Conflitos e lutas entre classes sociais no Governo Sarney



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Transcrição:

Anais do IV Simpósio Lutas Sociais na América Latina ISSN: 2177-9503 Imperialismo, nacionalismo e militarismo no Século XXI 14 a 17 de setembro de 2010, Londrina, UEL GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação Conflitos e lutas entre classes sociais no Governo Sarney (1985-1989) Suzane Conceição Pantolfi Tostes O presente trabalho é uma parte dos primeiros passos de reflexão em torno do projeto de pesquisa da dissertação de mestrado, vinculado ao Programa de Mestrado em História da Unioeste. Essa pesquisa tem como objetivo investigar e analisar de que forma a revista Veja divulgou os conflitos e lutas entre as classes sociais durante o Governo Sarney (1985 1989), percebendo ainda qual projeto social hegemônico se construiu nesse momento. E tendo como orientação o objetivo central mencionado a cima, estar percebendo ainda outros elementos acerca do tema, como: analisar através do discurso da revista, como Veja visualiza e compreende o Governo Sarney ; entender como a revista retrata ou apresenta através do Governo Sarney aspectos da democracia, tentando fazer uma relação com a política na Ditadura. Analisar também através do discurso como Veja percebe e vai construindo as noções e práticas Neoliberais ou que outro projeto esta sendo pensado durante o Governo Sarney? Já mencionado os objetivos que perpassam a pesquisa, é importante explicar porque tomo a revista como o objeto de pesquisa. Isso se dá por Mestranda em História pela Unioeste. End. eletrônico: suzinha_t@hotmail.com GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação 92

compreender e entender a revista como um órgão da grande imprensa, que se configura como um aparelho privado de hegemonia, haja vista que, Veja possui uma visão de mundo ( ideologia) da qual compartilha como uma determinada classe social. Veja é um aparelho privado de hegemonia, a favor da classe dominante, pois a mesma compartilha visão de mundo e projeto sociais hegemônicos. Tanto é que a revista escreve suas matérias para informar as frações da classe dominante no Brasil. Para podermos compreender melhor os objetivos levantados para pesquisa, tendo como recorte temporal o Governo Sarney (1985 1989) é preciso recuar um pouco e analisar os conflitos e embates que foram se constituindo ao longo do Regime Civil Militar no Brasil (1964-1985), principalmente após a crise do milagre econômico brasileiro na década de 70, juntamente com a mobilização social que vai perpassar o final da década de 70 e na década de 80. No período da ditadura, também ocorreu à entrada e ampliação das multinacionais e investimentos estrangeiros no país, assim como houve uma iniciativa maior de capitais vindo do Governo para as indústrias nacionais de base. Esse incentivo foi proporcionado pelo Governo brasileiro para facilitar e diminuir os custos das multinacionais que precisavam de matérias primas para produzirem suas mercadorias. E através dessa produção a burguesia nacional administrava o comércio interno brasileiro. Essa articulação desenvolvida na industrialização brasileira no período da ditadura foi denominada de tripé econômico brasileiro, a base de sustentação da economia durante a própria Ditadura. Porém esse regime ditatorial no Brasil começou a perder forças em meados da década de 70; pois o mundo estava vivenciando a crise estrutural do capital nesse momento e os capitalistas atribuíam essa crise: As demandas populares e a política compensatória do Bem Estar, de elemento vital à sobrevivência do Capital, passaram a ser apresentadas como responsáveis pela crise. (Dias, 2006. Pág.49). No Brasil a crise do capital foi vivenciada no período do regime militar na década de 70, através da crise do Petróleo que estourou nos países árabes. Bernardo Kucinski, relata sobre como desencadeou essa crise: O preço do Petróleo subiu porque os países árabes suspenderam suas exportações de petróleo em represália ao apoio das nações do Ocidente a Israel, na Guerra do Yom Kipur deflagrada em setembro de 1973. A guerra logo terminou, mas o preço do petróleo não baixou. (...) Às vésperas da crise, os gastos da Petrobrás em pesquisa e prospecção tinham sido os mais baixos de sua história, em relação aos seus investimentos totais. Toda a sua estrutura de produção de derivados estava baseada na GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação 93

importação de petróleo. Por isso, quando os preços internacionais saltaram espetacularmente ruíram os fundamentos da economia brasileira. ( KUCINSKI, 2001, p. 16) O Brasil estando vinculado às práticas do Sistema Capitalista, ou seja, dependendo economicamente e tendo suas políticas norteadas pelo capital, sua economia passou a ficar ainda mais refém das oscilações do mercado internacional. Em decorrência dessa prática e dependência o Brasil com a crise do Petróleo, foi afetado principalmente na economia interna, pois necessitava gastar mais recursos para manter o funcionamento das indústrias de todos os setores econômicos brasileiros. Contudo essa elevação do preço comercial do petróleo trouxe outras repercussões para o sistema econômico brasileiro, a inflação aumentou demasiadamente devido à diminuição das exportações e elevações das importações juntamente com o aumento da dependência financeira através de empréstimos aos bancos internacionais com juros exorbitantes. Como conseqüências dessa crise financeira, citada acima, vivenciada pelo Brasil, a autora Marly Rodrigues contribui dizendo sobre as exigências que o FMI (Fundo Monetário Internacional) passou a colocar ao país para continuar obtendo mais empréstimos: O pagamento dos juros da dívida passou a ser prioritário uma vez que o Brasil precisava mostrar-se capaz de superar suas dificuldades financeiras, forma de continuar merecendo novos créditos do FMI. (RODRIGUES, 2003, p. 41) Por meio dessa exigência imposta pelo Fundo Monetário Internacional, a classe social que mais sofreu diretamente e economicamente essa pressão, foi a classe trabalhadora; pois seus salários passaram por uma desvalorização muito grande, tendo como conseqüência a alta inflação e a interferência que o Estado passou a adotar nas negociações salariais. A classe trabalhadora principalmente a partir da década de 70 começa a sofrer mais sensivelmente as conseqüências da crise econômica brasileira, pois com o arrocho salarial aos trabalhadores e a inflação crescendo diariamente, o preço final dos produtos - a grande maioria era de consumo essencial para a reprodução da força de trabalho dos operários - sofriam grandes elevações, gerando assim um descontentamento ainda maior da classe trabalhadora. Em contrapartida os trabalhadores organizavam-se articuladamente em função de reivindicações de melhores remunerações e condições de trabalho. As greves no final da década de 70, tinham caráter popular e de massas, que começaram com os metalúrgicos, porém obtiveram adesões nos mesmos moldes por outras categorias assalariadas posteriormente. GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação 94

A reabertura política sendo ela lenta e gradual como diziam os políticos da época que deveria assim proceder, começou durante a gestão do Governo Geisel (1974-1979), que passava pela crise financeira oriunda da crise mundial do capitalismo. Essa reabertura política nos é colocada por David Maciel como sendo uma exigência requerida pelas elites brasileiras, haja vista que, esse modelo de governo civil ditatorial, não estava mais atendendo aos interesses das classes dominantes, devido a nova dinâmica capitalista que estava sendo consolidada pautando-se na reestruturação produtiva, tendo como um dos elementos como nos coloca Edmundo Fernandes Dias: Busca-se destruir não apenas o trabalhador coletivo, mas seus os coletivos. Em suma, quer se produzir um operário parcelar, descontínuo e, acima de tudo, inteiramente subordinado ao capital. Um trabalhador que, por medo de perder o emprego, defende não apenas a produtividade de capital mas, até mesmo, a demissão dos seus companheiros. O caso das ilhas de produção é exemplar; faz se com que um trabalhador vigie o outro, dispensando assim a vigilância do patrão. (DIAS, 2006, p.50) A nova dinâmica capitalista também se pautava no Neoliberalismo que estava em construção durante esse momento, mas que contempla a mínima intervenção do Estado na economia. Para que essas medidas fossem conquistadas e colocadas em prática era preciso que houvesse a redemocratização do país. Essa redemocratização do país é uma construção das elites que definem isso como a volta às práticas democráticas, ou seja, se ter mais liberdade para impor regras e fazer negociações tanto internacionais quanto nacionais sem depender do Estado, o que impedia as elites de terem e poderem exercer a liberdade econômica era a existência dos Atos Institucionais que concediam muitos direitos ao Estado que foram criados no período militar, mas que nesse momento era reivindicado sua anulação. Algumas medidas tomadas nesse processo de transição tiveram grande repercussão no cenário político, uma delas foi o pluripartidarismo. Segundo David Maciel havia: A necessidade de desarticular o sistema oposicionista de modo a dividi-lo para ampliar a margem de manobra do governo, o que seria possível com o pluripartidarismo. (MACIEL, 2004, p.231) Ou seja, através da institucionalização do pluripartidarismo, os movimentos oposicionistas passam a ser fragmentados e assim perdem seu poder de luta contra o Governo, com essa manobra o Estado contém mais facilmente a oposição. Com a implantação do pluripartidarismo, viabilizou-se a partir de 1980 a criação de vários partidos: PDS, PMDB (antigo MDB durante a ditadura militar) oposição do governo -, PTB, PDT, PP e PT. Partidos estes que fizeram parte das eleições de 1982 e contribuíram para fragmentação partidária de oposição, por outro lado legitimou um caráter GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação 95

mais democrático para as eleições, pois, anteriormente, os políticos eram indicados por eleições indiretas. Em 1982 ocorreram eleições diretas para governadores em todo Brasil, e a partir de 1984 a classe trabalhadora mobiliza-se reivindicando as eleições diretas para presidente, que ficou conhecida popularmente como o movimento das Diretas Já. Porém a emenda Dante de Oliveira, que visava a participação da população nas eleições para presidente foi encaminhada para o Congresso, porém não conseguiu votos suficientes para ser aceita. Não sendo aprovada a emenda Dante de Oliveira, as eleições para presidente no ano 1985 ocorreram de forma indireta por meio da votação dos membros do Colegiado Eleitoral: A 15 de janeiro de 1985 reuniu-se o Colegiado Eleitoral. Dele faziam parte os membros do Congresso Nacional e delegados de Assembléia Legislativa. (...) Tancredo Neves foi eleito por 480 votos contra 180 outorgados a Paulo Maluf. Houve 26 abstenções. Sua vitória foi comemorada com Hino Nacional entoado pelos repórteres que ocupavam o plenário e por grupos populares que acompanhavam a votação fora do edifício do Congresso. Depois de 21 anos o Brasil voltava a ter um presidente civil. (RODRIGUES, 2003, p. 23) Assim a Ditadura Civil Militar terminava com a eleição indireta de Tancredo Neves, todavia outros embates decorrentes da ditadura ainda nesse momento estão postos como: arrocho salarial; aumento da divida externa; inflação crescente e várias greves da classe trabalhadora. As formas de organizações estabelecidas pela classe trabalhadora durante a primeira metade da década de 80 foram diferentes maneiras encontradas de maior resistência contra a expansão do processo de exploração do capital sobre os trabalhadores. Embora a classe trabalhadora tenha desenvolvido artifícios e se mostrasse mais combativa na década de 80, a mesma não deixou de resistir à expansão do Capital durante a Ditadura Militar, o que ocorreu nesse período foram as formas repressivas de controle desenvolvidas pelo Estado para conter as manifestações e greves promovidas pelos trabalhadores. Além do controle exercido pelo Estado através de repressões, o mesmo utilizou os sindicados oficiais, com o intuito de desarticular as formas de organização da classe trabalhadora intermediadas pelos sindicatos dos trabalhadores. A ofensiva do Estado para controlar e sufocar as organizações sindicais da classe trabalhadora ocorreu mais drasticamente no início do regime militar, como David Maciel argumenta neste trecho; GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação 96

Na primeira frente de ação, aprofundou-se o processo de subordinação de trabalho ao capital, pela política extremamente repressiva desencadeado sobre o movimento dos trabalhadores, particularmente o movimento operário e pela contenção salarial. (MACIEL, 2004, p.38). Com base no fragmento de texto de David Maciel, para que os trabalhadores se readequassem nas formulações da reestruturação produtiva proposta pelo capital, os capitalistas tiveram que reduzir os salários dos trabalhadores e reprimir os movimentos sindicais, pois era preciso ter um novo trabalhador que fosse subordinado às novas práticas capitalistas. Através dessas medidas alguns movimentos operários passaram a organizarem-se clandestinamente e com o intuito de resistência as repressões sofridas. Mas, apesar dessa represália sofrida no começo da ditadura pela classe trabalhadora, não foi suficiente para acabar com o espírito de luta da mesma. Após a assinatura em 1979 da Lei de Anistia juntamente com outras reformas institucionais, as greves organizadas pelos metalúrgicos do ABC ganharam destaque em todo país e incentivaram a mobilização de outras categorias assalariadas a fazerem greves e reivindicarem melhorias em seus trabalhos. E isso levou as mudanças na forma de organização da classe trabalhadora. Significaram o rompimento com uma prática que submetia a organização das categorias profissionais aos estreitos limites impostos pelo Estado aos sindicatos e sua substituição por um sindicalismo mais próximo dos trabalhadores. (...) O sindicalismo autêntico acabou de abrigar grande variedade de propostas orientadas por diferentes concepções políticas e condicionadas pela organização específica de cada atividade profissional (RODRIGUES, 2003, p. 59). As greves neste momento tiveram uma enorme importância para a classe trabalhadora, todavia, além de levar às ruas milhões de pessoas e estar conscientizando sobre a necessidade da luta organizada para obterem melhores respostas as suas reivindicações, também foi um momento de romper com as barreiras impostas pelo regime militar. Voltar às formas de organizações abertas e recuperar o espaço de mobilização de cada categoria profissional intermediado pelo sindicato e independente politicamente do Estado. Em decorrência desse processo, onde a classe trabalhadora passa a entrar novamente no cenário da luta política e econômica através das greves no final da década de 70, o Estado em 1979 decreta o pluripartidarismo, ou seja, a existência de outros partidos, pois até então existiam somente a ARENA (situação) e MDB (oposição). Entre os líderes de alguns sindicatos, os metalúrgicos do ABC paulista se destacam por cogitarem a importância GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação 97

de se ter um partido político, formado por trabalhadores para atender suas necessidades. A expressão partidária mais vinculada organicamente à emergência do protesto popular e ao avanço do movimento social das classes subalternas foi o PT. Como já adiantamos, a perspectiva da criação de um partido próprio para os trabalhadores já se apresentava em diversas organizações da esquerda marxista e partiu da ação efetiva de alguns dos principais dirigentes do novo sindicalismo. A principal demanda presente na criação do PT era a autonomia política e organizativa dos trabalhadores diante do Estado, dos patrões e dos partidos dos patrões através da constituição de um instrumento político específico dos trabalhadores, que superasse sua ação corporativa e os inserisse na arena da disputa política (MACIEL, 2004, p. 253) Com a criação de um partido que lutasse na política pelos trabalhadores e ao mesmo tempo se colocasse combativo aos partidos que defendessem os patrões, ou seja, percebiam que era preciso lutar e criar mecanismos de luta não só no âmbito dos sindicatos e sim, e mais além, ter um partido que pudesse defender a classe trabalhadora na esfera política e econômica. Além da criação do PT, foram criados na década de 80 duas centrais com o objetivo de centralizar algumas lutas de toda a classe trabalhadora independente de categoria. A impossibilidade de conciliação entre as concepções presentes no movimento sindical - referentes, entre outros pontos, à forma de resistência ao arrocho salarial, à unidade e pluralidade dos sindicatos e sua relação com os partidos acabou por originar duas centrais sindicais: a CONCLAT, mais tarde CGT (Central Geral dos Trabalhadores), que aceita a estrutura sindical existente; e a CUT (Central Única dos Trabalhadores), composta por sindicalistas autênticos e pelas oposições sindicais, defensora da independência em relação à estrutura sindical oficial e de maior participação. (RODRIGUES, 2003, p. 61). Essas centrais tinham como sujeitos principais a classe trabalhadora, todavia, divergiam nas formas de lutarem e resistirem na concepção estrutural do sindicato. Apesar dessas incompatibilidades existentes, entre a CGT e a CUT, elas se mostraram muito importantes nas lutas ocorridas nas décadas de 80, pois ganharam adesões pelo Brasil. Na década de 80 ainda surgiram outros tipos de movimentos que envolveram a classe trabalhadora. Esses denominados de movimentos sociais, os quais englobam desde movimentos de bairro, clube de mães, até movimento social de origem rural, não se restringe somente a cidade e os trabalhadores urbanos. GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação 98

Essas foram as formas de mobilização desenvolvidas pela classe trabalhadora na década de 80 para se contrapor a ofensiva posta pelas medidas colocadas pelo Estado. Porém é importante ressaltar que durante a década de 80 as varias frações da classe dominante também se articularam em busca de organizações e associações que representassem os seus interesses, para assim conseguirem unificar forças ampliar a expansão econômica. O autor René Armand Dreifuss na obra O Jogo da Direita comenta bem a preocupação de alguns seguimentos da classe dominante no período do Governo Sarney em conseguir articular e unir forças para conseguir assegurar estabilidade no campo político. René Armand Dreifuss afirma:... os empresários se preparavam para defender não somente a existência do atual regime e sistema, mas a sua adequação, desenvolvimento e estabilidade, assim como a sua reinserção ou reboque na nova configuração transnacional. (Dreifuss,1989,p.45) Ou seja, os empresários estavam preocupados em como garantir meios para a expansão de poder nas esferas políticas e econômicas. Tanto é que criam mecanismos e agentes como os pivôs políticos, para elaborarem planos e estratégias de curto prazo para alcançarem resultados em termos de poder no cenário político brasileiro, durante o Governo Sarney. Uma outra tática desenvolvida pelas frações da classe dominante no período da década de 80, para aumentar sua força no campo político foi: Teve que penetrar no meio sindical e trabalhador o que foi importante para lançar desafios e ações derivativas, que engajassem estes setores em lutas paralelas. Um exemplo foi o esforço de montar um pacto social em 1986, o primeiro de uma série de tentativas. O pacto era uma necessidade política e econômica. Almejando a estabilização do quadro econômico dentro da ótica da classe. (Dreifuss, 1989, p.65) Porém com essa estratégia mencionada a cima os empresários também conseguiram em alguma medida desviar o foco de luta da classe trabalhadora e assim fazer com que algumas das organizações que representavam os trabalhadores se mobilizassem e encampassem outras lutas que tinham por objetivo beneficiar as frações da classe dominante. Esse cenário de conflito e tensão no âmbito da política e da economia persistiu em todo Governo Sarney. Ainda mais com os altos índices de inflação, divida externa pra pagar, greves de trabalhadores em prol de aumento de salários, entre outros fatores. Para conter a inflação e na tentativa de amenizar um pouco a crise econômica brasileira em 1986, foi criado o Plano Cruzado, pelo então Ministro Funaro, que tinha por objetivo o congelamento dos preços e juntamente com isso a fiscalização oficial, a criação de uma nova moeda. GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação 99

Alguns setores da classe dominante brasileira não enxergavam com bons olhos o Plano Cruzado, motivados por isso pressionaram o presidente Sarney, como afirma Dreifuss: Na mesma linha de pressão sobre governo, vale lembrar a mais dura e explosiva manifestação da Fiesp, resumida num documento de sete páginas e meia, onde seus diretores e assessores concluíram que não havia salvação para o governo Sarney, fora de um gesto heróico diante da crise. (...) A análise era pessimista em relação às chances de contornar a crise política que emergia da débâcle do Plano Cruzado, não visualizando muitas possibilidades a médio prazo para a nova política de governadores. Com ela, Sarney pretendia obter um mínimo de sustentação e base de manobra, para recuperar o prestígio. (Dreifuss, 1989, p.126) Ou seja, mesmo com a medida do Plano Cruzado, a crise econômica brasileira não havia sido contornada e por causa disso a federação dos empresários fez uma manifestação para alertar e pressionar o presidente da república José Sarney, que ele teria que fazer alguma coisa muito heróica para contornar ou pelo menos amenizar a situação. Ainda sobre o Governo Sarney, ou melhor sobre o político José Sarney, há uma obra que foi lançada no ano de 2009 intitulada: Honoráveis Bandidos: Um retrato do Brasil na era Sarney, escrito pelo jornalista Palmério Dória. A obra é uma descrição sobre a vida política de José Sarney e sua família, assim como também se remete a falar sobre os aliados políticos dele, articulando sempre essa descrição com os cargos políticos que assumiu José Sarney na política brasileira. Essa obra servirá para estar percebendo e analisando as alianças de Sarney durante o período em que governou o Brasil e estar compreendendo quais foram os seus planos políticos naquele momento. Com relação ao contexto histórico sobre a transição do fim da Ditadura Civil Militar para a chamada redemocratização ou Nova República podemos concluir que houve alguns fatores muito importantes que nos ajudam a perceber como se processou essa transição. Entre esses fatores se destaca a crise estrutural mundial pela qual passou o Capital, que ocasionou mudanças de ordem política, econômica e social. No Brasil essa crise estrutural do Capital, rearticulou as frações da classe dominante para reivindicarem a reabertura política para vias democráticas e a construção de organizações e associações que planejassem projetos sociais hegemônicos. Mas é pertinente ressaltar que mesmo sofrendo muitas pressões e conseqüências drásticas por causa da crise estrutural do Capital, a classe trabalhadora brasileira também teve um papel importante na transição da Ditadura para a Nova República. Isso se deu por causa das mobilizações e greves articuladas pelos trabalhadores em prol de GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação 100

melhores condições de sobrevivência e trabalho, assim como desenvolveu e criou organizações combativas para estar pensando e criando projeto social. Bibliografia DIAS, Edmundo Fernandes. Reestruturação produtiva : forma atual da luta de classes. Outubro, São Paulo, n 3, p.45-52, 2006. DREIFUSS, René. O jogo da Direita: na Nova República Petrópolis: Vozes, 1989. GRAMSCI, Antônio. Cadernos do Cárcere. Vol.2. 4 Edição Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006. KUCINSKI, Bernardo. Abertura, a história de uma crise. São Paulo: Editora Brasil Debate, 1982. KUCINSKI, Bernardo. O fim da ditadura militar. São Paulo: Contexto, 2001. MACIEL, David. Argamassa da Ordem: da ditadura militar á Nova República (1974 1985). São Paulo: Xamã, 2004. MENDONÇA, Sônia Regina e FONTES, Virginia Maria. História do Brasil Recente 1964 1980. 2 Edição. Editora Ática, 1991. MENDONÇA, Sônia Regina e FONTES, Virginia Maria. História do Brasil Recente 1964 1992. 5 Edição. Editora Ática, 2006. RODRIGUES, Marly. A Década de 80 Brasil: quando a multidão voltou ás praças. 3. ed. São Paulo: Ática, 2003. GT 2. Estado, ideologias e meios de comunicação 101