Implicações de Mudanças de Controlo Empresarial na Composição da Força de Trabalho. Natália Barbosa



Documentos relacionados
Investimento Directo Estrangeiro e Salários em Portugal Pedro Silva Martins*

INOVAÇÃO PORTUGAL PROPOSTA DE PROGRAMA

ESTRUTURA EMPRESARIAL NACIONAL 1995/98

EVOLUÇÃO DO SEGURO DE SAÚDE EM PORTUGAL

NCE/15/00099 Relatório preliminar da CAE - Novo ciclo de estudos

DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS COMBINADAS

Definições (parágrafo 9) 9 Os termos que se seguem são usados nesta Norma com os significados

NORMA CONTABILISTICA E DE RELATO FINANCEIRO 14 CONCENTRAÇÕES DE ACTIVIDADES EMPRESARIAIS. Objectivo ( 1) 1 Âmbito ( 2 a 8) 2

Desigualdade Económica em Portugal

BLOCO 11. ASSUNTOS: Controlo Análise dos Registos Contabilísticos Análise de estrutura e de eficiência Análise de actividade PROBLEMAS:

Desigualdade Económica em Portugal

NORMA CONTABILÍSTICA E DE RELATO FINANCEIRO 15 INVESTIMENTOS EM SUBSIDIÁRIAS E CONSOLIDAÇÃO

ASSUNTO: Plano de Contas (Caixa Central e Caixas de Crédito Agrícola Mútuo)

O estado actual e perspectivas sobre os investimentos estrangeiros directos NOTA DE TRABALHO REPRESENTAÇÃO COMERCIAL GENEBRA - SUÍÇA

EXAME NACIONAL DO ENSINO SECUNDÁRIO

NCE/09/02087 Relatório final da CAE - Novo ciclo de estudos

INE divulgou Síntese Económica de Conjuntura 4.º Trimestre 2005

INVESTIR EM PORTUGAL

IV Fórum do Sector Segurador e Fundos de Pensões. Lisboa, 15 de Abril de 2009

DESENVOLVER E GERIR COMPETÊNCIAS EM CONTEXTO DE MUDANÇA (Publicado na Revista Hotéis de Portugal Julho/Agosto 2004)

Contributo da APRITEL. 16 de Outubro de APRITEL BoasPraticasAP b.doc 1/9

BARÓMETRO PME COMÉRCIO E SERVIÇOS 4º TRIMESTRE 2013 DIVULGAÇÃO DE RESULTADOS

Em 2007, por cada indivíduo nascido em Portugal, foram criadas 1,6 empresas

EDITAL. Iniciativa OTIC Oficinas de Transferência de Tecnologia e de Conhecimento

Nota: texto da autoria do IAPMEI - UR PME, publicado na revista Ideias & Mercados, da NERSANT edição Setembro/Outubro 2005.

PRÉMIOS MORNINGSTAR DIÁRIO ECONÓMICO 2012 OBJETIVO

Desigualdade Económica em Portugal

As nossas acções Sonaecom

PROJECTO DE CARTA-CIRCULAR SOBRE POLÍTICA DE REMUNERAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS

NCRF 3 Adopção pela primeira vez das normas contabilísticas e de relato financeiro (NCRF)

DC24 - Empreendimentos Conjuntos (1) Directriz Contabilística nº 24

ANÁLISE DO MERCADO DE REMESSAS PORTUGAL/BRASIL

Estratégia Empresarial. Capítulo 6 Integração Vertical. João Pedro Couto

FEUP RELATÓRIO DE CONTAS BALANÇO

B. Qualidade de Crédito dos Investimentos das Empresas de Seguros e dos Fundos de Pensões. 1. Introdução. 2. Âmbito

VALOR DOS DIREITOS DE PROPRIEDADE INTELECTUAL NO SECTOR CULTURAL E CRIATIVO

Conferência "12 anos depois de Porter. E agora? Como retomar a estratégia de crescimento para os vinhos portugueses?"

POC 13 - NORMAS DE CONSOLIDAÇÃO DE CONTAS

Condições do Franchising

Aviso n. o 006/2014-AMCM

SEMINÁRIO OPORTUNIDADES E SOLUÇÕES PARA AS EMPRESAS INOVAÇÃO E COMPETITIVIDADE FINANCIAMENTO DAS EMPRESAS OPORTUNIDADES E SOLUÇÕES

M Pesa. Mobile Banking Quénia

CANDIDATURAS ABERTAS:

SISTEMA DE INCENTIVOS À I&DT

Factores Determinantes para o Empreendedorismo. Encontro Empreender Almada 26 de Junho de 2008

1. Tradicionalmente, a primeira missão do movimento associativo é a de defender os

Nota introdutória. PME em Números 1 IAPMEI ICEP

Conselho Nacional de Supervisores Financeiros. Better regulation do sector financeiro

Observatório da Criação de Empresas. Observatório da Criação de Empresas

CAPITAL DE RISCO EM MUDANÇA

Entrega Expresso e Facilitação do Comércio: Impactos na Economia Global

Resposta da Sonaecom Serviços de Comunicações, SA (Sonaecom) à consulta pública sobre o Quadro Nacional de Atribuição de Frequências 2010 (QNAF 2010)

Orientação de Gestão nº 06/POFC/2008

Apresentação FINANÇAS PÚBLICAS. Resultados de aprendizagem. Programa. Licenciatura em Direito 2º Ano, 1º Semestre 2008/09. Finanças Públicas - 2º Ano

Sessão de Abertura Muito Bom dia, Senhores Secretários de Estado Senhor Presidente da FCT Senhoras e Senhores 1 - INTRODUÇÃO

ACEF/1112/20967 Relatório final da CAE

NERSANT Torres Novas. Apresentação e assinatura do contrato e-pme. Tópicos de intervenção

Center for Innovation, Technology and Policy Research Centro de Estudos em Inovação, Tecnologia e Políticas de Desenvolvimento

ipea A ESCOLARIDADE DOS PAIS E OS RETORNOS À EDUCAÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO 1 INTRODUÇÃO 2 DADOS

CARACTERIZAÇÃO DA I&D EM PORTUGAL

EXAME NACIONAL DO ENSINO SECUNDÁRIO VERSÃO 2

- IAE - INQUÉRITO À ACTIVIDADE EMPRESARIAL. ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL PORTUGUESA CCI/Câmara de Comércio e Indústria

Empresariado Nacional e Tecnologias de Informação e Comunicação: Que Soluções Viáveis para o Desenvolvimento dos Distritos?

PRESSUPOSTOS BASE PARA UMA ESTRATÉGIA DE INOVAÇÃO NO ALENTEJO

Manual do Revisor Oficial de Contas. Directriz de Revisão/Auditoria 300 ÍNDICE

Estratégias. Chapter Title Gestão Grupos Empresas. 15/e PPT. Screen graphics created by: Jana F. Kuzmicki, Ph.D. Troy University-Florida Region

Manual do Revisor Oficial de Contas. Directriz de Revisão/Auditoria 835

INTERVENÇÃO DE SUA EXCELÊNCIA O MINISTRO DAS OBRAS PÚBLICAS, TRANSPORTES E COMUNICAÇÕES. Eng. Mário Lino. Cerimónia de Abertura do WTPF-09

FÓRUM DE PESQUISA CIES Olhares sociológicos sobre o emprego: relações laborais, empresas e profissões 18 de Dezembro de 2009

ESTRATÉGIAS DE NÍVEL EMPRESARIAL. Administração Estratégica Conceitos. Autores Peter Wright Mark J. Kroll John Parnell


Intervenção do Secretário Regional da Presidência Apresentação do projecto Incube = Incubadora de Empresas + Júnior Empresa.

Estratégia Nacional de Educação para o Desenvolvimento. ( ) ENED Plano de Acção

DECLARAÇÃO DE RISCO DE INVESTIMENTO (OTC) De 15 de Fevereiro de 2012

CFDs sobre acções CFDs sobre Índices. CFD s. Contracts for Difference

Sistemas de Incentivos Portugal 2020

Eng.ª Ana Paula Vitorino. por ocasião da

24 O uso dos manuais de Matemática pelos alunos de 9.º ano

Negócios Internacionais

Grupo Reditus reforça crescimento em 2008

METADE DA POPULAÇÃO RESIDENTE EM CIDADES CONCENTRADA EM APENAS 14 DAS 141 CIDADES

Barómetro Regional da Qualidade Avaliação da Satisfação dos Utentes dos Serviços de Saúde

NCE/11/01396 Relatório preliminar da CAE - Novo ciclo de estudos

O Quadro Nacional de Qualificações e a sua articulação com o Quadro Europeu de Qualificações

C 188/6 Jornal Oficial da União Europeia

Soluções com valor estratégico

Estratégia Empresarial. Capítulo 4 Missão e Objectivos. João Pedro Couto

NEGÓCIOS INTERNACIONAIS

PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS. QREN: uma oportunidade para a Igualdade entre homens e mulheres

01. Missão, Visão e Valores

Aspectos Sócio-Profissionais da Informática

Workshop de Economia da Saúde

Portugal 2020: Investigação e Inovação no domínio da Competitividade e Internacionalização

Gestão da inovação A avaliação e a medição das actividades de IDI

Gestão Estratégica da Inovação e da Tecnologia

INVESTIR EM I&D - PLANO DE ACÇÃO PARA PORTUGAL ATÉ 2010 CIÊNCIA E INOVAÇÃO -PLANO PLANO DE ACÇÃO PARA PORTUGAL ATÉ NOVA TIPOLOGIA DE PROJECTOS

ISO 9000:2000 Sistemas de Gestão da Qualidade Fundamentos e Vocabulário. As Normas da família ISO As Normas da família ISO 9000

Transcrição:

Implicações de Mudanças de Controlo Empresarial na Composição da Força de Trabalho Natália Barbosa Universidade do Minho, Escola de Economia e Gestão, 4710-057 Braga, Portugal Resumo Este artigo analisa o contributo de aquisições por investidores estrangeiros na intensidade de capital humano ao nível da empresa. Usando a base de dados Quadros de Pessoal para o período 1991-2000, avaliamos se existem efeitos diferenciados na composição da força de trabalho (qualificação e formação académica superior dos trabalhadores) nas empresas que experimentam mudanças de controlo decorrentes de aquisições por parte de investidores estrangeiros. Da análise efectuada emergiram dois importantes resultados. Primeiro, mudanças de controlo induzidas por investidores estrangeiros podem estimular efeitos positivos na dinâmica de emprego e, em particular, na composição das qualificações força de trabalho das empresas. Contudo, este resultado parece ser contaminado pela localização geográfica das empresas adquiridas, enfraquecendo a influência da mudança de controlo na intensidade de capital humano. Segundo, a nossa análise oferece evidência de que, se existir, o impacto das mudanças de controlo é um processo gradual, sugerindo que os efeitos de longo prazo diferem significativamente dos efeitos de curto ou médio prazo. Palavras-chave: investidores estrangeiros, fusões e aquisições, qualificações, educação

1 Introdução O aumento substancial do volume de activos transferido através de fusões, aquisições, e desinvestimentos observado durante a década de 90 (cf. Gugler et al. 2003) estimulou um debate alargado acerca dos antecedentes e consequências dessas transacções. Em particular, as operações de fusões e aquisições (F&A) foram objecto de vários estudos teóricos e empíricos na medida em que estas operações oferecem a oportunidade para reconfigurar a estrutura organizacional das empresas envolvidas e das suas competências nucleares. A reorganização de activos assume, na verdade, um papel crucial na reestruturação e desempenho das industrias (Bertrand and Zuniga, 2006) e, consequentemente, também no crescimento económico de um dado país (Aghion and Howitt, 1998). Tradicionalmente os trabalhos neste tópico investigam o impacto de mudanças na estrutura de capital no desempenho das empresas, usando o comportamento das cotações em bolsa, os lucros contabilísticos ou a produtividade do trabalho como indicadores de desempenho (e.g. Jensen(1988), McWilliams and Siegel (1997), Lichtenberg and Siegel (1992), McGuckin and Nguyen (1995), Dickerson et al. (1997), and Piscitello and Rabbiosi (2004, 2005)). Mais recentemente, e combinando a perspectiva da economia industrial e da economia do trabalho, os efeitos de mudanças na estrutura de capital no emprego e salários ao nível da empresa mereceram atenção na literatura económica (e.g. Conyon et al. (2002), Gugler and Yurtoglu (2004), and Harris et al. (2005)). Estes trabalhos analisam se as empresas envolvidas em transacções de controlo registam impactos negativos no volume de emprego e salários e se esses efeitos diferem por tipo de transacção de controlo. Os estudos empíricos existentes oferecem, contudo, reduzida evidência acerca do impacto das transacções de controlo no volume de emprego de diferentes tipos de trabalhadores. Na verdade, o impacto de operações de F&A na composição da força de trabalho das empresas envolvidas é um tópico pouco investigado. Uma excepção é o trabalho de Siegel et al. (2005), no qual os autores examinam como é que os padrões de produtividade associados a mudanças de propriedade se relacionam com as características da força de trabalho. Em nenhum dos casos, a natureza e nacionalidade das empresas adquirentes e o consequente impacto no volume e composição da força de trabalho foram objecto de análise. Em Barbosa (2006), investigamos como é que a quantidade e qualidade do capital humano se altera após transacções de propriedade que envolvem transferência de 1

controlo para investidores estrangeiros. Este pode, na verdade, ser um importante mecanismo através do qual as empresas de base nacional obtêm acréscimos de desempenho, sendo também benéfico para o crescimento e desenvolvimento económico do país de acolhimento. Além disso, a obtenção de evidência empírica acerca da forma como mudanças na composição da força de trabalho ocorrem podem contribuir para clarificar a relevância das operações que envolvem mudança de controlo no aumento do desempenho económico das empresas, nomeadamente através da reorganização de activos, aligeirando a eventual inércia organizacional, e eliminando potenciais duplicações ou redundâncias de recursos. O impressionante crescimento de operações internacionais de F&A, representando durante a década de 90 mais do que 25% dos total do valor das operações de F&A (UNCTAD, 2000) justifica o interesse em investigar as aquisições (totais ou parciais) por parte de investidores estrangeiros e os seus efeitos nas empresas adquiridas. O reduzido interesse que tópico tem suscitado resulta do facto destas operações não adicionarem capacidade produtiva na economia de acolhimento mas simplesmente transferirem a propriedade e controlo de investidores nacionais para estrangeiros. Mais, essa transferência é muitas vezes seguida de cortes no volume de emprego ou mesmo o encerramento de algumas actividades funcionais das empresas adquiridas. Contudo, de acordo com trabalhos prévios que indicam que as empresas estrangeiras induzem externalidades positivas nas economias de acolhimento, estimulando o crescimento e desenvolvimento e incrementando as qualificações e competências domésticas (Görg and Strobl, 2001; Slaughter, 2002), as aquisições internacionais podem efectivamente contribuir para a formação de capital humano. Adicionalmente, a heterogeneidade de empresas envolvidas em aquisições internacionais tende a ser superior do que no caso de operações de F&A entre empresas da mesma nacionalidade, reflectindo as diferenças entre países em termos de dotações de capital e factor trabalho, ambiente judicial e institucional. Como tal, a focalização da análise em operações internacionais de F&A enriquece a análise dos factores impulsionadores do desempenho das empresas. A análise efectuada baseia-se nas transacções de controlo envolvendo investidores estrangeiros ocorridas em Portugal durante os anos 90, período em que se verificaram importantes movimentos de reestruturação empresarial na Europa Continental (Gugler et al., 2003). A economia portuguesa é um caso interessante para análise na medida em que Portugal tem prosseguido uma politica proactiva na atracção de investimento directo estrangeiro (IDE), reconhecendo o papel que os investidores estrangeiros podem desempenhar no incremento das qualificações e competências dos 2

trabalhadores portugueses. Por outro lado, Portugal é uma pequena economia aberta e uma economia periférica no contexto da União Europeia que tem atraído investidores estrangeiros que procuram normalmente localizações com custos de produção relativamente baixos (Barbosa et al., 2004). Este estudo é o primeiro a avaliar as repercussões de mudanças de propriedade envolvendo controlo por parte de investidores estrangeiros na composição da força de trabalho ao nível da empresa. O estudo analisa empresas da indústria transformadora e a evolução da intensidade de capital humano depois da vaga de F&A ocorrida durante os anos 90. Assim, este trabalho oferece uma visão diferente da formação de capital humano ao nível da empresa, relacionando a composição da força de trabalho com a multinacionalidade dos investidores e com mudanças de propriedade. Para tal, foram usadas duas variáveis empíricas para aferir a intensidade de capital humano; a proporção de trabalhadores qualificados e a proporção de trabalhadores com formação académica superior no número total de trabalhadores. A primeira captura a componente do capital humano adquirida através da educação, formação profissional formal e formação no local de trabalho (i.e. aprendizagem pela execução), enquanto que a segunda refere-se a formação académica superior, a qual oferece conhecimento geral e específico mas também capacidades de aprendizagem em contextos não familiares. 2 Aquisições e composição da força de trabalho Na análise do impacto de mudanças de controlo na composição da força de trabalho ao nível da empresa usamos dados para todas as aquisições (totais ou parciais) por investidores estrangeiros de empresas portuguesas a operar na indústria transformadora durante o período 1991-2000. A fonte de informação foi a base de dados Quadros de Pessoal. A informação ao nível da percentagem do capital social da empresa detida por investidores estrangeiros obtida para vários anos permitiu-nos identificar as transacções de propriedade envolvendo controlo por parte de investidores estrangeiros. Uma empresa é detida e controlada por investidores estrangeiros sempre que a percentagem de capital por aqueles detida é superior a 50%. A amostra final inclui 83 aquisições e 59 desinvestimentos por parte de investidores estrangeiros. È importante salientar que, usando a base de dados Thomson One Banker Deals, a qual contem informação para mercados dispersos por todo o mundo e usa como fonte de informação as operações de F&A publicamente anunciadas, Bertrand and Zuniga (2006) regista 78 operações de F&A por investidores estrangeiros na indústria transformadora portuguesa durante o período 1990-1999. 3

Isto significa que a amostra por nós usada é bastante representativa das aquisições internacionais (totais ou parciais) envolvendo empresas portuguesas no período de 1991-2000. A amostra inclui ainda empresas portuguesas que não experimentaram qualquer transacção de controlo por parte de investidores estrangeiros durante o período em análise. A selecção deste grupo de empresas foi efectuada aleatoriamente replicando a distribuição das empresas pelos sectores de actividade da indústria transformadora. A amostra final inclui 1110 empresas activas durante o período de 1991 a 2000, das quais 12,8% estiveram envolvidas em transacções de controlo por parte de investidores estrangeiros. A distribuição temporal das transacções de controlo por parte de investidores estrangeiros incluídas na amostra é ilustrada na Tabela 1. Tabela 1: Distribuição temporal do número de transacções de controlo por investidores estrangeiros 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 TOTAL Aquisições 21 10 8 6 9 6 6 8 9 83 (58.5%) Desinvestimentos 33 5 2 4 6 3 6 - - 59 (41.5%) TOTAL 54 15 10 10 15 9 12 8 9 142 (100.0%) No início dos anos 90 é possível observar um número significativo de transacções de controlo efectuadas por investidores estrangeiros, com particular destaque para as operações de desinvestimento. Nos anos seguintes verificou-se uma redução significativa desse tipo de operações, sendo, no entanto, de registar que as operações de aquisição ocorrem regularmente durante o período em análise e excedem o número de operações de desinvestimento. Este resultado sugere que, de uma forma geral, as empresas portuguesas são alvos atractivos para os investidores estrangeiros. Comparando as empresas que experimentaram transacções de controlo e as restantes empresas (Tabela 2) é possível verificar que, no início do período em análise, a dimensão média das empresas que foram objecto de transacções de controlo por parte de investidores estrangeiros é superior à dimensão média das empresas que não registaram qualquer alteração na nacionalidade do seu capital. Adicionalmente, as empresas que reportam aquisição ou desinvestimento por parte de investidores estrangeiros registam maior produtividade do trabalho do que as restantes empresas. Isto sugere que os investidores estrangeiros tendem a privilegiar a aquisição das empresas relativamente mais produtivas. 4

Tabela 2: Média e desvio padrão (em parêntesis) de algumas variáveis de interesse por tipo de mudança de propriedade Ano Todas as empresas [N=1110] Aquisições [N=83] Desinvestimentos [N=59] Nacionalidade do capital inalterada [N=968] Proporção de 1991 trabalhadores qualificados 2000 Proporção de 1991 trabalhadores com formação académica superior 2000 0.410 (0.361) 0.445 (0.395) 0.003 (0.034) 0.009 (0.059) 0.453 (0.385) 0.484 (0.405) 0.004 (0.018) 0.013 (0.046) 0.420 (0.363) 0.457 (0.405) 0.003 (0.016) 0.020 (0.065) 0.406 (0.359) 0.441 (0.394) 0.003 (0.036) 0.008 (0.059) Dimensão da empresa (log do número total de trabalhadores) 1991 Produtividade do trabalho 1991 3.183 (1.400) 1.197 (2.682) 3.967 (1.479) 1.711 (2.794) 4.136 (1.547) 2.754 (8.699) 3.059 (1.340) 1.059 (1.713) Relativamente às variáveis que reflectem a quantidade e qualidade do capital humano verifica-se que as aquisições internacionais ocorrem com maior frequência em empresas com maiores rácios de trabalhadores qualificados e trabalhadores com formação académica superior. É interessante verificar que são também essas empresas que tendem a experimentar operações de desinvestimento por parte de investidores estrangeiros, sugerindo que a nacionalidade dos detentores do capital afecta a procura de trabalho qualificado. Mais, no período em análise a evolução das variáveis associadas à intensidade de capital humano reforçam a importância da nacionalidade dos investidores na medida em que o impacto da presença de investidores estrangeiros na formação de capital humano persiste mesmo depois de uma decisão de desinvestimento. Na verdade, empresas que experimentam desinvestimento por parte de investidores estrangeiros também registam acréscimos nos rácios de trabalhadores qualificados e trabalhadores com formação superior no final do período em análise. As trajectórias positivas nas variáveis associadas à intensidade de capital humano ao nível da empresa motivaram o recurso a métodos econométricos de forma a aferir a contribuição das mudanças de controlo na evolução dessas variáveis e, secundariamente, a identificar os principais determinantes da intensidade de capital humano. Da análise efectuada os principais resultados são: O impacto de transacções de controlo na composição da força de trabalho difere por tipo de trabalhador. Aquisições por parte de investidores 5

estrangeiros parecem ter um impacto negativo no rácio de trabalhadores qualificados imediatamente após a concretização da aquisição, enquanto que o rácio de trabalhadores com formação académica superior para ser inume a alterações de controlo. Contudo, o efeito positivo de operações de F&A no rácio de trabalhadores qualificados parece emergir nos períodos seguintes à concretização dessas operações. Este resultado sugere que os novos detentores da empresa ajustam gradualmente a composição da força de trabalho de forma a adequála aos seus objectivos. A relevância das transacções de controlo na formação d capital humano parece, no entanto, desvanecer quando controlamos para a localização geográfica das empresas adquiridas. Em particular, empresas localizadas no distrito de Lisboa são relativamente mais propensas a aumentar a intensidade de capital humano. A conjugação dos dois resultados anteriormente explicitados sugere que disparidades regionais em termos de dotação de trabalho qualificado e contexto (obstáculos e incentivos) inerente ao desenvolvimento de actividades económicas têm um papel mais proeminente na intensidade de capital humano ao nível da empresa do que a nacionalidade dos investidores. Os resultados indicam ainda que em média o impacto de transacções de controlo no rácio de trabalhadores qualificados é superior ao verificado no rácio de trabalhadores com formação académica superior. A intensidade de capital humano ao nível da empresa parece ainda ser neutral à idade da empresa, enquanto que a dimensão inicial da empresa tende a ter um impacto negativo na trajectória das variáveis associadas à intensidade de capital humano. Estes resultados sugerem que quando as empresas atingem uma dimensão suficientemente grande é mais provável a presença de duplicações e redundância de recursos, requerendo assim o reequacionar do volume de emprego e a reconfiguração da composição da força de trabalho. 3 Conclusão Neste estudo avaliámos o impacto de mudanças de propriedade envolvendo controlo por parte de investidores estrangeiros na intensidade de capital humano ao nível da empresa. Apesar dessas transacções de controlo serem menos promovidas e 6

incentivadas do que IDE de raiz, em virtude do receio de perda de controlo das empresas nacionais e do potencial efeito de diminuição do volume de emprego, esse tipo de transacções pode, na verdade, promover acréscimos de qualificações e nível educacional dos trabalhadores. Assumindo que a operações de IDE actuam como um mecanismo de transferência de recursos específicos à empresa, como sejam tecnologia e recursos intangíveis, os resultados confirmam que aquisições de empresas nacionais por parte de investidores estrangeiros tendem a aumentar o rácio de trabalhadores qualificados nas empresas adquiridas nos anos seguintes à concretização da aquisição. Assim, mesmo operações de IDE através de aquisições parecem ter um impacto positivo nas empresas adquiridas. Em particular, estas aquisições podem contribuir para estimular efeitos positivos na dinâmica de empreso e, em particular, na composição da força de trabalho ao nível da empresa. Contudo, não nos foi possível excluir a possibilidade do impacto positivo das mudanças de controlo na intensidade de capital humano detectado neste estudo estar contaminado pelas disparidades regionais em termos de dotação de trabalhadores qualificados e trabalhadores com formação académica superior. Se as características de algumas regiões proporcionam um contexto mais favorável à reconfiguração da composição da força de trabalho, independentemente da natureza e nacionalidade das empresas adquirentes, então as medidas de politica que visam incentivar a contratação de trabalhadores qualificados e com formação académica superior deverão actuar primariamente ao nível do contexto regional em que as empresas operam. Uma outra conclusão que emerge neste estudo é que a existir um efeito positivo de mudanças de controlo na composição da força de trabalho ao nível da empresa, ele demora tempo a ser concretizado. Este desfasamento temporal entre a causa (mudança de controlo) e o efeito (aumento do peso relativo dos trabalhadores qualificados e trabalhadores com formação académica superior) sugere cautela na avaliação prematura de operações de fusões e aquisições. Referências Aghion, P.; Howitt, P. (1998) Endogenous Growth Theory, The MIT Press. Barbosa, N. (2006) The impact of ownership change on human capital intensity: evidence from firm-level data, mimeo, Universidade do Minho. Barbosa, N.; Guimarães, P.; Woodward, D. (2004) Foreign firms entry in an open economy: The case of Portugal Applied Economics, 36 (5), pp. 465-472. 7

Bertrand, Olivier; Zuniga, Pluvia (2006) "R&D and M&A: Are cross-border M&A different? An investigation on OECD countries", International Journal of Industrial Organization, 24(2), pp. 401-423. Conyon, Martin J.; Girma, Sourafel; Thompson, Steve; Wright, Peter W. (2002) "The impact of mergers and acquisitions on company employment in the United Kingdom", European Economic Review, 46(1), pp. 31-49. Dickerson, Andrew P.; Gibson, Heather D.; Tsakalotos, Euclid (1997) "The impact of acquisitions on company performance: evidence from a large panel of UK firms", Oxford Economic Papers, 49(3), pp.344-361. Görg, H.; Strobl, E. (2001) "Multinational companies and productivity spillovers: A meta-analysis", Economic Journal, 111, pp. 723-739. Gugler, Klaus; Mueller, Dennis C.; Yurtoglu, B. Burcin; Zulehner, Christine (2003) "The effect of mergers: an international comparison", International Journal of Industrial Organization, 21(5), pp. 625-653. Gugler, Klaus; Yurtoglu, B. Burcin (2004) "The effect of mergers on company employment in the USA and Europe", International Journal of Industrial Organization, 22(4), pp. 481-502. Harris, Richard I. D.; Siegel, Donald S.; Wright, Mike (2005) "Assessing the impact of management buyouts on economic efficiency: plant-level evidence from the United Kingdom", The Review of Economics and Statistics, 87(1), 148-153. Jensen, Michael C. (1988) "Takeovers: Their causes and consequences", Journal of Economics Perspectives, 2(1), pp. 21-48. Lichtenberg, F. R.; Siegel, D. (1992) "Productivity and changes in ownership of manufacturing plants", in Lichtenberg, F. R. (ed.), Corporate Takeovers and Productivity, MIT Press, Cambridge, MA, pp. 45-67. McGuckin, Robert H.; Nguyen, Sang V. (1995) "On productivity and plant ownership change: new evidence from the Longitudinal Research Database", RAND Journal of Economics, 26(2), pp. 257-276. McWilliams, Abagail; Siegel, Donald (1997) "Events studies in management research: Theoretical and empirical issues", Academy of Management Journal, 40(3), pp. 626-657. Piscitello, Lucia; Rabbiosi, Larissa (2004) "More inward FDI? Medium-term effects of foreign acquisitions on target company productivity" Applied Economics Quarterly, 50(1), PP. 21-40 Piscitello, Lucia; Rabbiosi, Larissa (2005) "The impact of inward FDI on local companies' labour productivity: Evidence from the Italian Case", International Journal of the Economics of Business, 12(1), pp. 35-51. Siegel, Donald S.; Simons, Kenneth L.; Lindstrom, Tomas (2005) "Ownership change, productivity, and human capital: New evidence from matched employer-employee data in Swedish manufacturing", Rensselaer Working Papers in Economics, No. 0502. Slaughter, Mathew J. (2002) "Does Inward Foreign Direct Investment Contribute to Skill Upgrading in Developing Countries?", CEPA Working Paper 2002-08, Center for Economic Policy Analysis. UNCTAD (2000) World Investment Report 2000: Cross-border mergers and acquisitions and development, United Nations, New York and Geneva 8