Revista Ciências & Tecnologia. Produção de celulases por linhagens de Humicola grisea sob cultivo submerso

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Transcrição:

Revista Ciências & Tecnologia Produção de celulases por linhagens de Humicola grisea sob cultivo submerso CALADO, Vanessa Maria Menezes 1 ; DILLON, Aldo Jose Pinheiro 2 ; SALGUEIRO, Alexandra Amorim 3 1 Graduanda de Ciências Biológicas, Universidade Católica de Pernambuco UNICAP; 2 Professor do Instituto de Biotecnologia, Universidade de Caxias do Sul; 3 Professora do Departamento de Química e Meio Ambiente e Pesquisadora do Núcleo de Pesquisas em Ciências Ambientais NPCIAMB, UNICAP; Rua do Príncipe, 526, Boa Vista, CEP 50 050-900; e-mail: aas@unicap.br. Resumo As celulases são enzimas hidrolíticas utilizadas nas indústrias de alimentos, fármacos, cosméticos, detergentes e tecidos. Neste trabalho, foi investigada a produção de celulases por cultivo submerso de linhagens modificadas geneticamente de Humicola grisea. Celulose, bagaço de cana-de-açúcar, sacarose, fontes de nitrogênio e solução de micronutrientes foram investigados nos meios de produção. A estabilidade da enzima na presença de Tween-80 e albumina foi também investigada. Os experimentos foram realizados em frascos de Erlenmeyer no shaker a 150 rpm, a 42 C durante 72 horas. A atividade celulolítica foi determinada em unidade internacional na presença de carboximetilcelulose, a 50 C; a glicose foi avaliada pela técnica do ácido dinitrossalicílico. A maior atividade celulolítica detectada atingiu 13 UI.mL -1 na presença de celulose 10 g.l -1, sacarose 2,5 g.l -1, nitrato de sódio 2 g.l -1, proteína de soja 1 g.l -1, Tween-80 500 µl e albumina 5 g.l -1. Investigações científicas nas áreas de melhoramento genético e fisiologia de microrganismos precisam ser incentivadas para que a produção de celulases seja competitiva com as enzimas comercializadas. Palavras-chave: celulases, microrganismo, cultivo submerso. Cellulase production by Humicola grisea under submerged culture Abstract The cellulases are hydrolytic enzymes that are used in the following industries: food, pharmaceutic compound, cosmetic, detergent and textile. In this work, the cellulase production was investigated by submerged culture of samples of Humicola grisea genetically modified. Cellulose, sugar-cane bagasse, sucrose, different nitrogen sources and solution of micronutrients were investigated in the production medium. The stability of the enzyme was investigated in the presence of Tween-80 and albumen. The experiments were carried out in Erlenmeyer flasks in shaker of 150 rpm, at 42 C during 72 hours. The cellulolytic activity was determined by the international unit in the presence of carboxymethylcellulose at 50 C; the glucose concentration was determined by the technique of dinitrosalicylic acid. The highest cellulolytic activity reached 13 UI.mL -1 in the presence of cellulose 10 g.l -1, sucrose 2,5 g.l -1, sodium nitrate 2 g.l -1, soy protein 1 g.l -1, Tween-80 500 µl and albumen 5 g.l -1. Scientific investigations in the areas of genetic improvement and microorganism physiology must be stimulated so that cellulase production would be competitive with commercialized enzymes. Key-words: cellulases, microorganism, submerged culture. Introdução Os microrganismos têm um alto poder de multiplicação, são adaptáveis a vários meios nutricionais e sintetizam uma variedade de substâncias químicas, dentre elas as enzimas (ANDREAUS, 2002). Os fungos filamentosos têm sido manipulados geneticamente para produção de metabólitos de interesse industrial, com elevada produtividade. Esses microrganismos são muito aplicados pela facilidade de crescimento sob diferentes condições nutritivas, utilizando substâncias de baixo custo (AZEVEDO, 2004). As enzimas são catalisadores biológicos, constituídas de moléculas de proteínas, produzidas por células vivas. Esses biocatalizadores apresentam alta atividade catalítica e seletividade específica so- Ano 1 n. 1 julho-dezembro 2007-1

Centro de Ciências e Tecnologia bre o substrato (SAID; PIETRO, 2004). Nas indústrias, as enzimas têm viabilizado economicamente diferentes processos tecnológicos sob condições amenas de temperatura e pressão, além de diminuir a poluição ambiental (ÂNGELO, 2004). As celulases são enzimas que possuem capacidade de romper as ligações glicosídicas de microfibrilas da celulose, resultando na liberação de oligossacarídeos, celobiose e glicose (DILLON, 2004). Essas enzimas hidrolíticas são utilizadas nas indústrias de alimentos, fármacos, cosméticos, detergentes e tecidos. Dentre suas aplicações nas indústrias têxteis, destacam-se a bioestonagem e o biopolimento por modificação das fibras celulolíticas, melhorando a qualidade do tecido (JURGEN, 2001). O bagaço de cana-de-açúcar foi utilizado na produção de celulases como indutor por apresentar cerca de 50 % de celulose, 25 % de hemicelulose e 2,4 % de cinzas (PANDEY; SOCCOL, 1998). Esse resíduo tem sido utilizado para produção de energia pela queima em caldeiras além de ser exportado. Outra aplicação desse resíduo é a utilização como matéria-prima na fabricação de papel. Apesar do reaproveitamento do bagaço de cana-de-açúcar, às vezes, o excesso é desperdiçado nos pátios das destilarias. O objetivo deste trabalho foi investigar a produção de celulases por linhagens de Humicola grisea modificadas geneticamente por cultivo submerso, investigando a possibilidade do reaproveitamento do bagaço de cana-de-açúcar existente em excesso em regiões produtoras de açúcar e álcool. Material e métodos Microrganismo As onze linhagens do fungo filamentoso H. grisea, utilizadas neste trabalho, foram modificadas geneticamente pelo Dr. Aldo Dillon no Instituto de Biotecnologia da Universidade de Caxias do Sul e designadas pelos símbolos Hu -, Hu +, 01J, 09J, 21J, 22J, 02H, 04H, 09I, 12I e 13G. Manutenção das culturas As linhagens de H. grisea foram repicadas em tubos de ensaio com os meios de cultura inclinados: batata-glicose-ágar (BGA) e o meio de conservação: 400 ml da solução de celulose entumescida a 2,5 %; peptona 1 g.l -1 ; uréia 0,6 g.l -1 ; sulfato de amônio 1 g.l -1 ; fosfato de potássio 2 g.l -1 ; sulfato de magnésio 0,3 g.l -1 ; cloreto de cálcio 0,3 g.l -1 ; 1 ml da solução de micronutrientes de Mandels e Reese (1957) e agar 15 g.l -1. Meios de cultura As linhagens de H. grisea foram cultivadas em meios de cultura de composição química variada na presença de proteína de soja 1 g.l -1 e de 1 ml da solução de micronutrientes de Mandeles e Reese (1957). As diferentes condições nutritivas foram designadas pelas letras A, B, C, D, E, F, G e H, as quais estão especificadas na tabela 1. 2 - Universidade Católica de Pernambuco

Revista Ciências & Tecnologia Tabela 1 Composições químicas dos meios de cultura para produção de celulases O bagaço de cana-de-açúcar foi deslignificado (na presença de soda, a 120 o C durante 30 min), triturado e secado antes de ser utilizado nos meios de cultura. Outra série de meios de cultura foi investigada cujos meios foram preparados acrescentando 2 g da celulose ou do bagaço em cada condição nutritiva (designadas pelas letras A, B, C,..., H ). Sob essas condições, os microrganismos foram cultivados na presença das duas fontes de carbono, obedecendo à composição química da tabela 1. A influência do Tween-80 (500 ml) e da albumina (5 g.l -1 ) na atividade celulolítica foram investigadas utilizando as condições nutritivas C e D especificadas na tabela 1. Condições de cultivo Os microrganismos foram inoculados nos meios de cultura a partir de tubos de cultura pura inclinados, repicados com 5 dias de incubação. Os inóculos foram padronizados a partir de suspensões em água estéril na presença de Tween-80, contendo 105 esporos/ml Os cultivos submersos foram realizados sob agitação a 150 rpm, a 42 ºC por 72 horas, utilizando os meios de produção (tabela 1) em frascos de Erlenmeyer de 500 ml com volume útil de 200 ml. Determinações analíticas As amostras foram coletadas com 0, 24, 48 e 72 horas e centrifugadas; o sobrenadante foi utilizado para dosagens de ph e de atividade celulolítica. Na atividade celulolítica, foi utilizado carboximetilcelulose (CMC) como substrato cuja atividade foi avaliada por: (i) difusão em ágar a 50 ºC por 30 minutos; o halo de degradação do CMC foi revelado com a solução de Vermelho de Congo 0,025 % em tampão tris-hcl a ph 8,0 durante 30 minutos a 50 ºC; em seguida, o material inoculado foi lavado durante 5 minutos com a solução de NaCl 0,5 M preparada no mesmo tampão; (ii) atividade internacional (DOMINGUES et al, 2000) foi utilizado o CMC a 1 % preparado em tampão fosfato 0,1 M a ph 7,0; o sistema de reação foi avaliado a 50 ºC durante 10 minutos; uma unidade internacional de celulases foi definida como a quantidade de enzima que libera 1 mmol de glicose por minuto nas condições de trabalho; a glicose foi determinada pela técnica do dinitrossalicilato - DNS (WHITE; KENNEDY, 1990). Ano 1 n. 1 julho-dezembro 2007-3

Centro de Ciências e Tecnologia Formulação do produto final As amostras de extrato enzimático bruto, livre de células obtidas após centrifugação, foram conservadas em formol a 0,2 % e utilizadas na formulação do produto final na presença de albumina bovina a 0,5 %, Tween-80 a 5 % e polietileno glicol (ATPEG-200) a 5 %. Resultados e discussão As atividades celulolíticas determinadas para as linhagens de H. grisea (Hu -, Hu + ), cultivadas de acordo com a tabela 1, foram independentes da fonte de carbono utilizada. O nitrato foi a melhor fonte de nitrogênio e a presença da sacarose aumentou a produção de celulases. A atividade máxima de 5,9 UI.mL -1 foi determinada na presença de celulose, nitrato e sacarose (condição C, tabela 1), além da proteína de soja e da solução de micronutrientes no cultivo da linhagem (Hu + ) de H. grisea. Quando a celulose foi substituída pelo bagaço de cana-de-açúcar deslignificado, o valor máximo determinado foi 5 UI.mL -1 no cultivo da linhagem (Hu - ) de H. grisea. Nos cultivos submersos dessas linhagens de H. grisea, os valores de ph variaram muito pouco (ph = 6,8-7,9), permanecendo o meio de produção em torno da neutralidade desde o início do experimento até 48 h de agitação (figura 1). Figura 1 Variação de ph no cultivo de linhagens de H. grisea cultivada na presença de celulose (condição C) ou bagaço de cana-de-açúcar (condição D), sacarose, nitrato de sódio, proteína de soja e micronutrientes Considerando a atividade celulolítica máxima determinada (5,9 UI.mL -1 ), foi selecionada a condição nutritiva cuja composição química continha: celulose 10 g.l -1, sacarose 2,5 g.l -1, nitrato de sódio 2 g.l -1, proteína de soja 1 g.l -1 e micronutrientes (condição C) para investigar as outras nove linhagens modificadas geneticamente de H. grisea. A atividade celulolítica variou na faixa entre 0,6 e 1,2 UI.mL -1, enquanto o ph do meio de produção permaneceu ácido. Durante esses cultivos, os valores de ph variaram de 3,7 a 4,6. Logo, a baixa atividade celulolítica detectada comparada com os valores obtidos nos experimentos anteriores provavelmente foi devido ao ph, comprovando a importância desse parâmetro físico-químico na atividade enzimática (SAID; PIETRO, 2004). Na investigação da estabilidade da atividade celulolítica de linhagens de H. grisea na presença de Tween-80 e ATPEG-200, adicionados aos extratos enzimáticos livres de células, a atividade aumentou 4 - Universidade Católica de Pernambuco

Revista Ciências & Tecnologia cerca de duas a quatro vezes (tabela 2). Nas amostras formuladas, o formol foi utilizado como conservante para todos os extratos enzimáticos, não tendo interferido a atividade celulolítica. Tabela 2 Atividades celulolíticas (UI.mL -1 ) de extratos enzimáticos formulados de linhagens de H. grisea com 48 h de cultivo As atividades celulolíticas de H. grisea na presença de detergente e de proteína foram confirmadas experimentalmente. O valor máximo foi determinado para uma das linhagens (Hu - ) na presença de celulose, sacarose, nitrato de sódio, proteína de soja, micronutrientes, Tween-80 e albumina (figura 2). O resultado de atividade celulolítica determinado no valor de 13 UI.mL -1 foi cerca de três vezes maior com 24 h de cultivo quando comparado com os valores na ausência da albumina para as amostras de H. grisea investigadas. Nessa condição de trabalho, o ph atingiu valores acima de 8 com 48 h, aumentando gradativamente até ph 9 com 72 h de cultivo. Conseqüentemente, é necessário que a fisiologia das linhagens de H. grisea modificadas geneticamente seja investigada visando à produção de celulases sob controle do ph do meio de produção. Figura 2 Investigação da influência da albumina na atividade celulolítica Conclusões/Sugestão A produção de celulases por linhagens de H. grisea modificadas geneticamente independe da fonte de carbono: celulose e bagaço de cana-de-açúcar deslignificado; sacarose aumenta a atividade celulolítica e nitrato de sódio é a fonte de nitrogênio que estimula essa atividade. O valor de ph do meio de produção de celulases deve ser controlado na investigação da fisiologia de microrganismos. É necessário que investigações científicas de melhoramento genético e fisiologia microbiana sejam incentivadas para que a produção de celulases seja competitiva com as enzimas comercializadas. Ano 1 n. 1 julho-dezembro 2007-5

Centro de Ciências e Tecnologia Referências ANDREAUS, J. Uso de celulases na industria têxtil. In: SEMINÁRIO BRASILEIRO DE TECNOLOGIA EN- ZIMÁTICA - ENZITEC, 5., 2002, Brasília. Anais... Brasília: UnB, 2002, p. 50. ÂNGELO, Raquel S. Enzimas hidrolíticas. In: AZEVEDO, J. L.; ESPOSITO, E. Fungos: uma introdução à biologia, bioquímica e biotecnologia. Caxias do Sul: Educs, 2004, p. 263-285. AZEVEDO, João Lúcio. Genética dos fungos. In: AZEVEDO, J. L.; ESPOSITO, E. Fungos: uma introdução à biologia, bioquímica e biotecnologia. Caxias do Sul: Educs, 2004, p. 173-212. DILLON, Aldo. Celulases. In: SAID, S.; PIETRO, R. C. L. Enzimas como agentes biotecnológicos. Ribeirão Preto: Legis Summa, 2004, p. 243-270. DOMINGUES, F. C. et al. The influence of culture conditions on mycelial structure and cellulase production by Trichoderma reesei Rut C-30. Enzyme and Microbial Technology. v. 26, p. 394-401, 2000. JURGEN, A. A aplicação das celulases em processos de desbotamento. Química têxtil. n. 64, p. 5-17, 2001. MANDELS, M.; REESE, E. T. Journal of bacteriology. v. 73, p. 269-278, 1957. PANDEY, A.; SOCCOL, C. R. Bioconversion of biomass: a case study of lignocellulosics bioconversions in solid state fermentation. Brazilian Archives of Biology and Technology. v. 41, p. 379 390, 1998. SAID, Suraia; PIETRO, Rosemeire. Generalidades sobre aplicação industrial de enzimas. In:. Enzimas como agentes biotecnológicos. Ribeirão Preto: Legis Summa, 2004, p. 1-7. WHITE, C. A.; KENNEDY, J. F. Manual and automated spectrophotometric techniques for the detection and assay of carbohydrates and related molecules. In:. Techniques in carbohydrate metabolism, North- Holland: Elsevier, 1990, p. B312/20 B312/21. 6 - Universidade Católica de Pernambuco