FORMAÇÃO PROFISSIONAL E A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO ENSINO SUPERIOR E NA PÓS- GRADUAÇÃO

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FORMAÇÃO PROFISSIONAL E A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO ENSINO SUPERIOR E NA PÓS- GRADUAÇÃO Sônia Maria Marchiorato Carneiro - Profa. Sênior junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPR. Doutora em Meio Ambiente e Desenvolvimento (UFPR, 1999). <sonmarc@brturbo.com> Dada a emergência, em nossos dias, da necessidade de conscientização e capacitação prática dos cidadãos para a sustentabilidade socioambiental, torna-se urgente também o desenvolvimento da dimensão ambiental no processo educativo seja formal ou não, mas que depende prioritariamente da formação inicial (graduação) e continuada (pós-graduação e outros cursos) dos profissionais da Educação. Conferências, seminários, congressos etc., internacionais e nacionais, desde Estocolmo (1972), passando por Belgrado (1975), Tbilisi (1977), Moscou (1987), Rio (1992), Brasília (1997) e Tessalônica (1997), focalizaram a necessidade da formação de docentes e agentes ambientais para desenvolver a Educação Ambiental (CARNEIRO, 1999). Daí a importância de conteúdos ambientais e de EA nos programas dos cursos de formação. A Lei 9795/99, que instituiu a Política Nacional de EA, em seus Art. 8, coloca a necessidade da incorporação da dimensão ambiental na formação, especialização e atualização dos educadores de todos os níveis e modalidades de ensino e (...) dos profissionais de todas as áreas. Ainda quanto aos docentes, o Art. 11 dessa Lei reforça a necessidade da qualificação contínua de pessoal em atividade, com o propósito de atender adequadamente ao cumprimento dos princípios e objetivos da Política Nacional de EA. No entando, pesquisas recentes, conduzidas junto a alguns Programas de Pós-Graduação da UFPR Mestrados em Educação (GONÇALVES, 2003; RODRIGUES, 2003) e Geografia (VESTENA, 2003); e Especialização em Educação, Meio Ambiente e Desenvolvimento, do Doutorado em Meio Ambiente e desenvolvimento (TEREBINTO, 2003) mostraram que, no nível de ensino fundamental, vêm ocorrendo trabalhos iniciais de informação, identificação e descrição relativamente a elementos do meio, porém, com deficiência de orientação dos educandos para um raciocínio crítico-reflexivo sobre as dinâmicas e problemas socioambientais. Esse enfoque superficial das questões ambientais dificulta aos educandos o processo de apreender e construir valores, para o desenvolvimento de atitudes responsáveis em vista da prevensão e solução de problemas ambientais. Com efeito, a formação de uma conduta ética dos cidadãos em prol do meio, já desde a escola fundamental, supõe conhecimentos referenciados e atitudes engajadas por parte dos educadores quanto às questões socioambientais. Assim, nesse contexto de estudos diagnósticos, os resultados apontam que os educadores já começaram a tratar algumas idéias e termos relativamente a meio ambiente, EA e sustentabilidade ambiental, mas ainda não alcançam desenvolver uma prática educativa em perspectiva de referenciação socioambiental criteriosa. Diante dessa situação, que pode ocorrer em outros contextos socio-educacionais, torna-se evidente a urgência de empenho, pelas instituições formadoras, para o avanço qualitativo de seus Temática originalmente abordada, pela autora, por ocasião do VII EPEA-Encontro Paranaense de Educação Ambiental (São José dos Pinhais, 2004).

2 programas no sentido da superação de temáticas pontuais e incorporação da complexidade ambiental, em perspectiva de participação ativa nas transformações do conhecimento e do ensino dos paradigmas emergentes do saber ambiental (LEFF, 2001, p. 127). E os educadores compromissados com a EA sentem-se sentimo-nos diante de um desafio. O primeiro momento de reação construtiva será uma análise diagnóstica do distanciamento entre os currículos acadêmicos e os pressupostos e fundamentos da EA. Com base em um trabalho de Edgar Conzález Gaudiano, publicado em 1997 sobre a situação mexicana, mas de plena validade para a nossa realidade, faz-se conveniente considerar alguns impasses: - enquanto a EA postula enfoque interdisciplinar e centrado em problemas práticos e reais, o currículo acadêmico baseia-se em disciplinas e enfatiza problemas teóricos e abstratos; - a EA orienta-se a problematizações emergentes, enfocando conteúdos que surgem de problemas do ambiente de vida; mas o currículo acadêmico é pré-definido e orientado a atingir fins préestabelecidos; - um dos princípios pedagógicos da EA está na consideração do alto grau de incerteza na solução de problemas, sendo que a maioria dos programas educativos sustenta-se numa pedagogia a- problemática de disseminação de informações e sem critérios de desempenho eficiente em vista de objetivos determinados; - uma das funções do conhecimento em EA é seu uso imediato voltado ao valor social de uma qualidade de vida sustentável e emancipada; o conhecimento acadêmico, porém, vale como armazenamento para uso futuro e como elevação do status individual e econômico; - a EA propõ-se realizar uma aprendizagem de orientação holística e cooperativa; e a aprendizagem acadêmica é atomística e individualista; - a EA considera os alunos/estudantes como pensadores ativos e geradores de conhecimentos, ao passo que, para o currículo acadêmico, são normalmente espectadores passivos e recipientes do pensamento e conhecimentos alheios; - para a EA a aquisição de informação e ação integram-se processualmente na aprendizagem, mas na maioria das práticas escolares a aquisição da informação dissocia-se de suas aplicações; - na EA o domínio de conhecimentos e habilidades relevantes se demonstra pela ação dos estudantes/alunos em situações reais; nos currículos acadêmicos, eles escrevem sobre teo-rias em situações artificiais. A superação desses impasses demanda uma reformulação curricular dos cursos de formação inicial no ensino superior, bem como continuada em nível de Mestrado e Doutorado e, igualmente, a- tualização de conteúdos e metodologia dos demais cursos de avanço profissional (especialização, aperfeiçoamento etc.), sob a perspectiva de se trabalhar princípios e conceitos pedagógicoambientais, como fundamentação de habilidades diferenciais para a atuação dos educadores no âmbito socioambiental. Essa perspectiva da formação inicial e continuada dos educadores deverá, portanto, incorporar a dimensão ambiental, em seus fundamentos epistemológicos e metodológicos. Antes de tudo, cabe trazer um entendimento de EA, no sentido de que ela é uma orientação da prática educativa, mediante a qual as pessoas individual ou coletivamente buscam apreender as dinâmicas complexas de seus ambientes de vida, para desenvolver valores am-bientais e atitudes críticas, em vista de ações responsáveis para a sustentabilidade socioam-biental. Enquanto orienta-

3 ção da prática educativa, a EA envolve, pois, uma nova concepção pedagógica de conteúdos e métodos, em termos da construção de conhecimentos emergentes e significativos e de compromisso ético para com a qualidade de vida. E porque a EA não destrói nem substitui os currículos estabelecidos ou programas de cursos, mas a eles se deve incorporar como uma dimensão tanto inovadora quanto de urgente necessidade hoje em dia, torna-se importante enfocar os fundamentos epistemológicos e metodológicos para uma nova compreensão de homem e de mundo e as conseqüentes ações socioambientais. Quanto aos fundamentos epistemológicos, ou seja, relacionados ao conhecimento teóricoconceitual da área de EA, pode-se considerar algumas proposições orientadoras de conteúdos para programas de formação proposições integradas e complementares, adaptativas ao nível de cada programa concreto, sendo que não há uma ordem seqüencial ou de hierarquia entre elas: - linhas de pensamento de compreensão do mundo, a partir das relações sociedade-natureza sob uma perspectiva histórico-cultural e, nesse contexto, analisar as categorias teóricas das diferentes correntes sobre o ambiente em conexão com o processo educativo e, ainda, as implicações das diferentes concepções de natureza na ação humana sobre o meio (GONZÁLEZ GAUDIANO, 1998); - a EA em suas origens, vertentes e avanços nos contextos social, econômico e político movimentos, eventos, programas e dispositivos legais (CARNEIRO, 1999); - a EA em seus princípios éticos sob o foco das responsabilidades do homem para com a vida (conservá-la, mantê-la e enriquecê-la), frente à História (benefício das gerações presentes e futuras o que o homem foi, é e pode vir a ser) e para consigo mesmo (necessidades e interesses sócioindividuais nos processos de produção e consumo), em vista da sustentabilidade socioambiental (ORDÓÑEZ, 1992); - o enfoque da problemática socioambiental sob os princípios do paradigma da complexidade: o real enquanto múltiplo; as dinâmicas interativas, as interdependências, a variabilidade e incerteza multi-causais; os sistemas como unidades auto-reguláveis geradoras de organização/ordem, com maior ou menor estabilidade e duração; e redes como interações de sistemas nos planos biofísico e sociocultural (LEFF, 2001; CAPRA, 2002; MORIN, 2003); - o paradigma da sustentabilidade socioambiental, enquanto racionalidade orientada por novos valores e saberes, em vista de uma gestão político-econômica criteriosa das potencialidades e limites dos recursos naturais, desde os âmbitos locais das comunidades à globalidade do Planeta, sob os aspectos ecológico, social e cultural (LEFF, 1998); - e o enfoque interdisciplinar, como articulação integradora de diferentes disciplinas, para a construção coletiva do conhecimento frente às tensões entre as práticas humanas e as dinâmicas do meio natural (FLORIANI; KNECHTEL, 2003). Agora, em termos dos fundamentos metodológicos, em relação ao conhecimento pedagógico na área de EA, pode-se igualmente considerar um conjunto de proposições orientadoras do processo educativo em programas de formação também em sentido adaptativo ao nível de cada programa e sem uma hierarquia de precedência ou ordem seqüencial dessas proposições: - construção de nova linguagem pedagógico-didática para raciocinar a realidade socioambiental sob um foco interrelacional e global: articulação entre os múltiplos fatores da realidade ambiente (econômicos, sociais, políticos, culturais e técnicos), que se condicionam mu-tuamente e configuram

4 a situação de uma determinada problemática, com possível repercussão para além do âmbito local, podendo atingir os níveis regional e mundial (GONZÁLEZ GAUDIANO, 1998); - explicitação de uma lógica articuladora dos processos de transposição didática das questões socioambientais pelas dinâmicas de multidisciplinaridade: tratamento dos conteúdos ambientais em cada disciplina, segundo suas peculiaridades; interdisciplinaridade: relação de convergência dialógica das disciplinas via projetos integradores; e transdisciplinar: unidade teórico-prático de efetivação da dimensão ambiental nas práticas escolares, subsumindo saberes populares (CARNEIRO, 1999); - desenvolvimento de um enfoque crítico-social nas perspectivas diacrônica (dinâmica da História) e sincrônica (interrelações presentes) dos problemas reais ou potenciais, na concretude dos espaços de vida sob critérios de sustentabilidade socioambiental (ORDÓÑEZ, 1992); - orientação problematizadora dos processos diagnósticos e analítico-avaliativos, me-diante práticas multi e interdisciplinares envolvendo o entorno comunitário das escolas e a realidade de vida dos alunos quanto à prevenção e solução de problemas (CARVALHO, 2004); - e orientação de uma prática avaliativa, quanto à formação ambiental dos educandos, como processo diagnóstico e contínuo nos âmbitos: cognitivo desde conhecimentos prévios, préconceitos e representações até informações diferenciadas e conceitos específicos; axiológicoatitudinal preferências, posições e princípios; e de atuação prática decisão-ação (PAR-DO DÍAZ, 2002; CARNEIRO, 2004). A incorporação desses fundamentos, pelos cursos de formação dos educadores, demanda a superação de alguns obstáculos mais presentes, entre outros (CARNEIRO, 1995; LEFF, 1998; FLORIANI; KNECHTEL, 2003): - epistemológicos e institucionais: a ainda predominante visão analítico-fragmentária da realidade socioambiental, subjacente aos descasos administrativos e descompromissos ético-políticos frente à necessidade e possibilidades de solução e prevenção de problemas; esse diagnóstico demanda o entendimento da relativa competência e contribuição específica de cada área de conhecimento na discussão da problemática ambiental, em vista quebra da rigidez disciplinar da ciência institucionalizada; - psicossociológicos e culturais: a inércia das práticas escolares individualistas e disciplinaristas, bem como a falta ou ineficiência do diálogo entre instituições educacionais, entre estas e as comunidades, com órgãos administrativos e entre os próprios órgãos; igualmente, essa situação exige um esforço conjunto, participativo e inter-institucional para o planejamento de programas locais e regionais, como respostas apropriadas às questões de meio ambiente; - metodológicos: deficiência de concepção e vivência da reflexão e prática interdisciplinares, por acomodação ao esquema dos currículos disciplinaristas e como decorrência do individualismo no nosso modo corrente de pensar e agir; a superação de tal impasse supõe atitudes inovadoras frente às barreiras burocrático-legais do nosso próprio comportamento acadêmico e escolar, numa abertura a novas iniciativas e experiências de atualização de cursos e seus de programas curriculares. Os âmbitos ou níveis de obstáculos enfocados, outrossim, necessitam um defrontamento conjunto e, a mais, comportam contretudes e situações materiais de suporte (como projetos adequados quanto a tempo e espaço, recursos técnicos e financeiros). Enfim, os obstáculos à incorporação dos fundamentos epistemológicos e metodológicos, pelos cursos de formação dos educadores, encon-

5 tram sua dinâmica de continuísmo precisamente na tradição de anteriodade estabelecida alimentando a tendência de se adiar a hora de repensar e avaliar os objetivos e programas de formação dos profissionais da Educação. Assim, a efetividade de decisões e práticas que promovam a formação ambiental desses profissionais, passará (necessaria e certamente!) por uma vontade política de motivação sociocultural e referenciamento intelectual, engajada na construção de condutas socioambientalmente positivas, com base em quadros de sustentação e referência coletivas de uma sociedade civil organizada em vista de práticas propositivas (soluções/prenvenções de problemas) e reativas (não deixar passar...), bem como de ações pertinentes no cotidiano comunitário (CARNEIRO, 2004), na perspectiva da sustentabilidade, enquanto compromisso com a qualidade de vida no Planeta. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei nº. 9.795 de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre a educação ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, n. 79, 28 abr. 1999. ----. Decreto nº. 4.281 de 25 de junho de 2002. Regulamenta a Lei 9.795 de 27 de abril de 1999 (...). Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, n. 121, 26 jun. 2002. CAPRA, F. As conexões ocultas. Trad. de M. B. Cipolla. São Paulo: Cultrix, 2002. CARNEIRO, S. M. M. A dimensão ambiental da educação escolar de 1ª.- 4ª. séries do ensino fundamental na rede escolar pública da cidade de Paranaguá. Curitiba, 1999. 320 f. Tese (Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento) - Curso de Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento, Universidade Federal do Paraná. ------. A dimensão ambiental dos currículos escolares. Teoria e Prática da Educação. Maringá: Universidade Estadual de Maringá. Departamento de Teoria e Prática da Educação, v. 7, n. 1, p. 73-90, jan.-abr. 2004. CARVALHO, I. C. de M. Educação Ambiental: a formação do sujeito ecológico. São Paulo: Cortez, 2004. FLORIANI, D.; KNECHTEL, M. R. Educação Ambiental: epistemologia e metodologias. Curitiba: Gráfica Vicentina Editora, 2003. GONÇALVES, J. T. S. Formação continuada de educadores ambientais para efetivação das políticas de Educação Ambiental no 1.o e no 2.o ciclo do ensino fundamental municipal de Curitiba. Curitiba, 2003. 110 f. Dissertação (Mestrado em Educação) Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Paraná. GONZÁLEZ GAUDIANO, E. Educación Ambiental: história y conceptos a veinte años de Tblisi. México DF: Siste-mas Técnicos de Edición, 1997. ------. Centro y periferia de la educación ambiental. Um enfoque antiesencialista. México DF: Mundi Prensa, 1998. LEFF, E. Saber ambiental: sustentabilidad, racionalidad, complejidad, poder. México DF: Siglo Veintiuno Editores, 1998. ------. Epistemologia Ambiental. Trad. de S. Valenzuela. São Paulo: Cortez Editora, 2001. MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 8 ed. Trad. de C. E. F. da Silva; J. Sawaya. São Paulo: Cortez, 2003. ORDÓÑEZ, J. Hacia una filosofia de la educación ambiental. Práxis: Ética e Meio Ambiente. Costa Rica: Universidade Nacional, Departamento de Filosofia, n. 43-44, out. 1992. p. 45-58. PARDO DÍAZ, A. Educação Ambiental como projeto. 2 ed. Trad de F. Murad. Porto Alegre: Artmed Editora, 2002. RODRIGUES, M. H. O desenvolvimento da dimensão ambiental pelos professores de Geografia de 5ª. a 8ª. séries do ensino fundamental em escolas municipais de Araucária. Curitiba, 2003.

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