INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO Em mulheres com sintomas de cistite não complicada, As ITUs são classificadas da seguinte forma: a bacteriúria significante é definida como > 10 2 UFC/mL da urina do jato médio mais piúria (> 5 leucócitos/mm3). Em mulheres com pielonefrite não complicada e homens com ITUs, uma bacteriúria significante é definida como > 10 4 UFC/mL mais piúria, e em pacientes com ITUs complicadas a definição é >10 5 UFC/mL, com ou sem piúria. TIPOS: cistite, pielonefrite e bacteriúria assintomática. SINTOMAS: sintomática e assintomática. RECORRÊNCIA: esporádicas (< 1 ITU/6 meses e < 2 ITUs/ano); recorrente (> 2 ITUs/6 meses ou > 3 ITUs/ano) estas ainda podem ser por recaídas (mesma cepas) ou reinfecção (novas cepas). FATORES COMPLICANTES: complicada e não complicada. LOCAL DA INFECÇÃO: alta e baixa. EPIDEMIOLOGIA: nosocomial ou de comunitária. PATOGÊNESE: ascendente, hematogênica ou contígua. A infecção urinária é caracterizada pelo crescimento bacteriano de pelo menos 10 5 unidades formadoras de colônias por ml de urina (100.000 ufc/ml) colhida em jato médio e de maneira asséptica. Em determinadas circunstâncias (paciente idoso, infecção crônica e uso de antimicrobianos) pode ser valorizado crescimento bacteriano igual ou acima de 10 4 colônias (10.000 ufc/ml). Na maioria dos pacientes, as ITUs são o resultado da colonização da urina por bactérias fecais, que cresceram em meio aeróbio. O crescimento das bactérias anaeróbias na urina, como o Bacreoides fragilis, indica uma comunicação (fístula) entre o intestino e o trato urinário. O crescimento de um fungo na urina pode ser observado em pacientes com cateteres vesicais e nos pacientes imunocomprometidos com disseminação hematológica da Candida spp., proveniente de infecções em outros locais. Como muitos uropatógenos, tal transporte é facilitado pela aderência da bactéria às células epiteliais (como a Escherichia coli que têm fímbrias). Tal adesão também é importante para estimular as células da mucosa a liberarem citocinas, como a IL-6 e a IL-8, causando febre e aumentando a proteína C-reativa no sangue e mobilizando os leucócitos. Quando a bactéria atinge a bexiga, o estabelecimento de bacteriúria é facilitado pelo esvaziamento incompleto da bexiga, ou seja, quando há urina residual. Já volumes urinários residuais de 10 ml, comuns em indivíduos saudáveis, pode ser estabelecido um crescimento bacteriano na urina, já que o tempo de reprodução é 20 minutos para E. coli e a diurese normal é 60 ml/min. Pacientes com bacteriúria assintomática geralmente abrigam microorganismos menos virulentos do que aqueles que causam infecções sintomáticas. Tais organismos são mortos pelo plasma ou soro humano ( efeito bactericida sérico ) Em mulheres e em pacientes com diabetes tipo 2 existem estudos mostrando que a bacteriúria assintomática é um forte previsor de infecções subseqüentemente sintomáticas. Na gravidez, é como a pielonefrite, pois estas mulheres freqüentemente apresentam um refluxo vesicouretral durante os dois últimos semestres. A E. coli é a espécie bacteriana mais predominante. Os achados de Proteus spp. podem indicar a presença de cálculos renais ou tumores, pois estes organismos crescem em um ambiente alcalino. Cistite: o início da cistite é rápido, e os sintomas desenvolvem-se em menos de 24 horas. Normalmente, não há febre ou febre baixa na cistite. Nas mulheres sexualmente ativas, a 1
cistite comumente ocorre 24 a 48 horas após uma relação sexual, especialmente se não se segue a prática sexual do esvaziamento vesical pós-coito. Pacientes com cistite geralmente têm sintomas por 3 a 5 dias, tais como micção freqüente, queimação durante e após a micção, dor supra-púbica, hematúria e ou urina turva. O tratamento com antibiótico não reduz acentuadamente durante a sua duração, e a bacteriúria pode persistir após o tratamento. Pielonefrite: a pielonefrite também apresenta um início rápido com ou sem sintomas de cistite. Aproximadamente um terço dos pacientes desenvolve bacteremia. Fatores anatômicos podem contribuir para a ocorrência de pielonefrite que se caracteriza por febre, dor nos flancos, calafrios e sintomas de cistite (que podem estar ausentes). A típica dor lombar, resultante da inflamação e edema do parênquima renal, pode ser mascarada pela ingestão de analgésicos como o acetaminofeno, que também pode reduzir a febre. Um diagnóstico diferencial importante é o cálculo renal, que pode apresentar uma localização similar para a dor, normalmente sem febre. Também, a apendicite e a colecistite podem se manifestarem como dores lombares similares as de um paciente com pielonefrite do lado direito. Sepse: a sepse é uma condição ameaçadora à vida, causada por uma bactéria gramnegativa, a partir da urina, em uma paciente com bacteriúria. O motivo mais comum para sepse é a inserção ou, especialmente, a retirada de um cateter urinário. Portanto, pacientes com sepse nem sempre tem envolvimento renal pela sua infecção. Em raros casos, a bacteriúria e a fungúria podem resultar de uma disseminação hematogênica das bactérias para os rins, causando um abscesso renal. O foco da infecção é, neste caso, uma infecção em um local fora do trato urinário, como uma endocardite. A presença de mais de uma espécie em uma única amostragem é um forte indicativo de procedimentos defeituosos de amostragem e de contaminação. A piúria persistente em estudos bacteriológicos de rotina negativos pode sugerir tuberculose renal, sendo prudente obter uma amostra para microscopia direta e cultura para o Mycobacterium tuberculosis. A bacteriúria em pacientes com cateter não deve ser tratada, a menos que haja sintomas de infecções sistêmicas, ou seja, febre. A fungúria é tratada com fuconazol 400 mg um comprimido no primeiro dia e 200 mg um comprimido nos próximos 7 a 14 dias. CASO CLÍNICO 1 IDENTIFICAÇÃO: feminina, 22 anos, solteira, branca, natural de S. Maria e procedente de P. Alegre, estudante universitária. QUEIXA PRINCIPAL: Ardência miccional. HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL A paciente veio ao ProntoSus há 3 dias com queixa de ardência para urinar que iniciou há 2 dias. Foram coletados exames de sangue e de urina, solicitado ecografia e receitado solução de hioscina e dipirona 30 gotas VO 4 x / dia, se necessário. Melhorou, mas voltou ao ambulatório acompanhada, hoje, referindo febre, sensação de peso na região supra-púbica e vontade de urinar seguidamente desde ontem. Tem também dor dolente lombar direita, sem irradiação, que não modifica com posição adotada pelo corpo. A urina é turva e malcheirosa há dias. Nega secreção vaginal. Já apresentou episódios semelhantes no passado, tendo sido mais seguidos ultimamente. Nega calafrios. Refere cansaço e fadiga. A 1 Caso clínico dado em aula 2
acompanhante solicita ao médico informações sobre a natureza da doença, seu prognóstico e riscos. REVISÃO DOS SISTEMAS Geral: mal- estar indefinido. Gastrointestinal: inapetência desde ontem. Refere constipação intestinal crônica. Geniturinário: menarca aos 12 anos, menstruações regulares 30/3. Usou anticoncepcional oral até há 2 anos e suspendeu. Desde então usa gel espermicida e diafragma. Normalmente urina 4 a 5 x/ dia e não acorda à noite para urinar. Não tem o hábito de urinar após relações sexuais. Músculo-esquelético: caminhava durante 1 hora diariamente até anteontem. HISTÓRIA MÉDICA PREGRESSA Fez todas as vacinas. Nega doenças comuns da infância. Nega cirurgias. Nega infecções urinárias na infância. Nega ingestão habitual de bebidas alcoólicas: uma cerveja eventual no fim de semana. Nunca fumou. HISTÓRIA FAMILIAR Pai vivo com 53 anos, com saúde Mãe viva com 47 anos, com saúde Tem 1 irmão com 20 anos, com saúde, que apresentou enurese noturna até 8 anos de idade. Nega HAS, DM, Ca, doenças renais, incluindo urolitíase na família. HISTÓRIA PSICO-SOCIAL Mora com os pais em casa própria. Estuda sociologia. Iniciou vida sexual aos 16 anos. Tem namorado. EXAME FÍSICO: Bom estado geral e de nutrição. Lúcida, coerente e orientada. Corada e hidratada. PA deitada 110/60 mmhg FV 100 bpm Tax 37.2oC FR 24 mrpm Altura: 170 cm Peso: 60 kg IMC 20.7 Pele, mucosas, anexos e gânglios: sp Cabeça e pescoço: sp Ap. CV: íctus invisível e impalpável. FV 100, BNF RR 2T s/sopros Pulsos periféricos amplos e simétricos Ap. Resp. MsVs normalmente distribuídos Abdômen- inspeção: ndn. Palpação: discreta dor e desconforto à palpação do hipocôndrio e flanco D, bem como do hipogástrio; sem massas palpáveis, sem sinais de irritação peritoneal. Fígado no rebordo costal direito. Baço impalpável. Ruídos hidroaéreos presentes, normais. Giordano à D +. Sem edema de MsIs. EXAMES COMPLEMENTARES: hemograma: Htc 39%, Hgb 13.5g, Leucócitos 9000 c/ 30% de bastões. Creatinina sérica 0,9 mg/ dl. EQU: prot. 1+, Nitritos +, Estearases leucocitárias +, sedimento urinário: 40 leucócitos/c, 4 hemácias/c, bacteriúria abundante. Urocultura quantitativa com antibiograma: E. coli > 10 5 UFC/ ml de urina. Ecografia: Rim D mede 12,0 cm e Rim E também. Não há dilatação de cavidades coletoras. Os rins não apresentam alterações parenquimatosas significativas. Bexiga sp. CONTEÚDO PROPOSTO: 1. Neste caso apresentado, temos infecção urinária e comprometimento renal? O sinal de Giordano positivo, a dor em flanco e hipocôndrio direito e a febre são sinais que sugerem uma ITU alta, ou seja, com comprometimento renal. 2. Temos aí uma infecção urinária complicada? O que diferencia infecção urinária complicada de não complicada? Neste caso, a ITU pode ser classificada como não complicado, pois, segundo resultado da ecografia, não há alterações estruturais e, de acordo com o valor da creatinina, 3
não há perda de função renal. Uma infecção é dita complicada quando há alteração na estrutura ou função do sistema excretor mais comuns em casos de pielonefrite. 3. A paciente pertence a grupo de risco para infecção urinária? A maior suscetibilidade à infecção no sexo feminino é devida às condições anatômicas: uretra mais curta e sua maior proximidade com vagina e com ânus. Outros fatores que aumentam o risco de ITU nas mulheres incluem: episódios prévios de cistite (a paciente neste caso tem episódios prévios), o ato sexual, o uso de certas geléias espermicidas, a gestação e o número de gestações e a higiene deficiente, mais freqüente em pacientes com piores condições socioeconômicas e obesas. 4. Cistites são causadas apenas por bactérias? & 5. Quais os patógenos mais freqüentes causadores de infecção urinária? Os agentes etiológicos, mais freqüentemente envolvidos com ITU adquirida na comunidade, são, em ordem de freqüência: a Escherichia coli, o Staphylococcus saprophyticus, espécies de Proteus e de Klebsiella e o Enterococcus faecalis. A E. coli, sozinha, responsabiliza-se por 70% a 85% das infecções do trato urinário adquiridas na comunidade, e por 50% a 60% em pacientes idosos admitidos em instituições. Contudo, quando a ITU é adquirida no hospital, em paciente internado, os agentes etiológicos estão diversificados, predominando as enterobactérias, com redução na freqüência de E. coli (embora ainda permaneça habitualmente como a primeira causa), e um crescimento de Proteus sp, Pseudomonas aeruginosa, Klebsiella sp, Enterobacter sp, Enterococcus faecalis e de fungos, com destaque para Cândida sp. 6. Quais os diagnósticos diferenciais possíveis para Pielonefrite Aguda? Um diagnóstico diferencial importante é o cálculo renal, que pode apresentar uma localização similar para a dor, normalmente sem febre. Também, a apendicite e a colecistite podem se manifestarem como dores lombares similares as de um paciente com pielonefrite do lado direito. 7. Qual a atitude do médico quanto à solicitação da acompanhante? O médico, se a paciente consentir, informar sobre que ITUs são freqüentes, principalmente em mulheres. Que, se tratada, possivelmente não origina seqüelas. 8. A contagem de germes na urocultura desta paciente poderia caracterizar bacteriúria significativa? A bacteriúria significante é definida como > 10 2 UFC/mL da urina do jato médio mais piúria (> 5 leucócitos/mm3). Em mulheres com pielonefrite não complicada e homens com ITUs, uma bacteriúria significante é definida como > 10 4 UFC/mL mais piúria, e em pacientes com ITUs complicadas a definição é >10 5 UFC/mL, com ou sem piúria. Ou seja, nesta paciente, Urocultura quantitativa com antibiograma: E. coli > 10 5 UFC/ ml de urina, a bacteriúria é significante. 9. Qual a importância de investigar enurese na infância da paciente e familiares? Avaliar alguma malformação do sistema geniturinário, bem como a possibilidade de correção, caso elas existam, a fim de prevenir ITUs. 10. Há relação entre ITU e sexo ou atividade sexual? A mulher, em decorrência de sua anatomia, possui maior probabilidade de sofrer ITU. As ITUs sintomáticas são, de longe, mais comuns em mulheres sexualmente ativas, uma vez que o ato sexual pode aumentar a concentração de bactérias na região do períneo. 11. Deve-se tratar bacteriúria assintomática? Pacientes com bacteriúria assintomática geralmente abrigam microorganismos menos virulentos do que aqueles que causam infecções sintomáticas. Tais organismos são mortos pelo plasma ou soro humano ( efeito bactericida sérico ) Em mulheres e 4
em pacientes com diabetes tipo 2 existem estudos mostrando que a bacteriúria assintomática é um forte previsor de infecções subseqüentemente sintomáticas. 12. Se repetir estes quadros de infecção urinária a paciente poderá chegar à insuficiência renal terminal e diálise? Pacientes com cistite não complicada não precisam ser acompanhados. Pacientes com recorrências sintomáticas, pielonefrite ou ITU complicada devem ser acompanhados. As culturas de acompanhamento são importantes, pois a bacteriúria pode persistir e causar dano renal em pacientes afebris com pielonefrite. Neste caso, por se tratar de pielonefrite, a paciente, se não tratada coerentemente, poderá sofrer dano renal. 5