A homoafetividade na teledramaturgia da rede Globo: de que forma você se percebe por ali? 1



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Transcrição:

A homoafetividade na teledramaturgia da rede Globo: de que forma você se percebe por ali? 1 Glaucy de Sousa Santana 2 Robéria Nádia Araújo 3 Universidade Estadual da Paraíba, PB. RESUMO A pesquisa analisa de que forma a teledramaturgia da Rede Globo representa a homoafetividade, compreendendo como as novelas Amor à vida e Sangue Bom realizam essa abordagem. Para a percepção desse contexto, apresenta opiniões de um grupo homossexual sobre as referidas telenovelas, a fim de verificar os aspectos retratados nas tramas. Para fundamentar as ideias aqui discutidas, são utilizadas obras de Jost (2007), Gordillo (2010), Távola (1996). Trata-se de um estudo qualitativo que utiliza a Analise de Conteúdo como estratégia metodológica, a partir da abordagem categorial presente nos enredos. A novela Sangue Bom apresenta a homossexualidade de maneira caricata, e Amor à Vida, embora se aprofunde mais na questão, pouco contribui para que as relações homoafetivas sejam desvinculadas de preconceitos. PALAVRAS-CHAVE: Teledramaturgia; Homoafetividade; Amor à vida; Sangue Bom. Telenovela: Histórico, avanços e funções. Uma das primeiras aparições das narrativas dramáticas foi na Idade Média com contos e romances sobre a cavalaria, porém esse gênero se fortaleceu durante a Revolução Industrial com os folhetins, que tinham como objetivo inicial o de entreter a população. Os folhetins surgiram na França, no inicio do século XIX e eram publicados em periódicos.. Um exemplo de Folhetim é o Romance urbano de Joaquim Manoel de Macedo, A moreninha, que alcançou grande sucesso. Com o surgimento do rádio, esses folhetins foram perdendo sua força, pois o rádio conseguia divertir a todos inclusive os analfabetos e semianalfabetos. Assim os folhetins foram transformados em radionovelas, apresentando uma narrativa sonora produzida e divulgada por esse veiculo popular. Como exemplo, podemos citar a 1 Trabalho apresentado no DT 1 Jornalismo do XVII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste realizado de 2 a 4 de junho de 2015. 2 Bacharel em Comunicação Social da UEPB, e-mail: glaucysousas@gmail.com 3 Orientadora Prof.ª Drª em Educação. 1

radionovela Direito de Nascer (1951), criada pelo Cubano Félix Caignet. Em meados de 1960 o sucesso das radionovelas foi diminuindo, pois o custo de produção era bem elevado, e houve uma espécie de migração de verba para a TV o que fez com que o rádio perdesse seu grande potencial de entreter e informar para a televisão. Tal fato fez com que a radionovela migrasse para a TV, se se transformando no que chamamos hoje de telenovela. A telenovela é uma história de ficção atrelada á recortes da realidade, uma de suas características é que ela é fragmentada em capítulos, no qual o novo capítulo é o desenrolar do capítulo anterior. É exibida no período de seis meses á dez meses, os capítulos são apresentados geralmente de Segunda á Sábado. Outra característica desse gênero ficcional, principalmente as telenovelas da rede Globo, é que de forma geral as temáticas dos enredos se repetem, percebemos um mix entre drama, romance e violência. Segundo Távola (1996) a telenovela possui algumas peculiaridades que não podem ser comparadas a nenhum outro gênero ficcional. Telenovela tem como parâmetros estéticos, artísticos e culturais a literatura, o cinema, o teatro. É, contudo, gênero próprio com afinidades e diferenças significativas. Pode inserir-se no campo da literatura pós-moderna. Daí a dificuldade de sua conceituação. (TÁVOLA, 1996 p.48). Um dos diferenciais que a teledramaturgia carrega se compararmos as outras artes é que a telenovela busca o publico, o mercado antes mesmo de estar totalmente pronta. Ela é escrita e roteirizada a partir das pesquisas tanto do mercado como da sociedade, a telenovela consegue se adaptar as respostas e opiniões dos seus telespectadores, sendo por isso considerada uma obra aberta. Para Gordillo (2010) as ficções televisivas, além de proporcionarem entretenimento para o publico apresentam também quatro funções, a primeira é a de fabulização, que consiste numa tentativa de atrair as pessoas para outros contextos através das ações dos personagens, do tempo e do espaço, em seguida vem a socializadora, que consegue unir grupos sociais em torno de temáticas comuns gerando opiniões e preferências. A terceira função é a identitária, pois a teledramaturgia aparece como interprete da vida social. Já a disseminadora de modelos se caracteriza por organizar situações e personagens familiares convertendo os estereótipos em sugestões de comportamento social. E por fim a função formativa significa que por algumas tramas abordam em seus enredos mensagens educativas, trazendo para o publico a possibilidade de absorção de conteúdos pedagógicos. Nesse sentido, a importância da teledramaturgia é expor temas de interesse social permeados 2

por informações e valores que podem representar determinados contextos e situações, ajudando o publico a compreendê-los com mais facilidade. Concordamos com Bauman (2001), quando ele define a identidade atual como liquida, que se desfaz e se refaz em vários momentos, devido às transformações nas instituições pedagógicas como também pelo surgimento dos diversos dispositivos midiáticos, (TV, rádio, cinema, teatro, telenovelas) que trazem assuntos polêmicos que estão presentes no cotidiano e que são pouco debatidos pela sociedade. O autor afirma que no passado a identidade era herdada de berço, eram os próprios país que construíam a personalidade de seus filhos, passando para eles os seus valores e crenças. Hoje, em tempos pós-modernos, escolhemos quem queremos ser, o que queremos seguir. Portanto, temos mais liberdade de escolha, temos a capacidade de refletir, de criticar e ao fazer uma analise decidir com o que concordamos ou não e se discordamos criamos nossa própria identidade. A telenovela e suas peculiaridades Um relevante aspecto que merece nossa atenção é que cada vez mais percebemos que as vidas das pessoas se entrelaçam com as dos personagens e as ficções se confundem com a realidade. Quem acompanha um folhetim se identifica com algum personagem e se sente representado de algum modo pelas tramas apresentadas. Tornando a telenovela um instrumento que combina a atualidade ao passado, a informação e o divertimento, trazendo traços do cotidiano atrelados à ficção. Por isso, em toda ficção sempre há uma história verdadeira e em toda história verdadeira há elementos de ficção que se unem para garantir verossimilhança ao que é narrado (JOST, 2007, p.114). A telenovela se destaca por ter um roteiro que faz com que os telespectadores se aproximem cada vez de seus personagens dela, pois o gênero traz especificidades como a verossimilhança. Assim, é preciso pensar como tal personagem é construído dentro da telenovela. Já faz parte da rotina de todo brasileiro, chegar a sua casa e sentar-se em frente à televisão para assistir a sua telenovela preferida. Na maioria das vezes os telespectadores repetem esse hábito porque querem a principio relaxar e se entreter, mas posteriormente, refletem sobre o conteúdo visto. As experiências do imaginário televisivo são compartilhadas pelo publico, e esse assume papel de protagonista na aceitação do enredo. Além dos enredos tradicionais das novelas Globais outras discussões foram introduzidas nela como sobre as drogas, violência contra a mulher, homoafetividade, 3

exploração sexual, AIDS, violência e outros assuntos. Essa colocação de temas sociais nas tramas consiste no que chamamos de Merchandising Social. SCHIAVO caracteriza da seguinte maneira o merchandising social: Merchandising é a mercadoria andando, em movimentação dentro do mercado. No Brasil a ideia de merchandising, além de se relacionar à promoção do produto nos pontos de venda, também assumiu a conotação da propaganda inserida em programas de televisão, filmes e shows, entre outras formas de lazer e entretenimento. Neste contexto, as telenovelas constituem os mais adequados e eficazes suportes ao desenvolvimento de ações de merchandising televisivo. (SCHIAVO, p.86, 1989,). Uma autora que utiliza muito o Merchandising Social Glória Perez, na novela "O Clone" (2002), ela trazia à questão do vício em narcóticos, a partir da Personagem Mel, interpretada pela a atriz Débora Falabella em um dos capítulos, a personagem chega a ingerir perfume, numa crise de abstinência. A homossexualidade: contexto histórico e pluralidade dos termos Muitas pessoas pensam que a homossexualidade foi algo que surgiu recentemente, porém essa prática está presente na sociedade desde antigamente. Existem registros dessa orientação social em diversos povos. No Egito, por exemplo, mais especificamente na cidade de Tebas, existiu um grupo de militares do exército homossexuais e hoje, se existir algo parecido dentro dos quartéis, o soldado é punido e até mesmo expulso da corporação. O grupo militar de Tebas era composto por mais de 100 casais. No Brasil há registros de tribos indígenas que praticavam a homossexualidade no intuito de passar conhecimentos. Antigamente, o amor entre os semelhantes era tão comum quanto à heterossexualidade de hoje, nem sequer existia um conceito fixo para se definir a homossexualidade. A homossexualidade só veio a ser tratada como anormalidade, na Europa Medieval, quando a Igreja e o Estado se juntaram,sacrificando este tipo de sexualidade e estabelecendo um padrão para o povo que seria a heterossexualidade. Ou seja, toda e qualquer prática que se diferenciasse desse padrão era considerada errada e punida com vigor. De acordo com os estudos de Débora Vanessa Caús Brandão (2002) o termo homossexual foi utilizado pela primeira vez em meados de 1869 a 1870, pelo médico Karoly Benkert, que foi o primeiro a debater e escrever sobre o relacionamento afetivo entre os sexos iguais, e assim criou o termo homossexual. Para contribuir com a discussão do tema recorremos a Maria Berenice Dias, que define a palavra 4

homossexualidade da seguinte maneira: exprime tanto a ideia de semelhante, igual, análogo, ou seja, homólogo ou semelhante ao sexo que a pessoa almeja ter, como também significa a sexualidade exercida com uma pessoa do mesmo sexo (DIAS, 2000, p. 31). Em 1886, o médico e católico Richard Krafft criou o termo diagnóstico homossexualismo, defendendo que o sexo deveria ser praticado com o intuito de reprodução da espécie e dos ideais de amor à família e a Deus e denominou a homossexualidade de outro nome: o homossexualismo. Durante muito tempo até os dias atuais, vários estudos são feitos para descobrir a causa da homossexualidade. Um dos percussores a realizar o estudo foi Freud (1935) que afirmava que a homossexualidade é causada por uma saída "negativa" do complexo de Édipo, baseado na bissexualidade original, já que no inconsciente de cada pessoa encontramos inclinações tanto heterossexuais quanto homossexuais. A Associação Americana de Psiquiatria publicou em 1952 no Manual Diagnostico e Estatístico de Transtorno Mentais, que a homossexualidade era uma desordem mental. Assim, vários cientistas começaram a estudar sobre a temática e nada foi comprovado que a homossexualidade era um distúrbio dessa natureza. Com isso, em 1973, a Associação eliminou o homossexualismo enquanto doença. Esse novo contexto abriu uma atmosfera favorável para outras definições sobre o amor entre iguais. Dessa forma o homossexualismo volta a ser chamado de homossexualidade, no qual ao invés do sufixo ismo que é geralmente associado à doença passa para o sufixo dade, que traz consigo o significado de forma expressão. Daí por diante o mundo inteiro começa a entender a homossexualidade apenas com uma opção sexual, e se ela for tratada por alguém de maneira preconceituosa, esse alguém pode chegar à condenação penal. Mas será mesmo que o individuo escolhe ser homossexual? Pensamos que não, porque ninguém escolheria passar por tantos desafios na vida, ninguém escolheria o caminho mais difícil, que é o da homossexualidade, ninguém preferiria ser visto pelas outras pessoas como um ser anormal, na verdade a maioria das pessoas optaria pela jornada mais fácil, a da heterossexualidade. Assim através deste questionamento, a homossexualidade que era tratada como uma opção passa a ser tratada como Orientação sexual. A autora Gabriela Cabral (2004) explica a orientação sexual da seguinte forma: 5

O nome dado à atração sexual que um indivíduo sente por outro, independente do sexo que esse possui, podendo ser assexual quando não sente atração sexual por nenhum gênero (sexo feminino ou masculino), bissexual quando sente atração pelos dois gêneros, heterossexual quando sente atração somente pelo gênero oposto, homossexual quando sente atração por indivíduos do mesmo gênero e pansexual quando sente atração por diferentes gêneros (transexuais) (CABRAL, Gabriela. Orientação Sexual. Disponível em: http://www.brasilescola.com/sexualidade/orientacaosexual.htm. Acessado em: 04. Mar. 2014). Porém este termo traz consigo uma grande conotação sexual, e buscando eliminar esta característica do termo e no intuito de criar uma norma que regulamentasse a relação entre iguais à desembargadora Maria Berenice Dias, cria o termo homoafetividade As uniões entre iguais são semelhantes a uma família comum e os termos homossexual, homoeróticos eram muito estigmatizados e o termo homoafetivo demonstra que além do interesse sexual existem outros vínculos, afetivos que unem as pessoas. Sangue Bom e o personagem Tio Líli A telenovela Sangue Bom teve a autoria de Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari. Seus 160 capítulos foram exibidos no horário das 19 horas. A trama principal se desenrola em torno de seis jovens, com personalidades bem diferentes que no desenrolar da trama suas vidas se entrelaçam. O personagem desta trama que analisamos é Ulisses, mais conhecido por Tio Líli (Edwin Luisi), um cabeleireiro e maquiador, algo que se tornou uma espécie de carimbo quando os enredos abordam a temática da homossexualidade, o que de certa forma o generaliza e menospreza, mostrando que sua competência se volta apenas para trabalhar com atividades que envolvem a beleza da mulher. Ulisses usava roupas bem coloridas, calças amarelas e cor de rosa, camisas com estampas de flores, relógios e óculos com armações coloridas e chamativas sempre acompanhando as tendências da moda. E nisso mais uma vez aparecem os estereótipos, pois nem todo gay se veste dessa maneira extravagante. E essa associação do gay à moda só lhe atribui mais características do gênero feminino. Reforçando esse aspecto do gay afeminado, além do figurino notamos na novela trejeitos delicados e voz levemente afinada. Selecionamos um grupo de homossexuais, que mapeamos na rede social Facebook, e ao qual submetemos a eles um questionário, buscando conhecer suas opiniões sobre as abordagens das telenovelas que adotamos como objeto de estudo. Foram pesquisados 6

três jovens do sexo feminino e três jovens do sexo masculino. No intuito de preservar a identidade de cada um, optamos por identificá-los por suas iniciais, segundo acordo prévio. Os aspectos ressaltados compõem o personagem e se tornam é de extrema importância para verificarmos as caricaturas que permeiam os homossexuais na TV. De acordo com o entrevistado T.F. do sexo masculino, assistente administrativo de 26 anos a abordagem da telenovela Sangue bom trouxe novamente um olhar distorcido do cotidiano dos homossexuais: A novela Sangue bom abordou a homossexualidade através do personagem Líli, um cabeleireiro afeminado nada muito diferente das abordagens anteriores, como o fato de atribuir ao Tio Líli a profissão de cabeleireiro, a voz afeminada, atos que já estão batidos até demais. Não é porque eu sou gay que eu falo miando, não é porque eu sou gay que eu sei maquiar e cortar cabelo, e adoro tudo que se refere à moda e muito menos sou um palhaço. (T.F. entrevista, 28 de Abril de 2014). Vale ressaltar também que Tio Lili era um personagem secundário na trama, e o que chamava atenção era justamente a comicidade que foi atribuída ao seu perfil, que era muito caricato e divertido, abusando de bordões do tipo toda trabalhada na elegância. Essa característica pode alimentar na sociedade a ideia de que o homossexual não pode trazer consigo a característica da seriedade, que são pessoas que dão atenção assuntos fúteis. No capítulo exibido no dia 31/08/2013, o personagem desabafa com o companheiro de trabalho Sininho, sobre a aceitação familiar, e nesse dialogo podemos perceber as diferenças de quando uma família aceita o filho como ele é e quando o rejeita. Tio Lili lembra com tristeza que seu pai o expulsou de casa quando soube da sua homossexualidade e praticamente todos os seus parentes lhe deram as costas. No entanto, a cena se encerra com Tio Lili pedindo uma jujuba para Sininho na tentativa de amenizar a carga dramática da conversa que tiveram. Nesse momento, percebemos que quando a trama traz a abordagem do preconceito, que merece mais visibilidade, é tratada novamente como piada, como se fosse possível rir de tudo, até mesmo a respeito da negação da família, que não aceita a sexualidade de cada um. A novela poderia ter explorado ainda outros problemas que dificultam e entristecem o cotidiano do gay, como por exemplo, a homofobia, e os preconceitos. Outra questão que verificamos foi a de Ulisses se mostrar sempre meigo e amigo de todos, principalmente das mulheres, pois era o confidente de Renata e Verônica. Na maioria das cenas da trama, o personagem aparece em conversas com temas femininos e 7

superficiais, que assuntos vão desde recomendações amorosas a conselhos de Beleza. Acreditamos que a novela produziu uma representação homossexual ligada ao afetivo, já que mostra que um gay carinhoso, confiável e prestativo. Entretanto, não é possível se padronizar as personalidades humanas. Portanto, o personagem tio Líli segue uma linha heteronormativa, que para Spargo, (2004), especifica a tendência, no sistema ocidental contemporâneo referente ao sexo-gênero, de considerar as relações heterossexuais como a norma, e todas as outras formas de conduta social como desviações dessa norma. (SPARGO, 2004, p. 86). Em outras palavras, a sociedade tem a tendência em procurar sempre a feminilidade até mesmo onde essa não existe e, nesse sentido a trama coloca o personagem no papel social que a mulher geralmente ocupa, incluindo as características de amiga e companheira, comuns às personalidades dóceis e amáveis. No inicio, a trama deixa claro que ele teve um relacionamento com outro homem que não deu certo, porém esse ex-amor nunca apareceu na novela. E de repente, próximo do fim da trama, no capítulo do dia 28/09/2013, nosso personagem se relaciona com outra mulher para desmanchar a relação de seu sobrinho com Damaris, que não aceita que o seu tio se torne heterossexual. Dessa forma surge um aspecto positivo em meio aos negativos, ao mostrar o heterossexual como o anormal da história em relação ao tio Líli, tanto é que tanto Lucindo como os outros amigos não aceitam muito bem essa relação do personagem com dele com mulher. A novela quis mostrar que há parentes que entendem as opções de seus familiares. Lucindo não se conformou com a mudança repentina do tio. Contudo, a intenção ainda foi a de divertir os telespectadores, sem tratar do assunto com a seriedade que ele merece. Amor à vida e os casais das tramas: Niko e Eron, Félix e Niko Escrita por Walcyr Carrasco, ao todo foram 221 capítulos exibidos no horário das 21 horas. A história gira em torno das disputas que acontecem em 2001 com uma rica família pelo controle de um hospital, o renomado San Magno, na capital paulista. Nos aprofundamos em dois casais da trama principais para o nosso estudo Félix e Niko e Niko e Eron que mantêm um relacionamento na primeira fase da trama, Niko cozinheiro e dono de um restaurante japonês e Eron advogado do hospital San Magno, como foi explicado no capitulo anterior deste estudo. A novela mostra a relação dos 8

dois caracterizando Niko como a mulher da relação, atribuindo qualificações comuns a ela como: cozinhar bem, ser carinhoso, sensível e gentil com todos, sempre com um sorriso no rosto. Atribui a esse personagem o sonho de formar uma família adotando uma criança ou gerando, uma através do método da barriga solidária. O personagem usa roupas coloridas e descoladas. Já Eron se mostra mais sério, sempre de terno com cores escuras e fechadas. É mais masculino que Niko. Tem poucos amigos, é egoísta na relação, preocupando-se a maioria das vezes com ele mesmo. Passa a maior parte do tempo no hospital, o que significa a valorização do trabalho característica atribuída figura masculina. Podemos observar essa referência ao papel feminino e masculino em vários capítulos onde os dois são mostrados. Num deles, exibido no dia 07/06/2013, Niko conversa com Eron sobre a possibilidade de terem um filho juntos. Niko aparece servindo o café da manhã do seu companheiro característica típica feminina, comentando de forma meiga sobre a sua vontade de formar uma família de verdade. Isso nos remete aquela mulher que sonha com a família perfeita. Apesar de a trama abordar a homossexualidade de forma mais crítica, abrindo um espaço maior para essa discussão, o que inegavelmente é um fator positivo, ao mostrar outro olhar do homossexual masculino, diferente do padrão afeminado e caricato como ocorreu com o personagem Tio LÍli, a novela ainda peca por colocar o casal nos padrões da heteronormatividade: Eron sendo o homem da relação e Niko, a mulher. De acordo com a entrevistada J.S, de 22 anos, estudante de Arte e mídia e dançarina, esse aspecto foi interessante por romper com os estereótipos negativos: Em Amor à Vida vi que teve uma abordagem diferente, que não era aquela representação estereotipada de um gay. Eram dois homens não tanto afeminados, com carreiras boas/importantes e de papel importante na trama. O ponto positivo foi levar à sociedade esse outro lado do gay, o que não é visto como comédia, o que pode ser respeitado e etc. (J.S. entrevista, 10 de Março de 2014). Pino (2007) em seus estudos define a heteronormatividade como o enquadramento de todas as relações mesmo as supostamente inaceitáveis entre pessoas do mesmo sexo em um binarismo de gênero que organiza suas práticas, atos e desejos a partir do modelo do casal heterossexual reprodutivo (PINO, 2007, p. 160). A heteronormatividade não ocorre apenas da parte da emissora ao produzir a trama, mas da parte da sociedade também. Quando as pessoas deparam com um casal gay na rua, a nossa mente está tão familiarizada com o casal heterossexual, que tentamos imaginar 9

quem faz o papel de quem no relacionamento. Fantasiamos que um irá fazer o papel feminino e o outro o masculino, o mesmo fato ocorre também com os casais de lésbicas. Ou seja, a relação heterossexual continua servindo de parâmetros para os relacionamentos entre iguais. E como estamos acostumados a fazer tal associação, a forma de abordagem do homossexual em Amor à vida é mais aceita pelo público. Contudo, acreditamos que não há necessidade de submeter o gay a tais características, de firmar ainda mais esse conceito na mente dos telespectadores. Ao contrário, os padrões socialmente aceitáveis dificultam que as novelas comecem a retratar o gay como ele realmente é. Outra questão em que a trama perde pontos com relação à representação de casais homoafetivos, é no sentido de troca de carinho. O casal Niko e Eron manteve um relacionamento duradouro durante boa parte da trama e pouco se viu demonstração de afeto. O máximo que os telespectadores presenciavam era uma troca de abraços, mãos dadas, e só. E com esse tipo de abordagem, a novela demonstra que os casais homossexuais são assexuados e frios na maior parte do tempo, ou que são muito discretos nos gestos de carinho, uma imagem falsa, pois pessoas apaixonadas agem de modo parecido, para além das opções sexuais que possuem. É claro que a trama Amor à vida trabalhou muitas vezes com o imaginário dos telespectadores. Sutilmente em cenas onde os dois personagens caminhavam para o quarto juntos fazendo o publico entender que eles mantinham relações sexuais. Entretanto, cenas em que o casal trocasse beijos apaixonados de forma mais explícita, não houve. Observamos que o afeto entre casais heterossexuais da trama como Bruno e Paloma, Valdirene e o Palhaço, entre tantos outros era muito explícito. Então já que a Globo procura tanto enquadrar os casais homossexuais nos papéis de homem e mulher, como estamos acostumados a ver de forma expressiva, por que não mostrar o lado carinhoso dos casais homoafetivos? Uma abordagem positiva que a telenovela trouxe foi à inseminação artificial feita através de uma barriga solidária, o que favorece os casais homoafetivos, bem como a possibilidade de adoção de crianças por casais do mesmo sexo. J.S, de 27 anos, técnico em informática, declara: Amor à vida trouxe temas interessantes atrelados a homoafetividade, como a adoção de crianças por casais homossexuais, através do casal Niko e Eron, no qual ambos se mostravam inteligentes, estudados, com vida financeira bem estabelecida e eram mais sérios, se compararmos a tio Lili. (J.S. entrevista, 15 de Abril de 2014). 10

Félix e Niko se relacionaram na segunda fase da trama. Niko havia se separado do seu antigo companheiro, Eron, após descobrir que ele o traiu com Amarilys, e resolveu seguir sua vida sozinho. Já Félix havia sido expulso de casa depois que sua família descobriu suas armações contra Paloma passando a morar com sua antiga babá Márcia, cuja ajuda torna-se essencial para ele se tornar uma pessoa melhor e se redimir dos erros do passado. Com o desenrolar da novela, os dois personagens, que já se conheciam, mas não tinham muita intimidade, vão se aproximando e criando uma amizade muito forte. O público passa a perceber que Niko, seria um par adequado para a redenção do caráter duvidoso de Félix. Assim Niko conquistou o posto de mocinha da trama, graças ao seu jeito meigo, generoso, sendo a vitima das intrigas que o novo casal Amarilys e Eron armaram para ele. As suas dificuldades para adotar Jaiminho (uma criança negra) e conseguir a guarda de Fabrício (filho gerado por Amarirys) também contribuíram muito para ele conseguir a simpatia do público. Félix passou de vilão a herói, capaz de enfrentar tudo para salvar o filho de Niko e para salvar seu pai, César, que sempre o rejeitou. Notamos, dessa forma, que o personagem vilão passa a ganhar traço de humanidade a partir do envolvimento afetivo com Niko. Desse modo, a trama abordou conteúdos mais consistentes através da vida individual de cada personagem. A partir Niko, percebemos outra imagem do gay: aquela que busca acima de tudo a formação de uma família bem estruturada, a sua independência e a preocupação com os outros. Félix se torna o oposto da primeira fase da trama, quando era egoísta ao extremo, passando por cima de tudo e de todos para atingir seus objetivos. Esses dois contextos criados por Walcyr Carrasco trouxeram aspectos positivos para a sociedade gay, no sentido de que mostra a individualidade de cada um, desmitificando a imagem negativa exótica atribuída aos estereótipos criados por outras telenovelas. Outro aspecto que a trama abordou, através de Félix, foi à rejeição que ele sofria da parte de seu pai, por ser homossexual, e trouxe também o que essa rejeição pode causar em uma pessoa. No decorrer da novela, percebemos que as maldades do personagem buscavam atrair a atenção do pai, para mostrar o quanto ele podia conseguir, principalmente dentro do hospital que César dirigia. Quando os telespectadores descobrem essa razão, passam a perceber Félix como um personagem humanizado possível de redenção. 11

No capítulo exibido em 31/07, Edith revela a família Khoury durante um jantar, o segredo que Félix tanto temia o seu envolvimento com outro homem, o Anjinho. Com varias fotos tiradas dos encontros dele com o modelo, ela prova para a família a verdadeira orientação sexual do marido. O capítulo rendeu elevada audiência. Depois da revelação, Félix ganha o apoio da mãe, mas é rejeitado e humilhado por seu pai que afirma ter nojo e vergonha de ter um filho assim. Sem dúvida, a cena retrata uma das maiores dificuldades que um homossexual enfrenta em sua vida, que é contar para a família da sua condição e conseguir apoio e compreensão. Na realidade gay poucas vezes acontece à aprovação dos familiares, o que causa dor e sofrimento. De acordo com a entrevistada S.S, de 26 anos, militante do movimento LGBT em Campina Grande, a novela contribuiu bastante no quesito família, mostrando a realidade do gay em seu cotidiano e as dificuldades que ele sofre para ser aceito. De acordo com a militante, Amor à vida, ajudou a modificar algumas posturas familiares, que se comoveram com a trama. A novela Amor à Vida mostrou bem, principalmente, a parte de aceitação e respeito de um homossexual no meio familiar, tratou como ocorre o no dia a dia de alguns e auxiliou a aceitação nas famílias de muitos homossexuais (vi muitos relatos nas redes sociais). (S.S. entrevista, 19 de Março de 2014). Apesar do casal Félix e Niko ter sido bem aceito pelos telespectadores, a principio os dois seriam apenas amigos. Mas o público pediu tanto pelo romance dos dois que o autor decidiu atender ao pedido e assim foi criando um contexto romântico entre eles. A novela o que mostra assim que de uma amizade entre gays pode surgir um grande amor, como ocorre entre os heterossexuais, o que representa um fator positivo em relação à abordagem ficcional homoafetiva. Na opinião do entrevistado R.A. L, fotógrafo e artista de sanduíche, 4 de 25 anos, esse romance criado pelo autor trouxe pontos desfavoráveis o homossexual nas novelas sempre é mostrado com conotações sexuais, o que, segundo ele, não corresponde à realidade e pode contribuir com uma imagem negativa, assustando os héteros do convívio com eles, sob o risco de sofrerem assédio o que é negativo para essas pessoas confundidas com levianas e promíscuas. (R.A. L 20 de Março de 2014). No capítulo exibido 31/01/2014, o tão esperado beijo entre um casal homossexual de uma telenovela foi exibido para o público. Assim, Niko e Félix 4 Os artistas do sanduíche cumprimentam e servem os clientes, explicam os itens do cardápio e preparam os pedidos de alimentos. Eles também devem operar a caixa registradora, contar o estoque, realizar alguns poucos trabalhos com documentação e aderir aos padrões de qualidade dos alimentos. 12

protagonizaram uma cena marcante para a emissora e o beijo repercutiu muito entre os telespectadores. Contudo, acreditamos que esse beijo foi muito singelo para representar o amor que existia entre os dois. Outro aspecto que a trama abordou, a partir do casal, foi à formação de um novo tipo de família, na qual os filhos de Niko, Jaiminho e Fabrício, o filho de Félix Jonathas, César, e o casal vão morar juntos. Do ponto de vista sociológico, percebemos que no cotidiano estão se tornando comuns esses novos formatos de família, o que pode representar um avanço para a teledramaturgia abordar essas questões. No entanto, falta muito para que a discussão consiga representar a realidade nos enredos das novelas. Quando refletimos sobre as tramas e as opiniões dos entrevistados, observamos que a maioria entende de forma negativa alguns aspectos dos enredos e dos personagens. Contudo, ao serem indagados a respeito de qual personagem se aproxima mais da veracidade do cotidiano gay, dos 6 entrevistados, 4 elegeram o personagem Niko como o mais verossimilhante com a realidade homossexual. Destacamos aqui opiniões interessantes a esse respeito. A primeira é a do coordenador administrativo F.S (2014) de 29 anos, que escolheu Niko por ele ser uma pessoa focada em seus objetivos, não ser tão afeminado como aqueles que já estamos acostumados a ver, por ele ter segurança naquilo que faz e naquilo que quer e por ele trazer assuntos relevantes do diadia do gay, como a adoção. Ao compararmos as duas respostas, diagnosticamos que o personagem foi bem aceito pela plateia LGBT, por não ser caricato e afeminado, por ter mantido a mesma linha de personalidade na trama e principalmente por ter representado abordagens importantes que perpassam os conflitos sofridos pelos homossexuais. Outro personagem que foi citado pelos entrevistados como representante da homossexualidade no contexto paraibano foi o Félix, mas não pelo seu comportamento afeminado, mas porque retratou sua relação familiar, que é comum a muitos gays, em todo desenrolar da trama. A militante do movimento LGBT de Campina Grande S.S., de 26 anos, destacou esse aspecto: Penso que falando de gays o personagem Félix de Amor à Vida mostrou quase tudo que os gays sofrem em âmbito familiar, a batalha para crescer na vida (independente da queda ter sido provocada por ele mesmo) e, principalmente, por mostrar que existem muitos homens casados que são gays e mantêm um relacionamento de aparências para uma aceitação na sociedade. (S.S. entrevista, 19 de Março de 2014). 13

Esses relatos fazem compreender que quanto mais às tramas se desvincularem da figura do gay cômico e afeminado, trazendo a figura do homossexual masculinizado, inserido no âmbito familiar, com os parentes participando inteiramente da sua vida, relacionando esses personagens com temáticas mais importantes como o casamento, adoção, conflitos amorosos, entre outras, mais haverá aproximação com a realidade gay e consequentemente, mais aceitos eles serão tanto pelos homossexuais quanto também pela sociedade em geral. Um fator que faz com que o publico LGBT não se identifiquem com as abordagens da homossexualidade nas tramas é o fato de somente se exibir cenas eróticas entre casais heterossexuais, censurando expressões de paixão entre casais homoafetivos. Quando exibem um beijo é algo como um selinho ou um beijo um pouco mais demorado, mas sem demonstração de desejo. Como afirma a estudante de 23 anos, M.Á. B, que não se sente representada nas novelas: Considerações Finais Não mesmo. A mídia por diversas vezes é hipócrita e ela não me representa. Um tabu gigantesco existe pelo simples fato de mostrar ou não algo tão singelo como um beijo (entre pessoas do mesmo sexo), porém percebemos a vulgaridade explícita em muitos outros programas que têm o mesmo alcance que as novelas. (M.Á.B. entrevista, 20 de Março de 2014). Com este estudo, conseguimos entender que as telenovelas possuem muito mais funções do que os próprios telespectadores imaginam. Entre elas, destacam-se a de socialização, educação, disseminação, formação de novas identidades, entre outras. As tramas são de fato grandes instrumentos de construção da realidade e possuem o poder de influenciar os comportamentos sociais. Com a ajuda dos entrevistados enxergamos também que as novelas pouco representam a realidade do homossexual brasileiro, o que exige dos autores maior conhecimento dessa realidade. Enxergamos também que as novelas Rede Globo expõem três tipos de homossexuais: o assumido, que traz sempre características como a voz afeminada, jeito muito alegre de ser, movimentos delicados e roupas coloridas. O outro é o pervertido e marginalizado, aquele que se envolve com todo mundo só pelo prazer ou por dinheiro, sem sentimentos. E por último o homossexual que muito se assemelha ao heterossexual, mas é mostrado como assexuado, que mantém um relacionamento com outro homem, porém sem manifestar afeto ou desejo. Entendemos que a discussão entre telenovela e diversidade sexual, encontra-se no seu estágio inicial, o que exige estudos e pesquisas sobre o tema, de maneira que a academia possa contribuir para a sugestão de 14

preconceitos, auxiliando a ruptura de estigmas que desconsideram o universo gay e tratam a homoafetividade como tabu. Esperamos que este estudo tenha dado um passo importante nessa direção e possa originar novas pesquisas. REFERÊNCIAS BRANDÃO, Débora Vanessa Caús (2002). Parcerias homossexuais: aspectos jurídicos. São Paulo: RT, 2002. BAUMAN, Zygmunt. Modernidade liquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. CABRAL, Gabriela. Orientação Sexual. Disponível em: <http://www.brasilescola.com/sexualidade/orientacao-sexual.htm.>acessado em: 04. Mar. 2014 DIAS, Maria Berenice (2000). União homossexual: o preconceito & a justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. FREUD, S. Observaciones Psicoanaliticas sobre um caso de Paranóia. (Domentia Paranoides) Autobiograficamente Descrito. Obras Completas, Editora Nueva, B. Aires, Arg., 1948, II, pg. 661. GORDILLO, Inmaculada. Manual de narrativa televisiva. Madrid: Editorial Sintesis, 2010. JOST, François. Compreender a televisão. Porto Alegre: Sulina, 2007. PINO, Nádia Perez. A teoria queer e os intersex: experiências invisíveis de corpos des-feitos. Cadernos Pagu, v. 28, p. 149-174, jan. /jun, 2007. SCHIAVO, M. R. Merchandising Social: Uma Estratégia de Sócio-Educação para Grandes Audiências. Tese de Livre-Docência. Universidade Gama Filho. Rio de Janeiro, 1995. SPARGO, Tamsin. Foucault y la teoria queer. Barcelona: Gedisa, 2004. TÁVOLA, Artur Da. A telenovela brasileira: história análise e conteúdo. São Paulo: Globo, 1996;. 15