Hartmann estudou gestão hoteleira mas cedo descobriu a paixão pelo vinho FOTO: DR

Transcrição

1 Como se faz um grande sommelier 15 de Setembro de 2011, por Ana Filipa Luzia Tem apenas 25 anos e garante que o seu gosto pelo vinho começou aos 16 anos, razão pela qual se mudou para Londres, cidade onde diz ser possível provar todo o tipo de vinhos. Começou a sua carreira norestaurante Kronenschloesschen, em Rheingau, e já trabalhou directamente com o Master Sommelier Hendrick Thoma. Falamos de Johannes Hartmann, actual headsommelier do restaurante Petrus, propriedade do conhecido chef de cozinha Gordon Ramsay. Numa breve passagem por Portugal, Hartmann falou-nos um pouco mais de si. Estudou gestão hoteleira e já tem um percurso brilhante no mundo vinho. Quando e como descobriu o seu gosto pelo vinho? Aos 16 anos. Estava a estagiar e percebi que gostava mais de vinho do que da parte hoteleira. Vivi então a minha primeira experiência mais próxima do vinho, na feira Prowein, em Dusseldorf, à qual fui por minha conta. Não sabia como abordar um vinho e muito menos como prová-lo, por isso comecei a pensar como poderia melhorar. Entretanto, comecei a visitar adegas e, com o tempo, percebi este sonho de me tornar sommelier. Pensava que não ia ser possível porque sempre achei que era necessário ter qualidades vastíssimas e sempre vi um sommelier como uma pessoa intocável (risos). Mas acabei por decidir seguir em frente e, por sorte, conheci o head-sommelier do restaurante Kronenschloesschen numa adega onde falámos um pouco. Ele ficou impressionado com a forma como eu falava de vinho, gostou e acabou por me oferecer o lugar de sommelierque, claro, aceitei. Foi um ano e meio depois que conheci o Hendrik Thoma e fiquei muito impressionado com ele. Respeito-o muito. Hartmann estudou gestão hoteleira mas cedo descobriu a paixão pelo vinho FOTO: DR Como foi trabalhar com Hendrik Thoma? O que mais recorda desses tempos? Trabalhei com ele pouco tempo, apenas sete meses. O Hendrik estava no Hotel Louis C. Jacob, em Hamburgo, e candidatei-me. Cheguei a estar lá, mas ele saiu pouco tempo depois. Ele é um master sommelier com grandes qualidades. É um mestre no que faz, em todos os sentidos. Ssabe como entreter as pessoas, como falar com elas... No que diz respeito ao trabalho, tive que ser muito cuidadoso já que ele presta bastante atenção ao que fazemos, questionando sempre o que fazemos. É muito exigente.

2 Hendrik Thoma, mentor de Hartmann FOTO: symposio.com Como é que chega a head-sommelier no restaurante Petrus? Eu já trabalhava para a empresa do Gordon Ramsay como sommelier e entretanto ouvi falar do novo Petrus. Sempre esteve lá mas surgiu na altura renovado, como uma reencarnação do antigo e prestigiado Petrus. Decidi então candidatar-me à vaga desommelier e segui para entrevista, acabando por ficar. Entretanto, a antiga head-sommelier, japonesa, mudou-se para Hong-Kong e fiquei no lugar dela. No fundo, fui promovido (risos). E como é trabalhar com Gordon Ramsay e a sua equipa? Estou a gostar imenso. Eu gosto muito do Gordon Ramsay, respeito-o bastante e acho que o que fez pela indústria da culinária é extraordinário. Na verdade, eu pensava que não se passava muita coisa em termos de fine dinning e com ele percebi que estava errado. Mas sim, é muito positivo, ainda que ele nem sempre lá esteja por ter tantos restaurantes e viajar tanto. Mas está lá o seu nome e a sua gestão e ele motiva-nos muito. Ele está sempre de bom humor, desde que as coisas corram bem! (risos) Nunca gritou comigo mas, nunca se sabe (risos). Petrus, onde o jovem sommelier trabalha actualmente FOTO: isgplc.com

3 Gordon Ramsay FOTO: telegraph.co.uk Na sua opinião, quais as principais características que um sommelier deve ter? Deve ser uma pessoa muito aberta e flexível, interessando-se por coisas novas com paixão e dedicação. Como em qualquer outra profissão, se não houver paixão não há motivação e, aqui, esta é muito necessária. São precisas muitas horas. Pode dizer-se que é necessária uma grande vontade de aprender? Exactamente. Não é estudar, tornar-se sommelier e parar, fazendo apenas o que se aprendeu. Em dois anos estamos desactualizados! É preciso ir sempre tomando atenção aos novos vinhos e é preciso não esquecer que todos os anos há novas colheitas. É um estudo para toda a vida. E depois, penso que é necessário também ter os sentidos apurados para perceber o que o vinho apresenta. É evidente que se pode treinar mas não deixa de ser um talento. Quais os vinhos mais pedidos? O Petrus vai ser sempre um espaço muito eclético no que respeita ao pedido de vinhos. Mas os clientes continuam a pedir-me muito os brancos de Borgonha e os vinhos de Bordéus. Isso não consigo mudar! Mas há cada vez mais pessoas a pedir vinhos com interesse e valor em termos da dicotomia preço-qualidade e nessa categoria já pode entrar, por exemplo, um branco português ou um tinto do Douro. Mesmo os apreciadores de vinhos da velha guarda estão cada vez mais atentos às novas tendências e a perceber que nem sempre é preciso gastar muito dinheiro em châteaux para se provar bom vinho. Há outros vinhos no mercado também interessantes e que valem a pena provar. E neste momento, há algum vinho que esteja a recomendar particularmente? É difícil responder a isso... depende do meu humor (risos).

4 Johannes Hartmann FOTO: DR Já teve oportunidade de provar os vinhos portugueses? O que achou? Sim. Nesta visita em particular ainda não consegui visitar um wine bar, infelizmente. Mas no geral, posso dizer que gosto bastante dos vinhos portugueses, são muito bons. À semelhança dos vinhos alemães, os portugueses tiveram também alguns problemas de reputação e os clientes, especialmente em Inglaterra, não esquecem essas coisas. Mas hoje é bastante visível a qualidade e, pessoalmente, recomendo muitos vinhos tintos do Douro. Para o futuro, o que é que ainda quer fazer? Sou muito novo e, agora, o que quero mesmo é ser bem sucedido no Petrus e conseguir uma óptima lista de vinhos. Mas depois quero muito viajar. Já viajo bastante, mas quero fazê-lo ainda mais e quero descobrir o mercado asiático. Além disso, gostaria de abrir o meu próprio negócio, não só ligado ao vinho mas também com uma vertente turística. Há muitas oportunidades, felizmente, e penso que o vinho é um bom motor de arranque. Sobretudo, tem de ser algo que goste porque nunca iria fazer algo de que não gostasse... Tenho boas perspectivas! (risos) Que conselho deixa a quem quer seguir a profissão? Apurem os vossos sentidos, primeiro que tudo, e não copiem os outros. Tentem ser vocês próprios porque senão não passarão de cópias e perderão o rasto à vossa identidade. Só se acreditarem nos vossos instintos e no que estão a fazer vão conseguir encontrar o vosso caminho. Se um sommelier não conhecer os vinhos ou até mesmo os preços e confiar demasiado nas adegas, pode ficar desconfortável. Acho também que devem ser o mais objectivos possível... E arriscar

5 Sim, arriscar. Venham a Londres que é uma cidade fantástica para se conseguir boas ligações no mundo do vinho. Há cá muitos sommeliers e masters sommeliers e os fornecedores de vinhos promovem provas todas as semanas. Há sempre coisas novas a acontecer, é fácil aprender e é muito fácil provar coisas novas. Um dia mais tarde, Nova Iorque ou Hong Kong poderão vir a ser locais cruciais mas, neste momento, para umsommelier, Londres é o sítio para se estar. «voltar