Estudos funcionalistas: Interface entre sintaxe e semântica na Língua Portuguesa

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Transcrição:

https://periodicos.utfpr.edu.br/rl Estudos funcionalistas: Interface entre sintaxe e semântica na Língua Portuguesa Thiago Magno de Carvalho Costa magnodecarvalho@gmail.com Universidade Federal do Paraíba,João Pessoa, Brasil. Página 116 A obra Forma & conteúdo, organizado pelos professores doutores Camilo Rosa Silva e Dermeval da Hora, decorre da junção de textos acadêmicos resultantes de trabalhos de dissertação de mestrado e teses de doutorado, revisitados por pesquisadores que estiveram sob a supervisão/orientação da professora Dra. Maria Elizabeth Affonso Christiano que, até o ano de 2014, foi docente do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). O livro busca ainda fazer, como o próprio subtítulo já informa, uma homenagem à referida professora, mostrando um pouco das pesquisas que comungaram com a sua trajetória enquanto pesquisadora, trazendo, assim, mais visibilidade à sua produção acadêmica. O capítulo de introdução, escrito pelos organizadores do livro, traz aos leitores uma breve explanação dos setes capítulos que transcorrerão nas páginas subsequentes. Logo na sequência, há um texto em homenagem à professora Maria Elizabeth Affonso Christiano, primorosamente escrito pelo professor Camilo Rosa Silva. Nessa homenagem, pode-se ter uma noção da vasta produção acadêmica da professora, a partir da sua contribuição às pesquisas em Linguística e às ligadas ao ensino de língua portuguesa. É nesse capítulo, ainda, que temos acesso ao seu perfil acadêmico, à lista de artigos publicados em periódicos, à lista de livros e capítulos de livros publicados e/ou organizados pela professora, além da lista dos seus trabalhos publicados em anais de congresso e, finalmente, a lista dos trabalhos de dissertação e de tese orientados no Programa de Pós- Graduação em Letras (PPGL) assim como, posteriormente, no Programa de Pós- Graduação em Linguística (PROLING) da UFPB. O capítulo inicial é escrito por Maria Medianeira Souza, atualmente, professora da Universidade Federal de Pernambuco, e intitula-se SUJEITO E VOZ VERBAL: ACHADOS SINTÁTICOS SEMÂNTICOS. No texto, a professora remete-se às asserções da sua pesquisa de dissertação (SOUZA, 1999) através de um recorte. Nesse sentido, considerando os objetivos do livro, a autora faz uma convergência entre os estudos sintáticos e os semânticos, representando a sintaxe pela Gramática das Dependências (ou Teoria das Valências - TV) e a semântica pela Gramática de Casos (ou Teoria dos Casos Profundos - TC). O propósito do capítulo é redefinir as concepções de sujeito e de voz ativa preconizadas pela nossa Gramática Tradicional (GT), baseando-se no caso do Experienciador, tal como estabelecido na TC. Para tanto, a autora considera as

Página 117 inadequações das descrições e das análises presentes na GT. Assim sendo, Souza (2016) analisa um corpus de verbos e orações, das modalidades oral e escrita, provenientes de doze entrevistas do banco de dados do Projeto de Variação Linguística no Estado da Paraíba (VALPB), através da integração da TC (FILLMORE, 1968, 1977, 1989; CHAFE, 1979; COOK, 1979) e da TV. A autora reforça, assim, que não se propõe a resolver os percalços da GT e nem do ensino de língua portuguesa, mas apenas diminuir alguns dos problemas apresentados pela gramática. Em UMA ANÁLISE SINTÁTICO-SEMÂNTICA DOS VERBOS LOCATIVOS NAS ESTRUTURAS DO PORTUGUÊS BRASILEIRO, a professora da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Maria da Luz Olegário, retoma a sua pesquisa realizada durante o curso de mestrado (OLEGÁRIO, 2001) e defende a necessidade de uma proposta de gramática da língua portuguesa que seja mais funcional, mais pragmática, para que assim possam ser preenchidas as lacunas da relação sintático-semântica, estabelecidas entre o verbo e os termos que o acompanham (objeto direto ou indireto, complemento nominal etc.). Para cumprir o seu propósito, a autora nos mostra uma análise sintático-semântica de verbos denominados locativos sob a égide da Gramática de Valências (GV) (TESNIÈRE, 1959, 1996; VILELA, 1992; BORBA, 1996; entre outros) e da Gramática de Casos (GC) (FILLMORE, 1968, 1977, 1989; CHAFE, 1979; COOK, 1979), fazendo um contraponto com as concepções da GT (ROCHA LIMA, 1999; LUFT, 1978; CUNHA; CINTRA, 1999; BECHARA, 1999). Após suas análises, Olegário mostra em seus resultados o quão importante é a natureza semântica para a conceituação e para a subcategorização de verbos, conforme sugestões da GV e da GC. Ao escrever MAS TEM MUITOS PORÉNS!, terceiro capítulo do livro, Camilo Rosa Silva, professor da Universidade Federal da Paraíba, faz uma releitura da sua tese de doutoramento, defendida no ano de 2005, que teve como corpus 180 editoriais (todos do século XX), do jornal paraibano A União, cuja análise focalizou o uso das conjunções opositivas, conhecidas na GT como adversativas e concessivas. Para o recorte pretendido nesse capítulo, Silva (2016) traz a análise apenas da conjunção mas, fazendo um percurso desde sua etimologia (BUENO, 1966; CASTILHO, 2002), passando pelo seu desenvolvimento conceitual (NEVES, 2000), mostrando a posição que o item ocupa na distribuição sintagmática e, ainda, estendendo-se à investigação dos contextos de uso e o seus papéis semântico-discursivos. Anteriormente às conclusões, Silva (2016), motivado pela classificação de Neves (2000), cataloga as especificidades funcionais da conjunção, seguindo os seguintes critérios: (i) com valor opositivo preponderante, (ii) com valor opositivo compartilhado com outros valores, (iii) com valor opositivo preservado na correlação e (iv) com valor discursivo-textual preponderante. Com isso, o autor nos mostra as várias facetas do item mas que, sem se licenciar do seu valor opositivo, não desempenha apenas o papel sintático-semântico de conjunção adversativa, mas funções especificamente textuais e, sobretudo, discursivas. A professora da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Valéria Viana Sousa, é a autora do quarto capítulo, intitulado OS (DES)CAMINHOS DO VOCÊ: UMA ANÁLISE SOBRE VARIAÇÃO E MUDANÇA NA FORMA, NA FUNÇÃO E NA REFERÊNCIA DO PRONOME. O referido texto é um recorte da tese de doutorado de Sousa (2008) e tem como proposta analisar, sob o respaldo das teorias funcionalistas norte-americanas, o pronome você. A autora foi motivada pelas

Página 118 hipóteses de que o referido pronome sofreu um processo de gramaticalização e de que na atualidade exerce a função de pronome pessoal do caso reto, passando a referenciar a segunda pessoa (P2), a primeira pessoa (P1) e um valor indeterminado. Com o intuito de cumprir com os seus objetivos, Sousa (2016) divide o capítulo em três partes: (a) a origem do pronome você e o seu percurso desde o uso do item mercê, (b) um diálogo teórico entre o pronome e os estudos funcionalistas, seguindo os cinco princípios básicos da gramaticalização prescritos por Hopper (1991) (estratificação, divergência, especialização, persistência e decategorização) e (c) a análise, do ponto de vista sincrônico, tratando sobre qual tem sido o padrão de uso do pronome você no momento atual, baseando-se no corpus do VALPB. A partir das análises de Sousa (2016), é possível perceber a variação sofrida pelo pronome, haja vista a autora mostrar que o valor de indeterminação tem sido a referência mais utilizada pelos falantes do português brasileiro. Logo no início do quinto capítulo, a professora Iara Ferreira de Melo Martins, da Universidade Estadual da Paraíba, assevera que o item assim está evoluindo gramaticalmente, deixando de ser um dêitico discursivo e passando a funcionar como marcador discursivo. Este é, provavelmente, um dos motivos do título do capítulo ser: MAPEAMENTO DAS MULTIFUNÇÕES DO ASSIM: DOS DÊITICOS DISCURSIVOS AOS MARCADORES DO DISCURSO EM CONTEXTOS ORAIS PARAIBANOS. O texto é uma parte da tese de doutorado de Martins (2008) e teve como corpus 60 entrevistas sociolinguísticas provenientes do VALPB as quais, segundo a autora, foram construídas através de um planejamento localmente dimensionado e situado, dando, assim, certa espontaneidade e imprevisibilidade quanto ao direcionamento que cada entrevistado deu às suas intervenções. A professora divide o seu capítulo em cinco partes, a citar: (1) a origem do uso do item assim e a sua trajetória; (2) os aparatos teóricos do funcionalismo linguístico que embasam o seu estudo, Heine, Claudi e Hünnemeyer (1991), Hopper e Traugott (1993), Givón (1971, 1990 e 1991), acrescentando as contribuições de Cavalcante (2000) e Marcuschi (1995, 1997); (3) a descrição e a interpretação dos dados coletados, seguindo duas classificações, a de Função Gramatical (com três subfunções) e a de Função Discursiva (com uma subfunção); (4) a trajetória de gramaticalização do assim, mostrando que o termo migra de uma função mais gramatical para uma mais discursiva; e (5) as considerações finais, nas quais ela faz um resumo dos usos mais recorrentes do assim, em contextos orais paraibanos, mostrando que o item vem, cada vez mais, agregando funções e valores, adquirindo, portanto, um papel mais discursivo, sem se afastar completamente do seu valor de modo. No capítulo FUNCIONALISMO/GRAMATICALIZAÇÃO E REFLEXIVIDADE NO PORTUGUÊS DO BRASIL: UMA ANÁLISE DO CLÍTICO SE EM JOÃO PESSOA, Fernanda Rosário de Mello, professora da Universidade Estadual do Paraná, remonta uma discussão travada em sua tese de doutorado (MELLO, 2009). Em seu recorte, a autora sugere que o pronome clítico se, no português brasileiro, está passando por uma mudança linguística através do processo de gramaticalização, conforme os princípios de Hopper (1991). Com base em textos orais extraídos do corpus do Projeto VALPB, a parte da pesquisa apresentada nesse capítulo objetiva a checagem empírica do caso do se reflexivo como um caso de gramaticalização, tendo como suporte teórico os princípios básicos do funcionalismo norte-americano. Através do texto de Mello (2016), é possível perceber que o pronome se reflexivo vem alargando seu uso na fala da cidade de

João Pessoa. Conforme as análises da autora, o elemento perde certos traços que lhe são essenciais para que seja caracterizado como reflexivo, à medida que vai expandindo seu contexto de ocorrências, torna-se mais opaco e menos transparente em sua função, passando a conviver em contextos mais abstratos de uso, deixando sua tarefa primeira, angariando novas nuances no discurso. Quando Cléber Ataíde escreve o capítulo final, NEM TUDO QUE RELUZ É OURO: AS CONSTRUÇÕES VS PARA ALÉM DO ESTATUTO DA INFORMATIVIDADE DO SN-SUJEITO, fazendo um recorte da sua tese de doutoramento (ATAÍDE, 2013), ele propõe a investigação acerca do fenômeno da ordenação verbo-sujeito (VS) no português como um resultado não apenas de fatores formais, mas de estratégias textual-discursivas. O autor tem por objetivo demonstrar a relação da estrutura morfossintática da língua com a função que ela possivelmente exerce na organização textual. Baseado nos exemplos presentes em Ataíde (2013) e em Ataíde e Jacó (2015), o autor nos mostra que os resultados da pesquisa apontam que, em nível discursivo, as cláusulas VS estão associadas às estratégias de continuidade e descontinuidade textual. Para isso, Ataíde (2016) nos diz que os fatores discursivos, a partir dos parâmetros da transitividade de Hopper e Thompson (1980), afiliados à noção do plano discursivo e do estatuto informacional das cláusulas de Chafe (1976) e Prince (1980), permitiram a caracterização de quatro tipos de cláusulas com sujeito posposto: VS apresentativa, VS não-apresentativa, VS de comentário e VS de discurso reportado. Nas suas considerações finais, Ataíde (2016) nos informa que as cláusulas VS de comentário e VS de discurso são as duas que mais contribuem para o processo de progressão do tópico discursivo, além de provocar a suspensão do tema. Ainda conforme o autor, é possível caracterizar sintaticamente este tipo de sentença, através de duas configurações, nas quais a ordenação dos constituintes tem relação ao modo que o usuário da língua escolhe para codificar o discurso do outro, seja fazendo o uso do discurso direto, seja fazendo o uso do discurso indireto. Em síntese, não há dúvidas de que a obra ora resenhada, mais do que homenagear a dedicação acadêmica da profa. Dra. Maria Elizabeth Affonso Christiano, instaura um acontecimento nos estudos funcionalistas, principalmente por apresentar interface entre a sintaxe e a semântica, dando-nos a possibilidade, na caminhada empreendida pelas suas 254 páginas, de fazer, não somente incursões teóricas, mas também fomentar produtivas reflexões a partir das discussões aventadas. Ainda que alguns dos trabalhos tenham sido originalmente defendidos há mais de uma década, entendemos que nunca estiveram tão em voga, especialmente no que concerne aos debates acerca da melhoria do ensino de língua materna no Brasil. Página 119

Linguistic Funcionalism: syntax interfacing semantics in Portuguese Language studies. REFERÊNCIAS ATAÍDE, Cléber A. Da esquerda para a direita: descrição e uso das cláusulas VS em textos pernambucanos dos séculos XVIII, XIX e XX. 195 f. Tese (DOUTORADO). UFPB: João Pessoa, 2013. ATAÍDE, Cléber A.; JACÓ, Daniele Damásio. Os aspectos sintático-semânticos e textuais das construções verbo-sujeito em dados de língua escrita. Serra Talhada, Universidade Federal Rural de Pernambuco, 2015. BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. 37ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 1999. BORBA, F. S. Uma gramática de valências para o português. São Paulo: Ática, 1996. BUENO, Francisco da Silveira. Grande dicionário etimológico-prosódico da língua portuguesa: vocábulos, expressões da língua geral e científica sinônimos contribuições do tupi-guaran. Vol 5. São Paulo: Saraiva, 1966. CASTILHO, Ataliba T. de. A língua falada no ensino português. 4 ed. São Paulo: Contexto, 2002. CAVALCANTE, Mônica Magalhães. Expressões indiciais em contextos de uso: por uma caracterização dos dêiticos discursivos. Tese (Doutorado). UFPE: Recife, 2000. CHAFE, Wallace. Givenness, contrastiveness, definiteness, subjects, topics and point of view. In: LY, C.N. (ed.). Subject and topic. New York: Academic Press, p 25-55, 1976.. Significado e estrutura linguística. São Paulo: Ao Livro Técnico, 1979. COOK, W. Case grammar: development of the matrix model. Washington, D.C: Georgetown University Press, 1979. Página 120 CUNHA, C; CINTRA, L. Nova gramática do português contemporâneo. 2 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.

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