OS IMPACTOS DAS OBRAS DA COPA DE 2014 NO PORTO DO MUCURIPE (FORTALEZA- CEARÁ): A IMPLANTAÇÃO DO TERMINAL MARÍTIMO DE PASSAGEIROS. Gabriela Bento Cunha 1 Dr. Alexandre Queiroz 2 aqp@metrowiki.com Universidade Federal do Ceará - UFC INTRODUÇÃO Fortaleza é um dos destinos turísticos mais procurados, em escala nacional, na atualidade. Isso é uma consequência das políticas de turismo implantadas pelo governo do estado do Ceará e que coloca a capital cearense dentro de roteiros que têm se concretizado nos últimos vinte anos. Os fatores que propiciam à Terra da Luz esse reconhecimento são o marketing das belezas naturais do estado, principalmente as praias e, recentemente, a transformação da capital Fortaleza como cidade empresarial e atrativa para grandes eventos, como a Copa do Mundo de 2014. A escolha do Brasil como sede do evento incentivou e mobilizou várias capitais a venderem seus atrativos para recebem os jogos. Doze capitais foram escolhidas como subsedes e tiveram que realizar obras em diversas vertentes para atender as exigências da Federação Internacional de Futebol FIFA. Em Fortaleza, as obras terão foco em mobilidade urbana, reforma e construção de estádios, ampliação de aeroportos e a criação de um Terminal Marítimo de Passageiros (TMP) no Porto do Mucuripe, objeto de estudo dessa pesquisa. Busca-se, como objetivo geral, analisar as transformações de ordem turística e espacial oriundas da implantação do Terminal Marítimo de Passageiros no Porto do Mucuripe. Através dessa analise, entende-se o processo de ocupação da zona costeira de Fortaleza e do Grande Mucuripe (composto pelo Mucuripe, Serviluz e Vicente Pinzon), as diferentes funções que a orla de Fortaleza (eixo Beira Mar ao Mucuripe) exerce, principalmente no setor turístico, além de abordar as mudanças de ordem turística e espacial, oriundas do novo equipamento. 1 Graduanda do curso de Geografia na Universidade Federal do Ceará - UFC 2 Professor adjunto A do departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará UFC
METODOLOGIA Para a elaboração da pesquisa foi realizado um levantamento bibliográfico, buscando explicar a formação e estruturação do espaço litorâneo na capital cearense e outras cidades. Nesse contexto, atenta-se para Dantas (2011), Ferreira (2011), Harvey (2005), Ramos (2003) e Urry (1995). A realização do procedimento metodológico abriga três etapas: a primeira consistiu na leitura de teses, dissertações e obras sobre a ocupação da faixa litorânea de Fortaleza e o contexto econômico vivenciado no período e sua composição atual. No segundo momento, ocorreu à coleta de dados sobre a obra em órgãos públicos e privados (IBGE, Companhia Docas do Ceará, Secretária de Turismo SETUR), a sua zona de impacto, valores e prazo de conclusão. Além disso, analisou-se a relação da implantação do equipamento com a atividade turística em Fortaleza, utilizando exemplos ocorridos em outras cidades do mundo. Já no estágio final da pesquisa, a última etapa consistiu nos trabalhos de campo, que foram realizados para visualizar os objetivos propostos para o local, às primeiras transformações de ordem turística e social, confrontar o levantamento bibliográfico com a realidade e comprovar as hipóteses levantadas para a área: formação de um novo corredor turístico entre a praia do Futuro e a Beira Mar, criação de um equipamento multiuso para a população e crescimento do turismo marítimo. A IMPLANTAÇÃO DO TERMINAL MARÍTIMO DE PASSAGEIROS: UMA NOVA DINÂMICA PORTUÁRIA?. A abertura da cidade de Fortaleza para o mar ocorreu, principalmente, pela cultura de algodão. Foi um desenvolvimento mútuo: à medida que a cidade intensificava os investimentos no setor marítimo, a cultura de algodão se fortalecia, transformando a cidade em capital. Incluso nesse contexto também se encontra a apreciação aos espaços litorâneos. A região do Mucuripe, primeiramente ocupada por comunidades pesqueiras e depois por pessoas advindas do sertão, é um reflexo da relação do homem com o mar no
período dos séculos XVIII e XIX: um espaço para a vivência dos pobres. A construção do Porto na enseada do Mucuripe surgiu da necessidade que a cidade tinha para se firmar definitivamente no cenário cearense. Antes da sua localização atual, o Porto de Fortaleza localizava-se no Poço das Dragas, próximo à praia de Iracema e que, devido à sua pouca profundidade, não oferecia condições adequadas para os desembarques. Inaugurado em 1947, o Porto do Mucuripe foi construído para suprir a carência no setor portuário de Fortaleza e assim melhorar o suporte para os navios comerciais que ali desembarcavam. Em 1955, ocorreu a primeira reforma de ampliação do Porto do Mucuripe, que além de incorporar à área novos serviços, gerou impacto ambiental para a comunidade pesqueira, com processos de erosão percebidos na formação da Praia Mansa e também na praia de Iracema. A ocupação existente no bairro do Mucuripe era predominantemente de pescadores, que se apropriaram do espaço em busca de meios de sobrevivência, como a pesca. Percebe-se que a instalação do Porto alterou a dinâmica da população que ali vivia através dos impactos ambientais e da implantação de novos equipamentos. A construção do Porto do Mucuripe propiciou a criação de uma zona marcada por diferentes usos: habitação, industrial e serviços. A ocupação da área foi favorecida pela construção da via férrea Parangaba-Mucuripe, que facilitava o fluxo de pessoas e mercadorias para o local. As comunidades que já residiam no bairro se aproveitaram da infraestrutura oferecida pelo Porto. A instalação na região atraiu indústrias, primeiramente os moinhos de trigo, que ocuparam o local na década de 1950 e permanecem até os dias atuais. A Fábrica de Asfaltos de Fortaleza (ASFOR) e os terminais de Gás Butano também se instalaram próximos ao Porto. A Petrobras instalou a LUBNOR (Lubrificantes e Derivados do Nordeste) na região, responsável pela produção e refinaria de lubrificantes, o que ocasionou a construção de novas vias de acesso para a área. Com isso, novas atividades foram incorporadas pelos moradores, como os armazéns e a criação de uma nova zona de prostituição. Essas atividades tiveram como consequência uma ocupação desordenada e com pouca qualidade de vida. A construção da termoelétrica e a instalação do Serviço de Energia Elétrica Municipal no entorno do Porto do Mucuripe, originou o bairro do Serviluz.
Entende-se que, em diversos períodos históricos, que a instalação da atividade industrial foi o fator determinante para a transformação do espaço. Para Ferreira (2011, p. 47), a fábrica foi representativa no que concerne à correspondência entre a forma do seu arranjo espacial interno e a organização espacial da cidade. A instalação do Porto de Fortaleza no Mucuripe alterou os meios de produção e as relações sociais: inicialmente, as ocupações de pescadores ainda predominavam sobre a área. Com a implantação das indústrias e as oportunidades de emprego, o bairro começa a ser ocupado por trabalhadores que construíram moradias simples, sem acabamento, e de forma desordenada, originando um aglomerado no entorno do Porto: O Grande Mucuripe composto pelo Mucuripe, Vicente Pinzon e o Serviluz (ver mapa 1). A produção do espaço urbano é resultante de ações acumuladas através do tempo e elaboradas por agentes que produzem e consomem o espaço. Com isso, é necessário, primeiramente, entender que a cidade e o seu arranjo espacial são consequências da ação desses vários agentes, com destaque para alguns: o Poder Público, a iniciativa privada e a própria sociedade. A impulsão na ocupação das faixas de praia e a sua transformação em espaço de consumo e lazer são reflexos da ação conjunta dos produtores do espaço. O movimento de urbanização na Beira Mar e nas demais praias da cidade de Fortaleza começa a ocorrer nas décadas de 20 e 30, estendendo-se até 1970. O poder público agiu no intuito de produzir mecanismos para garantir a concentração de riquezas onde as classes mais abastadas se estabeleciam. Esses mecanismos são as obras públicas. Mapa 1: Localização da área em estudo através de imagem de satélite.
Elaboração: CUNHA (2014). O redirecionamento das classes privilegiadas para a zona leste de Fortaleza ocorreu concomitantemente com investimentos públicos que valorizassem o local, como a construção do Plano Diretor de 1962. Este orienta a cidade para o litoral com a criação, em 1963, da atual Avenida Beira-Mar, que acaba gerando uma integração entre a cidade e à zona de praia. Ocorre uma intensificação nesse processo segregador com as ações do setor privado, tais como a construção de hotéis, barracas de praia, pousadas, além dos loteamentos e os arranha-céus que iniciam o processo de verticalização da avenida e dos bairros como Aldeota e Meireles. A valorização dessas áreas busca suprir a demanda por espaços de lazer, em uma escala cada vez mais ampla e com uma estrutura flexível. Os investimentos públicos e privados dinamizam esse mercado de acordo com seus interesses. Urry (1996, p.64) explica que a economia do turismo não pode ser compreendida separadamente da análise do desenvolvimento cultural e da política do setor.. Com isso, pode-se definir, atualmente, que o Grande Mucuripe é composto por dois processos: o de favelização e o de verticalização. Estas são reflexos das atividades econômicas desenvolvidas na área: o turismo, a pesca e a atividade industrial associada ao Porto. Para Ramos (2003, p. 89):
É importante destacar a expansão dessa área chamada Mucuripe, que não mais restringe-se à delimitação oficial da Prefeitura de Fortaleza, mas abrange uma grande gama de bairros que formam o chamado Grande Mucuripe e contém relações sociais, econômicas e culturais.. Os bairros que formam o Grande Mucuripe Mucuripe, Vicente Pinzon e Serviluz (também conhecido como Cais do Porto) possuem características socioeconômicas diversificadas. No Conjunto Santa Terezinha, que faz parte do bairro Mucuripe, percebe-se uma ocupação oriunda do processo de remoção das favelas e criação de conjuntos habitacionais. Os primeiros, na década de 1980, possuíam infraestrutura e não abrigavam moradias precárias. A instalação dos moradores no conjunto ocorreu diferente de outras áreas no entorno do Porto, como o Serviluz e nas favelas próximas, já que fazia parte de um programa público de erradicação das favelas. Ramos, (2003, p. 72) dá ênfase ao momento econômico vivenciado pela cidade: Era o momento em que o turismo começava a produzir divisas para o Estado, marcando o início da construção de hotéis na Av. Beira-Mar. O objetivo da criação do Conjunto Santa Terezinha era abrigar os moradores das favelas próximas ao Mucuripe, e assim deixar a área livre para a nova demanda social que chegava ao Bairro. Os conflitos existentes na área podem não ser rotineiros, mas estão presente através dos produtores do espaço. Estes alteram a dinâmica do local e o transforma em produto de consumo, principal fator de segregação e de desentendimentos. Aprofunda Ferreira (2011, p. 33) que: O uso do espaço, a vida que se dá no lugar, e, assim, também emergirão as tensões, posto que há sempre um jogo algumas vezes aberto, mas na maioria das vezes oculto entre apropriação e dominação do espaço. Aqui,a tensão entre valor de uso e valor de troca no uso do solo urbano está posta, e a cada vez maior mercadificação do espaço traz consequências para a camada mais pobre, que tem sido ainda mais espoliada. No caso do Grande Mucuripe, as transformações na área, cada vez mais intensas, estão vinculadas ao novo contexto vivido pela cidade de Fortaleza: o seu empresariamento, que a transforma em mercadoria e vende a sua imagem em uma
escala global. Se a formação do Mucuripe e seu entorno está associada à instalação do Porto e as atividades desempenhadas por ele: zona industrial, comércio, exportação e etc. Atualmente não se percebe mais essa ligação tão estreita. A construção do Porto do Pecém, na região metropolitana de Fortaleza, extraiu grande parte da produção comercial e industrial do Porto do Mucuripe. Isso alterou o número de empregos fornecidos no local e a saída de algumas pessoas em busca de novas oportunidades. Aliado ao crescimento do turismo, essa ocupação vem se transformando e busca atender a demanda turística e também das classes abastadas. As áreas antes ocupadas pela classe trabalhadora da zona portuária começam a interessar os produtores que visualizam novas zonas de crescimento imobiliário e instalação de serviços. Além disso, os espaços de lazer marítimo nessa área, oriundos do impacto ambiental do Porto, - a Praia Mansa e o Titanzinho foram apropriados pelos pobres, mas que interessa aos especuladores no cenário atual. A explicação dada por Ramos (2003, p. 84): É que a produção da moradia nessas áreas é algo bastante lucrativo para os especuladores, já que a verticalização é uma forma de expandir o volume de capital sobre a terra. Considerando a valorização dessas áreas, evidenciada pelo preço médio por metro quadrado dos terrenos aí encontrados, como mostraremos a diante, é fácil perceber porque essas terras não são mais acessíveis em termos de moradia para a população de origem. Explica também as constantes remoções de moradores ou saída destes para o Conjunto Santa Terezinha, Morro do Teixeira, Cais do Porto, Vicente Pinzón e até mesmo outros bairros mais distantes do Mucuripe. A capital cearense já tem sua imagem consolidada no cenário turístico. A chegada dos visitantes por vias áreas e terrestres acaba por se tornar comum as outras cidades. Com a localização geográfica privilegiada, Fortaleza já se encontra entre os cinco destinos com maior fluxo turístico internacional, tendo um enorme potencial para atender a demanda dos cruzeiros. Esse diferencial, com a implantação do terminal, busca consolidar a cidade no turismo marítimo. Segundo a companhia responsável pela administração do Porto Docas do Ceará (2012): Com quase 60 anos de atividade desde a construção do molhe do Titan, o Porto de Fortaleza se destaca nas rotas de cruzeiro ao longo da costa brasileira, sendo também a primeira escala em águas nacionais para navios vindos da Europa e Estados Unidos..
O Porto do Mucuripe não possui uma estrutura adequada para a recepção de grandes cruzeiros e, essa precariedade não está associada apenas ao desembarque, mas também na profundidade para atracação de navios de grande porte. No momento, ele atua prioritariamente como porto de trânsito e, a partir do terminal, a capital pode se converter na melhor cidade para operações do tipo flyport, devido a sua distância de Lisboa e Miami. Além disso, o seu perímetro de influência compreende parte das regiões norte e nordeste do Brasil, atraindo assim mais passageiros. A enseada do Mucuripe possui uma posição estratégica é ponto de conexão para diversos destinos nacionais. A construção do Porto do Mucuripe foi consequência do crescimento econômico do estado do Ceará e da elevação de Fortaleza à cidade. Se o seu objetivo inicial era suprir a carência portuária, atualmente, a necessidade de implantação do terminal é de fornecer estrutura adequada para o desembarque de cruzeiros e consolidar esse mercado na cadeia turística. O projeto abrange um terminal com múltiplas funções e com impactos diretos no entorno do Mucuripe. A localização do porto entre dois fluxos turísticos de Fortaleza induz à formação de diversas hipóteses para a área: especulação imobiliária, investimentos privados na Praia Mansa, construção de vias de acesso e, consequentemente, valorização do espaço e formação de novos arranjos espaciais modelados por diversos agentes. Em Fortaleza, a zona portuária do Mucuripe é marcada por diversos usos e funções. A implantação da zona industrial originou uma ocupação desordenada da população mais pobre em busca de emprego, formando o aglomerado do Serviluz e do Vicente Pinzon. Aliado a ela, já se encontrava a comunidade de pescadores no próprio Mucuripe que, com a construção do porto, sofreram impactos ambientais e não conseguiam competir com a pesca industrial. Já o desenvolvimento do turismo, junto à valorização da Avenida Beira Mar, e o desejo de morar na praia, propiciaram o crescimento intenso da faixa litorânea de Fortaleza, com maior impacto na zona leste da cidade. Essa dinâmica acabou estendo a ocupação para além da praia do Meireles, atingindo áreas do Mucuripe e do entorno.
Os recursos para a implantação do Terminal Marítimo de Passageiros são provenientes do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) COPA 2014. Está inserido na administração da Companhia Docas do Ceará, responsável pelo andamento da obra e do funcionamento do Porto. É uma companhia de economia mista, vinculada à Secretária de Portos da Presidência da República. Ao todo, serão investidos 149 milhões de reais. O valor inclui os custos com as obras civis, equipamentos (sistema de ar condicionado, escadas rolantes, elevadores e defensas para navios) e fiscalização. Teve inicio em março de 2012 e será finalizada em maio de 2014, para atender a demanda da Copa do Mundo. Mesmo sem estar finalizada, a construção do equipamento já mostra as primeiras mudanças no entorno do Porto do Mucuripe. Vários trechos dos bairros, como na Praia do Futuro, Serviluz e no Vicente Pinzon, estão em obras. O projeto do TMP prevê o aumento da profundidade do Porto em 14 metros e, além do cais existente (com 685m), outro de atracação será implantado com 350 metros para a recepção de cruzeiros, oferecendo a infraestrutura adequada para atracações simultâneas e para as companhias. É válido ressaltar que outros projetos são voltados para área, buscando integrar a zona portuária a alguns locais da cidade, como o aeroporto. Isso será realizado através do VLT, com uma estação no Mucuripe. Além disso, o sistema rodoviário terá uma área especial de estacionamento, favorecendo a recepção e, também, para veículos normais, serão disponibilizadas vagas no terminal e estações do metrô. Essa política de mobilidade tem como objetivo inserir o Terminal Marítimo em um ponto de atração para a população local, já que, na Praia Mansa local de implantação do equipamento será um espaço público que permitirá visitação e contemplação do lugar. A ampla gama de serviços ofertados pelo Terminal está pautada na lógica de flyport, o conceito onde a criação de espaços multifuncionais permite que as atividades de cruzeiro possam ser rapidamente modificadas, atendendo às diferentes demandas sazonais e operacionais. Os serviços disponíveis no espaço são comércios, restaurantes, cafés, ambulatório, acesso à internet e órgãos que atuam na operação turística e alfandegária. Dessa forma, os espaços multiusos do equipamento podem abrigar diferentes eventos e convenções, sendo projetados para permitir a sua expansão interna.
Esse pensamento está vinculado à governança empreendedora adotada pela cidade de Fortaleza e ocasiona impactos na imagem do local, principalmente a sua valorização. O que se pode compreender do projeto do TMP é a busca pela consolidação de Fortaleza em mais um vetor da cadeia turística. O uso do mar em sua totalidade: como espaço de lazer, contemplação e recepção. Em uma cidade pautada no turismo, o impacto da implantação desse equipamento ganha proporções maiores: a visibilidade que o entorno do porto vai receber e que será moldada pelos agentes do espaço através de ações do poder público e da iniciativa privada. O que explica a urbanização litorânea de Fortaleza é a inserção da atividade turística em sua cadeia econômica. Isso ocorre na década de 1980 e transforma a faixa de praia da cidade. Na Avenida Beira Mar ocorre a construção de condomínios de luxo e de grandes hotéis, buscando atender o mercado turístico que se formava. Esse contexto vivido por Fortaleza também ocorreu em Recife, Salvador e Natal, mostrando que as capitais nordestinas se apropriaram do mar para consolidar a sua imagem. O Porto do Mucuripe localiza-se entre os dois maiores corredores de fluxo turístico da orla fortalezense. Na Avenida Beira Mar concentra-se a rede hoteleira e espaços de lazer, como restaurantes, atividades esportivas e feira de artesanato. Já na Praia do Futuro, encontra-se o complexo turístico das barracas de praia, um serviço muito procurado por turistas e pouco encontrado em outras cidades. Já é possível perceber a ligação entre estes três corredores. A zona portuária é, em sua maior parte, composta por moradias da classe mais baixa, dotada de ruas sem asfalto, algumas até sem serviço de esgoto, além da violência oriunda do tráfico de drogas. O contraste nessas três áreas é grande, mas existe uma perspectiva de transformar o Grande Mucuripe além de um ponto de desembarque, mas também um corredor turístico. A implantação do Terminal Marítimo de Passageiros não consolida apenas o turismo marítimo, mas a inserção de uma nova faixa de praia na orla de Fortaleza e, esta, é voltada para atender a demanda das classes mais favorecidas. As hipóteses de especulação imobiliária, de uma nova função portuária e expansão da malha urbana puderam ser visualizadas ainda que de forma discreta nos trabalhos de campo e nas
propostas de investimentos para a área. Essa lógica é expressa por Ferreira (2011, p. 203): O tipo de governança urbana empreendedora que enfatiza as formas específicas de acumulação do capital. Assim, os projetos de frentes marítimas como um problema urbano, [...] têm sido postos em prática através das parcerias público-privadas baseadas no mercado para revitalizar a área portuária. A valorização do litoral, em Fortaleza, é tão intensa que a produção do espaço urbano nessas áreas é rápida e busca atender a demanda de habitação e lazer para a classe média alta. As implicações desse processo estão diretamente associadas aos produtores do espaço e a organização espacial moldada por eles. A construção de equipamentos desse porte na cidade consolida a imagem de Fortaleza como litorânea marítima e, é assim pautada, a lógica dos investimentos públicos e privados que são responsáveis pela expansão da malha urbana e da apropriação do espaço por determinados grupos sociais. CONSIDERAÇÕES FINAIS O que podemos concluir é que, a implantação de um equipamento de grande porte como o Terminal, em uma área de pouco interesse dos produtores urbanos, ocasiona intensas transformações, oriundas da adoção de novas funções e serviços ofertados para a cidade. No caso do Grande Mucuripe, podemos indicar a função de moradia - possivelmente voltada para as classes mais elevadas -, o turismo, através de um equipamento aberto ao público e decorrente das obras de mobilidade e restauração de alguns bairros, além da criação de um novo corredor turístico: o eixo Praia do Meireles, Mucuripe e Praia do Futuro, ocasionando grandes impactos econômicos para a cidade. REFERÊNCIAS
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