Diretrizes no Tratamento do Câncer Obstrutivo do Cólon Esquerdo
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- Thalita de Abreu da Costa
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1 CAPÍTULO 6 Diretrizes no Tratamento do Câncer Obstrutivo do Cólon Esquerdo q Luca Ansaloni q Fausto Catena q Bruno Monteiro Tavares Pereira Introdução A maioria dos casos de obstrução aguda do cólon é secundária ao câncer colorretal. Até 20% dos pacientes com diagnóstico de câncer de cólon apresentam sintomas de obstrução aguda 1-4. A cirurgia de emergência para obstrução aguda do cólon está associada a um risco significativo de morbidade e mortalidade e com uma alta porcentagem de criação de estoma (temporário ou permanente) 1,2,5,6. Considerando que as obstruções do lado direito do cólon são geralmente tratadas por uma fase de ressecção com anastomose primária para todos os pacientes 1, controvérsia continua a girar em torno do manejo de emergência do câncer de cólon esquerdo obstrutivo (OLCC). Na verdade, várias opções para OLCC estão disponíveis (Figura 6.1): colostomia em alça (C) ou ileostomia em alça com posterior ressecção (procedimento em dois ou três estágios); ressecção primária com colostomia: procedimento de Hartmann (HP); ressecção e anastomose primária (PRA): colectomia total/subtotal (TC); colectomia segmentar (SC): com irrigação do cólon intraoperatória (ICI); com descompressão manual (MD). stent metálico autoexpansível endoscópico do cólon (SEMS): paliação; ponte para a cirurgia. Coloproctologia seção i 1
2 2 ATUALIDADES EM CLÍNICA CIRÚRGICA - INTERGASTRO E TRAUMA 2012 Opções de Tratamento para a OLCC 1. Colostomia simples com tratamento estagiado 2. Ressecção primária com colostamia terminal (procedimento de Hartmann) 3. Ressecção e anastomose no mesmo tempo cirúrgico A. Colectomia total/ subtotal B. Colectomia segmentar B1. Irritação colônica intra-operatória B2. Descompressão manual sem irrigação 4. Stent colônico A. Paliação B. Ponte para cirurgia Figura 6.1 Opções de tratamento para a OLCC. A conferência World Society of Emergency Surgery (WSES) and Peritoneum and Surgery (PnS) Society teve como objetivo avaliar a literatura disponível para gerar recomendações baseadas em evidência sobre o manejo do OLCC. É importante mencionar, entretanto, que as sugestões provenientes deste estudo não são substitutas do julgamento clínico. Métodos Foram consultados manuscritos específicos sobre OLCC no PubMed e na Cochrane publicados antes de abril de As seguintes palavras-chave foram utilizadas: neoplasia do cólon, obstrução intestinal, stents, colectomia. Além disso, termos de texto foram utilizados em combinação, tais como: obstrução colônica, stents cólon, operação de Hartmann, irrigação do cólon, colostomia, anastomose. Não houve restrição de idioma. A função artigos relacionados no PubMed foi usada e as referências dos artigos recuperados foram revisadas. Inicialmente, o presidente (Dr. Ari Leppaniemi) e membros da comissão colaboraram para a preparação de um projeto de declarações preliminares. Subsequentemente, o presidente, os membros da comissão e especialistas de renome mundial no campo reuniram-se para um consenso na conferência sobre OLCC durante o 1 o Congresso Mundial de Sociedade Mundial de Cirurgia de Emergência e da IX Reunião da Sociedade de Cirurgia e Peritônio (PNS) (Bolonha, Itália, julho de 2010). Durante a conferência, cada membro da comissão apresentou um resumo das provas disponíveis para cada uma das opções de tratamento delineadas na Figura 1.
3 DIRETRIZES NO TRATAMENTO DO CÂNCER OBSTRUTIVO DO CÓLON ESQUERDO 3 Os dados disponíveis a partir de revisão de literatura foram analisados e graduados de acordo com o nível de evidência validado pelo sistema de recomendação do American College of Chest PhysICIans (ACCP) (Tabela 6.1) 7,8. Essas apresentações serviram para lançar uma discussão sobre o melhor manejo do OLCC. Após exaustiva discussão, a comissão foi convidada a redigir recomendações finais. Os coordenadores fundiram um comitê de declarações preliminares com as observações e recomendações do painel, e tiveram a responsabilidade de resumir a discussão sobre padrões de tratamento para OLCC, que foram apresentados no manuscrito: Ansaloni e cols. Guidelines in the management of obstructing cancer of the left colon: consensus conference of the world society of emergency surgery (WSES) and peritoneum and surgery (PnS) society. World Journal of Emergency Surgery 2010:5:29-. Tabela 6.1 Graus de Recomendação Segundo a ACCP (American College of Chest Physicians) Grau de Recomendação Risco-benefício Metodologia da Evidência Suporte Implicações 1 A Conhecido 1 B Conhecido 1 C + Conhecido 1 C Conhecido 2 A Desconhecido 2 B Desconhecido 2 C Desconhecido ECR sem importantes limitações ECR com importantes limitações (p. ex., resultados inconsistentes) ECR com resultados equivocadamente interpretados/ensaios clinicos não randomizados Estudo observacional ECR sem importantes limitações ECR com importantes limitações (p. ex., resultados inconsistentes) Estudo observacional Forte recomendação, servindo para a maioria dos pacientes na maior parte das circunstâncias sem complicações Forte recomendação, aplicável à maioria dos pacientes Forte recomendação, aplicável à maioria dos pacientes na maioria das circunstâncias Recomendação intermediária, pode variar quando disponível evidência com forte recomendação Recomendação intermediária, a melhor ação pode diferenciar dependendo das circunstâncias/pacientes ou valores sociais Fraca recomendação, intervenções alternativas podem ser melhores para alguns pacientes em determinadas circunstâncias Recomendação muito fraca; outras alternativas são aconselhadas
4 4 ATUALIDADES EM CLÍNICA CIRÚRGICA - INTERGASTRO E TRAUMA 2012 Resultados Colostomias em Alça (C) com Procedimento Estagiado vs. Procedimento de Hartmann (HP) Colostomia em alça é um componente histórico do esquema terapêutico estagiado para OLCC. No primeiro estágio, a obstrução é manejada pela colostomia. O segundo estágio ocorre algumas semanas depois, quando o tumor é ressecado e a colostomia é fechada (dois estágios) ou, alternativamente, a colostomia pode ser encerrada em uma terceira fase. Atualmente, existe apenas um estudo clinico randomizado, realizado por Kronborg e cols. 9, em 1995, comparando colostomia de emergência com três procedimentos estagiados (58 pacientes) versus HP (63 pacientes) para OLCC. Os autores mostraram nenhuma diferença em termos de mortalidade (8/58 vs. 8/63 pacientes) taxa de morbidade, taxa de recorrência e sobrevivência câncer-específica, o tempo de permanência no hospital foi menor no grupo ressecção 9. No entanto, este estudo tem algumas limitações importantes devido a falhas metodológicas: não estima o tamanho da amostra; procedimentos realizados por 36 cirurgiões assistentes e em treinamento; acompanhamento incompleto; patologia subjacente heterogênea (com restrições não malignas, respondendo por 14% dos casos). Anteriormente, Fielding e cols. 10, em 1979, publicaram um estudo prospectivo não randomizado (PNRS) que mostrou a taxa de mortalidade igual para ambos os grupos 10, porém o estudo foi afetado pelo forte viés de seleção. Uma revisão sistemática da Cochrane em 2008, realizada por De Salvo e cols. 11, comparou o procedimento estagiado vs. ressecção primária, e encontrou semelhante mortalidade em ambas as estratégias terapêuticas 11. Deve ser observado que o estudo Kronborg 9 foi excluído por fraqueza metodológica. Em teoria, vários benefícios poderiam estar associados à criação de uma colostomia em alça: fornece descompressão do cólon; minimiza o trauma cirúrgico; reduz o risco de contaminação a partir de intestino despreparado; permite estadiamento e avaliação multidisciplinar antes do tratamento definitivo. Nossa revisão da literatura revela que C não fornece qualquer benefício a curto ou a longo prazo sobre a HP, enquanto múltiplas operações estão associadas a maior tempo global de internação: 49 dias no grupo C contra 35 dias no grupo HP (p = 0,01), e finalmente a abordagem em estágios mostra uma não significativa tendência para expor o paciente a maior morbidade cumulativa em resultado de múltiplas cirurgias 9. Recomendação: HP deve ser preferida à C para OLCC, uma vez que C demonstra estar associada a maior tempo de internação hospitalar e necessidade de múltiplas operações, mas não com uma redução na morbidade perioperatória (grau de recomendação 2B). Conselho: o papel do procedimento em estágios, com preferência à operação de dois estágios, deve ser considerado: 1. na situação clínica em que uma abordagem cirúrgica como controle de danos pode ser aplicada, como acontece no cenário do trauma; 2. quando a terapia multimodal neoadjuvante pode ser aplicada; ou 3. no caso de tumor irressecável.
5 DIRETRIZES NO TRATAMENTO DO CÂNCER OBSTRUTIVO DO CÓLON ESQUERDO 5 Procedimento de Hartmann (HP) vs. Ressecção Primária e Anastomose (PRA) Não há ensaios clínicos randomizados comparando HP e PRA, assim nem classe A e B de evidência disponível. Em 2004, Meyer e cols. 6, através de um estudo randomizado prospectivo não multicêntrico, compararam, no cenário de emergência, 213 pacientes submetidos a HP e 340 pacientes submetidos a PRA para OLCC. A taxa de mortalidade no caso do tratamento paliativo para HP e PRA, respectivamente, foi de 33% contra 39% e em caso de intenção curativa para HP e PRA, respectivamente 7,5% vs. 9,2%, porém ambos sem diferença estatística; também a taxa de morbidade não foi significativamente diferente entre os grupos, e finalmente a HP foi a mais frequente opção cirúrgica 6. Os autores fizeram um substancial esforço no planejamento do estudo, da coleta e análise dados, contudo, o número de instituições participantes foi muito elevado (309) e heterogêneo, abrangendo desde hospitais regionais até hospitais universitários. Finalmente, dentre os estudos prospectivos não randomizados e retrospectivos, as taxas de fístula anastomótica em pacientes com OLCC tratados com PRA varia de 2,2% a 12% 5,6,12-14, semelhantes às relatadas para cirurgia eletiva, variando de 1,9% a 8% Além disso, a nossa revisão da literatura sugere que o HP pode estar associado a piores resultados a longo prazo. Villar e cols. 13, em 2005, publicaram um estudo prospectivo não randomizado comparando HP (n = 20 pacientes) com PRA (n = 35 pacientes) divididos em colectomia segmentar (SC) ou colectomia total (TC): eles relataram sobrevida global em 5 anos igual a 38% e 41-45% para HP e PRA (divididos em subgrupos), respectivamente. Porém esta diferença foi provavelmente resultado de um viés de seleção, já que anastomose foi evitada em pacientes de alto risco A ausência de anastomose faz o HP tecnicamente uma operação mais fácil e, obviamente, elimina o risco de deiscência de cólon em um cenário já complexo, como ocorre na obstrução de alto grau: assim, o HP ainda permanece uma opção também adequada por cirurgiões menos experientes e não especializados. A principal desvantagem do HP é claramente a necessidade de uma segunda operação para inverter a colostomia, que será também associada a um risco de deiscência anastomótica semelhante ao da PRA. Além disso, é um pouco decepcionante observar que o índice de reversão do estoma é de apenas 20% naqueles pacientes com câncer de cólon 12,19. A PRA oferece a vantagem de um procedimento definitivo sem a necessidade de nova cirurgia. Suas principais desvantagens estão relacionadas com o maior desafio técnico e o risco potencialmente mais elevado de vazamento anastomótico que pode ocorrer numa situação de emergência. Embora a PRA apareça, pelo menos em teoria, mais atraente que o HP em OLCC, vários parâmetros (paciente e cirurgião relacionados) devem ser levados em consideração antes de escolher o procedimento cirúrgico 5,14,20. A estratificação de risco é a base da seleção de pacientes. Um estudo realizado pela Associação de Coloproctologia da Grã-Bretanha e Irlanda (ACPGBI) sobre a obstrução do intestino grosso causada por câncer colorretal identificou quatro importantes fatores preditores de resultado idade, grau de ASA, urgência operatória e estágio de Dukes 5. Resultados semelhantes foram demonstrados por outros estudos 14,20. Recentes estudos de grande porte demonstraram que a taxa de mortalidade
6 6 ATUALIDADES EM CLÍNICA CIRÚRGICA - INTERGASTRO E TRAUMA 2012 após PRA na obstrução do câncer de cólon direito é maior que a mortalidade após PRA para OLCC 5,14,21, ao passo que outro estudo não mostrou alguma diferença 22. Esses achados podem ser explicados pelo fato de que quase todos os pacientes com obstrução direita são tratados por uma ressecção estagiada e anastomose, enquanto os pacientes com OLCC são cuidadosamente selecionados de acordo com o risco. Tendo em mente essas considerações, o HP poderia ser apropriado para pacientes considerados de alto risco. Além disso, as mesmas considerações poderiam explicar os resultados de um questionário realizado pela Sociedade Americana de Cirurgiões do Aparelho Digestivo, em 2001, que responderam que 67% iriam realizar o HP, e 26%, uma colostomia simples no paciente de alto risco 23. Caso contrário, deveríamos assumir uma falta de aderência à evidência demonstrada na literatura na prática clínica ou dificuldade em mudar a tradição cirúrgica. A experiência e subespecialidade do cirurgião parece ser um fator primordial na escolha de anastomose ou colostomia. Tem sido demonstrado que anastomose primária é mais provável de ser realizada por consultores colorretais em vez de cirurgiões gerais, e por consultores em vez de estagiários supervisionados 20. O estudo ACPGBI mostrou que a taxa de mortalidade após a cirurgia foi similar entre membros e não membros ACPGBI 5. Este resultado pode ser contestado, já que foi questionado a uma população voluntária. O Projeto Câncer no Intestino Grosso mostrou que os participantes tiveram uma taxa de mortalidade maior que os consultores após a ressecção primária em casos de obstrução no final dos anos 1970, e esse resultado manteve-se inalterado 20 anos depois, no estudo de Zorcolo 1,20. Outros estudos também têm demonstrado que estagiários não supervisionados têm significativamente maior morbidade, mortalidade e taxas de deiscência da anastomose 10,24. Recomendação: O HP não oferece nenhum benefício de sobrevida global, comparado à ressecção segmentar do cólon com anastomose primária em OLCC (grau de recomendação 2C); HP deve ser considerado em pacientes com cirurgia de alta risco (grau de recomendação 2C). Ressecção e Anastomose Primária (PRA): Total ou Colectomia Subtotal (TC) vs. Colectomia Segmentar (SC) Existe apenas um estudo clínico randomizado (grupo de estudo SCOTIA) comparando colectomia subtotal versus em irrigação colônica seguida de anastomose, publicado em 1995, que comparou a TC (47 pacientes) vs. SC (44 pacientes) e irrigação colônica intraoperatória (ICI). Não houve diferenças na morbidade, mortalidade geral e taxas de complicações individuais (superficiais e profundas: infecções de sítio cirúrgico, fístulas anastomóticas). Em relação aos resultados de longo prazo, notou-se que os pacientes submetidos a TC tiveram estatisticamente um maior número de evacuações diárias, em comparação com ICI/SC. Os autores concluíram que SC seguida de ICI deve ser, portanto, preferida em relação à TC 25. Outro estudo não randomizado comparando as duas técnicas não demonstrou qualquer diferença na mortalidade, mas mostrou significativamente mais complica-
7 DIRETRIZES NO TRATAMENTO DO CÂNCER OBSTRUTIVO DO CÓLON ESQUERDO 7 ções pós-operatórias cirúrgicas no grupo de ICI, em especial infecções superficiais de sítio cirúrgico 26. TC com anastomose primária (um estágio) em OLCC acaba forçando o cirurgião a trabalhar em um cólon massivamente distendido e carregado 27,28, além disso, a dilatação proximal do cólon torna difícil a detecção de um tumor sincrônico, assim a TC pode inadvertidamente ignorar a necessidade de mais uma operação, especialmente em pacientes gravemente enfermos. No entanto, nós não podemos estender o uso da TC como uma profilaxia de uma futura malignidade ou síndromes de tumores hereditários 27. Na década de 1980, colectomia segmentar com ICI foi sugerida como uma operação alternativa. Tem a vantagem de fazer uma anastomose em um intestino preparado, preservando o cólon normal. As principais preocupações são o prolongamento do tempo operatório, o risco de fístula anastomótica e contaminação, e a necessidade de maior experiência técnica 25. As indicações absolutas para o STC em OLCC são isquemia do cólon direito, laceração serosa ou perfuração do ceco, tumores malignos sincrónicos proximais que ocorrem em 3 a 10% dos casos 27. A maior desvantagem é a ressecção do cólon saudável, resultando em baixos resultados funcionais com muitos pacientes queixando-se de diarreia no pós-operatório 25,27,28. Recomendação: TC para OLCC (sem perfuração cecal ou evidência de certos tumores sincrônicos do cólon) não deve ser mais preferida em relação à SC com ICI, uma vez que os dois procedimentos estão associados à mesma mortalidade/morbidade, enquanto a TC está associada a taxas mais elevadas de prejuízo à função intestinal (grau de recomendação 1A). Ressecção e Anastomose Primária (PRA): Colectomia Segmentar (SC), com Irrigação do Cólon no Intraoperatório (ICI) vs. Colectomia Segmentar (SC) com Descompressão Manual (MD) Lim e cols. 29, em 2005, publicaram o ensaio clínico randomizado comparando apenas ICI (24 pacientes) com MD (25 pacientes) em OLCC. Os autores concluíram que MD é um procedimento mais simples e mais curto que a ICI, e oferece resultados semelhantes em termos de mortalidade, morbidade ou taxas de deiscência anastomótica, mas o estudo foi de pouca força estatística, com casuística muito pequena 29. Em média, a ICI aumenta a duração da cirurgia em pelo menos 1 hora, embora este tempo possa melhorar com o aumento da experiência. Para ultrapassar os problemas da ICI, vários estudos sugerem a ressecção segmentar e anastomose primária somente com MD como uma alternativa segura Esta ideia foi apoiada por vários ensaios clínicos randomizados que compararam o preparo intestinal mecânico a nenhuma preparação em cirurgia aberta eletiva de cólon. Os resultados foram separadamente examinados em nove revisões sistemáticas de ensaios clínicos randomizados da Cochrane 15 e em uma metanálise com sete ensaios clínicos randomizados (ECR) 33. Ambos os estudos concluíram que não há evidências convincentes de que o preparo mecânico intestinal está associado a taxas reduzidas de vazamento da anastomose em cirurgia colorretal eletiva.
8 8 ATUALIDADES EM CLÍNICA CIRÚRGICA - INTERGASTRO E TRAUMA 2012 Finalmente, em 2009, Kam e cols. 34 publicaram uma revisão sistemática sobre ICI vs. MD nas emergências colorretais do lado esquerdo: eles incluíram um ECR, um estudo prospectivo comparativo e cinco séries de casos prospectivos descritivos e concluíram que, embora a força dos estudos seja pobre e estudos prospectivos e randomizados em larga escala sejam desejáveis, nenhuma significância estatística pôde ser mostrada entre os dois procedimentos 34. Recomendação: durante a ressecção segmentar e anastomose primária na OLCC (sem perfuração cecal ou evidência de tumor sincrônico do cólon direito), MD ou ICI pode ser realizada, já que as duas técnicas são associadas à mesma taxa de mortalidade/morbidade. A única diferença significativa é que a MD é mais curta e mais simples. Ambos os procedimentos podem ser realizados, dependendo da experiência/preferência do cirurgião (grau de recomendação 1A). Stents Endoscópicos do Cólon (SEMS) Stents colônicos foram introduzidos na década de 1990 e têm sido utilizados para cuidados paliativos ou como uma ponte para a cirurgia: após a resolução da obstrução com um stent endoscópico, o paciente está devidamente estagiado e pronto para receber tratamento multidisciplinar e, eventualmente, cirurgia eletiva ou semieletiva 35. Paliação: Stents Endoscópicos do Cólon (SEMS) vs. Colostomia (C) Existem três ECRs comparando colostomia vs. SEMS para o alívio da obstrução colônica maligna Xinopulos e cols. 36, em 2004, randomizaram 30 pacientes. No grupo do stent (SEMS) a colocação foi realizada em 93,3% e não houve mortalidade. Em 57% dos pacientes em que o stent foi colocado com sucesso, a obstrução intestinal foi definitivamente resolvida (ou seja, até o óbito). A sobrevida média foi de 21,4 meses no grupo SEMS e 20,9 meses no grupo-controle. A média de internação foi bastante elevada em ambos os grupos e significativamente mais elevada no grupo C: 28 dias versus 60 dias. Este estudo apresentou várias limitações, e o tamanho da amostra pode ter limitado a capacidade de discernir as diferenças entre os grupos 36. Fiori e cols. 37, em 2004, randomizaram 22 pacientes tanto para C ou SEMS: a mortalidade foi de 0% em ambos os grupos, a morbidade foi semelhante. O grupo SEMS retornou ingestão oral em menor tempo, assim como restauração da função intestinal, e de internação. Este estudo também foi limitado pelo tamanho pequeno, simples e pela falta de acompanhamento 37. O ECR multicêntrico DuTCh Stent-in I foi planejado para randomizar pacientes com câncer colorretal incurável para SEMS ou cirurgia: o estudo foi encerrado prematuramente depois que 21 pacientes se matricularam, porque quatro casos do grupo stent foram relacionados a perfurações tardias, resultando em três mortes entre os dez pacientes no grupo SEMS. Não há explicação clara para esta alta taxa de perfuração. Os autores apontaram que os dados de segurança sobre os stents utilizados foram limitados neste estudo (WallFlex, Boston Scientific Natick, MA) 38. Estudos subsequentes utilizando stent Wallflex para obstrução colônica demonstraram uma taxa de perfuração de cerca de 5% 39-42, o que está em consonância com o comumente observado com outros stents 42.
9 DIRETRIZES NO TRATAMENTO DO CÂNCER OBSTRUTIVO DO CÓLON ESQUERDO 9 A viabilidade, segurança e eficácia do SEMS têm sido analisadas por estudos retrospectivos. Existem quatro revisões sistemáticas que analisam o resultado de SEMS para obstrução do intestino grosso, sendo o estudo Sebastian o mais completo e focalizado Foram recuperados 54 estudos, com um total de pacientes e os resultados foram: sucesso técnico de 94%, sucesso clínico de 91%, perfuração do cólon 3,76%, migração do stent em 10%, reobstrução do cólon 10%, mortalidade stent-relacionada de 1% 44. Estes estudos demonstraram que o stent colônico é uma técnica relativamente segura, com altas taxas de sucesso. A influência dos stents do cólon nos resultados oncológicos foi questionada, mas nenhuma resposta está disponível. Vários estudos sugeriram que ressecção primária do tumor com intenção paliativa prolongaria a sobrevida em pacientes com câncer colorretal estágio IV 47,48. No entanto, a força desses estudos retrospectivos é pobre, devido ao desenho do estudo sem terapias adjuvantes uniformes entre os grupos, e a tendência para comparar tumores irressecáveis estágio IV com pacientes com câncer ressecável estágio IV. Por outro lado, vários estudos retrospectivos e comparativos não mostraram nenhuma diferença significativa em termos de sobrevida global após 3 e 5 anos de seguimento, entre a cirurgia de emergência e colocação de stent 49,50. Stents colônicos têm um papel atrativo em uma abordagem multidisciplinar ao câncer de cólon obstrutivo, no entanto, observação clínica próxima é necessária: por exemplo, há um relato na literatura médica de que o stent de cólon pode aumentar o risco de perfuração colônica em pacientes candidatos ao uso de determinadas medicações quimioterápicas (bevacizumab). Assim, de acordo com os autores, tratamentos alternativos com SEMS devem ser considerados nesses pacientes 51. Recomendação: em instalações com capacidade de colocação de stent, SEMS deve ser preferido à colostomia paliativa para OLCC, já que a colocação do stent está associada a similares taxas de mortalidade/morbidade e menor tempo de internação (grau de recomendação 2B). Conselho: os autores sugerem considerar cautelosamente tratamentos alternativos com stent em pacientes elegíveis para terapia baseada em uso de bevacizumab. Ponte para a Cirurgia: Stents Endoscópicos do Cólon e Cirurgias Planejadas versus Cirurgia de Emergência Cheung e cols. 52 publicaram recentemente um ECR que comparou a abordagem endolaparoscópica (24 pacientes) vs. cirurgia convencional aberta (24 pacientes). Em pacientes que foram randomizados para o grupo de cirurgia endolaparoscópica, a colocação de um SEMS para descompressão do cólon foi tentada dentro horas da admissão e colectomia eletiva laparoscópica assistida foi realizada dentro de 2 semanas após a colocação de SEMS. Os pacientes que foram randomizados para cirurgia aberta foram submetidos à de emergência HP ou TC com a ICI no mesmo dia da admissão. Em mais de 3 anos de período de estudo, 50 pacientes foram inscritos e 48 estavam disponíveis para a análise final (24 no grupo da cirurgia aberta e 24 no grupo cirurgia endolaparoscópica).
10 10 ATUALIDADES EM CLÍNICA CIRÚRGICA - INTERGASTRO E TRAUMA 2012 Em geral, apenas seis de 11 pacientes submetidos a HP tiveram reversão posterior do trânsito intestinal; PRA foi realizada em 13 pacientes, dois pacientes apresentaram fístula (dois de 11, 18,8%) necessitando de colostomia, e em um destes houve reversão posterior do trânsito; assim, operação em um estágio foi realizada com sucesso em 38% e em 75% foi evitada colostomia permanente. Descompressão do cólon por SEMS foi alcançada em 83% dos pacientes, enquanto 17% tinham HP. No tempo da cirurgia planejada, 67% dos pacientes no grupo cirurgia endolaparoscópica tiveram sucesso em cirurgias de um estágio, os quatro pacientes restantes tiveram ileostomia revertida (33%); finalmente, no grupo endolaparoscópico nenhum paciente foi deixado com estoma permanente. Além disso, os pacientes randomizados para o grupo endolaparoscópico em relação à cirurgia de emergência tiveram significativamente maior sucesso nas operações de um estágio (16 vs. 9; p = 0,04), menos perda de sangue acumulado (50 ml vs. 200; p = 0,01), menor infecção da ferida (2 vs. 8, p = 0,04), redução da incidência de fístula (0 vs. 2; p = 0,045) e maior coleta de linfonodos (23 vs. 11, p = 0,05). Cheung e cols. 52 sugerem que a descompressão do cólon fornece o tempo de reanimação necessário, estadiamento adequado e preparo intestinal seguro para ressecção eletiva minimamente invasiva. Com efeito, a incidência de anastomose primária é duas vezes maior que na cirurgia de emergência. A incidência de estorna e as complicações pós-operatórias são significativamente reduzidas 52. Estudos observacionais comparando o uso de SEMS seguido por cirurgia planejada vs. cirurgia de emergência (HP, ou PRA) já foram realizados. Martinez-Santos 53, em um estudo não randomizado e prospectivo comparando 43 pacientes no grupo SEMS com 29 pacientes no grupo de cirurgia de emergência, relataram uma taxa de sucesso técnico de 95% no grupo SEMS, no entanto, apenas 26 pacientes no grupo SEMS tiveram cirurgia adicional: no tempo de cirurgia planejada para SEMS, a comparação das taxas médias de SEMS vs. cirurgia de emergência mostraram: anastomose primária 84,6% vs. 41,4%, com p = 0,0025; morbidade de 40% vs. 62%, p = 0,054; internação na UTI de 0,3 vs. 2,9 dias, p = 0,015; reintervenção de 0% vs. 17%, p = 0,014; mortalidade foi 9% vs. 24%, porém sem atingir significância estatística 53. No entanto, o estudo é um pouco confuso, pois inclui também uma grande população de SEMS paliativo 14 e as duas populações SEMS são por vezes misturadas e, em seguida, comparadas ao grupo de cirurgia de emergência. Resultados semelhantes são relatados também em estudos retrospectivos menos robustos 50,54. Tinley 55, em 2007, realizou uma metanálise de estudos não randomizados que comparou SEMS e cirurgia aberta para obstrução intestinal maligna: SEMS foi tentado em 244 de 451 pacientes (54,1%), com uma taxa de sucesso de 92,6%; mortalidade ocorreu em 14 (5,7%) em SEMS e em 25 (12,1%, p = 0,03) em uma cirurgia de emergência 55. Esta metanálise, porém, foi provavelmente prejudicada pelo a heterogeneidade do estudo, uma vez que ambos os grupos foram submetidos a stent paliativo ou como ponte para a cirurgia. Nesta metanálise, a taxa de mortalidade para implante de stent (5,7%) foi muito mais elevada que a taxa de 0,6% relatada em uma grande revisão sistemática 45. Pouco se sabe sobre os resultados oncológicos de usar SEMS como uma ponte para cirurgia eletiva. Um artigo recente recomenda que a cirurgia deve ser agendada
11 DIRETRIZES NO TRATAMENTO DO CÂNCER OBSTRUTIVO DO CÓLON ESQUERDO 11 logo após a inserção do stent, devido ao risco de propagação do tumor a partir de perfuração e deslocamento do stent 56. No entanto, viés de seleção, de indicação e de temporização do stent pode explicar o alto nível de complicações relacionadas com SEMS e, consequentemente, o conselho dos autores sobre sobrevivência a longo prazo 57. Finalmente, não há disponível nenhum estudo comparando a sobrevivência em SEMS versus outras opções cirúrgicas. A relação custo/efetividade do SEMS é um parâmetro importante, já que os stents são muito caros. Pensa-se que seu custo é compensado pela menor permanência hospitalar e pela menor taxa de realização de colostomia. Dois estudos de análise de decisão nos EUA e no Canadá calcularam a relação custo/efetividade de duas estratégias concorrentes stent colônico e ressecção de emergência primária para OLCC 58,59. Ambos concluíram que stent de cólon seguido por cirurgia eletiva é mais eficaz e eficiente que a cirurgia de emergência. Um pequeno estudo retrospectivo do Reino Unido, em 1998, mostrou que implante paliativo de stent em comparação com cirurgia descompressão permite poupar uma média de 1.769, enquanto o stent como uma ponte para a ressecção eletiva vs. HP de emergência seguido pela reversão eletiva do trânsito intestinal salvou uma média de Um ECR da Grécia comparando SEMS e colostomia para tratamento paliativo de pacientes com obstrução inoperável parcial maligna do cólon mostrou diferença muito pequena nos custos, com o grupo de stent sendo 6,9% (132 euros) mais caro por paciente 36. Outro estudo da Suíça mostrou o SEMS 19,7% menos oneroso que a cirurgia 61. Nenhum destes estudos incorporou os custos ocultos de sacos de colostomia utilizados na comunidade. Apesar de stents parecerem ter uma relação custo/efetividade aceitável, os resultados são difíceis de comparar, porque os custos dos cálculos variam em diferentes sistemas de saúde. Custos diferentes para paliação e pontes para a cirurgia, e o custo dos stents é provável que diminua ao longo do tempo. Recomendação: SEMS deve ser usado como uma ponte para cirurgias eletivas em hospitais de referência específicos e em doentes selecionados, principalmente por sua utilização parecer associada a menor mortalidade, menor tempo de internação, e uma menor taxa de formação de colostomia (grau de recomendação 1B). CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta conferência teve como objetivo analisar as evidências científicas disponíveis sobre as modalidades de tratamento para OLCC e como estas são implementadas na prática clínica. O objetivo dos autores foi oferecer apoio prático e científico no manejo da OLCC. A comissão científica fez todos os esforços para recolher e classificar a melhor evidência científica disponível sobre o tratamento de OLCC (Tabela 6.2). Posteriormente, a discussão conjunta e do painel científico desempenhou um papel fundamental nas declarações do consenso. Todos os participantes da conferência concordaram que o encontrado na literatura é relativamente pobre e que os ECR existentes muitas vezes não são suficientemente robustos; portanto, entre seis modalidades de tratamento possíveis, apenas duas atingiram o grau A.
12 12 ATUALIDADES EM CLÍNICA CIRÚRGICA - INTERGASTRO E TRAUMA 2012 Tabela 6.2 Evidências Utilizadas para Formação do Presente Consenso Tipo de Evidência C vs. HP HP vs. PRA TC vs. SC SC + ICI vs. SC + MD SEMS vs. C in Palliation SEMS + Surgery vs. Surgery Total de Estudos RCT PNRS/OS ,6,12-14, ,53,54 14 CSR SR MA Análise de Custo , RCT: Ensaio clínico randomizado; PNRS/OS: estudo prospectivo não randomizado/estudo observacional; CSR: revisão sistemática Cochrane; SR: revisão sistemática; MA: metanálise. Para ajudar na tomada de decisão, os autores desejam sugerir que os cirurgiões considerem mais três pontos-chave relacionados à OLCC: estratificação dos pacientes de acordo com as regras ACPGBI; ambiente clínico; habilidade do cirurgião. O objetivo, como de costume, é oferecer a melhor opção para o paciente. O procedimento em estágios, com preferência para duas fases, deve ser reservado quando a terapia multimodal é esperada ou em caso de cenários dramáticos. PRA com descompressão manual é uma opção segura e parece estar associada a melhores resultados. HP pode ainda ter um papel em pacientes de alto risco para deiscência de anastomose. TC é uma opção atraente em caso de tumores ou pólipos sincrônicos e/ou iminente ou real ameaça de perfuração do cólon direito. SEMS representam uma valiosa opção, tanto ao tratamento paliativo como a uma ponte para cirurgia eletiva. Obviamente, alta experiência clínica e técnica são obrigatórias para tratar a obstrução do cólon por stents com sucesso e segurança: devido a esta consideração, o uso de rotina na prática ainda é limitado. No entanto, apoiamos fortemente a aplicação judiciosa do processo e encorajamos uma maior utilização de stents após o treinamento adequado em hospitais de referência, com a meta de testar ainda mais esta modalidade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Phillips RK, Hittinger R, Fry JS, Fielding LP. Malignant large bowel obstruction. Br J Surg. 1985;72: Mella J, Biffin A, Radcliffe AG, Stamatakis JD, Steele RJC. Population-based audit of colorectal cancer management in two UK health regions. Br J Surg. 1997;84:
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