aproximar os trabalhadores das formas de resistências e lutas de movimentos e organizações da população que vivem nos territórios. É preciso garantir análises das organizações espaciais ressignificadas na produção de territórios nas
contradições da sociedade capitalista, para que se rompa com a visão de individualização dos problemas sociais, tão recorrentes aos projetos que perpassam historicamente a política de assistência social no país, e que propiciem de fato, ações participativas e intersetoriais que interfiram nas relações de poder e que impactem nas dinâmicas locais e também mais macroestruturais. Referências DRAIBE. S. M. Intersetorialidade. In: Dicionário de Políticas Públicas. 2 ed. São Paulo: Editora da Unesp; Fundap, 2015. FAUSTINO, T. Q. D. S. Assistência Social &Intersetorialidade: conteúdos para um debate. In: VI Jornada Internacional de Políticas Públicas O desenvolvimento da crise capitalista e a atualização das lutas contra a exploração, a dominação e a humilhação. Disponível em:<http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2013/jornadaeixo2013/anais-eixo16- impassesedesafiosdaspoliticasdaseguridadesocial/assistenciasocial-e-intersetorialidadeconteudosparaumdebate.pdf>. Acesso em: 23 de fevereiro de 2017. FERNANDES, B. M. Territorialidade.In: Dicionário de Políticas Públicas.2 ed. São Paulo: Editora da Unesp; Fundap, 2015. KOGA, D.; RAMOS, F. & NAKANO, K. A disputa territorial redesenhando relações sociais nas cidades brasileiras. Disponível em: <file:///c:/users/aluno/downloads/texto%20as%20disputas%20territoriais.pdf>. Acesso em:23 de fevereiro de 2017. MINAYO, Maria Cecília de S. (org.). Pesquisa Social: Teoria, método e criatividade; Petrópolis: Vozes, 2008. MONNERAT, G. L. & DE SOUZA, R. G. Intersetorialidade e Políticas Sociais: um Diálogo com a Literatura Atual. In: A Intersetorialidade na Agenda das Políticas Sociais.1 ed. São Paulo: Editora Papel Social, 2004. MDS. Política Nacional de Assistência Social PNAS/2004.
NASSER, A. C. A. Prefácio A produção do espaço Henri Lefebvre. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/eav/article/view/68706/71286>. Acesso em: 23 de fevereiro de 2017. PEREIRA, P. A. P. A Intersetorialidade das Políticas Sociais na Perspectiva Dialética. In: A Intersetorialidade na Agenda das Políticas Sociais.1 ed. São Paulo: Editora Papel Social, 2014. PEREIRA, T. D. Política Nacional de Assistência Social e território: enigmas do caminho. Revista Katálysis. V.13, 2010, p. 191-200.