KEYWORDS: Bantu Languages, Rhonga, Morphology, Diminutivization.



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Transcrição:

EMPREGO DE DIMINUTIVOS EM RHONGA (BANTU, TSONGA) 1 Natália Alves Antunes 2 Tânia Diniz Ottoni Valias 3 Ricardo Campos de Castro 4 RESUMO: Este texto tem por objetivo descrever a formação de diminutivos em Rhonga. Nesta língua, a diminutivização pode realizar-se morfológica ou sintaticamente. A primeira estratégia dá-se por meio dos morfemas circunfixais {xi-...-ana} e {svi-...-ana}. Essas unidades gramaticais denotam diminutivização no singular e no plural, respectivamente. Já no componente sintático a língua utiliza-se da palavra ntrongo pequeno. Este último pode ser considerado um adjetivo qualificativo nos termos de Cunha & Cintra (1984), Moura Neves (2000), Bachetti (2006) e outros. PALAVRAS-CHAVE: Línguas Bantu, Rhonga, Morfologia, Diminutivização. ABSTRACT: This paper aims to describe the formation of diminutives in Rhonga. In this language, the diminutivization can perform morphological or lexically. The first strategy is given through circunfixal morphemes {xi-...ana} e {svi-...ana}. These grammatical units denote diminutivization singular and plural, respectively. The lexical component of language is used ntrongo word "small". The latter can be considered qualifying adjective according Cunha & Cintra (1984), Moura Neves (2000) and others. KEYWORDS: Bantu Languages, Rhonga, Morphology, Diminutivization. 1 O presente trabalho faz parte do Projeto Descrição e Documentação de Línguas Moçambicanas, o qual é coordenado pelo Prof. Dr. Fábio Bonfim Duarte (UFMG-Brasil) e pelo Prof. Dr. Armindo Ngunga (UEM-Moçambique). Esse projeto é financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES/Brasil), por meio do Edital n o 33/2012 (Programa Internacional de Apoio à Pesquisa e ao Ensino por meio da Mobilidade Docente e Discente Internacional Pró-Mobilidade Internacional). 2 Graduanda em Linguística pela Universidade Federal de Minas Gerais/Brasil. E-mail para contato: antunes.alves.natalia@gmail.com 3 Graduanda em Linguística pela na Universidade Federal de Minas Gerais/Brasil. E-mail para contato: taniavalias@hotmail.com 4 Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos da Universidade Federal de Minas Gerais/Brasil. E-mail para contato: ricardorrico@uol.com.br 1

0. JUSTIFICATIVA A importância do desenvolvimento de estudos como este consiste na criação de estratégias que visem possibilitar a implantação de uma educação bilíngue em Moçambique, já que o Português, língua oficial do país, não é a língua materna falada pela maioria da população. Busca-se também a valorização, a preservação e a documentação das línguas africanas. Adicionalmente, a relevância dessa pesquisa reside no reconhecimento da necessidade de contribuir para impedir a morte da língua de estudo por meio de sua documentação e aplicação linguística. De acordo com Dimande (2012): Estas e outras acções são necessárias na medida em que concorrem para evitar a perda linguística, o primeiro passo para o desaparecimento dos demais saberes de um grupo, já que a visão de mundo passa necessariamente pela língua. A cerca disto, Mello (1999) assegura que a perda de uma língua significa desperdiçar a oportunidade de obter conhecimentos que poderiam responder a problemas enfrentados actualmente, uma vez que a língua é a chave para o coração de um povo. Por isso, Engholm apud Mello (1999), considera que se perdermos a chave, perdemos o povo. Se guardarmos a chave em lugar seguro como um tesouro, abriremos as portas para riquezas incalculáveis, riquezas que jamais poderiam ser imaginadas do outro lado da porta. (DIMANDE, 2012). A tentativa de possibilitar a criação de ferramentas facilitadoras para um ensino bilíngue também é uma motivação para o desenvolvimento deste trabalho. Segundo Chimbutane (2011): O uso de uma língua que é familiar aos aprendentes tem o potencial de elevar a participação e a aprendizagem destes. Nas classes em que a L1 é objeto e meio de ensino a atmosfera interativa é favorável à aprendizagem. Os aprendentes são ativamente envolvidos na lição, podem desafiar os seus professores e falam com propriedade e vontade. (Chimbutane (2001). Este artigo está organizado em 6 seções. Na seção 1 discutimos o conceito de diminutivização. Na seção 2 contextualizamos as Línguas Bantu, sua classificação, sua localização e suas principais características. Na seção 3 inserimos a explicação teórica das classes nominais em Bantu, bem como seu funcionamento. Na seção 4 apresentamos como o fenômeno da diminutivização ocorre na língua Rhonga. Finalmente, na seção 5, exibimos as considerações finais. 2

1. Diminutivização De acordo com De Belder, Faust & Lampitelli (2014), translinguisticamente, diminutivos apresentam um comportamento misto em relação a seu significado 5. Diminutivo, ou forma diminutiva (DIM), é o termo utilizado para transmitir o grau reduzido de um significado básico, a pequenez do objeto ou qualidade do nome, intimidade, carinho etc. É o oposto de um aumentativo. Enquanto muitas línguas aplicam o diminutivo gramatical aos nomes, algumas o utilizam com refererência a adjetivos e até mesmo em relação a outros âmbitos do discurso. Formas diminutas são muitas vezes utilizadas com a finalidade de expressar afeto. Em muitas línguas, o significado da diminutivização pode ser traduzido como pequeno, pequenino e outros. Diminutivos são usados frequentemente ao se comunicar com crianças. Além disso, pessoas adultas às vezes usam diminutivos em contextos de ternura e intimidade, comportando e falando como crianças e se referindo, afetivamente a outras pessoas. Nesse uso, diminutivos são termos hipocorísticos 6 nos termos de Dubois (2001). Em muitas línguas, a formação de diminutivos por meio do acréscimo de afixos é um expediente muito produtivo. Como corolário dessa produtividade, todos os substantivos, e não apenas nomes próprios podem ser diminuidos. O significado básico de diminuição nessas línguas é a pequenez do objeto nomeado. Nesse sentido, as acepções de carinho, intimidade, etc. são secundárias e dependentes do contexto. Em Rhonga, esse fenômeno é responsável pela nomeação de algo de menor tamanho ou diminuida a dimensão do objeto referido, assim como pela ideia de valor depreciativo ou apreciativo. Nesta língua, a diminutivização pode se realizar morfológica ou sintaticamente. A primeira estratégia dá-se por meio dos morfemas circunfixais {xi-...-ana} e {svi-...-ana}. Essas unidades gramaticais denotam diminutivização no singular e no plural, respectivamente. No componente sintático, a língua serve-se da palavra ntrongo pequeno. 5 Tradução aproximada de: Cross-linguistically, diminutives display mixed behavior with respect to meaning. 6 De acordo com Debois (2001), em linguística histórica, hipocorístico é uma palavra que exprime afeto. São processos hipocorísticos, entre outros, a reduplicação silábica e a utilização de sufixos diminutivos. Exemplos: titi, papá, paizinho etc. 3

2. Línguas Africanas 2.1 O Grupo das Línguas Bantu 7 Segundo Greenberg (1963), as línguas africanas são classificadas em quatro grandes famílias, a saber: a Afro-Asiática, a Nilo-Sahariana, a Congo-Kordofoniana e a Khoi e San. Essas grandes famílias estão representadas no mapa do continente, indicado na imagem abaixo. Imagem 1 Famílias Linguísticas da África Cada uma dessas famílias é constituída por subfamílias, que, por sua vez, são divididas em grupos constituídos por diversas línguas. A família Congo-Kordofaniana se subdivide em duas subfamílias: Kordofaniana e Níger-Congo, sendo essa última 7 Tipologicamente, as línguas naturais podem ser agrupadas em 3 tipos em relação à sua estrutura interna e características morfológicas pertinentes, a saber: línguas aglutinantes, línguas isolantes e línguas flexionais. Santiago (2001) afirma que as Línguas Bantu podem ser consideradas do tipo aglutinante porque na sua maioria, as palavras são formadas pela aglutinação de morfemas, e cada morfema representa uma unidade significativa, para determinar por ex: os substantivos, o gênero, o diminutivo, plural, verbos, etc...), ou seja, os afixos se unem a raiz, porém mantendo a identidade fonológica dos morfemas. (SANTIAGO, 2001, pag. 28). 4

dividida em sete grupos linguísticos, dentre eles o grupo das Línguas Bantu. O mapa da imagem 2 apresenta a área em que as línguas Bantu se distribuem no território africano. Imagem 2 Área das Línguas Bantu Segundo Ngunga (2004) o grupo Bantu contém aproximadamente 600 línguas faladas por cerca de 220 milhões de pessoas. Além disso, essas línguas são classificadas em um mesmo grupo devido a características semelhantes. Segundo o autor, algumas dessas características perpassam por questões tais como: (i) terem um sistema de gêneros gramaticais, que não referenciam à noção de sexo, em que os indicadores de gênero devem ser prefixos; (ii) possuírem classes organizadas em pares que geralmente opõem o singular ao plural de cada gênero; (iii) serem dotadas de um vocabulário comum a outras línguas pressupondo uma língua comum de origem; (iv) terem um conjunto de radicais invariáveis a partir dos quais, por meio da aglutinação de afixos, a maior parte das palavras é formada. Guthrie (1967-71) dividiu e classificou tais línguas, geográfica e genealogicamente agrupando-as nas zonas apresentadas pelo mapa abaixo em que se pode visualizar exatamente onde o Rhonga é falado. 5

Imagem 3 Zonas e grupos de línguas Bantu Em Moçambique encontram-se hoje 20 línguas Bantu espalhadas por todo o território, contidas nas zonas G, P, N e S. A seguir apresentaremos a língua de trabalho Rhonga, classificada por Guthrie (1967-71) como S.54, conforme a imagem 3. 6

2.2 A Língua Rhonga ou o Xirhonga 8 O Rhonga é uma língua falada em Moçambique por cerca de 650 mil falantes. Segundo Bachetti (2006), esta língua pertence ao subgrupo linguístico Tsonga, juntamente com as línguas Changana e Tshwa, predominante nas províncias de Maputo, Gaza a Inhambane, ao sul de Moçambique. Além de destas línguas, nestas províncias também se falam outras línguas de outros grupos. A língua Rhonga está concentrada principalmente na Província e na Cidade de Maputo. É importante ressaltar que não é tarefa simples fazer o mapeamento exato da localização dessa língua devido ao intenso deslocamento de pessoas que começou nos tempo colonial que buscavam trabalho e educação no maior centro urbano do país, e intensificou-se com a guerra de 1976 a 1992, por ser o local que oferecia melhor segurança e melhores condições de vida. O contato entre os povos, impulsionado por esses fatores, resulta em uma mistura linguística. O Rhonga e o Changana encontram-se hoje muito próximos e inter-relacionados, com misturas e empréstimos recíprocos entre uma e outra línguas. De acordo com Bachetti (2006) o Rhonga compreende quatro variantes, a saber: (i) Xilwandle ou Xikalanga, falada no distrito da Manhiça, (ii) Xinondrwana, falada em Marracuene, Maputo, Matola e Boane, (iii) Xizingili ou Xiputru, falada desde katembe até Ponta do Ouro e (iv) Xihlanganu, falada na Moamba-sede e parte do distrito de Namaacha. A imagem 3, a seguir, indica aproximadamente a localização da língua Rhonga. 8 O termo Xirhonga pode ser decomposto da seguinte forma: o morfema [{xi-} + radical do nome do povo]. Tal morfema pertence à classe 7. No contexto em que o prefixo {xi-} coocorrer com o radical que se refere ao nome de um povo, a acepção do substantivo gerado nesse processo derivacional designará a língua ou o costume desse povo. Mais especificamente, Rhonga é o nome do povo e Xirhonga é a língua do povo Rhonga. 7

Imagem 3 Localização da língua Rhonga A variante de referência e que será utilizada para este estudo é o Xinondrwana, já que é a de maior abrangência territorial. 3. Sistema de Classes Nominais A noção de classes nominais é de extrema importância para a compreensão dos fenômenos nas línguas Bantu, como por exemplo, a diminutivização. Segundo Heine, Vossen, Lambert & Reh (1982), dois terços das línguas africanas possuem classes nominais. O critério mais importante na subclassificação desse sistema é a divisão entre gênero linguístico, baseado na distinção de sexo feminino e masculino dentro da classe linguística a que pertence. A este estudo importa essa última, já que em Rhonga o 8

sistema de classes é baseado na natureza do nome (nature-based), e leva em consideração a sua semântica. O número de classes naturais pode variar entre dois e quarenta. Mais de quatrocentas línguas africanas usam esse sistema, mas, segundo Heine, Vossen, Lambert e Reh (1982), ele é restrito à família Congo-Kordofoniana. O sistema de classes pode também ser distinguido entre marcado e não marcado. O marcado tem obrigatoriamente marca de classe no nome e pode ser marcada por sufixos, prefixos, ambos ou por meio de tons. Segundo Bachetti (2006), em Rhonga existem dezesseis classes nominais marcadas por prefixação. Os prefixos das classes nominais provêm hipoteticamente de um Bantu Comum reconstruído por Guthrie (1967). Como as línguas sofrem alterações no decorrer do tempo, alguns prefixos nem sempre aparecem nos nomes, podendo ser modificados ou até mesmo desaparecer nas classes que indicam singular. No que se refere às classes nominais que indicam plural, os prefixos estão presentes com regularidade. A tabela abaixo compara os prefixos do Bantu Comum com os do Rhonga: 9

Tabela 1: Prefixos de Classes Nominais FONTES: Guthier (1967) e Bachetti (2006) Classes Prefixos Bantu Comum (Guthier 1967) Xirhonga (Bachetti 2006) 1 *mu- mu- 2 *ba- va- 3 *mu- mu- 4 *mi- mi- 5 *i- dri- 6 *ma- ma- 7 *ki- xi- 8 *bi- swi- 9 *N- yi- 10 *N- ti- 11 *du- li- 12 *tu- 13 *ka- 14 *bu- wu- 15 *ku- ku- 16 *pa- ha- 17 *ku- ku- 18 *mu- mu- 19 *pi- Para além dos dados apresentados acima, há autores que divergem em relação aos prefixos apresentados e sua ortografia. Ngunga (2004) apresenta o prefixo da classe 5 como {li-} e o prefixo da classe 8 como {svi-}, e indica a realização da classe 21 com o prefixo {ji-}. Essas divergências não fazem parte do escopo deste trabalho. No entanto, é relevante o fato de que para todos os autores consultados, as classes 12, 13 e 19 não se realizam em Rhonga, sendo essas classes tradicionalmente utilizadas na 10

diminutivização de nomes em outras línguas Bantu. O critério utilizado para a designação das classes nominais consiste, via de regra, em agrupar os nomes de acordo com seus traços semânticos, conforme a tabela abaixo: Nº Prefixo Nominal Denominação Categoria Gramatical Significado 1 {mu-} mu pessoas SG de 2 2 {va-} va pessoas PL de 1 3 {mu-} mu plantas SG de 4 4 {mi-} mi plantas PL de 3 5 {dri-} dri frutos SG de 6 6 {ma-} ma frutos e líquidos PL de 5 e 14 7 {xi-} xi instrumentos SG de 8 8 {swi-} swi instrumentos PL de 7 9 {yi-} yi animais PL de 9 e 11 10 {ti-} ti animais e coisas longas SG de 10 11 {li-} li coisas longas SG de 10 14 {wu-} wu abstratos e líquidos N e SG de 6 15 {ku-} ku verbos N 16 {ha-} ha locativos N 17 {ku-} ku locativos N 18 {mu} mu locativos N FONTE: Bachetti (2006) Diferentemente das demais, as classes 16, 17 e 18, que indicam locativos, podem se manifestar também como infixos ou no fim da palavra. O critério semântico de classificação de classes nominais não parece ser capaz de explicar fielmente o agrupamento dos nomes nas suas respectivas classes. Mesmo que haja recorrência de algumas categorias semânticas dentro das classes, são raríssimas as classes em que aparecem apenas nomes de uma mesma categoria semântica. Muitos nomes que deveriam se encaixar em alguma classe x pertencem a outra classe y, seja por mudanças semânticas ou por substituição de seus prefixos. 11

Como evidência das asserções acima, é que há nomes de animais que se encontram nas classes 7 e 8, como é o caso de xipixi gato e svipixi gatos, o que contradiz o critério semântico de que os animais se distribuem nas classes 9 e 10. Além disso, as classes 9 e 10 acolhem palavras como yimpi guerra e tiyimpi guerras que, naturalmente, não se enquadram nessa semântica. 4. Diminutivização em Rhonga 4.1 Contextos Gerais Nas línguas Bantu há os prefixos nominais que tradicionalmente desempenham essa função, são eles {xi-} e {svi-} (classes 7 e 8), {ka-} e {tu-} (classes 12 e 13) e {pi-} (classe 19). Há também os morfemas diminutivos {-nyana} ou {-ana}, resultantes do processo de gramaticalização de {*-yana} que, segundo Dimande (2012), significava criança no Proto Banto. Em Rhonga, os afixos descontínuos {xi-...-ana} e {svi-...-ana} denotam diminutivização no singular e no plural, respectivamente, de acordo com os exemplos abaixo. (1a) n w-ana SG-filho Filho (1c) v(a)-ana PL-filho Filhos (1b) xi-n wan(a)-ana DIM-filho-DIM2 Filhinho (1d) svi-n wan(a)-ana DIM1-filho-DIM2 Filhinhos (2a) n-guluve SG-porco Porco (2c) ti-nguluve PL-porco Porcos (2b) xi-nguluv(e)-ana DIM1-porco-DIM2 Porquinho (2d) svi-nguluv(e)-ana DIM1-porco-DIM2 Porquinhos 12

Observa-se nos exemplos (1) e (2) que o morfema circunfixal {xi-...-ana} é acrescentados à base nominal com o intuito de produzir a diminutivização dos itens lexicais n wana criança e nguluve porco. O curioso é que para a realização da diminutivização no plural, o circunfixo {svi-...-ana}é acrescentado aos substantivos em sua forma singular e não no plural. Mais especificamente, a unidade gramatical {svi-...-ana} atribui dois traços distintivos, a saber [+DIMINUTIVO] e [+ PLURAL]. Além disso, os prefixos nominais {-va} e {-ti} 9 também portam o traço [+PLURAL]. Adicionalmente, seguindo o Princípio do Contorno Obrigatório (OCP 10 ), não deve haver a ocorrência de traços idênticos em adjacência. Por isso, a língua evita tal redundância por meio do circunfixo {svi-...-ana} juntamente com o tema nominal no singular em detrimento dos prefixos {-va} e {-ti} com o radical no plural. Tais afirmações são corroboradas pela agramaticalidade de (3b). 9 Prefixos de classe 2 e 10, respectivamente. 10 Abreviatura de Obligatory Contour Principle. O Princípio de Contorno Obrigatório, proposto inicialmente por Leben (1973) é uma hipótese fonológica que estipula que certos traços idênticos e consecutivos são rejeitados nas representações superficiais. 13

(3a) ti-nguluve PL-porco Porcos (3b) *svi-ti-nguluv(e)-ana DIM1-PL-porcos-DIM2 Porquinhos Uma suposta violação ao Princípio de Contorno Obrigatório pode ser vislumbrada por meio do exemplo em (4b). (4a) v(a)-ana PL-filho Filhos (4b) svi-va-(a)na-ana DIM1-PL-filho-DIM2 Filhinhos O dado em (4b) parece violar o princípio fonológico já estipulado. Porém a análise pode ser mantida pelo motivo que passamos a descrever: uma vez que a língua não admite temas cujo padrão seja monossilábico, o pré-prefixo de número é mantido em palavras com menos de duas sílabas e reanalisado como parte do tema nominal. Esse afixo deixa de codificar quantificação e passa a fazer parte do tema preservando o padrão silábico -CVCV, Nessa linha de investigação, o morfema circunfixal {svi-...-ana} ocorre com um tema nominal no singular contrariando a análise morfológica de (4b) e o Princípio de Contorno Obrigatório continua sendo observado. Observe a reanálise do dado (4b) em (4c) abaixo. (4c) svi-van(a)-ana DIM1-filho-DIM2 Filhinhos Além do mais, nos contextos em que a língua forma plurais por substituição 11 o pré-prefixo singular reanalisado pode permanecer na formação do diminutivo circunfixal e emergirá a forma superficial com o afixo gramaticalizado no singular. Por isso, ficará a critério do falante a utilização de uma ou outra forma, conforme o par de dados abaixo. 11 Chomsky (1965) afirma que concatenação é um instrumento linguístico cuja finalidade é a de formar sequências de elementos numa estrutura linear. Adicionalmente, Langa (2000), em conformidade com Hyman (1975) e Ngunga (2000), afirma que alguns sons podem sofrer alterações de acordo com o contexto nos quais ocorre. Tais modificações tem o intuito de fazer com que a linearidade obedeça a critérios fonéticos. Assim, de acordo com os autores, há pelo menos três expedientes para se formar sequências concatenadas, a saber: substituição, adição e elisão. No primeiro subtipo, um som ocupa o lugar de outro; no segundo, um é acrescido ao outro e; no terceiro, um sofre elisão em detrimento de outro. 14

(5a) svi-van(a)-ana DIM1-filho-DIM2 Filhinhos (5b) svi-n wan(a)-ana DIM1-filho-DIM2 Filhinhos Assim, (5a) e (5b) podem ser consideradas paráfrases temáticas nos termos de Baker (1988), porque ainda que existam importantes diferenças entre as duas variantes, as relações semânticas/temáticas se mantém nas duas variantes. Mais especificamente, expressam a mesma proposição. 4.2 Palavras terminadas em A, E e I Quando ocorrem em posição final de palavras, as vogais a, e e i sofrem elisão no processo de afixação da marca de diminutivização. Esse processo ocorre para evitar hiatos desnecessários na língua. Dessa forma, o sufixo {-ana} é acrescentado na íntegra elidindo as vogais finais, conforme os exemplos abaixo: A (6a) wanuna homem Homem (6b) xi-wanun(a)-ana DIM1-homem-DIM2 Homenzinho (7a) jaha rapaz Rapaz (7b) xi-jah(a)-ana DIM1-rapaz-DIM2 Rapazinho (8a) thanga coxa Coxa (8b) xi-thang(a)-ana DIM1-coxa-DIM2 Coxinha E (9a) ndleve orelha Orelha (9b) xi-ndlev(e)-ana DIM1-orelha-DIM2 Orelhinha (10a) nenge perna 15

Perna (10b) xi-neng(e)-ana (11a) phaphalate borboleta Borboleta DIM1-perna-DIM2 Perninha (11b) xi-phaphalat(e)-ana DIM1-borboleta-DIM2 Borboletinha I (12a) mirhi corpo Corpo (13a) boti barco Barco (14a) mbuti cabrito Cabrito (12b) xi-mirh(i)-ana DIM1-corpo-DIM2 Corpinho (13b) xi-bot(i)-ana DIM1-barco-DIM2 Barquinho (14b) xi-mbut(i)-ana DIM1-cabrito-DIM2 Cabritinho Os exemplos de (6) a (14) mostram que a diminutivização das palavras terminadas em a, e e i em Rhonga é realizada por meio do acréscimo do morfema circunfixal {xi-...ana} elidindo-se a vogal final do tema nominal de origem. 4.3 Palavras terminadas em O e U Quando ocorrem em posição final de palavras, as vogais o, e u são semivocalizadas 12 no processo de afixação da marca de diminutivização através do acréscimo do afixo descontínuo {xi-...-ana}. Esta semivocalização resulta do desencadeamento do processo de resolução do hiato formado entre as vogais finais dos temas nominais e a vogal do sufixo, conforme os exemplos abaixo: 12 De acordo com Cristal (1980a), semivocalização é o fenômeno que consiste na passagem de uma consoante ou vogal a semivogal. Tal processo ocorre em posição de fronteira de sílaba e pode ser representada por esta sequência, típica de alguns dialetos do Brasil, tais como Como exemplo brasi[l] > brasi[w]. Para Langa, acompanhando Katamba (1989) e Hyman (1975), semivocalização é a perda do traço [+sil] por um segmento vocálico. LANGA (2012, p. 69). 16

O (15a) nholoko cabeça Cabeça (16a) tinyo dente Dente (17a) huko galinha Galinha (15b) xi-nhlokw-ana DIM1-cabeça-DIM2 Cabecinha (16b) xi-tinyw-ana DIM1-dente-DIM2 Dentinho (17b) xi-hukw-ana DIM1-galinha-DIM2 Galinhinha U (18a) mhunu pessoa Pessoa (18b) xi-mhunw-ana DIM1-pessoa-DIM2 Pessoinha (19a) mbilu coração Coração (19b) xi-mbiliw-ana DIM1-coração-DIM2 Coraçãozinho (20a) ndlapfu elefante Elefante (20b) xi-ndlapfw-ana DIM1-elefante-DIM2 Elefantinho Os exemplos de (15) a (20) confirmam que há semivocalização no processo de resolução de hiato quando há diminutivização de palavras terminadas em o e u. 4.4 Palavras Terminadas em -ANA Nas palavras terminadas em -ana, há a substituição da terminação da palavra pelo infixo <at> e o acréscimo do morfema descontínuo sufixo {xi-...-ana} ou {svi-...-ana} conforme o contexto exigir. Isso ocorre para não haver a repetição da segunda parte do circunfixo diferenciando, assim, as palavras da classe 7 e 8 terminadas em -ana dos seus respectivos diminutivos. Seguem os exemplos abaixo: 17

(21a) muhongolwana golfinho Golfinho (22a) nghwayana prostituta Prostituta (21b) xi-hongolw-at-ana DIM1-golfinho-SUBST-DIM2 Golfinho pequeno (22b) xi-nghwayn-at-ana DIM1-prostituta-SUBST-DIM2 Prostitutazinha O exemplo em (21b) mostra a introdução do infixo <at> em nomes do Rhonga que terminam em -ana. Em (22) apresentamos um exemplo de nomes da classe 7 que termina em -ana e o acréscimo de <at> ao complexo morfológico, para se diferenciar a palavra inicial de seu respectivo diminutivo. 4.5 Palavras das Classes 7 e 8 4.5.1 Palavras das Classes 7 e 8 com mais de duas sílabas Quando o nome pertence às classes 7 e 8, logo, possui os prefixos {xi-} ou {svi-}. Assim, a primeira parte do morfema circunfixal não necessita ser acrescida. Isso evita repetições desnecessárias. Apenas a parte final do morfema discontínuo, a saber: {- ana} é inserida na palavra. Dessa forma, tanto as funções de marca de diminutivo, quanto as funções de prefixo de classe, são realizadas de forma sincrética em apenas um morfema, a saber, {xi-} ou {svi-}. Nessa linha de investigação, palavras pertencentes às classes nominais 7 e 8 tornam-se agramaticais quando recebem integralmente os circunfixos de diminutivização {xi-...-ana} ou {svi-...-ana}, conforme os exemplos abaixo. (23a) xikoxa velho Velho (23b) xikox(a)-ana velho-dim Velhinho (23c) *xi-xikox(a)-ana DIM1-velho-DIM2 Velhinho (24a) xipixi gato Gato (24b) xipix(i)-ana gato-dim Gatinho (24c) *xi-xipix(i)-ana DIM1-gato-DIM2 Gatinho 18

(25a) svikoxa velhos Velhos (25b) svikox(a)-ana velhos-dim Velhinhos (25c) *svi-svikox(a)-ana DIM1-velhos-DIM2 Velhinhos (26a) svipixi gatos Gatos (26b) svipix(i)-ana gatos-dim Gatinhos (26c) *svi-svipix(i)-ana DIM1-gatos-DIM2 Gatinhos 4.5.2 Temas nominais monossilábicos das classes 7 e 8 Segundo Dimande (2012) nos temas nominais monossilábicos das palavras das classes 7 e 8 há acréscimo e repetição dos prefixos {xi-} e {svi-} com o intuito de se garantir e estrutura -CVCV do tema nominal, conforme os exemplos abaixo: (27a) xiva casa Casa (28a) sviva casas Casas (29a) xipho lontra Lontra (27b) xi-xiv(a)-ana DIM1-casa-DIM2 Casinha (28b) svi-xiv(a)-ana DIM1-casa-DIM2 Casinhas (29b) xi-xiphw-ana DIM1-lontra-DIM2 Lontrinha Dessa forma, quando as palavras possuem temas nominais monossilábicos é permitido que haja repetição dos prefixos {xi-} e {svi-} garantindo a estrutura básica da palavra. Além disso, consoante Dimande (2012), cada morfema garante uma função, o primeiro indica gênero do nome e o segundo a marca de diminutivo. 19

4.6 Diminutivização Sintática Existem casos em Rhonga em que a diminutivização por meio do acréscimo de afixos resulta em construções mal formadas, conforme os exemplos abaixo: (30a) mamana mãe Mãe (31a) tanana pai Pai (30b) *xi-mam(a)-at-ana DIM1-mãe-SUBST-DIM2 Mãezinha (31b) *xi-tat(a)-at-ana DIM1-pai-SUBST-DIM2 Paizinho (32a) makwavu irmão Irmão (32b) *xi-makwavw-ana DIM1-irmão-DIM2 Irmãozinho Uma vez que a diminutivização de alguns nomes por meio da estratégia de circunfixal resulta em itens agramaticais, a língua em análise serve-se de outro expediente, a saber: a diminutivização sintática. Ou seja, um item lexical independente e invariável irá atribuir o traço [+DIMINUTIVO] ao nome a que se refere. Note os exemplos abaixo. (33a) mamana mãe Mãe (33b) mamana mãe Mãezinha ntrongo pequeno (34a) tanana pai Pai (34b) tanana pai Paizinho ntrongo pequeno (35a) makwavu irmão Irmão (35b) makwavu ntrongo irmão pequeno Irmãozinho 20

Os exemplos de (33) a (35) deixam mostrar que a diminutivização de nomes que não podem ser diminuídos por afixos é realizada por meio da palavra ntrongo, uma estratégia sintática e não morfológica. De acordo com Chilaule (2014), em comunicação pessoal, a tradução desses dados remete ao significado de pequeno, não em termos da pequenez do objeto nomeado, mas sim com a acepção afetiva. Tal assertiva conforma-se com a acepção hipocorística afetiva conforme de Debois (2001), tal como acontece com o sufixo {-zinho/a} em Português. 5. Considerações finais Neste artigo, foi nosso objetivo descrever e examinar as construções diminutivas na língua Rhonga, a qual pertence ao grupo linguístico Bantu. Mostrámos que a diminutivização pode ser realizada por meio de duas estratégias básicas, uma morfológica e outra sintática. A primeira consiste no emprego do morfema circunfixal {xi-...ana} e {svi-...ana}. Essas unidades gramaticais denotam diminutivização no singular e no plural, respectivamente. Demonstramos que, de acordo com o Princípio de Contorno Obrigatório, para a realização da diminutivização no plural, o circunfixo {svi-...-ana}é acrescentado aos substantivos no singular e não no plural. Notou-se ainda que, nos nomes monossilábicos cujo par singular/plural é construído por meio de substituição, o pré-prefixo é preservado com o intuito de se manter o padrão estrutural -CVCV. Além disso, a leitura quantificacional desse pré-prefixo é neutralizada no processo morfofonológico. Por isso ele pode ser preservado tanto o singular quanto o plural, mas sua a leitura será, via de regra, singular. Desta maneira, duas formas superficiais poderão ser geradas constituindo-se em paráfrases temáticas (cf. Baker 1988). Com isso, o Princípio de Contorno Obrigatório não é violado. Averiguamos ainda o comportamento da diminutivização das palavras de acordo com a terminação do tema nominal. Especialmente, as palavras pertencentes às classes nominais 7 e 8 com mais de duas sílabas, apenas a parte final do morfema descontínuo pode ser adicionado uma vez que elas já possuem os prefixos {xi-} ou {svi-}. Já quando os temas forem monossilábicos, nas classes 7 e 8, há acréscimo e repetição dos prefixos {xi-} e {svi-}. No componente sintático, a língua recorre à palavra ntrongo pequeno na acepção afetiva conforme Debois (2010). Este último pode ser considerado um adjetivo 21

qualificativo nos termos de Cunha & Cintra (1984), Moura Neves (2000), Bachetti (2006) e outros. Por fim, observamos que o processo de formação de palavras diminutivas com conotação afetiva pode se servir do expediente de diminutivização sintática por meio da palavra ntrongo pequeno. Referências Bibliográficas BACHETTI, Cláudio. 2006. Gramática da Língua Ronga. Paulinas Editorial. Maputo. BAKER, Mark Cleland. Incorporation: A Theory of Grammatical Function Changing. University of Chicago Press Chicago, 1988. CHOMSKY, Noam. Aspects of the Theory of Syntax. Cambridge: The MIT Press, 1965. DE BELDER, Marijke, FAUST, Noam & LAMPITELLI Nicola. On a low and a high diminutive: Evidence from Italian and Hebrew. (2014) The syntax of roots, the roots of syntax. A. Alexiadou, H. Borer & F. Schaefer (eds.). Oxford, OUP. CHILAULE, Stelio. (2014). Arquivo Pessoal. Não Publicado. CUNHA, Celso & CINTRA, Lindley. (1984). Nova Gramática do Português Contemporâneo. Lisboa: João Sá da Costa (8ª edição, Lisboa: João Sá da Costa,1991) DIMANDE, Ernesto (2012). A Morfofonologia da Diminutivização em Xirhonga. Universidade Eduardo Mondlane. Dissertação de Mestrado inédita. 123 p. DUBOIS, Jean et ali. Dicionário de Linguística. 8ª Edição Tradução Federico Pessoa de Barros. São Paulo. Cultrix, 2001. GREENBERG, Joseph Harold. (1963) Some universals of grammar with particular reference to the order of meaningful elements. In Universals of Language. Cambridge: MIT Press. pp. 73 113. GUTHRIE, Malcolm (1967 71) Comparative Bantu: an introduction to the comparative linguistics and prehistory of the Bantu languages. 4 vols. Farnborough: Gregg Press. HYMAN, Larry. 1975. Phonology: Theory and Analysis. San Francisco: Holt, Rinehart and Winston. HEINE, Bernd, VOSSEN, Rainer, LAMBERT, Michael. & REH, Mechthild. 1982. A Typology of African Languages. In Recent German Research on Africa: Lenguage and Culture: Deutsche Forschungsgemeinschaft, Bonn. 22

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