A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO, ANESTESISTA, HOSPITAL (privado e público) E EQUIPE MÉDICA I - A RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA DO MÉDICO



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Transcrição:

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO, ANESTESISTA, HOSPITAL (privado e público) E EQUIPE MÉDICA Rénan Kfuri Lopes Sumário: I - A RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA DO MÉDICO II - O ANESTESISTA III - O HOSPITAL (privado e público) IV - A EQUIPE MÉDICA I - A RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA DO MÉDICO Indubitavelmente, o Código Civil vigente preservou o conceito geral da responsabilidade subjetiva no trato da responsabilidade civil do médico, sendo necessário demonstrar tenha o profissional atuado com culpa, praticando um ato ilícito, susceptível para gerar o direito a indenização no denominado erro médico (arts. 927 caput e 951). O ato ilícito é caracterizado quando o médico procede em desacordo com a ordem jurídica, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imperícia, causando um dano patrimonial ou moral a terceiros (arts. 186 e 187, CC). Uma realidade estanque urge enfatizar: um médico estará incompleto se descurar do necessário aprimoramento técnico. Por outro lado, não se pode olvidar que os profissionais vêm passando uma séria crise estrutural, com baixa remuneração, impingindo à maioria, principalmente dos recém formados, trabalhar em vários empregos particulares e públicos além do

próprio consultório, sujeitando-se a um mercado pernóstico que só beneficia os planos de saúde, não sobrando recursos nem tempo para uma melhor preparação, data venia. A propósito, há uma insatisfação geral, de médicos e usuários, com as empresas ligadas à saúde suplementar. Pesquisa recente do Datafolha nos revela dados importantes: 93% dos médicos brasileiros sofre pressões dos planos de saúde e das empresas do ramo no sentido de não solicitarem determinados exames, não internarem pacientes, e quando internam, sofrem pressão para dar alta precoce 1. A novidade trazida pelo Código Civil de 2.002 veio no parágrafo único do art. 927, discorrendo explicitamente sobre a responsabilidade objetiva. Doravante, além dos casos - ilícitos - que a lei taxativamente pautar como de responsabilidade objetiva (que independe de demonstrar a culpa do agente), passou a integrar esta estirpe aqueles próprios das atividades de risco, prescrevendo a lei civil quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para direitos de outrem. Com isso, expandiu-se o raio da responsabilidade objetiva por intermédio de uma norma aberta ante a terminologia legal da atividade normalmente desenvolvida. Não se particularizaram quais seriam estas atividades desenvolvidas, depreendendo-se que esta análise haverá de ser feita em cada caso concreto. Espera-se, entretanto, que os pretórios decidam com serenidade, para que o novo propósito legal não caia no descrédito das decisões apaixonadas, que só prestam para repercutir discórdia e insegurança. Serão necessárias análises atentas e profundas que exigir a situação concreta, avaliando o que efetivamente seja uma atividade costumeira do ofensor (não esporádica ou eventual), atrelada à característica marcante da teoria do risco do empreendimento. A teoria do risco tem lugar pelo fato da atividade cotidiana exercida pelo empreendedor (em tese o ofensor) lhe trazer substanciais vantagens, e proveniente destes riscos 1 A Classificação Hierarquizada, os médicos e a sociedade, por Abdon José Murad Neto (site www.portalmedico.org.br) 2

assumidos causar prejuízos para outros, resultando a obrigação de reparação cível ao lesado. O serviço médico prestado se amolda em linhas gerais como um contrato de prestação de serviço, consensual, escrito ou verbal, de adorno bilateral pelo médico que presta o serviço com o paciente que o recebe. Poucas as relações ilícitas com traços de responsabilidade extracontratual, apenas exemplificando, a emissão de falsos atestados médicos e negativa de prestar socorro. Na grande maioria o médico atende o paciente em virtude deste contrato atípico de prestar um serviço especializado, locando seus conhecimentos científicos. A responsabilidade subjetiva do médico restou consagrada no art. 951 do Código Civil, só evidenciada nos casos que, no exercício da atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitado para o trabalho. Corroborando, a mens legis da legislação consumerista apontou que a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação da culpa (art.14 4º da Lei 8.078/90). Como dito alhures, preservou-se a necessidade de se demonstrar tenha o médico agido com culpa ou erro profissional, causando dano ao paciente. Sem a prova cabal da prática do ato ilícito, dentre as situações conjeturadas nos arts. 186, 187 e 951 do Código Civil, não se há de responsabilizar o médico. Jungido à responsabilidade subjetiva, consolidou-se na doutrina e jurisprudência a obrigação de meio, ou seja, ao médico não lhe é imposto no seu ofício o resultado único de curar o paciente, mas sim a prestação de cuidados conscienciosos, atentos e de acordo com as aquisições da ciência. Há de ser diligente no seu mister, utilizando os recursos que lhe são colocados em favor da recuperação da saúde do seu paciente, e mesmo que sobrevenha o lamentável óbito, não lhe pode imputar responsabilidade se agiu dentro dos padrões da ciência medicina. Desse modo, constituem-se causas de exclusão de responsabilidade do médico a demonstração de que a sua conduta profissional não foi omissa nem negligente, empregando ao paciente o que a ciência médica dispunha, observadas as 3

peculiares do caso em si. Ausente a figura do ilícito, não se poderá falar na obrigação de indenizar. Importante frisar que é do paciente o ônus da prova do erro profissional do médico (art. 14 4º do Código de Defesa do Consumidor e art. 333 inciso I do CPC). Entretanto, o direito hodierno evolui para a inversão do ônus da prova, atribuindo-o ao médico (prestador de serviço), quando o paciente (consumidor) demonstrar ser hipossuficiente ou o juiz constar de chofre a verossimilhança nas suas alegações (art. 6º, VIII do CDC). Insta pontuar que a jurisprudência enquadrou algumas atividades médicas no rol da responsabilidade objetiva, aquela que o médico está obrigado a um resultado esperado, sob pena de ser impelido a indenizar o paciente. A teoria do risco se encaixa com mais evidência no cotidiano forense nos casos de cirurgia estética, quando o médico se propõe a realizar uma intervenção visando exclusivamente melhorar a aparência física do paciente, assumindo o resultado positivo. E não atingido o êxito esperado ou piorando a feição estética, salvo culpa do paciente ou fato imprevisível (aqui caberá ao médico o ônus de provar estas circunstâncias excludentes de responsabilidade), responderá o profissional de forma objetiva pelo risco de sua atuação. O Conselho Federal de Medicina, recentemente, editou a Resolução nº 1.711 de 10.12.2003, com o propósito de estabelecer uma maior segurança nas cirurgias de lipoaspiração, valendo destacar as seguintes obrigações do médico: não deve ser indicada para fins de emagrecimento; necessidade de treinamento específico e habilitação para o ato cirúrgico; apurada anamnese, exame físico, avaliações clínicas e laboratoriais pré-cirúrgicas; presença obrigatória do anestesista (exceto as de pequeno porte), esclarecendo ao paciente a droga anestésica a ser utilizada, obtendo o seu consentimento; monitorização do paciente; limitação dos percentuais dos volumes aspirados de acordo com a técnica praticada e a alta do paciente só sucederá quando estiver prontamente restabelecido. Portanto, a responsabilidade civil do médico é subjetiva, mas existem especialidades que em virtude da previsão 4

positiva do resultado, vão se consolidando no seio dos tribunais, alicerçado pelo Código Civil, como responsabilidade objetiva. II - O ANESTESISTA O anestesiologista atua de modo especial, com funções bem delimitadas pela ciência médica quando intervém no ato cirúrgico, valendo dizer se tratar de um profissional autônomo, sem guardar vínculo com o cirurgião-operador ou cirurgião-chefe, muito menos com o restante da equipe médica. Nesse diapasão, salvo situações sui generis, quando identificadas condutas conjuntas e írritas do anestesista e do cirurgião, é que se revelará a solidariedade a guisa de responsabilidade civil. Compete ao anestesista agir com cautela em três etapas distintas: pré operatório, operatório e pós-operatório. No pré operatório ou na visita pré anestésica, tem de avaliar por antecipação o paciente, verificar o risco cirúrgico, proceder a exame clínico e anamnese, averiguar o resultado dos exames laboratoriais ou os exigir junto com o risco cirúrgico (isso é importantíssimo, jamais realizar a cirurgia sem ver o risco cirúrgico negligência irrespondível) e até colher dados adicionais que entender necessário junto ao paciente e seus familiares. Tudo isso deve ser lançado na papeleta do paciente, com calma e maior detalhamento possível. A papeleta é um documento que tanto pode desvelar a boa atuação preventiva do anestesista ou a sua completa omissão. É o anestesista que delibera se a cirurgia irá ou não ser realizada, ou até mesmo a sua interrupção, obediente às normas da Resolução nº 1.363/93 do Conselho Federal de Medicina. A Resolução nº 1.363/93 do Conselho Federal de Medicina mensura com precisão as atribuições das quais o anestesista não pode afastar nas etapas operatória e pós 5

operatória, mesmo que sobre si recaia a pressão por parte do cirurgião ou da família do paciente para se realizar o ato cirúrgico, sobremaneira nas intervenções eletivas. Assim, obrigatoriamente, para preservar as condições mínimas de segurança na prática da anestesia deverá observar na fase operatória: - as condições da sala de cirurgia; - a monitorização constante dos pacientes nos aspectos que a ciência médica entender indispensável; - os equipamentos, gases e drogas em condições para o ato em si e eventual intercorrência; - remover o paciente para a sala de recuperação pós anestésica, e, se não tiver disponibilidade nesse local, permanecer na sala de cirurgia até a sua liberação. No pós operatório só liberar o paciente depois de verificar seu pronto restabelecimento. Logo, o anestesista é um profissional cujas atitudes são autônomas do cirurgião, com grande responsabilidade em seus atos, cabendo-lhe decidir sobre o início ou não do ato cirúrgico, a sua interrupção, observados os itens de segurança tratados nesse estudo. III - O HOSPITAL (privado e público) Os hospitais e as clínicas privadas que prestam atendimento na área de saúde são responsáveis solidários com o médico. Porém há uma minudência nesta relação. A responsabilidade do profissional é subjetiva, necessitando a prova de que tenha atuado com imprudência, negligência ou imperícia. Assim, num primeiro passo, a responsabilidade matriz a ser investigada é se houve ou não a ocorrência do chamado erro médico. Não existindo, desaparece a responsabilidade de ambos, médico e hospital. 6

Mas se demonstrado o ilícito, independentemente de que não tenha agido com culpa em qualquer grau no ato médico em si, o hospital é solidariamente responsável com o médico. Exceção se faz nos casos que o hospital ou a clínica casualmente oferecem suas estruturas para um médico não participante do seu quadro clínico realizar a cirurgia, sem com ele manter qualquer grau de preposição. É a teoria do risco e da responsabilidade objetiva, que açambarca tanto o hospital privado (que pela relação de consumo tem assento no art. 14 caput e 1º do CDC) como o público (que também resvala na lei consumerista pelo serviço público prestado, art. 3º do CDC), comprovando-se a existência do prejuízo, ante a dicção abrangente do art. 37 6º da Constituição Federal: As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de culpa ou dolo. O art. 43 do Código Civil veio em reforço, tratando da responsabilidade objetiva do Estado sob a modalidade do risco administrativo, tanto na conduta comissiva como na omissiva (causa direta e imediata do não impedimento do dano): As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos de seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo. Mister ressaltar que não comungamos com a tese do risco integral, pois a base do ilícito se apura sob a ótica da responsabilidade subjetiva (o ato médico), e provadas as causas excludentes (arts.12 3º e 14 3º do CDC), desaparece a figura do nexo causal, não podendo gerar sob qualquer pretexto o direito de reparação civil. Tem o hospital (privado ou público) o direito de regresso contra o médico ou servidor através de ação própria, posicionando-se o egrégio Superior Tribunal de Justiça contra a denunciação da lide sob o enfoque de que diferentes os fundamentos com a ação matriz e a introdução complexa de outra 7

prova pericial e testemunhal que só serviria de entreve na prestação jurisdicional (RSTJ 14:440 e 84:202). IV - A EQUIPE MÉDICA Normalmente, a equipe médica é escolhida por um médico, que o acompanhará nos atos cirúrgicos. Esta equipe se compõem de profissionais da área que atua o cirurgião, em geral integrada por assistentes, instrumentador, auxiliares, enfermeiras e quantos mais que o médico principal convocar. Prevalece o princípio da responsabilidade subjetiva do médico, e via de conseqüência ela é extensiva aos profissionais que incorporam sua equipe. Perante o direito, a relação do chefe da equipe com os seus membros é de preposição. Tem-se que qualquer ato ilícito praticado por integrante da equipe, a apuração da responsabilidade individual do infrator se perfaz sob a ótica da responsabilidade subjetiva (necessário provar tenha agido em desacordo com as técnicas médicas e causado prejuízo ao paciente). Mas o chefe da equipe responde pessoal e solidariamente pelo fato injurídico cometido por integrante da equipe, não podendo perquirir se ele (o chefe da equipe) tenha participado ou não da ilicitude cometida. Responde ele por culpa in eligendo e in vigilando, nos termos dos arts. 942, 932,III e 933 do Código Civil. Sintetiza o inciso III do art. 932: São também responsáveis pela reparação civil:...iii. o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele. É a teoria da responsabilidade por fato de outrem, numa presunção absoluta, na qual a culpa do autor do dano transporta a responsabilidade objetiva para a pessoa que a dirige, independentemente de saber se o chefe da equipe participou do ato inquinado de ilícito ou não se houve com o dever de vigilância. 8

Sub censura. Rénan Kfuri Lopes, adv. FEVEREIRO DE 2004 9