Dr. Helder Nakaya Vacinas

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Transcrição:

Entrevista Dr. Helder Nakaya Vacinas Entrevistador: Bruno Scramignon Apesar de seu emprego em larga escala há muitos anos, ainda existem muitas questões em relação a diversos aspectos relacionados à produção, segurança e eficácia das vacinas. Para tirar algumas dúvidas, o aluno do curso de Microbiologia da UFRJ, Bruno Scramignon, entrevistou o pesquisador Helder Nakaya. Helder é Biólogo de formação e doutor em Bioquímica pelo Departamento de Bioquímica do IQ USP. Atualmente é docente do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP e professor adjunto da Emory University. É membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências. CIÊNCIA EM TELA: Em relação às instituições públicas de fomento à pesquisa, qual a importância das políticas públicas e de apoio financeiro ao estudo e desenvolvimento das vacinas? HELDER: O apoio das agências de financiamento públicas é essencial para a primeira fase do desenvolvimento, quando identificamos quais são os antígenos que são importantes para colocar na vacina e como vamos testar se essa vacina é protetora ou não. Isso é geralmente feito inicialmente em modelos animais. Aí vem a segunda fase que envolve a tentativa de aplicar isso para humanos. Ambas as fases necessitam de muito financiamento. Mas o financiamento é escasso para o tamanho do benefício que uma vacina pode dar. Então eu acho que, na verdade, deveria haver mais chamadas especiais para, justamente, financiar o desenvolvimento de novas vacinas. Porque não há nada tão barato e tão efetivo quanto as vacinas. Este seria um investimento estratégico muito bom para as agências financiadoras. Até porque existem organismos para os quais é muito complexo desenvolver uma vacina. Por exemplo, há casos em que o vírus muda bastante, como o vírus do HIV. Em outros casos, não se sabe que tipo de resposta imune você quer induzir para destruir o patógeno ou se as proteínas daquele patógeno são suficientes para induzir uma boa resposta imune. Em outras palavras, por mais que você tente fazer uma vacina para determinados patógenos, você não consegue. E aí, essa é uma das limitações. Não é tão simples você criar vacinas para todos os patógenos. Aquela fórmula que as pessoas achavam que funcionava, que era você inativar ou atenuar um patógeno e injetar de volta, não funciona para todos os patógenos. Há vários motivos para não funcionar. 1

CIÊNCIA EM TELA: Em relação à sua eficácia, por que ocorre de um determinado grupo de pessoas ter uma melhor resposta do que outro a uma determinada? HELDER: Isso acontece mesmo quando se faz esse tipo de estudo com modelos animais que, teoricamente, são geneticamente muito similares, estão todos em um ambiente controlado e você vê uma variação. Agora você imagina fazer esse tipo de coisa com humanos, onde cada um vem de uma etnia diferente, tem um grau de estresse diferente, um histórico familiar diferente, genética diferente, estado nutricional diferente. Por exemplo, pessoas malnutridas vão ter o sistema imune diferente do de uma pessoa bem nutrida, microbiota, infecções passadas, vacinações passadas... Então o que acontece é que cada um desses fatores contribui para o sistema imunológico ser individual. Ou seja, existe uma variedade, uma heterogeneidade enorme entre as pessoas e todos esses diferentes fatores contribuindo para uma resposta imune diferente. É por isso que a gente vê uma resposta imune diferente, mesmo quando você imuniza com uma mesma vacina. CIÊNCIA EM TELA: E de que modo a sua pesquisa pode vir a contribuir para a eliminação ou minimização desse problema? HELDER: Nossa pesquisa poderia contribuir com isso por que a gente consegue, justamente, avaliar essa heterogeneidade. A gente consegue entender o que que faz uma pessoa ser diferente da outra por meio de análises estatísticas, onde você leva em consideração a idade, o gênero ou algum outro tipo de fator clínico. Ou seja, a análise tenta entender o que que está acontecendo, o que está mudando, independentemente de todos esses fatores. Também é possível avaliar o porquê de algumas pessoas responderem melhor à vacina. Estamos fazendo este estudo com a colaboração de pesquisadores do mundo todo. Basicamente, nós tentamos examinar o que acontece com a atividade de mais de 25 mil genes em paralelo no sangue de pessoas antes e depois da vacinação. E aí usamos a bioinformática para descobrir quais deles devem ser importantes para a resposta imunológica. CIÊNCIA EM TELA: Em relação a eficácia de uma vacina, quais seriam os fatores que influenciam nessa eficácia? Seria a maneira como ela é produzida? Seria a maneira como ela é estocada? HELDER: São vários fatores. Um deles é a escolha do antígeno. Então, por exemplo, que tipo de antígeno você coloca, se você vai colocar um adjuvante ou não, que dose você vai colocar, onde você vai administrar a vacina, por exemplo, se é na veia, se é por mucosa, se é oral... Depois temos que saber quantas doses serão dadas, qual o intervalo de tempo entre elas, testar mistura de doses, por exemplo, colocar uma dose de adjuvante e depois duas de antígeno... Enfim, existe uma área inteira que é só para testar a eficácia das vacinas e determinar quais são os fatores que melhor contribuem para a eficácia delas. Aí, mesmo que você escolha o patógeno, que você saiba qual é a proteína, você terá que saber, dessa proteína, se for no caso proteico, qual peptídeo, qual região da proteína escolher para colocar na vacina. Antes disso você tem que saber qual proteína vai colocar, por exemplo, se é do 2

capsídeo do vírus ou parte externa da bactéria. E que tipo de peptídeo colocar? Um que vai induzir uma resposta T ou uma resposta B? Se o peptídeo que você escolheu, vai ser imunogênico ou não, quer dizer se esse peptídeo é conservado e vai ser reconhecido pelo sistema imune. Ele vai ter uma imunogenicidade fraca ou vai ser bastante imunogênico? Pode gerar efeitos adversos? Além disso, é necessário verificar se essa resposta imune que ele vai gerar vai ser específica para aquele patógeno, aquela cepa, ou vai funcionar para várias outras cepas daquele patógeno. Então, o ideal para você fazer uma vacina efetiva é você selecionar um bom antígeno, que vai induzir uma boa resposta imune e vai ser capaz de proteger o organismo e gerar uma grande memória. Ou seja, a imunidade induzida pela vacina pode persistir pela vida inteira e ela poderia servir para cepas diferentes do mesmo patógeno. Essa seria a vacina mais eficaz de todas. Geralmente, vacinas que contém o vírus atenuado, ou seja, contendo um patógeno enfraquecido que chega a infectar e a replicar sem causar a doença, são mais fortes e mais imunogênicas do que as inativadas. Entretanto, geram mais efeitos colaterais. Então há sempre os prós e contras. Por isso que eu estou dizendo que é uma área enorme e que é preciso um grande investimento. CIÊNCIA EM TELA: Em relação a qualidade dessas vacinas, muitas pessoas pensam as que vêm do exterior têm melhor qualidade. Isto procede? HELDER: Bom, da mesma forma que medicamentos genéricos deveriam ter a mesma eficácia de um medicamento importado ou de marca, vacinas produzidas nacionalmente também deveriam ser iguais às internacionais. Entretanto, quem desenvolve os medicamentos e as vacinas são países estrangeiros. Infelizmente o Brasil não investe no desenvolvimento de novas vacinas. Uma exceção recente é a vacina da Dengue desenvolvida no Butantan. O que geralmente acontece é que o Brasil pega vacinas que já foram definidas como boas e as produz com uma qualidade boa. Então, a qualidade da vacina e da limpeza, pureza e eficácia é igual. Só que claro, existem vacinas que ainda tem a patente que a tecnologia ainda não é sabida pelos brasileiros. Nestes casos, só nos resta importar (e pagar caro por isso). CIÊNCIA EM TELA: Bom, falamos sobre eficácia e qualidade e isso, de certa forma, acaba estando associado à segurança que as pessoas sentem em tomar ou não uma vacina. Em relação ao crescimento movimento antivacina: como se justificaria esse crescimento que vem ocorrendo, por exemplo, na Europa, nos Estados Unidos e agora, recentemente, até mesmo aqui no Brasil? HELDER: Eu acho que o movimento antivacina está mais relacionado com a falta de conhecimento e com essa sensação de proteção que as pessoas têm. Justamente porque as vacinas funcionam tão bem, as pessoas não adoecem mais e se sentem protegidas. Vacina é um contrato social, ou seja, todos precisam ser vacinados, justamente para proteger as pessoas que não podem ser vacinadas devido a idade ou algum problema de saúde... Se você não se vacina mas todos a sua volta estão vacinados, é claro que você não ficará doente. Pois a doença não está sendo transmitida. Mas se uma grande fração das pessoas 3

pararem de tomar vacina, a doença irá se espalhar. E isso já acontece nos Estados Unidos, Europa e, claro, aqui. CIÊNCIA EM TELA: Fala-se muito sobre a vacina de DNA. Eu gostaria que você falasse um pouco a respeito. HELDER: Bom, a vacina de DNA ela não é muito imunogênica, mas é extremamente segura. Então é mais fácil você conseguir passar pela regulação, usando uma vacina de DNA, que é mais segura. Entretanto, ela geralmente não é tão efetiva quanto uma vacina atenuada ou mesmo inativada. CIÊNCIA EM TELA: Como surgiu o seu interesse em trabalhar com vacinas? HELDER: Eu sempre considerei as vacinas como sendo um dos maiores triunfos da medicina. Então eu já tinha total admiração pelo tema. E aí, o que aconteceu foi que, eu terminei meu doutorado e o pesquisador, com quem eu fui trabalhar, lá nos Estados Unidos, na Emory University, queria começar um projeto sobre vacinas. E queria fazer isso usando o que eu sabia fazer, que era bioinformática. Então foi assim que eu entrei nessa área, foi unindo minha expertise na bioinformática e o interesse do laboratório dele, que era de imunologia sobre a vacina. E isso só fez aumentar meu interesse, desde então. CIÊNCIA EM TELA: Como você enxerga o futuro das vacinas? Vamos continuar no mesmo formato de pesquisa e produção? HELDER: Bom, as vacinas para doenças infecciosas eu acho que vão continuar. Por que é aquilo né? Em time que está ganhando não se mexe. Então, pelo menos, para aquelas já tradicionais, que se mostram extremamente efetivas, como a da febre amarela, é difícil você imaginar que elas vão mudar muito no futuro. O que vai acontecer com a de febre amarela e é o que já está acontecendo, é reduzir a dose da vacina, para poder vacinar mais gente. Afinal, ela é tão forte que consegue ser efetiva, mesmo quando você reduz a dose. Então eu acho que o que vai acontecer, para as vacinas já estabelecidas, é tentar melhorar e otimizar, tornando elas ainda mais seguras do que já são. Para outras doenças infecciosas é o que também já está acontecendo: as pessoas então tentando fazer vacinas para Chikungunya, Zika, etc. A vacina do Ebola, por exemplo, surgiu rapidamente e já é muito eficaz em gerar uma resposta imune específica. Só que ainda não houve uma epidemia de Ebola para ela poder ser testada. CIÊNCIA EM TELA: Para finalizar, em que contexto você fala ou já falou sobre vacinação para outros grupos de não especialistas, pessoas que não são da área acadêmica, por exemplo? Você já teve experiência de falar para um público escolar (professores do ensino médio, ensino fundamental, alunos de educação básica)? Se já teve essa oportunidade, como foi a experiência em falar para esse público? 4

HELDER: Eu valorizo demais essa divulgação científica, tanto é, que escrevo, regularmente, para o blog da Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI), que são justamente para pessoas que não são especialistas em imunologia. Eu também tive um projeto de extensão que se chama Divulgando Ciência com Animação, onde criamos videozinhos (https://goo.gl/yq4gfd) para qualquer pessoa leiga entender um pouco mais sobre ciência, inclusive, vacinas. Essa semana mesmo eu estava no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro, dando uma palestra para pessoas de todas as áreas, sobre inovações na ciência e até mencionei sobre as vacinas. Portanto, eu acho extremamente importante e estou, continuamente, levantando essa bandeira de que as vacinas são extremamente importantes. Sobre o pesquisador e o entrevistador Helder Nakaya Biólogo da Universidade de São Paulo e doutor em Bioquímica pelo Departamento de Bioquímica do IQ USP. Pós-Doutorado na Emory University, Atlanta (USA). Docente do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP e professor adjunto da Emory University. Membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências. http://lattes.cnpq.br/5515247461567730 Bruno Scramignon Bacharel em Ciências Biológicas: Microbiologia e Imunologia (UFRJ). Realizou estágio no laboratório de biologia molecular de bactérias/ufrj sob a orientação da Dra. Agnes Figueiredo. Em 2016 fez uma participação colaborativa, tendo o seu nome vinculado em um artigo científico ( Complete genome sequence of the MRSA isolate HC1335 from ST239 lineage displaying a truncated AgrC histidine kinase receptor. - Genome Biology and Evolution). 5