O ENSINO DE MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO PROFISSIONALIZANTE- INDUSTRIAL NA VOZ DO JORNAL O ETV : ECOS DA REFORMA CAPANEMA



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Transcrição:

O ENSINO DE MATEMÁTICA NA EDUCAÇÃO PROFISSIONALIZANTE- INDUSTRIAL NA VOZ DO JORNAL O ETV : ECOS DA REFORMA CAPANEMA Antonio Henrique Pinto ahenriq@unicamp.br Introdução O ensino de matemática passou por várias reformulações ao longo do século XX, tanto no Brasil quanto em muitos outros países. Isso pode ser exemplificado por dois casos que, não por acaso, tiveram origem lá fora e depois repercutiram aqui no Brasil. O primeiro diz respeito ao movimento internacional de modernização do ensino de matemática iniciado em fins do século XIX e que se estenderam até as duas primeiras décadas dos século XX. O segundo movimento de reformulação ocorreu a partir da segunda metade do século XX e foi denominado de Movimento da Matemática Moderna. Tanto um quanto o outro tiveram ampla repercussão nas propostas oficiais de ensino de matemática aqui no Brasil. No Brasil o auge do primeiro movimento se deu ao fim da década de 20 e início da década de 30, quando as idéias de Félix Klein começaram a penetrar nos sistemas de ensino, tendo à frente o professor Euclides Roxo, catedrático da cadeira de matemática do Colégio Pedro II no Rio de Janeiro. Inicialmente implantadas no Colégio Pedro II no ano de 1928, essas propostas de reformulação foram estendidas a todo o sistema educacional brasileiro por meio da Reforma Francisco Campos de 1931. Dentre as várias propostas de reformulação destacamos duas. A primeira foi à unificação em uma única disciplina denominada de Matemática das várias matemáticas que até então eram ensinadas separadamente de acordo com a série escolar (Aritmética, Álgebra, Geometria, Trigonometria), o que alterou a estrutura curricular do ensino de matemática nas escolas. A segunda foi à ênfase na valorização da intuição e da experimentação

2 como ponto de partida para o ensino de matemática na sala de aula, o que alterou (ou se propôs alterar) a metodologia de ensino da matemática. Já o segundo movimento de reformulação teve o seu auge aqui no Brasil na década de 60 e início da década de 70, quando as idéias do grupo de matemáticos franceses denominado de Bourbaki começaram a se expandir à todo o sistema de ensino brasileiro através de vários grupos de pesquisas que surgiram em diversas universidades brasileiras. Novamente foi alterado (ou se propôs alterar) a estrutura do ensino nas escolas e, principalmente, o currículo (conteúdo e metodologia) da matemática ensinada na sala de aula onde, em detrimento da intuição e da experimentação foi valorizada a formalização e axiomatização fundamentadas na teoria dos conjuntos e nas estruturas algébricas. Entre os anos 30 e os anos 60 há um Capanema A reformulação do sistema educacional ocorrida em 1942, denominada de Reforma Capanema, já foi largamente comentada entre os estudiosos da história da educação. Entretanto, um aspecto que talvez seja a pedra angular dessas reforma ainda não foi suficientemente comentado. Trata-se da inclusão do ensino profissionalizante-industrial (também o comercial e o agrícola) na estrutura do sistema educacional brasileiro. Identificado como um ensino voltado à formação de trabalhadores de baixa qualificação cuja aprendizagem requeria apenas o aprender a fazer em detrimento do aprender a pensar, a partir dessa reforma o ensino profissionalizante começou a ter alguma equivalência com o ensino secundário, sendo a equivalência inteiramente concluída com a LDB/61. O que a Reforma Capanema significou para o ensino de matemática? Segundo Valente (2003) essa reforma consolidou alguns aspectos anteriormente contemplados na Reforma Francisco Campos e que estavam sob o risco de serem suprimidos diante dos ataques dos defensores do ensino clássico, cuja expressão maior era o padre Arlindo Vieira. Assim, na Reforma Capanema consolidou-se a vitória de Euclides Roxo e dos defensores de um ensino escolar mais científico já anteriormente implementadas pela Reforma Francisco Campos, em cujo currículo o ensino da Matemática e o das ciências passou a ter um maior destaque. Entretanto, uma questão histórica faz-se pertinente nesse debate, qual seja, encontrar a motivação que levou o professor Euclides Roxo a defender um currículo científico em detrimento do currículo clássico. Por que levanto essa questão se, a princípio, ela parece

3 irrelevante? Teria sentido histórico tal indagação? Minha resposta é que sim. Senão, vejamos. Euclides Roxo recebeu influência das idéias do movimento internacional de modernização do ensino de matemática cuja referência principal é a figura do professor F. Klein, um dos principais líderes desse movimento. Ocorre que Klein teve no início de sua carreira a oportunidade de trabalhar no Tecnische Holschule de Munique entre os anos de 1875 e 1880. Isso, segundo Miorim (1996) muito o influenciou na formulação de suas propostas que inspiraram a reformulação do ensino de matemática na Alemanha e, depois, em diversos países. A proposta de Klein, segundo as palavras de Miorim, era que...tanto as escolas técnicas como as secundárias deveriam dar uma formação básica de matemática a seus alunos e, também, ser considerados igualmente como uma exigência para as universidades (1996, p. 70). Logo, a proposta de um ensino voltado para aplicações práticas e iniciado na experimentação produzia ressonância nos ouvidos dos professores de matemática de sua época. Ora, ocorre que na Alemanha o processo de industrialização estava, literalmente, em pleno vapor, o que exigia a formulação de um currículo de matemática que atendesse à formação de trabalhadores qualificados e preparados às industrias. No Brasil, ao contrário dos países europeus, a economia era hegemonicamente agrária com um incipiente processo de industrialização em alguns estados. Portanto, os ecos do movimento de modernização iniciados no início do século só foram ser ouvidos aqui no Brasil nas décadas de 30 e 40. Melhor dizendo, os ecos do movimento modernizador fizeram-se ser ouvidos pois, como afirma Valente (2003), Euclides Roxo só consegui implementar suas idéias com muito esforço, perseverança e valendo-se sabiamente do contexto autoritário da época. Voltando à Reforma Capanema e, especificamente, ao aspecto em que ela estabelecia o processo de equivalência entre os ensino profissionalizante e o ensino secundário, uma outra especulação histórica pode ser levantada. Será que a defesa por um ensino escolar mais científico exerceu alguma influência à proposição da equivalência presente na Reforma Capanema? É possível que a resposta seja positiva e há indícios para que se pense assim. Por exemplo, no que se refere a unificação das várias matemáticas implementadas na Reforma Francisco Campos de 1931 tal iniciativa só chegou ao ensino profissionalizante na Reforma Capanema de 1942. Outro indício refere-se à própria industrialização que começa a ganhar força a partir da década de 40, sendo

4 portanto necessário a implementação de um ensino mais científico que tivesse início no nível primário e médio e com continuidade até o nível superior. Assim, o lento processo de industrialização brasileira nas primeiras décadas retardou a implementação das propostas de reformulação do ensino de matemática e, uma vez implementadas pela Reforma Francisco Campos em 1931, não foram suficientes para atender ao objetivo proposto visto que a desvinculação entre ensino secundário e ensino profissionalizante levou a poucos resultados práticos quanto à implementação de um ensino mais científico. Assim, em 1942, pelo Decreto-Lei nº 4073 foi instituída a Lei Orgânica do Ensino Industrial que determinou o princípio da equivalência entre ensino profissionalizanteindustrial e o ensino secundário. A partir dessa lei foram criadas, pelo governo federal, as Escolas Técnicas que substituíram as Escolas de Aprendizes e Artífices que haviam sido criadas em 1909 no governo de Nilo Peçanha. Cada escola levava o nome de sua cidade, geralmente localizada nas capitais dos estados. A localizada na cidade de Vitória foi, então, denominada de Escola Técnica de Vitória. O Jornal O ETV O ETV era o nome do jornal editado pelos alunos do curso de tipografia e encadernação da Escola Técnica de Vitória, dai o nome do informativo. Tratava-se de um informativo oficial da escola pois nele eram divulgados portarias e editais administrativos, bem como informes gerais do cotidiano da escola. Sua elaboração ficava a cargo de alguns professores e coordenadores pedagógicos e sob a supervisão do diretor da escola. Apesar desse aparato burocrático os alunos participavam ativamente das matérias que eram veiculadas no jornal e sentiam-se muito honrados por isso. Assim, matérias esportivas eram as mais comuns, principalmente as relacionadas ao futebol que era amplamente incentivado nas práticas desportivas entre os alunos. Também eram comuns matérias sobre as atividades culturais e recreativas, muito incentivadas pelos professores. Até concurso de oratória, de poesias, de crônicas, de desenhos estavam presentes nas matérias do jornal. Entretanto, o que chama a atenção era a presença de notas de aulas das diversas disciplinas entre as matérias produzidas pelo jornal. Em relação a disciplina de matemática encontramos o conteúdo programático da 1ª série, da 2ª serie e da 4ª série do curso Básico Industrial ou, Ginásio Industrial. Encontramos também diversas notas de aula em forma de problemas propostos aos alunos. Algumas curiosidades a respeito de personagens da história da matemática

5 também eram muito comuns, bem como muitas charadas e questões de raciocínio lógico-matemático. Mas, o mais curioso foi uma matéria sobre o matemático Souzinha que aparecia em forma de um programa radiofônico, onde o locutor narrava a história da vida desse matemático e que eram intercaladas por frases propagandistas anunciando algum patrocínio comercial local que era conseguido pelo jornal. Síntese conclusiva O jornal O ETV, através de suas matérias educacionais relacionadas à disciplina de matemática, retrata com fidelidade o significado e importância da Reforma Capanema para o ensino profissionalizante-industrial. Quanto ao ensino de matemática é possível constatar em suas páginas que a concretização às propostas de um ensino mais científico passou a ser possível a partir da Reforma Capanema. É uma pena que no auge do ensino industrial na década de 60 tenha surgido o Movimento da matemática Moderna, o que impediu que essa rica experiência de educação matemática no ensino profissionalizante influenciasse o ensino secundário. Pena também que tenha surgido a profissionalização obrigatória na lei 5.692/71, impedindo que o ensino secundário (transformado em 2º grau profissionalizante) fosse mais voltado ao desenvolvimento de um currículo científico de verdade. A experiência bem sucedida do ensino de matemática nas escolas técnicas transformaram-se em desastre educacional nas escolas de 2º grau. Assim, sendo a expressão viva do currículo de matemática da Escola Técnica de Vitória da década de 40 até a década de 50, esse jornal representa um documento histórico que faz ecoar as idéias modernizadoras daqueles que foram os defensores de um ensino de matemática mais criativo, dinâmico e prático. Palavra Chave: Ensino secundário Ensino industrial Reforma Capanema Referências Bibliográficas - MIORIM, Maria Ângela. Introdução à história da educação matemática. São Paulo: Atual, 1998. - VALENTE, Wagner Rodrigues (Org.). Euclides Roxo e a modernização do ensino de matemática no Brasil. São Paulo: Biblioteca do educ. matemático. 2003.