Necrotizing Pneumonia In Children Submitted To Thoracoscopy By Pleural Empyema



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Transcrição:

Volume 3, N. 3 Toracoscopia e Pneumonia Necrosante em Crianças Portadoras de Empiema Pleural: Relevância no Diagnóstico e Tratamento. Comunicação Artigo Preliminar Original 119 Experiência Inicial com 30 Casos. Toracoscopia e Pneumonia Necrosante em Crianças Portadoras de Empiema Pleural: Relevância no Diagnóstico e Tratamento. Experiência Inicial Com 30 Casos Necrotizing Pneumonia In Children Submitted To Thoracoscopy By Pleural Empyema Mauricio Macedo, Karine Furtado Meyer, Roneyara Velamiel, Marcio Abelha Serviço de Cirurgia Pediátrica Hospital Estadual Infantil Darcy Vargas RESUMO Avaliar a incidência de pneumonia necrosante em pacientes submetidos a toracoscopia por empiema pleural, a apresentação clínica e diferença de evolução entre portadores de empiema e os de pneumonia necrosante. MÉTODOS: Análise de 30 pacientes, com idade média de 3,9 anos, portadores de empiema pleural submetidos a toracoscopia no período de Julho de 2001 a Junho de 2005. Indicação de toracoscopia: 1) sem drenagem torácica prévia: presença de ultra-sonografia de tórax com derrame septado, 2) drenagem torácica prévia: a) pneumotórax persistente, b) persistência de febre e/ou saída de secreção purulenta, c) exame de ultra-sonografia com presença de septos e coleções. RESULTADOS: 43%. Pneumonia necrosante ocorreu em 13 (43%) pacientes (idade média de 4 anos), sendo cinco com pneumotórax à radiografia de tórax. Nestes, a cultura do líquido pleural foi positiva para Streptococcus sp (3 pacientes), Staphylococcus aureus (1 paciente) e Pseudomonas aeruginosa (1 paciente). Oito dos treze pacientes evoluíram com fístula pleural, com tempo de drenagem e de alta hospitalar em média igual a 16,9 e 19 dias, respectivamente. O empiema simples ocorreu em 17 pacientes (idade média de 4 anos) com cultura do líquido positiva para Streptococos sp em um paciente. Dois evoluíram com fístula pleural sendo o tempo de drenagem e alta hospitalar em média igual a 7,7 e 11 dias, respectivamente. CONCLUSÃO: A pneumonia necrosante esteve presente em 43% dos pacientes submetidos à toracoscopia por empiema pleural. Deve ser suspeitada na presença de pneumotórax ou piopneumotórax, como também em casos que foram drenados e que persistem com febre e drenagem purulenta. Os pacientes acometidos são os que apresentam maior incidência de fístula bronco-pleural, maior tempo de drenagem e de internação hospitalar. Palavras-chave: EMPIEMA PLEURAL; TORACOSCOPIA; PNEUMONIA NECROSANTE ABSTRACT To evaluate the incidence of necrotizing pneumonia in patients submitted to thoracoscopy by pleural empyema and the difference of clinical evolution between patients with empyema and empyema with necrotizing pneumonia. METHODS: Analysis of patients (mean age of 3,9 years) with pleural empyema submitted to thoracoscopy between July 2001 and June 2005. The thoracoscopy indication criteria in patients not submitted to previous thoracic drainage were thorax ultrasonography with presence of septated empyema, and in patients that had already been submitted to thoracic drainage, the presence of both persistent pneumothorax and fever, and the excretion of purulent secretion or ultrasonography exam with the presence of septum and collections. RESULTS: Necrotizing pneumonia was diagnosed in 13 patients (43%), with mean age of 4 years. Five had thorax radiography with pneumothorax. The pleural liquid culture was positive for Streptococcus sp (3 patients), for Staphylococcus aureus (1 patient) and for Pseudomonas aeruginosa (1 patient). Eight developed pleural fistula. The drainage duration and hospital discharge was in average 16.9 and 19 days, respectively. Necrotizing pneumonia absence was verified in 17 patients, with mean age of 4 years. Liquid culture was positive for Streptococos sp in one patient. Two patients developed pleural fistula. Drainage duration and hospital discharge was in average 7.7 and 11 days, respectively. CONCLUSION: Necrotizing pneumonia was diagnosed in 43%. It must be suspected in cases which already present pneumothorax or pio-pneumothorax, and in cases which were drained and fever and purulent drainage persist. The incidence of brocopleural fistula, duration of tube insertion, and postoperative length of stay in hospital is higher in patients with necrotizing pneumonia. Key words: NECROTIZING PNEUMONIA, PARAPNEUMONIC EFFUSION, THORACOSCOPY. MACEDO M, MEYER KF, VELAMIEL R, ABELHA M. Toracoscopia e Pneumonia Necrosante em Crianças Portadoras de Empiema Pleural: Relevância no Diagnóstico e Tratamento. Experiência Inicial Com 30 Casos. Rev bras videocir 2005;3(3): 119-124. Recebido em 10/07/2005 Aceito em 18/09/2005 119

120 Macedo M e cols. Rev bras videocir, Jul./Set. 2005 A toracoscopia diagnóstica e terapêutica é amplamente utilizada em pacientes adultos em diversas situações clínicas. Considerando a faixa etária pediátrica, na grande maioria das vezes ela é empregada no tratamento do empiema pleural. Apesar dos avanços nas terapias antimicrobianas, as complicações das infecções pulmonares ainda ocorrem e estão associadas a uma morbidade significativa 1. A principal complicação é o empiema pleural que ocorre em 10% dos casos. O tratamento do empiema sempre esteve baseado na administração de antibióticos, toracocentese, toracostomia com drenagem fechada ou aberta e toracotomia 2. Com o advento da cirurgia minimamente invasiva a toracoscopia foi adicionada ao arsenal terapêutico 3. A toracoscopia possibilita uma visão ampla de toda a cavidade pleural, permitindo a lise de aderências pleurais, a aspiração de coleções e a retirada do excesso de fibrina depositada sobre a pleura parietal e visceral. A visão ampla da cavidade pleural pela toracoscopia evidenciou, também, que além da efusão pleural, algumas crianças apresentam necrose pulmonar focal, também chamada de pneumonia necrosante (PN). Também denominada gangrena pulmonar, é uma complicação grave das pneumonias, decorrente de trombose dos vasos sanguíneos com conseqüente necrose do parênquima 4. É considerada uma entidade rara mais comum em adultos e geralmente apresentada em relatos de casos ou imagens radiológicas 4-5. A maioria dos pacientes (94%) apresenta efusão parapneumônica associada 5. O organismo mais envolvido na sua patogenia é o Streptococcus pneumoniae, seguido por Aspergillus, Legionella e Staphylococcus aureus 4. A PN é responsável por elevada morbimortalidade na população infantil. Deve ser suspeitada em casos de falha de resposta à antibioticoterapia e drenagem pleural 5. Uma vez diagnosticada, deve ser tratada com ressecção de todo o tecido necrótico 5. Pouco se encontra na literatura acerca da incidência de PN em crianças, sua apresentação clínica, evolução destes pacientes e qual a melhor abordagem terapêutica. Neste estudo procurou-se avaliar a incidência de PN em pacientes submetidos a toracoscopia por empiema pleural, com ênfase para a diferença de apresentação e evolução clínica entre portadores de empiema simples e portadores de empiema com PN. MÉTODOS SELEÇÃO DE CASOS Foram selecionados pacientes com idade média de 3,9 anos (1 a 16 anos) portadores de empiema pleural, submetidos a toracoscopia no período de Julho de 2001 a Junho de 2005 no Serviço de Cirurgia Pediátrica do Hospital Estadual Infantil Darcy Vargas, São Paulo, SP. Não foram utilizados critérios de exclusão. Foram encontrados os seguintes critérios de indicação da toracoscopia: - Nos pacientes não submetidos à drenagem torácica prévia- presença de ultrassonografia de tórax com derrame septado, - Nos pacientes já submetidos à drenagem torácica - pneumotórax ou febre persistentes, saída de secreção purulenta ou ultrassonografia com presença de septos e coleções. TÉCNICA EMPREGADA Os procedimentos foram realizados no centro cirúrgico sob anestesia geral. Eram utilizados três portais de entrada, um para a colocação da câmara e os outros dois para as pinças de trabalho. Eram desfeitas as aderências pleurais e liberadas todas as lojas, com a retirada da carapaça de fibrina sob visão direta, até a constatação da expansão pulmonar e limpeza completa da cavidade pleural. Quando existia uma cavidade no parênquima com restos teciduais desvitalizados era diagnosticada a necrose pulmonar. Nos casos de necrose do parênquima foi realizada a retirada de todo o tecido necrótico. Um dreno de tórax era deixado com entrada no orifício da porta de trabalho póstero-inferior. Este dreno era retirado quando havia completa expansão

Volume 3, N. 3 Toracoscopia e Pneumonia Necrosante em Crianças Portadoras de Empiema Pleural: Relevância no Diagnóstico e Tratamento. Experiência Inicial com 30 Casos. 121 pulmonar, cessado a drenagem purulenta, na ausência de fístula bronco-pleural. VARIÁVEIS ANALISADAS Foram avaliados: - sexo - idade - indicações da toracoscopia - presença de PN - características radiológicas dos pacientes - características clínicas dos pacientes - cultura de líquido pleural - presença de fístula bronco-pleural - tempo de drenagem - tempo de hospitalização RESULTADOS Foram encontrados 30 pacientes, 13 do sexo feminino e 17 do sexo masculino, com uma idade média de 3,9 anos (1 a 16 anos). A toracoscopia foi indicada sem drenagem prévia em 12 pacientes, e com drenagem prévia em 18 pacientes. Neste segundo grupo, o tempo decorrido entre a drenagem e a toracoscopia foi, em média, nove dias. A indicação de toracoscopia com drenagem prévia foi devida ao aparecimento de pneumotórax pós-drenagem de tórax (10 pacientes), à persistência de febre e saída de secreção purulenta pós-drenagem (6 pacientes) ou à ultra-sonografia de tórax com diagnóstico de derrame septado (14 pacientes). PN foi diagnosticada em 13 pacientes (6 do sexo feminino e 7 do sexo masculino), com idade média de 4 anos (variou de 1 a 8 anos). Todos os pacientes eram previamente saudáveis, sem história de aspiração ou imunodeficiência. Dos 13 pacientes, cinco tinham radiografia de tórax com pneumotórax. A cultura do líquido pleural foi negativa em 8 pacientes, positiva para Streptococcus sp em 3 pacientes, para Staphylococcus aureus em 1 paciente e para Pseudomonas aeruginosa em 1 paciente. O achado à toracoscopia foi secreção purulenta com septos de fibrina e necrose de parênquima pulmonar em todos os pacientes. Oito destes treze pacientes evoluíram com fístula pleural. O tempo para retirada do dreno no pós-operatório foi em média 16,9 dias (variou de 5 a 30 dias). A alta hospitalar ocorreu em média no 19 dia póstoracoscopia (7 a 31 dias). Não houve óbitos. Ausência de PN foi constatada em 17 pacientes (5 do sexo feminino e 12 do sexo masculino), com idade média de 4 anos (variou de 1 a 16 anos). Todos os pacientes eram previamente saudáveis, sem história de aspiração ou imunodeficiência. A cultura do líquido foi negativa em dezesseis pacientes e positiva para Streptococos sp em um paciente. Os achados a toracoscopia foram: secreção purulenta com septos de fibrina (14 pacientes), empiema organizado (3 pacientes). O tempo para retirada do dreno foi em média 7,7 dias (variou de 2 a 14 dias). A alta hospitalar ocorreu em média no 11 dia pós-toracoscopia (7 a 21 dias). Quatro pacientes desse grupo apresentavam pneumotórax à radiografia, sendo que dois evoluíram com fístula pleural. Foram estes os quatro pacientes que necessitaram maior tempo de drenagem pós-toracoscopia (média de 13,5 dias). Não houve óbitos. Tabela-1. Tabela 1 - Características diferenciais em pacientes com PN. Características Sem pneumonia necrosante Com pneumonia necrosante Pneumotórax 4/17 (23,5%) 5/13 (38,5%) Fístula 2/17 (11,7%) 8/13 (61,5%) Cultura + 1/17 (5,9%) 5/13 (38,5%) Mortalidade Não houve Não houve Imunodeficiência Ausente Ausente Tempo dreno 7,7 dias 16,9 dias Tempo alta PO 11 dias 19 dias

122 Macedo M e cols. Rev bras videocir, Jul./Set. 2005 DISCUSSÃO A indicação da toracoscopia no empiema pleural da criança ainda é motivo de controvérsia entre os cirurgiões pediátricos, bem como o momento ideal para sua utilização 6-10. O empiema pleural é uma doença que pode ser dividida em três diferentes estágios 11. O primeiro é o exsudativo, onde existe inflamação com acúmulo de líquido fluido e de baixa celularidade. Este líquido é facilmente drenável. No segundo estágio, o fibrinopurulento, ocorre invasão bacteriana com agregação de leucócitos polimorfonucleares e fibrina. O líquido pleural se torna espesso formando loculações e uma membrana sobre a pleura. Neste estágio a expansibilidade pulmonar já se encontra comprometida. O terceiro estágio, ou fase de organização, ocorre dentro de 2 a 4 semanas, com a convergência de fibroblastos e transformação da membrana pleural em tecido inelástico 11. A toracoscopia tem a sua grande indicação na fase fibrinopurulenta, antes da fase de organização 11. Os critérios para indicação de toracoscopia, utilizados no serviço, foram: baixa resposta clínica à drenagem torácica; persistência de febre; drenagem purulenta ou evolução para pneumotórax e ultrassonografia de tórax diagnosticando um derrame pleural com septos. Com o emprego da toracoscopia, começou a ser registrada no Serviço a ocorrência de PN, com cavitações pulmonares de diferentes dimensões, condição não suspeitada anteriormente. Weissberg et al 6 encontraram três casos de PN em 107 pacientes adultos submetidos à pleuroscopia por empiema com resposta não satisfatória à drenagem torácica (2,8%). Subramaniam et al 13 descreveram dois pacientes com necrose pulmonar em 39 crianças submetidas a toracoscopia por empiema, que não responderam à drenagem isolada e que apresentavam loculações à tomografia computadorizada de tórax (5,1%). Kercher et al 14 encontraram dois casos de necrose pulmonar em 16 crianças submetidas à toracoscopia por empiema pleural (12,5%). Em nossa casuística a PN foi diagnosticada em 43% dos casos. Talvez esse fato resulte de um diagnóstico mais precoce ou, mais provavelmente, por estarmos fazendo tal diagnóstico em casos menos graves, anteriormente considerados pneumonias mais resistentes ao tratamento empregado. Além disso, o Serviço é referência para toracoscopia, assim recebem-se mais casos de empiemas complicados, que não resolveram com a terapia convencional de drenagem e antibioticoterapia. Tabela 2. A idade média para ocorrência de PN foi de 4 anos e está de acordo com os relatos prévios cuja idade varia de 2 a 4 anos 4-5. Nenhum dos nossos pacientes foi à óbito ao contrário de 5,5% relatados 5. Em nosso meio, a imunodeficiência não foi um fator de risco para a PN. Aparentemente, a necrose desenvolve-se a partir da natureza invasiva do microorganismo, que destrói o parênquima pulmonar através da liberação de enzimas proteolíticas 5, 15,16, ou através de uma exacerbada resposta inflamatória mediada por citocinas decorrente da interação do agente causal e do hospedeiro 5. A PN deve ser suspeitada principalmente em pacientes que apresentam pneumotórax ou piopneumotórax à radiografia inicial ou na evolução pós-drenagem torácica, já que a presença de ar no espaço pleural implica necessariamente em lesão de parênquima pulmonar. O desenvolvimento da fístula broncopleural resulta da progressão da necrose pulmonar até a periferia do pulmão adjacente à Tabela 2 Séries com diagnóstico de PN através a adoção de toracoscopia. Série Tipo n Empiema PN % Weissberg et al 6 Adulto 107 3 2,8 Subramaniam et al 13 Criança 39 2 5,1 Kercher et al 14 Criança 16 2 12,5 Macedo et al Criança 30 13 43

Volume 3, N. 3 Toracoscopia e Pneumonia Necrosante em Crianças Portadoras de Empiema Pleural: Relevância no Diagnóstico e Tratamento. Experiência Inicial com 30 Casos. 123 pleura. A incidência de fístula broncopleural em PN é em torno de 63-70% 4-5. Oito dos treze pacientes com necrose pulmonar evoluíram com fístula broncopleural, coincidente com os dados de literatura. Em nosso estudo o pneumotórax foi diagnosticado em 9 pacientes, cinco deles com necrose pulmonar. Dos quatro pacientes em que a necrose não foi diagnosticada, dois evoluíram com fístula, indicando que com certeza a lesão pulmonar existia e não fomos capazes de localizá-la. Nestes quatro pacientes acreditamos que havia necrose e esta não foi diagnosticada. Foram eles que necessitaram maior tempo de drenagem do grupo sem PN, com média de 13,5 dias de dreno versus 5,9 dias nos demais pacientes. Acreditamos que a identificação da necrose pulmonar é influenciada pela curva de aprendizado no tratamento videoendoscópico do empiema, pois muitas vezes apresenta-se recoberta por fibrina ou então bloqueada por outras estruturas, sendo de difícil visualização. Além disso, áreas de necrose de menor tamanho também podem passar despercebidas. Uma vez diagnosticada, o tratamento da necrose pulmonar deve ser agressivo, com debridamento de todo tecido necrótico 6, limpeza da cavidade e ampla drenagem pleural, juntamente com antibioticoterapia e cuidados de fisioterapia respiratória. Com a realização da toracoscopia e com o debridamento do tecido necrótico pulmonar, é comum o aparecimento precoce de fístula pleural, porém, sem descarga purulenta associada e, aparentemente, com evolução mais benigna. Após o fechamento da fístula, estes pacientes evoluem com expansibilidade pulmonar completa, sem necessidade de múltiplas drenagens e nem de drenagem pleural aberta, diminuindo muito a morbidade, além do tempo de internação. Antes do advento da toracoscopia, era freqüente nos depararmos com pacientes que evoluíam com a necessidade de várias drenagens, com dificuldade de expansibilidade pulmonar e persistência do quadro infeccioso, muitas vezes permanecendo longos períodos com drenagem torácica aberta e, em algumas vezes, sendo necessária a realização de toracotomia para realização de ressecções pulmonares ou então de decorticação. A ressecção pulmonar pode ser necessária em casos extremos, nessas situações, a fenestração e limpeza mecânica local se constituiriam em medidas preliminares, promovendo o restabelecimento do paciente do quadro infeccioso, antes de realizar a ressecção pulmonar 5. Não foi empregada em nenhum de nossos pacientes. O organismo mais envolvido na patogenia da PN, segundo dados de literatura, é o Streptococcus pneumoniae, seguido por Aspergillus, Legionella e Staphylococcus aureus 4. Na presente série, oito pacientes com PN tiveram cultura negativa do líquido pleural, devendo-se considerar o uso prévio de antibióticos. Dentre os pacientes com cultura positiva, três estavam infectados por Streptococos sp, o maior causador de necrose pulmonar segundo dados de literatura 4. CONCLUSÕES A PN era pouco diagnosticada antes do advento da toracoscopia. Deve ser suspeitada na presença de pneumotórax ou piopneumotórax, como também em casos que foram drenados e que persistem com febre e drenagem purulenta. Os pacientes com PN são os que apresentam maior incidência de fístula bronco-pleural, maior tempo de drenagem e de internação hospitalar. Referências Bibliográficas 1. Moir CR, Telander RL. Complications of lower respiratory tract infection: Empyema complicating pneumonia, pneumatoceles, and respiratory embarrassment. In: Falls JC, Filler RM, Georges L, eds. Pediatric Thoracic Surgery. New York: Elsevier; 1991.p 299-305. 2. Bechamps GJ, Lynn HB, Wenzl JE. Empyema in children: Review of Mayo Clinic experience. Mayo Clin Proc 1970;45:43-50. 3. Silen M, Weber T. Thoracoscopic debridement of loculated empyema thoracis in children. Ann Thorac Surg 1995;59:1166-8. 4. Hoffer FA, Bloom DA, Colin AA, et al. Lung abscess versus necrotizing pneumonia: implications for interventional therapy. Pediatr Radiol 1999;29:87-91.

124 Macedo M e cols. Rev bras videocir, Jul./Set. 2005 5. Hacimustafaoglu M, Celebi S, Sarimehmet H, Gurpinar A, Ercan I. Necrotizing pneumonia in children. Acta Paediatr 2004;93:1172-1177. 6. Weissberg D and Refaely Y. Pleural empiema: 24-year experience. Ann Thorac Surg 1996;62:1026-1029. 7. Rothenberg SS. Thoracoscopy in infants and children. Semin Pediatr Surg 1998;7:194-201. 8. Rodgers BM, Moazum F, Talbert JL. Thoracoscopy in children. Ann Surg 1979;189:176-180. 9. Patton RM, Abrams RS, Gauderer MWL. Is thoracoscopically aided pleural debridement advantageous in children? The American Surgeon 1999;65:69-72. 10. Kern JA, Rodgers BM, Thoracoscopy in the management of empyema in children. J Pediatr Surg 1993;28:1128-32. 11. Shah AA, Shah AV, Shah RC, et al. Thoracoscopy in management of empyema thoracis in children. Ind Pediatr 2002;39:957-961. 12. Campos JRM, Andrade Filho LO, Werebe EC, Minamoto H, Quim AO, Filomeno LTB, Jatene FB. Thoracoscopy in children and adolescents. Chest 1997;111:494-497. 13. Subramaniam R, Joseph VT, Tan GM, et al. Experience with vídeo-assisted thoracoscopic surgery in the management of complicated pneumonia in children. J Pediatr Surg 2001;36:316-319. 14. Kercher KW, Attorri RJ, Hoover D, et al. Thoracoscopic decortication as firs-line therapy for pediatric parapneumonic empiema. A case series. Chest 2000; 118:24-27. 15. Penner C, Long R. Pulmonary gangrene. A complication of bacterial pneumonia. Chest 1994; 105: 567-573. 16. Refaely Y, Weissberg D. Gangrene of the lung: treatment in two stages. Ann Thorac Surg 1997; 64:970-974. Endereço para correspondência MAURÍCIO MACEDO Rua Comandante Garcia D Ávila, 37 Morumbi, São Paulo SP CEP 05.654-040 Fone: (11)37724594 E-mail: mmmacedo@uol.com.br Revista Brasileira de Videocirurgia v.3 n.3 Jul/Set 2005 Assinaturas:+ 55 21 3325-7724 E-mail: revista@sobracil.org.br ISSN 1678-7137: impressa ISSN 1679-1796: on-line SOBRACIL - Editora Prensa - Rio de Janeiro, RJ - Brasil